A palavra zelote significa “aquele que finge ou simula ter zelo” e foi adotada para nomear a operação que investiga um dos maiores esquemas de sonegação de impostos e fiscais do país. Em 26 de março de 2015, a Polícia Federal deu início à investigação de um suposto esquema de corrupção no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), que estaria vendendo sentenças e decisões em benefício de grandes empresas. Associado ao Ministério da Fazenda, o Carf é uma espécie de tribunal especializado em julgar recursos da Receita Federal. Por meio desse órgão, por exemplo, cidadãos e empresas podem questionar impostos, multas e outras penalidades recebidas, antes de ir à justiça.
COMO FUNCIONA O CARF?
O Conselho de Administração de Recursos Fiscais é um órgão colegiado que reúne conselheiros por 2 anos de mandato, em um modelo de gestão paritária, ou seja, igualmente divididos em:
Enquanto os primeiros 50% são auditores indicados pela Receita Federal, os outros 50% são compostos por advogados, no geral, na função de defender a perspectiva dos contribuintes. Esses últimos, antes da Operação Zelotes, trabalhavam sem remuneração. A partir de então, passaram a trabalhar em regime de dedicação exclusiva, para que não haja mais conflito de interesses e portas abertas à corrupção.
Alguns relatórios da Polícia Federal, por exemplo, apontaram que certos conselheiros omitiam-se ou alteravam seus votos para favorecer certas empresas, em troca de pagamentos em dinheiro. De acordo com o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, essa estrutura paritária acoberta somente grandes contribuintes que estão em débito com a Receita Federal.
O MOVIMENTO DAS INVESTIGAÇÕES
Ao que indica, esse esquema possivelmente teve início no ano de 2005, mas as investigações mesmo começaram apenas em 2013, quando um envelope com duas páginas de denúncias foi deixado na Polícia Fazendária, em Brasília. No decorrer das investigações iniciais, notou-se que servidores e conselheiros do Carf fraudavam a tramitação dos processos e, por conseguinte, o resultado da sentença do Conselho. Como isso acontecia?
Com o poder do voto na deliberação de processos, os conselheiros eram subornados para reduzir ou anular os valores das multas, que seriam aplicadas pela Receita Federal. Além disso, também vendiam informações privilegiadas para influenciar decisões quanto a Medidas Provisórias (MP), em benefício próprio. Foi desse modo, por exemplo, que uma montadora de automóveis teria pago R$57 milhões para aprovar a MP 471, em 2009, o que lhe rendeu R$879,5 milhões em vantagens fiscais, segundo O Globo.
O rombo nos cofres públicos chegou a R$5,7 bilhões (valor apurado até março de 2015). Já o montante dos processos investigados alcança a casa dos R$19 bilhões, valor este que quase se iguala ao valor presente na Operação Lava Jato (estima-se que seja por volta de R$20 bilhões), além de superar o valor de outras investigações do mesmo gênero, como o Mensalão.
A Operação Zelotes investiga cerca de 70 empresas, majoritariamente bancos, montadoras e escritórios de advocacia. A Polícia Federal investiga envolvimento das seguintes instituições:
- Banco Bradesco;
- Banco Safra;
- Banco Santander;
- BankBoston;
- Café Irmãos Júlio;
- Cimento Penha;
- Ford;
- Gerdau;
- Grupo RBS;
- J.G. Rodrigues;
- Mitsubishi;
- Mundial-Eberle;
- Entre outras, que você pode conferir nesta lista completa.
Além das instituições acima, o Partido Progressista, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seu filho também estão sendo investigados pela operação. Qual foi a conexão encontrada na investigação?
A Polícia Federal convocou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 11 de dezembro de 2015, a prestar contas de uma duvidosa compra de Medidas Provisórias (MP). Aqui, levanta-se a suspeita de que um grupo de empresários e lobistas pagou por essas medidas, que beneficiaram instituições do setor automotivo e que este agregado de pessoas possuíam contatos livres e diretos na Presidência da República durante o governo do então presidente Lula. A empresa Marcondes e Mautoni, uma das instituições suspeitas de se envolver no esquema, tem um contrato com o filho do ex-presidente num valor aproximado de R$ 2 milhões. Esse contrato refere-se a um serviço de consultoria.
Confira também: Operação Lava Jato e o combate à corrupção.
AS FASES DA OPERAÇÃO
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CASOS SEMELHANTES
A “Operação Quatro Mãos”, deflagrada em 06 de julho de 2016 pela Polícia Federal, prendeu um membro do Carf. O movimento partiu de uma denúncia de uma empresa de grande porte no momento em que o membro quis influenciar no processo do julgamento. Mesmo sendo no mesmo campo e com certa semelhança, a operação não possui nenhum vínculo com a Zelotes.
E COMO ESTÁ A OPERAÇÃO ZELOTES HOJE?
No dia 14 de Junho, o presidente do Banco Bradesco, Luiz Carlos Trabuco Cappi foi inocentado pelo TRF (Tribunal Regional Federal). A sentença foi por unanimidade, visto que não havia causa suficiente para acusá-lo.
Já em 22 de junho, a ex-presidente Dilma Rousseff prestou um depoimento por videoconferência como testemunha em um processo relacionado à Operação Zelotes. O depoimento foi prestado em Porto Alegre, e durou em média uma hora e meia. A ex-presidente é também testemunha do Ministério Público Federal, e respondeu perguntas tanto de acusação quanto de defesa. Por fim, o depoimento foi encaminhado para a 10ª Vara em Brasília. Hoje, as investigações ainda estão em andamento.
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Ficou mais fácil entender o que se passou no Carf e como aconteceu a corrupção?
Fontes: Polícia Federal; Valor Econômico; Dicionário; Folha de São Paulo; Operação Zelotes – G1.