Homeschooling: o que é, como funciona, no Brasil é permitido?

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Imagem: Foto da mãe ajudando seus filhos a aprender em casa – Fonte: Freepik

O homeschooling foi apresentado como projeto de lei durante anos no Congresso Nacional, mas somente nesses últimos quatro anos que ganhou relevância no debate público. Mas afinal de contas, o que é homeschooling? Neste texto a Politize! vai te explicar sobre o assunto.

Veja também nosso vídeo sobre a fragmentação partidária!

O que é homeschooling e como funciona?

Homeschooling é o termo americano que refere-se à modalidade em que os filhos aprendem de forma personalizada sem a necessidade de frequentar a escola

De acordo com Barbosa (2013, p. 17):

“Cabe enfatizar a possibilidade de diferentes formas de realização e prática do homeschooling, mediante um estudo estruturado (seguindo programas e cronogramas de atividades) ou um estudo livre baseado nos interesses das crianças; realizado dentro da casa ou em outros espaços livres e/ou locais públicos; com uso dos recursos educacionais locais ou não; ou mesmo na combinação de duas ou mais formas”

O homeschooling ganhou popularidade no século XIX, como antagonista ao modelo tradicional de ensino. Durante o século XX nos Estados Unidos da América – EUA, surge o movimento da desescolarização, que defendia o retorno da educação formal para a família.

Este movimento era formado no primeiro momento, por pedagogos progressistas, que acreditavam que cada aluno aprendia de uma maneira e que o melhor ensino era o individualizado.

Mas, a partir de 1980, as ideias da desescolarização foram associadas ao pensamento conservador, que questionava o ensino tradicional, por motivo, de valores morais, religiosos e a qualidade do ensino. 

O norte-americando John Holt (1923-1985) professor e ativista do movimento da desescolarização foi um dos grandes percursores da popularização do homeschooling nos EUA e no mundo.

A respeito de John Holt, Barbosa (2013), a partir de Gaither (2008), ressalta:

John Holt (1923-1985) foi um educador norte-americano, explícito defensor do homeschooling e pioneiro na teoria dos direitos da juventude. Em seus dois livros iniciais (How Children Fail, 1964; How Children Learn, 1967), estão detalhadas as ideias básicas de sua filosofia educacional, na qual destaca como a educação compulsória destrói a curiosidade natural das crianças em aprender e coloca no lugar desta medo e habilidades necessárias para passar nos testes.” (BARBOSA, 2013, p. 95).

Hoje, a modalidade é autorizada em mais de 60 países, como: Austrália, EUA, Finlândia, Japão e Nova Zelândia. Em contrapartida, é proibido, em países como: Alemanha, Coreia do Sul, Holanda, Suécia e Uruguai.

De acordo com a Associação Nacional de Educação Domiciliar – ANED, atualmente existem 35 mil famílias e 70 mil estudantes entre 4 e 17 anos na modalidade de ensino homeschooling no Brasil.

Homeschooling no Brasil é permitido?

Imagem: Votação na Câmara dos Deputados acompanhada por pais, mães e crianças nas galerias do Plenário / Fonte: Agência Câmara de Notícias

Nos últimos anos o homeschooling vem ganhando espaço no meio midiático e no debate público, entretanto, o tema não é novo, e foram apresentadas dez propostas ao longo do tempo. 

Porém, ganhou mesmo visibilidade nacional, em 2018, quando o Supremo Tribunal Federal – STF, reconheceu a modalidade de ensino como constitucional, desde que regulamentada por lei Federal. O Governo Federal entre os anos de 2019-2022, defendeu o homeschooling como principal proposta para a educação.

No ano de 2020, por causa da pandemia do coronavírus – COVID-19, alguns estados e municipios começaram a elaborar leis para autorizar a educação domiciliar como resposta à situação dos alunos não poderem frequentar a escola. 

O governador de Brasília, por exemplo, sancionou a lei que permitia o homeschooling na capital. Apesar disso, a modalidade de ensino segue proibida, porque o texto não foi regulamentado.

Outro fato que chama atenção das autoridades sobre a temática, ocorreu em 2021, foi a situação da estudante aprovada na Universidade de São Paulo – USP. Impedida de fazer a matrícula no curso de engenharia, pois a sua vida acadêmica, foi cursada inteiramente na modalidade de ensino doméstico. Sem vínculo com nenhuma instituição escolar, situação atual que não é permitida por lei.

Até o momento, não existe nenhuma lei que assegure a educação domiciliar no Brasil. Veja o que diz os cincos dispositivos legais que garantem a educação como um dever da família e do Estado: 

  • Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal: Abandono intelectual – Art. 246 – Deixar, sem justa causa, de prover à instrução primária de filho em idade escolar: Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa. (BRASIL, 1940, n.p.).
  • Constituição da República Federativa do Brasil (1988): Art. 205, que assegura a educação como “[…] direito de todos e dever do Estado e da família […].” (BRASIL, 2018,p. 160).
  • Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do adolescente: Art. 4º e Art. 53 dispõem sobre o dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público na efetivação da educação, entre outros direitos (BRASIL, 1990, n.p.).

O dispositivo aponta, a obrigatoriedade da matrícula e a frequência na instituição escolar, de acordo com os seguintes artigos:

Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.

Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de: 

II – reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares.(BRASIL, 1990, n.p.).

  • Na Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional):

Destaca-se o art. 2º que, além de dispor sobre o dever da família e do Estado com a educação, estabelece a sua finalidade: “[…] o pleno desenvolvimento doeducando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”(BRASIL, 1996, n.p.).

Art. 5º. O acesso à educação básica obrigatória é direito público subjetivo, podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída e, ainda, o Ministério Público, acionar o poder público para exigi-lo.

§ 1º. O poder público, na esfera de sua competência federativa, deverá:

I – recensear anualmente as crianças e adolescentes em idade escolar, bem como os jovens e adultos que não concluíram a educação básica; .

II – fazer-lhes a chamada pública;

III – zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.

§ 2º. Em todas as esferas administrativas, o Poder Público assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatório, nos termos deste artigo, contemplando em seguida os demais níveis e modalidades de ensino, conforme as prioridades constitucionais e legais.

§ 3º. Qualquer das partes mencionadas no caput deste artigo tem legitimidade para peticionar no Poder Judiciário, na hipótese do § 2º do art. 208 da Constituição Federal, sendo gratuita e de rito sumário a ação judicial correspondente.

§ 4º. Comprovada a negligência da autoridade competente para garantir o oferecimento do ensino obrigatório, poderá ela ser imputada por crime de responsabilidade.

Art. 6º. É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 (quatro) anos de idade. (BRASIL, 1996, n.p.)

  • Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil: Art. 1.634: “Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:

I – dirigir-lhes a criação e a educação” (BRASIL, 2002a,n.p.).

O que os especialistas dizem sobre o homeschooling?

Não existe dados científicos que comprovem o desempenho do aluno no Brasil. A própria Associação Nacional de Educação Domiciliar (ANED) admite que não é possível medir os resultados acadêmicos da educação escolar em casa, devido ao receio das famílias serem processadas.

Ainda, conforme o site da instituição, posiciona-se a favor dos pais escolherem a modalidade de ensino dos filhos. Argumenta que a sua posição é baseada na Declaração Universal de Direitos HumanosDUDH e no Código Civil Brasileiro – CC. Veja o que diz os artigos da DUDH e CC/CF:

Segundo o Art. 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

  1. Todo homem tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico profissional será generalizada; o acesso aos estudos superiores será igual para todos em função dos méritos respectivos.
  2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos nacionais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.
  3. Os pais têm prioridade de direito de escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos (ONU, 1948).

De acordo com o Art. 1.634 da Lei nº. 10.406 de 10 de Janeiro de 2002 do Código Civil, seção II – Do direito do Exercicio do Poder da Familia:

Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: 

I – dirigir-lhes a criação e a educação.

Por outro lado, a Organização da Sociedade Civil Todos pela educação, posiciona-se contra o modelo homeschooling. Conforme a OSC Todos Pela Educação:

“Ao analisar aspectos de natureza legal, o Parecer nº. 34/2000 do CNE menciona, por exemplo, o princípio com base no qual o ensino deve ser ministrado relativo à “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” (art. 208, I). 

Ao mesmo tempo, “a Constituição Federal aponta nitidamente para a obrigatoriedade da presença do aluno na escola, em especial na faixa de escolarização obrigatória (…), instituindo para o Poder Público a obrigação de recensear, fazer a chamada escolar e zelar para que os pais se responsabilizem pela frequência à escola” (CF, art. 208, § 3º).

Abordando a finalidade da Educação de promover “o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (LDB, art. 2º), o Parecer da CEB/CNE conclui que a Educação é dever do Estado e da família.

“Porque a família, só ela, jamais reunirá as condições mínimas necessárias para alcançar objetivos tão amplos e complexos”. Afirma também que a solidariedade humana e a tolerância recíproca, que fundamentam a vida em sociedade, “não deverão ser cultivados no estreito (no sentido de limitado) espaço familiar”.

Na opinião dos brasileiros, segundo o Datafolha, a pesquisa divulgada em 14 de maio de 2022, mostra que 8 em cada 10 brasileiros reprovam o ensino doméstico.

O levantamento mostra que 78,5% discorda totalmente dos pais terem o direito de tirar os filhos da escola para ensiná-los em casa, 62,5% totalmente, e 16% em parte. A pesquisa também afirma que 89,9% das pessoas concordam que crianças devem ter o direito de frequentar a escola mesmo que os pais sejam contra.

O que muda com a regulamentação do homeschooling?

Imagem: Câmara dos Deputados aprova projeto que regulamenta o homeschooling / Fonte: Agência Brasil – EBC

O projeto de lei a PL nº. 3.179 de 2022 aprovado na Câmara dos Deputados, propõe regulamentar as etapas do ensino fundamental I e II, e o ensino médio. Contudo, o responsável que escolher a modalidade de educação escolar em casa, deve cumprir alguns requisitos, para que possam oferecer o ensino para seu filho (a) ou tutelado (a). Os requisitos são:

  • Escolher uma instituição credenciada; 
  • Realizar a matrícula do estudante (anualmente);
  • Apresentar comprovante de escolaridade de ensino superior reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC);
  • Apresentar os Antecedentes Criminais da Justiça Federal e Estadual ou Distrital;
  • Vincular o estudante ao órgão competente do sistema de ensino e ser atualizado anualmente;
  • Cumprir a Nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC);
  • Realizar a formação integral, observando o desenvolvimento intelectual, emocional, físico, social e cultural;
  • Registrar as atividades pedagógicas recorrentes e relatórios trimestrais dessas atividades;
  • Acompanhar o desenvolvimento do estudante junto com um profissional e fazer encontros semestrais;
  • Assegurar a convivência familiar e comunitária;
  • Garantir que o aluno realize as avaliações de aprendizagem;
  • Participar da avaliação estadual ou municipal da educação básica.

Por fim, o projeto de lei segue para a análise do senado, caso aprovado, vai para sanção presidencial, caso seja alterado, volta para câmara. 

E você, o que achou do ensino homeschooling? Deixe o seu comentário.

Referências:
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1 comentário em “Homeschooling: o que é, como funciona, no Brasil é permitido?”

  1. Miriam R. M Moreira

    Muito bom!
    Concordo que tudo precisa esta dentro dos parâmetros da lei e sendo averiguado para que realmente aconteça a aprendizagem.
    Creio que essa opção é valido e importante para quem tem condições de fazer com responsabilidade. Estou aguardando essa aprovação!

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Conteúdo escrito por:
Professor de Ciências Sociais. Bacharel em Administração Pública-UFVJM. Pós-graduando em Educação em Direitos Humanos – UFVJM e graduando em História – UFTM.
Botelho, Patrick. Homeschooling: o que é, como funciona, no Brasil é permitido?. Politize!, 12 de fevereiro, 2023
Disponível em: https://www.politize.com.br/homeschooling/.
Acesso em: 23 de nov, 2024.

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