Andando pelas ruas de São Paulo, é possível perceber diferentes regiões com características econômicas específicas. Se você pegar um trem da estação Júlio Prestes até a Consolação, por exemplo, verá uma divisão social conforme a renda da população. Essa segregação espacial ocorre em diferentes países ao redor do mundo, afetando classes sociais distintas.
Para entender um pouco mais desse fenômeno geográfico, a Politize! separou alguns pontos importantes sobre o tema neste texto.
Veja também nosso vídeo sobre a desigualdade social!
O que é segregação espacial ?
Segregação espacial é a divisão de uma região, conforme a classe social da população que nela habita. Essa separação abrange outros aspectos além do espaço, como transporte público, educação, saúde e emprego.
Devido ao aumento da urbanização no Brasil, a população foi crescendo gradativamente nos centros das cidades e, com isso, diferenciando as classes sociais por regiões. Com a especulação imobiliária, os indivíduos mais pobres são levados a escolher locais mais afastados das regiões nobres, formando assim divisões geográficas.
Veja também nosso vídeo sobre especulação imobiliária!
Segregação Residencial
É através da desigualdade social que se estabelece a segregação socioespacial dentro das cidades como uma expressão geográfica. A segregação residencial consiste no aglomerado de classes sociais distintas no meio urbano, com a ocupação de cada espaços por uma classe distinta.
Os bairros mais nobres das cidades geralmente possuem acesso a todos os serviços públicos, como saneamento básico, infraestrutura e lazer, além de concentram a maioria dos empregos. Portanto, moradores de bairros mais pobres têm de se locomover para as zonas centrais constantemente, buscando ter acesso aos comércios, escolas e parques localizados nessas regiões.
A segregação espacial na antiguidade
A separação espacial por diferentes condições econômicas existe desde a Idade Antiga, em que os indivíduos com a maior renda estabeleciam-se próximos uns dos outros. Aqueles que tinham poucas riquezas, conhecidos como plebeus, concentravam-se em regiões menos favorecidas, formando um conjunto de cabanas simples e semelhantes umas as outras.
Roma Antiga
Na Roma Antiga, os chamados patrícios exibiam um padrão de vida luxuoso, com suas residências localizadas próximas ao palácio do Imperador e aos centros de cultura, como bibliotecas, jardins e termas privadas. Porém, diferentemente de hoje, naquela época não existiam regiões específicas separando ricos e pobres. Portanto, na mesma rua poderiam haver grandes palácios e pequenas cabanas.
Grécia Antiga
Durante o período arcaico na Grécia Antiga, consolidou-se a chamada pólis grega. As duas principais cidades-estado desse período foram Atenas e Esparta, que possuíam diferentes sistemas urbanos e sociais.
Em Esparta, a organização social era dividida em hilotas, escravos que conviviam com a aristocracia; periecos, que viviam mais afastados das regiões centrais e espartanos, no topo da pirâmide social.
Em Atenas, a população era dividida em eupátridas, membros da aristocracia ateniense que tinham amplos poderes e acesso à cultura; cidadãos atenienses, que moravam perto dos grandes centros urbanos e escravos, na base da hierarquia.
Como esse fenômeno ocorre em cidades do Brasil?
As grandes metrópoles brasileiras são divididas entre o centro e a periferia. As áreas centrais são caracterizadas por possuirem mais investimentos e oportunidades de emprego. Já a periferia, onde a população de baixa renda está concentrada, conta com investimentos escassos, obrigando esses indivíduos a se deslocarem para o centro em busca de trabalho.
É possível perceber um aumento significativo da construção de condomínios fechados, ampliando ainda mais a exclusão social. Essa autossegregação é causada principalmente pela violência urbana.
Além disso, no Brasil existe também a segregação regional, ou seja, uma diferença entre as regiões brasileiras. O processo de urbanização e industrialização não foi igual em todos os estados. São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, tiveram um processo mais acelerado, se comparados a outras unidades da federação. Com isso, a segregação espacial ocorreu por motivos distintos.
Quer entender mais sobre desigualdade social no Brasil? Confira o conteúdo do Projeto Direito ao Desenvolvimento: Desigualdade social no Brasil: conheça o Novo Pacto Nacional das OSCs!
Da ponte pra cá
São Paulo atualmente possui a maior população do Brasil. Porém, desde o século XIX, a cidade é protagonista em desempenho econômico e populacional. Com a implementação do modelo industrial na capital brasileira, principalmente a partir de 1930, indivíduos de outros estados vieram para a capital paulista buscando melhores condições de vida.
O aumento da desigualdade social em São Paulo veio, portanto, principalmente devido ao aumento populacional, em razão da vinda de imigrantes para a metrópole.
Operários não tinham acesso ao setor imobiliário privado e, por consequência, buscavam oportunidades de moradia em áreas desvalorizadas da cidade. Isso provocou a ocupação de áreas como beiras de córregos, encostas, terrenos com risco de enchentes ou desabamento, áreas de proteção ambiental, entre outras.
A concentração da renda em algumas regiões da cidade tem como efeito diferenças na qualidade de vida, impactando diretamente a expectativa de vida da população, tendo em vista que bairros nobres dispõem de mais recursos financeiros.
Uma obra artística que ilustra bem o fenômeno da segregação espacial é a música do Racionais “Da ponte pra cá”. Na canção, é destacada a diferença entre os bairros de São Paulo nos versos “nós aqui, vocês lá, cada um no seu lugar”, demonstrando que existem regiões com diferentes estilos de vida, como no trecho “o mundo é diferente da ponte pra cá”.
A periferia de São Paulo sofre com falta de saneamento básico, educação e saúde, enquanto outros locais dispõem de todos esses serviços, além de espaços de cultura e lazer, como teatros, pinacotecas e museus. Assim, fica claro que a vida “diferente da ponte pra cá” é um reflexo das enormes desigualdades sociais na capital paulista.
Rio de Janeiro
No livro “O Cortiço”, do escritor Aluísio Azevedo, são retratadas casas humildes e superlotadas, conhecidas como “cortiços”, em que a população de baixa renda vivia na época. A literatura histórica representa um Rio de Janeiro diferente do atual, em que pobres moravam no centro da cidade, devido à proximidade com o seu local de trabalho.
A reforma urbana, conhecida como Reforma Pereira Passos, consistiu na demolição dessas casas populares para modernizar o centro, com a construção em seu lugar de estradas e edifícios inspirados no plano de remodelação de Paris. Alguns moradores dos cortiços deslocaram-se para a periferia, enquanto outros ocuparam as encostas dos morros, ampliando o crescimento populacional das favelas.
Segundo o IBGE, o Rio de Janeiro é o terceiro estado mais desigual do Brasil. Além da reforma urbana implementada entre 1903 e 1906, outros fatores ampliam a segregação espacial. É o caso da inflação, da informalidade e da baixa renda, que fazem com que indivíduos mais pobres procurem opções de moradias mais baratas, concentrando esse grupo em regiões precárias com ausência de recursos.
O Brasil atualmente possui 10 milhões de pessoas vivendo em áreas de risco, sendo que a maioria está localizada na região sudeste. No começo do ano foram observados diversos casos de desabamentos no litoral norte de São Paulo, deixando feridos e mortos. A segregação espacial não só afeta a mobilidade das grandes cidades, mas aumenta o risco de morte de milhares de pessoas.
Portanto, é possível perceber que sem a devida fiscalização e garantia de moradias populares o problema da segregação socioespacial irá aumentar ainda mais, colocando em risco a vida de diversas pessoas.
E aí, conseguiu entender o que é segregação espacial e como ela afeta na organização da cidade? Conta aqui nos comentários o que você achou!
Referências:
- Estadão – Segregação socioespacial: o que é e quais são seus impactos?
- Observatório das Metrópoles – Desigualdade e segregação na metrópole: O Rio de Janeiro em tempo de crise
- BEARD, Mary. SPQR: A história da Roma antiga. 1º edição. Crítica, 2017.
- DE SOUZA CAVALCANTI, Lana; ARAUJO, Manoel Victor Peres. Segregação socioespacial no ensino de Geografia: um conceito em foco. Acta Geográfica, p. 140-159, 2017.
- DA SILVA OLIVEIRA, Patrícia. REMOÇÕES NO RIO DE JANEIRO DO SÉCULO XIX E O PROCESSO DE SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL. Anais do XVI Simpósio Nacional de Geografia Urbana-XVI SIMPURB, v. 1, p. 2279-2298, 2019.
- Hughes, Pedro Javier Aguerre. Periferia: um estudo sobre a segregação socioespacial na cidade de São Paulo. 2003. 184 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2003.
- SANTOS, Douglas Parreira; FERREIRA, Idelvone Mendes. A segregação espacial e residencial na cidade contemporânea. Neves, AF, De Paula, MH, Anjos, PHR, Bernardo, JL e Pires, MGG, Estudos interdisciplinares em Ciências Ambientais, Território e Movimentos Sociais. Blucher, São Paulo, Brasil, p. 175-189, 2016.
1 comentário em “Segregação espacial: as desigualdades nas áreas urbanas”
Texto muito bem escrito e com uma linguagem acessível para entendermos sobre a realidade em nossa volta e como os espaços foram se moldando ao longo do tempo.