A segurança pública é um tema que, de forma praticamente diária, está em pauta na imprensa brasileira. A sensação de insegurança e o medo estáão presentes na vida de grande parte da sociedade civil brasileira, principalmente nos grandes centros urbanos.
Assim como o acesso à saúde, à educação e à moradia, a garantia de ir e vir com segurança é um direito fundamental previsto pela Constituição Federal de 1988, sendo dever do Estado assegurá-lo.
Neste texto, você vai conhecer os órgãos responsáveis pela segurança pública no Brasil. Além disso, você vai entender quais as problemáticas ligadas ao tema, algumas políticas públicas que visam diminuir a falta de segurança e também como essa sensação é mensurada.
Quem é o responsável pela segurança pública no Brasil?
O Art. 144 da Constituição traz que:
A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade [situação do que está protegido e seguro] das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
- Polícia federal;
- Polícia rodoviária federal;
- Polícia ferroviária federal;
- Polícias civis;
- Polícias militares e corpos de bombeiros militares.
A Polícia Federal, Rodoviária Federal e Ferroviária Federal são organizadas e mantidas pela União. A Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros militar são forças auxiliares e reserva do Exército e, junto à Polícia Civil, são subordinados aos governadores.
A nível ministerial, há a Secretaria Nacional da Segurança Pública, órgão do Ministério da Justiça com competência para implementar, acompanhar e avaliar as políticas e programas nacionais de segurança pública.
Cabe ainda a essa Secretaria incentivar os órgãos estaduais e municipais a elaborarem planos integrados de segurança, além de fortalecer e integrar os órgãos responsáveis pela segurança dos territórios nacionais.
Ainda segundo a Constituição Federal, o policiamento das ruas e a manutenção da segurança são tradicionalmente conferidos à Polícia Militar.
Que tal um infográfico para entender quem faz o quê?
Como mensurar a violência?
Você sabia que, em média, a cada nove minutos uma pessoa é morta violentamente no Brasil? O medo cotidiano ao sair de casa e transitar por vias públicas pode ser vivenciado por qualquer cidadão brasileiro que resida em uma das metrópoles do país ou mesmo em uma cidade de médio a grande porte.
Como forma de medir o nível de insegurança ou violência das cidades, são utilizados dados de indicadores que expressam o número de crimes contra o patrimônio (como furtos) e a vida. Tais indicadores são construídos e seus dados coletados e analisados, geralmente, pelas Secretarias de Estado responsáveis pela segurança de cada unidade federativa.
Após o recolhimento de dados em cada estado, um panorama nacional é publicado anualmente pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Os crimes violentos letais e intencionais (CVLI) são o termômetro da violência no Brasil, uma vez que expressam a maior preocupação do cidadão quando o assunto é segurança.
O infográfico abaixo, elaborado pelo G1, traz os dados desde 2007, ano em que o FBSP começou a medição.
Confira o infográfico em sua publicação original
Saiba mais: Feminicídio: a faceta final do machismo no Brasil
Como a violência se manifestou em 2022?
O Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou o 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, que traz dados atualizados sobre o quadro de violência do país.
Destacam-se o crescimento do registro de casos de violência de gênero, racismo e contra pessoas LGBTQIA+, além de uma mudança no quadro de crimes patrimoniais.
2022 foi o ano com mais casos de estupros registrados. Foram, em média, 205 estupros por dia, totalizando 74.930 vítimas, considerando também os casos de estupros de vulneráveis. Nesse sentido, 6 em cada 10 vítimas tinham até 13 anos.
Especialistas relatam que, o crescimento de registros de estupro de vulneráveis pode ter ocorrido devido a volta às aulas presenciais. Isso porque o papel da escola no combate aos crimes sexuais contra crianças e adolescentes é essencial para que as denúncias sejam feitas.
O documento registrou um aumento de 68% de crimes de racismo e o crescimento de 54% de crimes contra pessoas LGBTQIA+. Apesar disso, muitos casos podem estar subnotificados, pois além de não serem registrados nas delegacias, alguns estados não divulgaram informações para o Fórum, o que dificultou na mensuração dos dados.
Além disso, observou-se uma nova configuração de crimes patrimoniais no Brasil depois da pandemia de Covid-19. Em 2022, foram registrados 208 golpes virtuais por hora e 1.819.409 crimes de estelionato somente neste ano. Isso representa um crescimento de 326,3% desde 2018.
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Quem mata e quem morre?
76,5% das vítimas de homicídio no Brasil são negras. O perfil de quem mata e morre no país é o mesmo: homens negros, com baixa escolaridade e baixa renda, moradores de periferia e com idade de até 29 anos.
A construção social do nosso país se correlaciona ao problema da segurança pública nacional, assim como o perfil dos principais atores envolvidos. A escravidão foi abolida no Brasil em 1888, mas não foram criadas políticas públicas de inclusão e trabalho para a comunidade negra.
É só reparar nos empregos que não exigem tanta qualificação e, consequentemente, pagam salários menores. Eles são ocupados, em sua maioria, por negros. Ainda existe a falha do Estado em fornecer acesso digno à moradia, escolas e serviços básicos e de direito dos cidadãos. Somado a isso, a criminalização dessas pessoas foi naturalizada, fazendo com que as periferias se tornassem o único refúgio.
Ainda podem ser mencionados diversos recortes da violência no país, como os feminicídios, os assassinatos brutais contra a população LGBTI+ e as mortes relacionadas às Polícias Civis e Militares.
Em um ranking mundial de 83 países, o Brasil ocupa a quinta posição em homicídios femininos, com uma taxa de 4,8 assassinatos para 100 mil mulheres, das quais 65% são negras. No que diz respeito à comunidade LGBTI+, ocorre um assassinato por dia relacionado à homofobia. Além disso, somos o país que mais mata transexuais no mundo.
Em 2022, 172 policiais foram assassinados e 82 cometeram suicídio. Entretanto, a maior parte dessas mortes ocorreram durante a folga desses policiais.
Para uma visualização melhor de todos esses dados, nós criamos um infográfico para você!
Os desafios da segurança pública no Brasil e políticas públicas para sua solução
Na teoria, pensar em segurança envolve os órgãos policiais e o Corpo de Bombeiros, além do Ministério da Justiça, controle de fronteiras e sistema carcerário, por exemplo.
Na prática, e no nosso recorte de segurança pública nas ruas, o termo é reduzido e diretamente associado à Polícia Militar. Ligado a essa associação, a maioria dos brasileiros têm uma visão negativa sobre o desempenho desses profissionais. Os números apontam que cerca de 7 em 10 brasileiros desconfiam do trabalho da Polícia.
Atribuir à Polícia Militar a responsabilidade de enfrentar e diminuir a violência é um fardo muito pesado e, por muitas vezes, não muito efetivo. Os crimes contra a vida deveriam ser tratados de uma forma intersetorial. Ou seja, com a implementação de políticas públicas inteligentes que englobam o investimento não só em policiamento, mas também em esporte, lazer, educação, saúde e acesso ao trabalho, por exemplo.
De uma forma geral, deve-se entender que tudo está conectado e, portanto, não se diminui a violência nas cidades sem que haja ações de melhoria na qualidade de vida dos principais atores que a promovem.
A violência no Brasil atinge todas as classes sociais. Portanto, as políticas públicas e a ação do Estado devem envolver desde os bairros de elite, até as comunidades mais vulneráveis.
Pensando dessa maneira, no dia 16 de maio de 2018, o Senado Federal aprovou o projeto de lei 19/2018 para a criação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp). O Susp objetiva a integração dos órgãos nacionais de segurança, como as polícias, secretarias estaduais de segurança e guardas municipais, para que atuem de forma cooperativa e sistêmica.
Além disso, o projeto também institui a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS), sancionada pelo então presidente Michel Temer, que propõe a ação conjunta da sociedade e dos órgãos de segurança e defesa social da União, estados, Distrito Federal e municípios.
Veja também nosso vídeo sobre o que é necropolítica!
Boas práticas no âmbito da segurança pública
Como o Brasil é um país continental, desigual e diverso, é importante agir nas esferas menores, como a municipal, entendendo assim os contextos locais.
Políticas públicas eficientes no enfrentamento da violência podem ser amplamente desenvolvidas pelas cidades, no que diz respeito à prevenção de delitos e diminuição de situações que possibilitem a ocorrência de crimes.
Alguns especialistas brasileiros em segurança pública citam o controle às armas de fogo e a diminuição da desigualdade social como alguns dos pontos principais no combate à violência. Eles ainda afirmam que o país precisa priorizar tal questão, incluindo efetivamente o tema da segurança na agenda pública nacional.
É necessário entender a violência como um fenômeno complexo, variável e mutável.
Em relação a isso, o coordenador do núcleo sobre Políticas de Segurança da UFPE, José Luiz Ratton, mencionou alguns pontos que considera indispensáveis para a segurança pública. Entre eles estão:
- Construção de mecanismos eficientes de redução da violência policial;
- Prevenção e investigação dos crimes contra a vida;
- Controle as armas de fogo com políticas de longo prazo;
- Atenção ao encarceramento elevado e humanização das prisões;
- Adoção de políticas sobre drogas.
Ignácio Cano, professor e membro do Laboratório de Análise da Violência da UERJ, elucida que são necessários programas voltados aos jovens da periferia. Afinal, essas são as pessoas que representam o recorte populacional mais afetado pela violência nas cidades.
Além de tais iniciativas, deve-se buscar a melhoria das taxas de esclarecimento de homicídios e uma mudança no policiamento ostensivo no país.
A segurança pública é um dos problemas mais alarmantes da sociedade brasileira atual. Políticas de longo prazo, inteligentes, planejadas e efetivas são fundamentais no seu combate. É necessário ter em mente que o entendimento das peculiaridades locais, o estudo de boas práticas nacionais e internacionais, assim como a priorização do assunto segurança pública nas agendas governamentais podem ser o ponto chave para sua solução.
E aí, conseguiu entender o cenário da segurança pública no Brasil? Deixe sua opinião nos comentários!
Referências
- G1 – Brasil registra quase 60 mil pessoas assassinadas em 2017
- Âmbito Jurídico – Direito Fundamental à Segurança Pública
- O Globo – Especialistas em segurança pública afirmam que país deve priorizar combate à violência
- Agência Patricia Galvão – Feminicídio
- Fórum Brasileiro de Segurança Pública – Dados
- G1 – Queda no número de homicídios em 2018
- Fórum de Segurança Pública – Infográfico Consciência Negra
- Carta Capital – Militarização: uma história do Estado contra o povo
- UOL – ONG aponta recorde de LGBTs mortos no Brasil em 2017
- Jornal do Commercio – Polícia brasileira é a que mais mata e a que mais morre
- G1 – Polícia que mata, polícia que morre
- Fórum de Segurança Pública -Retrato da violência contra negros e negras no Brasil
- Fórum de Segurança Pública – Segurança pública em números – 2017 registra quase 60 mil pessoas assassinadas em 2017
- Senado – Segurança pública integrada
- Senado – Senado aprova o Sistema Único de Segurança Pública
- Gov.BR – Senasp
- Fórum de Segurança Pública – Anuário Brasileiro de Segurança Pública
1 comentário em “Segurança pública brasileira: responsáveis, números e desafios”
Ótimo artigo escrito Ícaro, um produção textual bem clara e objetiva com apresentação de dados estatísticos alarmantes e enfatizantes, e arrisco dizer, assustadores deste cenário devastador, que é a violencia no país. De fato, falta sim investimentos e força de vontade de nossas autoridades em ” se mexer” em busca da solução destes conflitos, como voce cita, através de políticas públicas inteligentes, pois a integração dos órgãos responsáveis pela Segurança Pública já existe, só muitas das vezes não se faz presente por motivos maiores.