Alguns municípios e estados tem desempenhado grandes papéis nas economias regionais ao criarem novas ferramentas para atingir objetivos locais de desenvolvimento. As ações adotadas, a autonomia e a independência em contatos internacionais deu a esses atores nacionais visibilidade em ambiente global. Essas relações conduzidas por governos subnacionais ou regionais em busca de seus interesses são conhecidas como paradiplomacia.
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Uma visão tradicional
No contexto do pós-Guerra Fria e dos processos de globalização, a década de 1980 foi marcada pelo surgimento de novas demandas políticas, econômicas e sociais a nível global. Com isso, novos atores passaram a agir despertando mudanças nas relações internacionais.
Mas o que isso significa?
Nas teorias tradicionais das Relações Internacionais, os Estados-Nações – provenientes da Paz de Westfália (1648) – eram considerados os únicos atores relevantes nas relações a nível global. Nessa visão clássica, é atribuição dos Estados nacionais atuarem nas relações exteriores e na tomada de decisões sobre o desenvolvimento interno dos países, isso porque é considerado que estes são dotados de soberania.
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Para tanto, os governos locais eram tidos como meros executores de obras públicas, provedores de serviços básicos e reguladores da vida comunitária. Ou seja, pelo paradigma dominante das relações internacionais supõe-se que há uma separação entre o âmbito internacional (federal) e o doméstico (municipal ou estadual).
A mudança de paradigma
As novas relações econômicas e a necessidade de desenvolvimento motivaram entes subnacionais a se relacionar e cooperar com o mundo exterior. As novas tecnologias da informação, os avanços nas telecomunicações, a diminuição nos custos de transporte de cargas e pessoas também contribuíram para essa mudança, afinal tornaram o plano internacional mais acessível.
A partir da década de 1980, os textos normativos no direito internacional também passaram a considerar o papel dos estados-municípios no desenvolvimento econômico e social dos países, fortalecendo, a partir de 1990, o status jurídico desses entes no direito internacional. Passou a existir, portanto, uma linha muito tênue na separação dos assuntos domésticos e de cunho internacional.
Com novas redes profissionais e de ativismo político, organizações não governamentais e movimentos sociais, os temas sociais, a educação, a cultura, os direitos humanos, as politicas de gênero, o meio ambiente, o comércio exterior e outros que já incorporavam as pautas da política externa passaram a ser assuntos primários para os entes subnacionais. Desta forma, a atuação dos governos locais e governos regionais nas relações exteriores se fortaleceu lado a lado a temas mais tradicionais como a segurança nacional, cooperação militar e acordos entre países.
Diplomacia e a paradiplomacia: qual a diferença?
A primeira é um instrumento utilizado pelos países na política externa com o objetivo de estabelecer contatos pacíficos com outros países e atingir seus interesses em um âmbito nacional e internacional.
A segunda envolve todas as atividades externas e processos de implementação de cooperações, investimentos e aproximações realizados pelos entes subnacionais (municípios e estados) de diversos países.
Atividades da paradiplomacia
Os governos locais ou regionais podem praticar a paradiplomacia por meio de algumas estratégias, sendo estas:
- Estabelecimento de vínculos para promoção de interesses comuns;
- Criação de escritórios permanentes em cidades no exterior, com o objetivo de captar investimentos, promover o comércio e divulgar o potencial turístico do local;
- Assinatura de acordos e convênios no exterior com outros atores internacionais;
- Promoção da cooperação interregional e criação de associações interregionais transnacionais;
- Participação em feiras e outros eventos internacionais de negócios visando a promoção de produtos, serviços, tecnologia, turismo do município;
- Cooperação transfronteiriça entre territórios contíguos de diferentes Estados nacionais;
- Participação nas delegações nacionais, conferências, eventos e missões no exterior envolvendo temas globais, com o objetivo de apresentar e defender os interesses específicos ligados ao território municipal ou estadual;
- Sediar eventos internacionais para promoção de comércio, turismo e atração de investimentos;
- Participação em organizações de integração supra-estatais, como o Mercosul ou a União Europeia;
- Cooperação para o desenvolvimento e ajuda humanitária.
A paradiplomacia no mundo
A internacionalização dos governos locais constituiu uma importante ferramenta para alcance de seus próprios objetivos de desenvolvimento e transformação da economia, dos fluxos globais de comércio e dos investimentos. Vamos ver alguns exemplos de países onde há atuação da paradiplomacia!
O Canadá é um dos exemplos mais tradicionais de paradiplomacia. Conforme sua constituição, as províncias devem dividir a responsabilidade pelo desenvolvimento e crescimento econômico com o governo central. Uma das responsabilidades dos estados-municípios, por exemplo, é o incentivo as exportações, já que o aumento desta atividade é um canal para criação de empregos, para incentivar o crescimento da economia e para atrair investimentos.
Já na América Latina, podemos citar o exemplo do México. No país, mesmo havendo prescrição legal que a atribuição de exercer a política externa é do governo central, a localização geográfica fronteiriça aos EUA contribui para relações paradiplomaticas e um significativo incremento econômico.
Outro exemplo é a Argentina. No país, há um modelo institucional que delega às províncias argentinas o direito de criar regiões para o desenvolvimento econômico e social, além também da possibilidade de criar órgãos para cumprir a celebração de convênios e tratados internacionais. Nesse sentido, Buenos Aires é considerada destaque no país. Por concentrar a maioria dos fatores produtivos da Argentina, a cidade foi elevada a condição de Cidade Autônoma de Buenos Aires, tornando-se a única cidade autônoma em relação à província (ou Estado).
A experiência brasileira
Governos democráticos e, preferencialmente, sistemas federativos são ambientes importantes para a existência de paradiplomacia, como é o caso do Brasil.
Nossa Constituição de 1988 atribui competência internacional à União, porém, mesmo que não institucionalizada, existem condições propícias para que os estados e municípios possam desenvolver atividades paradiplomáticas.
O papel dos entes subnacionais brasileiros teve seu inicio com processos de integração regional: integração Argentina-Brasil, criação do Mercosul e também em relação ao Paraguai, Uruguai e Bolívia.
Nesse sentido, os Estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, por exemplo, foram os primeiros a criarem estruturas institucionais de relações internacionais, visando obter benéficos acordos de integração envolvendo política, cooperações técnicas e investimentos financeiros.
Ainda, nessa questão, podemos citar as cidades de São Paulo e Porto Alegre. As duas cidades foram as primeiras a obterem êxito ao constituírem seus próprios gabinetes paradiplomáticos e reivindicarem a negociação direta perante as agências internacionais.
Atualmente, os entes subnacionais do nosso país desempenham atividades como: executar e acompanhar projetos internacionais; organizar, coordenar e apoiar a realização de eventos internacionais; identificar oportunidades de projetos, premiações, ações e boas práticas nacionais e internacionais; e promover a captação de investimentos.
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REFERÊNCIAS
Guilherme de Cruzeiro Iser: Os entes subnacionais nas Relações Internacionais: o fenômeno da paradiplomacia.
Maria Clotide Meirelles Ribeiro: Globalização e novos atores: a paradiplomacia das cidades brasileiras.
Diandra Schatz Ferreira: PARADIPLOMACIA NAS CIDADES BRASILEIRAS: Elementos impulsionadores internos.