O atual governo Lula (PT) tem se reunido para discutir os detalhes do novo arcabouço fiscal. A medida entrou nos planejamentos do novo governo devido às críticas feitas por Lula ao teto de gastos públicos desde a campanha eleitoral de 2022.
No entendimento do atual presidente, as regras do teto de gastos excluem os mais empobrecidos do orçamento público e não atribui prioridade a áreas consideradas essenciais, como: infraestrutura, moradia, educação e saúde.
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Para que você possa entender o que é o arcabouço fiscal e o que a medida pretende alterar na atual regra fiscal, a Politize! compilou neste texto estas e outras informações. Acompanhe!
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O que é o arcabouço fiscal
Antes de tudo, você deve estar se perguntando o que significa arcabouço, ou então, por que chamam essa nova regra de arcabouço fiscal. Saiba que arcabouço significa “um conjunto de coisas” e, nesse caso, fiscal refere-se a receitas e despesas do governo. Por isso, nomeou-se a mudança como “arcabouço fiscal”.
A proposta será um conjunto de regras que irá direcionar a forma como o governo federal irá administrar as contas públicas. A questão que se coloca é: de onde surgiu a possibilidade de criar-se uma nova regra fiscal?
No fim de 2022, antes mesmo do novo governo ser empossado, foi aprovada e sancionada a PEC da Transição. Dentre uma série de medidas, a Proposta de Emenda Constitucional determinou que o governo apresentasse, por meio de projeto de lei complementar, até 31 de agosto de 2023, uma nova regra fiscal para substituir o teto de gastos.
De forma resumida, essa âncora fiscal corresponde a uma série de regras econômicas e fiscais que devem ser obedecidas pela gestão eleita para governar entre 2023-2026. Essas normas substituirão o teto de gastos, atual regra em vigor no país, aprovada em 2016 por Michel Temer.
No fim, o objetivo das duas medidas, teto de gastos e arcabouço fiscal, é o mesmo: controlar os gastos públicos a fim de deixar as contas públicas no azul.
De acordo com o plano de governo da chapa Lula-Alckmin, o objetivo é construir um “novo regime fiscal, que disponha de credibilidade, previsibilidade e sustentabilidade”.
Quem assume o debate sobre o arcabouço fiscal, a nova regra do orçamento federal, são os ministros da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e do Planejamento, Simone Tebet (MDB). A dupla será responsável por definir o texto que deve ser apresentado ao atual presidente Lula (PT), antes mesmo de ser encaminhado para apreciação do Congresso Nacional.
Arcabouço fiscal é um rebranding do teto de gastos?
Entendendo que o termo “rebranding” refere-se ao processo pelo qual empresas e instituições costumam adotar para realizar ajustes e reestruturação em sua marca, alterando a maneira como se colocam ao público e ao mercado, alguns especialistas têm chamado o novo arcabouço fiscal de um rebranding, ou seja, como se fosse um novo teto de gastos.
O teto de gastos, criado em 2016, é considerado uma das maiores âncoras fiscais do país, seu objetivo central é impedir o descontrole das contas públicas, dessa forma, todo governo deve obedecê-lo. Porém, cabe lembrar que essa não é a única regra a ser seguida, a legislação brasileira instituiu outras duas:
- A meta de resultado primário (déficit ou superávit), fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias correspondente a cada ano;
- A regra instituída pelo Artigo 167 da Constituição Federal, que obriga os governos a pedirem autorização do Congresso para emitir títulos da dívida pública em alguns casos.
Por isso, o arcabouço fiscal tem sido chamado de “novo teto”, pois dentre suas metas a cumprir estão os objetivos de:
- Estabilizar a dívida pública;
- Equilibrar as contas do governo;
- Aumentar o investimento em áreas sociais, consideradas prioritárias.
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Em resumo, Fernando Haddad afirma que a proposta será uma combinação da Lei de Responsabilidade Fiscal e do teto de gasto, buscando afastar os defeitos presentes nas duas medidas. Simone Tebet aposta que a proposta irá considerar a preocupação em zerar o déficit fiscal e estabilizar a relação dívida/PIB, garantindo os investimentos sociais necessários para fazer o país crescer novamente.
Por que se fala em novo arcabouço fiscal
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O governo Lula entende que o teto de gastos não permitiu que o país investisse, como deveria, em áreas como infraestrutura, moradia, educação e saúde. Além disso, a medida caiu em descredibilidade devido às exceções que foram criadas para driblar o cumprimento da regra, na visão da economista Vilma Conceição, diretora-executiva da Instituição Fiscal Independente (IFI).
“A regra do teto vem perdendo eficácia e não há mais garantia de que será capaz de assegurar a sustentabilidade fiscal”, afirmou Vilma Conceição ao G1.
Por estes motivos, a equipe econômica de Lula pretende criar novos parâmetros fiscais que permitam, segundo ela, estabilizar a dívida pública ao mesmo tempo que garanta o investimento em áreas consideradas prioritárias.
Caso o novo arcabouço fiscal não seja implementado, o governo Lula terá que:
- Aumentar o endividamento para cumprir promessas de campanha;
- Contar com o aumento de arrecadação através da melhora da economia;
- Aumentar os impostos da população e das empresas.
A âncora fiscal tem sido chamada de novo arcabouço fiscal, pois o Brasil já possui regras fiscais que determinam como o governo pode utilizar os recursos públicos e como deve gerir a dívida pública, levando em consideração o dever que o Estado brasileiro tem de honrar seus compromissos.
Entre elas estão a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), aprovada em 2000 pelo governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), assim como o Teto de Gastos, aprovado em 2016 durante a gestão de Michel Temer (MDB), que determinava que as despesas só poderiam crescer em relação a variação da inflação.
A principal crítica da equipe de Lula ao teto de gastos é que a medida “engessaria” os gastos públicos, limitando a quantidade de recursos destinados a uma área. Por outro lado, durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), foram aprovadas Propostas de Emenda Constitucional (PEC) que possibilitaram exceções quanto a utilização do orçamento, a exemplo da PEC dos Precatórios
Portanto, o novo arcabouço fiscal propõe uma revisão das regras que deverão ser seguidas pelos governantes nos próximos anos, ou seja, pretende-se estabelecer novos padrões de governança e dar uma nova perspectiva sobre como o governo conduzirá sua política fiscal e cuidará para equilibrar os gastos públicos com a responsabilidade social.
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O que se espera do arcabouço fiscal
Segundo a proposta, o objetivo é “instituir regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do país e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico”.
Entretanto, a medida precisa encontrar uma saída para as contas públicas de 2023, já que a previsão é de um déficit primário de R$ 231,5 bilhões. De forma resumida, o déficit público é a diferença entre o que o governo arrecada e o que é gasto. Desse modo, um dos pontos previstos é zerar o déficit público até 2024 e finalizar o ano de 2023 com o déficit em até R$ 100 bilhões.
A partir do aval do atual presidente, Lula (PT), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), tornará o texto público e dará encaminhamento ao Congresso Nacional, onde será discutido e votado até o fim de agosto deste ano.
Espera-se que o novo arcabouço fiscal traga maior credibilidade e segurança jurídica para o país, tranquilizando as incertezas em relação aos gastos públicos e amenizando, sobretudo, as desconfianças que os investidores possam ter em relação ao Brasil. Dessa forma, a expectativa é que a taxa de juros (Selic) diminua no médio e longo prazo.
Manter a taxa de juros alta facilita o endividamento do governo, pessoas físicas e empresas, o que, consequentemente, desacelera o crescimento econômico. Portanto, diminuir os juros favorece o crescimento da economia.
Outra expectativa é que, com a alteração das regras, o governo Lula aumente a disponibilidade de recursos voltados para políticas sociais: tanto para a criação de novos programas quanto para a ampliação dos já existentes.
Argumentos contrários e favoráveis
A ministra do planejamento, Simone Tebet (MDB), afirma que o novo arcabouço fiscal poderá agradar a todos, inclusive o mercado financeiro, pois a proposta atende pontos de interesse em comum:
- Zerar o déficit fiscal;
- Estabilizar a relação dívida/PIB;
- Garantir os investimentos necessários que farão o país voltar a crescer.
Na opinião do cientista político André César, da Hold Assessoria, o arcabouço fiscal parece ser mais um “rebranding” do teto de gastos, possuindo uma opinião mais neutra quanto à proposta.
“É outro nome para o mesmo produto. O governo Lula quer se diferenciar do antigo governo até na questão semântica. Talvez tenha alguma mudança no teto, que deve subir, mas tem que ver o que vai ser mesmo porque até agora ninguém viu”, disse em entrevista a Exame.
O economista Sérgio Vale, da MB Associados, acredita que no médio e longo prazo, o arcabouço poderá ajudar no crescimento da economia, na disponibilidade de crédito, assim como no controle da inflação.
“O arcabouço fiscal, se ele for bem-feito e significar queda mais consistente de juros no futuro, essa queda de juros pode resultar em mais crédito e maior crescimento econômico”, explicou o economista ao G1.
Por outro lado, agentes do mercado, entrevistados pela BBC News Brasil, têm demonstrado preocupação quanto ao tema e consideram que esta pode ser a primeira grande batalha de Lula no Congresso Nacional, o que servirá para verificar o tamanho de sua base parlamentar e a habilidade de sua equipe em executar articulações políticas.
“O mercado está ansioso porque, ainda que seja só narrativa, o governo só tem falado em expansão do gasto e não em corte de despesas. Isso eleva a preocupação dos agentes do mercado sobre a trajetória e a sustentabilidade da dívida”, afirmou Gabriel Leal de Barros, da Ryo Asset, em entrevista à BBC News Brasil.
A economista Vilma Conceição alertou para a trajetória entre a dívida pública e o PIB,
“Hoje, nossa dívida tem uma trajetória insustentável. O novo arcabouço tem que indicar como é que o governo vai conduzir a dívida e trazê-la para parâmetros mais equilibrados e sustentáveis”, disse à BBC News Brasil.
O novo arcabouço fiscal será bem aceito pelo Congresso Nacional?
A avaliação de especialistas entrevistados pela BBC News Brasil, é de que aprovar o novo arcabouço fiscal poderá ser a primeira grande batalha de Lula no Congresso Nacional e listam alguns motivos.
- Motivos cronológicos;
- Motivos políticos.
O primeiro motivo, cronológico, se dá pelo fato de que, se o novo arcabouço fiscal for apresentado ao Congresso em março, sua tramitação começará antes da Reforma Tributária, outra proposta do atual governo Lula. Além disso, caso a medida não seja aprovada ainda em 2023, o orçamento de 2024 deverá seguir regras fiscais antigas, ou seja, submeter-se ao teto de gastos de 2016.
Quanto ao motivo político, a aprovação do novo arcabouço será o primeiro teste da base política do governo Lula, o que exigirá muita articulação. O economista Manoel Pires afirma que essa tramitação é mais difícil do que aprovar a Reforma Tributária, pois esta última será mais fácil de adiar por alguns meses, diferente do arcabouço.
O economista Gabriel Leal de Barros, sócio e economista-chefe da consultoria Ryo Asset, explica que:
“O arcabouço é como se fosse o Plano Real do Lula. Algumas pessoas vão dizer que estou exagerando, mas não acho que seja o caso. Essas regras serão fundamentais para ditar o futuro do governo, como o mercado vai reagir a ele e vão demandar muita negociação com o Congresso”, disse o economista Gabriel Leal de Barros.
E aí, conseguiu entender tudo o que está envolvido na proposta do novo arcabouço fiscal? Deixe sua opinião nos comentários!