Índices de democracia: como mensurar os princípios democráticos?

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O exercício da cidadania de forma consciente e crítica é um aspecto essencial para qualquer sociedade. Nesse sentido, é indispensável conhecer os índices de democracia para poder se posicionar diante de tantos dados e informações que são apresentados constantemente pelos meios de comunicação e pela internet. 

Desta forma, os índices de democracia influenciam a checagem de fatos, o processo de formulação de políticas públicas, pesquisas acadêmicas e uma infinidade de usos.

Mas afinal, por que os índices de democracia existem? Quais são eles? O que os números mostram? Neste texto, vamos discutir tudo isso e um pouco mais!

Veja nosso vídeo também sobre o que é uma democracia!

Afinal, o que é democracia?

A definição de democracia não é tão óbvia quanto parece. Este é um conceito abstrato e possui diversas explicações. Há quem diga que democracia é a presença de eleições, porém regimes ditatoriais podem passar por processos eleitorais.

Leia mais: Ditadura militar no Brasil

Há também quem diga que é na democracia que a vontade da maioria sobressai ou que é o governo do povo. Porém, a conclusão que podemos chegar é que tentar definir democracia pela sua forma de funcionamento não nos levará a uma resposta. 

Em resumo, vamos definir a democracia como um regime político, ou seja, uma forma de organização do conjunto de instituições políticas do Estado. Dessa forma, de acordo com o cientista político Robert Dahl, um regime democrático pleno deve cumprir duas condições: participação pública e contestação do governo.

Quantos aos tipos de democracia, destacam-se três:

  • Democracia representativa: o povo elege representantes que irão representar seus interesses na tomada de decisões políticas;
  • Democracia direta: a própria população participa diretamente da tomada de decisões políticas;
  • Democracia participativa: cria-se uma co-gestão de assuntos de interesse público entre o povo e o governo.

O que são índices de democracia?

Um índice (também conhecido por taxa ou indicador), de acordo com uma definição simples do dicionário online, pode significar “aquilo que revela alguma qualidade”, ou seja, é uma maneira de quantificar e/ou substituir um conceito. Um índice pode avaliar e medir fenômenos, tendências e contextos em determinadas sociedades.

Em resumo, o índice serve para indicar algo e, na estatística, esses indicadores irão apresentar a evolução de um aspecto ao longo do tempo.

Dessa forma, os índices da democracia servem para analisar o nível da democracia ao redor do mundo. Em alguns índices de democracia, por exemplo, estão contidas dimensões como o processo eleitoral e funcionamento do governo, que podem ser mensuradas com indicadores, como: as eleições são justas e livres? A administração pública recebe interferência do poder político de outros países?

Alguns índices de democracia variam entre 0 e 1, considerando que quanto mais perto de 1, mais democrático é o local; e quanto mais perto de 0, menos democrático.

Mas por que os índices de democracia são importantes? Iremos entender a seguir!

Quiz: tipos de democracia? Teste o que você sabe sobre eles!

Preparamos um infográfico para tornar mais fácil a compreensão do conteúdo!

Por que esses índices são importantes?

Apesar da falta de consenso na definição do conceito de democracia, a existência de ferramentas que alertem a situação política no mundo são importantes. A democracia moderna apresenta características capazes de demonstrar o funcionamento pelo, ou não, das instituições. 

Portanto, é necessário saber quando o sistema está em funcionamento pleno ou não. Por isso, é necessário realizar medições regularmente, em escalas mensuráveis e menos subjetivas, ou seja, medir com dados quantitativos.

Índices de Democracia: importância e impasses metodológicos

Quando estudamos democracia, algumas dúvidas e impasses metodológicos podem surgir. Esses impasses funcionam como um ciclo.

O primeiro impasse é dizer o que é democracia: a democracia é um regime político cuja definição pode se tornar bastante ampla e, para alguns, abstrata, pois existe uma gama de pensadores que definem democracia de maneiras diferentes: o que é democracia para alguém acaba não sendo democracia para outra pessoa. 

Saiba mais: O que é democracia

A partir disso, devemos prestar atenção para o segundo impasse: quais propriedades devem ser consideradas? Deve-se levar em conta aspectos que têm validade para a vida real, buscando entender se a característica faz sentido para nossa sociedade atualmente, ou seja, em democracias modernas. 

A metodologia para identificar a presença das características democráticas nos países também pode se tornar um problema metodológico. É difícil visualizar, de forma concreta, se um país possui determinada característica democrática quando não se define bem o que ela significa. Vamos pensar em uma situação hipotética: 

Imagine um país que possua eleições para eleger um presidente, mas essas eleições acontecem sob ameaças e perseguições aos cidadãos. É provável que, no índice, a presença das “eleições” nesse país não seja considerada por não estar de acordo com os princípios democráticos.

E por fim, quantas características são necessárias para considerar um país democrático? Se apenas um aspecto da democracia estiver presente em um Estado-nação, no caso as eleições, só esse aspecto é suficiente para dizer que o local é democrático?

Os índices de democracia têm como aspiração principal resolver a maior parte das questões apresentadas acima, avaliando o que não é diretamente observável (no caso, a democracia), a partir de coisas observáveis (como as eleições), e por isso são tão importantes. 

Assim como os problemas que acabamos de discutir estão relacionados entre si, as características que explicam a democracia também estão, na forma de um índice de democracia. Características isoladas nunca irão explicar sozinhas a democracia, mas sim em conjunto.

A seguir, iremos conferir alguns indicadores de democracia.

V-DEM

O Variedades de Democracia (tradução livre), ou V-DEM, fornece uma base de dados ampla e desagregada que reflete a complexidade do conceito de democracia, que vai além da simples presença de eleições. 

Em linhas gerais, faz-se uma distinção entre cinco ideias de democracia:

  • Eleitoral;
  • Liberal;
  • Participativa;
  • Deliberativa; e
  • Igualitária.

São 450 indicadores sobre democracia e sistemas políticos, com isso, o V-DEM cobre 202 países. Aproximadamente metade dos indicadores se baseiam em informações obtidas em documentos oficiais como constituições e outros, e a outra metade consiste em avaliações mais objetivas por cerca de 2.500 especialistas em questões como cumprimento de regras e práticas políticas. 

O V-Dem desenvolve técnicas teoricamente embasadas para agregar indicadores em índices. Você pode checar neste link de forma interativa todos os indicadores que o V-DEM possui.

O Índice avalia, com notas de 0 a 1, o quanto um país se aproxima de um regime ditatorial completo (0) ou de uma democracia plena (1). Em 2020, o Brasil registrou pontuação de 0,51, e foi considerado o quarto país que mais se afastou da democracia no ano.

The Economist Intelligence Unit – Índice de Democracia

O The Economist Intelligence Unit (The EIU) faz parte do Economist Group, fazendo previsões econômicas, políticas e sociodemográficas, e presta consultoria através de análises e pesquisas, com prognósticos econômicos e análise de riscos em países.

O Índice de Democracia foi criado pela The EIU, em 2006, e recebe atualizações anuais desde 2010, nos fornecendo uma ideia da situação da democracia em 165 países independentes e em 2 territórios. Ele se baseia em cinco categorias democráticas

  • Processo eleitoral e pluralismo;
  • Liberdades civis;
  • Funcionamento do governo;
  • Participação política;
  • Cultura política.

Para mensurar as categorias, são usados cerca de 60 indicadores para formar uma pontuação geral que varia de 0 a 10 para cada país (cada categoria também varia de 0-10). Assim, os países são classificados numa escala: os que têm pontuação de 0 a 4 são regimes autoritários, de 4 a 6 regimes híbridos, de 6 a 8 democracias imperfeitas, e de 8 a 10 democracias plenas.

Em 2020, o Brasil foi considerado pelo The EIU como uma democracia imperfeita. A pontuação total do país foi de 6,92. O desempenho do Brasil (na 49.ª posição do ranking) é:

CategoriaPontuaçãoDesempenho
Processo eleitoral e pluralismo9,58Excelente
Liberdades civis7,94Razoável
Participação política6,11Abaixo da média
Cultura política5,63Fraco
Funcionamento de governo5,36Fraco
Tabela: Politize!

Outros índices de democracia

Freedom House

Esta instituição promove a mudança democrática através da defesa dos direitos humanos com foco em direitos políticos e liberdades civis, através de ações como a publicação anual de relatórios com indicadores da liberdade no mundo, liberdade na internet e na mídia, além do monitoramento de eleições, da defesa do estado de direito, da liberdade religiosa e dos direitos LGBTI.

Veja também: Direitos humanos: conheça as três gerações!

Em 2020, o Brasil recebeu a classificação de “país livre”, com 74 pontos em uma escala de 0 a 100. Em termos de Liberdade na Internet, a Freedom House classifica o Brasil como parcialmente livre, com uma pontuação de 63 de 100.

Em 2022, o Brasil se manteve nessa classificação, porém pontuando menos do que em relação a 2020. Nesta edição, o Brasil marcou 72 pontos. Quanto à Liberdade na Internet, o país permanece como parcialmente livre, com 65 pontos.

World Values Survey (WVS)

Uma rede internacional de pesquisadores que estuda a mudança gradual nas percepções das pessoas e os impactos dessa mudança na vida social e política de quase 100 países. Atualmente coleta dados com quase 400 mil pessoas, com indicadores que tratam sobre a importância da democracia para as pessoas, a escolha de líderes em eleições livres, dominação religiosa, dentre outros.

Em pesquisa realizada pelo WVS entre 2010 e 2014 no Brasil, 62.1% da população entrevistada considera o fato das mulheres terem os mesmos direitos que os homens como uma característica fundamental da democracia.

Quality of Government Institute – QOG

É uma instituição que tem como foco a qualidade do governo, mas vem construindo bases de dados não só com este indicador, mas também com o índice de democracia liberal e o índice de democracia deliberativa, considerando se o chefe do Executivo é um oficial militar e outros indicadores.

O QOG reúne indicadores de outras iniciativas, como o BTI Project, em uma única base de dados. Em 2015, o indicador “participação política” presente na base de dados construída pelo QOG, teve um valor de 9 no Brasil, se aproximando muito de 10 e, portanto, representando um ótimo valor para questões como a escolha de governantes e outras liberdades.

Entretanto, em 2022, sete anos depois, o Brasil ocupa o 29º lugar com o valor de 8.25. Nas demais categorias, a classificação do país foi:

  • Estaticidade  (capacidade do Estado): 9.0;
  • Participação política: 8.3;
  • Estado de Direito: 8.0;
  • Estabilidade das Instituições Democráticas: 9.0;
  • Integração política e social: 7.0.

Índice da Democracia 2022: ranking dos países com as melhores e piores posições

O Índice de Democracia de 2022 evidencia cinco grandes mudanças no ranking, sendo três positivas e duas negativas. Sendo assim:

  • Chile, França e Espanha voltam à categoria “democracia plena”, principalmente devido à atuação do governo durante a pandemia em 2020 e 2021;
  • Nova Guiné e Peru foram rebaixados da categoria “democracia defeituosa” para “regime híbrido”;
  • Cresceu o número de “democracias plenas” indo de 21, em 2021, para 24, em 2022;
  • Diminui o número de “democracias falhas”, indo de 53 para 48;
  • Aumentou o número de “regimes híbridos”, indo de 34 para 36.

Diante disso, o número de “regimes autoritários” permaneceu o mesmo, sendo 59.

Sendo assim, os 10 países com os melhores posicionamentos no ranking do Índice de Democracia de 2022, são:

  1. Noruega – 9.81 pontos;
  2. Nova Zelândia – 9.61 pontos;
  3. Islândia – 9.52 pontos;
  4. Suécia – 9.39 pontos;
  5. Finlândia – 9.29 pontos;
  6. Dinamarca – 9.28 pontos;
  7. Suiça – 9.14 pontos;
  8. Irlanda – 9.13 pontos;
  9. Países Baixos – 9.00 pontos;
  10. Taiwan – 8.99 pontos.

Por outro lado, os 10 países com os piores posicionamentos no ranking foram:

  1. Afeganistão – 0.32 pontos;
  2. Myanmar (antiga Birmânia) – 0.74 pontos;
  3. Coreia do Norte – 1.08 pontos;
  4. República Centro-Africana – 1.35 pontos;
  5. Síria – 1.43 pontos;
  6. República Democrática do congo – 1.48 pontos;
  7. Turcomenistão – 1.66 pontos;
  8. República do Chade – 1.67 pontos;
  9. Laos – 1.77 pontos;
  10. Guiné Equatorial – 1.92 pontos.

O Brasil foi considerado uma “democracia falha” e ocupou o 51º lugar, com 6.78 pontos, 2 posições abaixo em relação ao último ano. Quanto às outras categorias, confira a pontuação brasileira:

  • Processo eleitoral e pluralismo: 9.58 pontos;
  • Liberdades civis: 7.65 pontos;
  • Funcionamento do governo: 5.00 pontos;
  • Participação política: 6.67 pontos;
  • Cultura política: 5.00 pontos.

Como podemos ver, existe uma variedade de índices de democracia, construídos por diversos projetos. Usar estes índices como fontes de informação sobre os contextos democráticos ao redor do mundo é bastante interessante e nos ajuda a entender melhor a sociedade.

Quando acompanhamos algum índice ao longo do tempo, é fácil relacionar o valor do índice a um determinado período de tempo com acontecimentos políticos e econômicos daquele período. Agora que sabemos quais ferramentas usar, por que não acompanhar o valor desses índices no Brasil nos próximos anos?

O que achou do resultado do Brasil nesses índices de democracia? Comente a sua percepção!

Referências:

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Conteúdo escrito por:
Graduanda em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Tem interesse nas áreas de Políticas Públicas, Análise de Dados e Comportamento Político.
Brito, Mariana. Índices de democracia: como mensurar os princípios democráticos?. Politize!, 19 de fevereiro, 2018
Disponível em: https://www.politize.com.br/indices-de-democracia/.
Acesso em: 20 de nov, 2024.

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