O Renascentismo impactou diretamente as relações humanas e práticas culturais desenvolvidas entre os séculos XIV e XVI. Essa influência continuou nos anos seguintes, já que alguns pensadores consideram a Renascença – ao lado da Reforma Protestante, da monarquia absolutista e do capitalismo – como um dos eventos-chave para entender o surgimento da Modernidade no Ocidente.
Mas, afinal, o que foi o Renascentismo? Quais eram suas características? Como suas ideias e manifestações conseguiram mudar a história da Europa? Neste artigo, a Politize! te conta tudo isso e muito mais!
Origem do Renascentismo
Como movimento intelectual, artístico, científico, econômico e político, o Renascentismo, ou Renascimento, despontou enquanto importantes transformações aconteciam na sociedade europeia. Seus princípios apareceram diante do declínio do Feudalismo, que sofria com a dinamização de espaços urbanos que, posteriormente, formariam as grandes cidades.
Nesse período, a Europa experimentava o aumento do comércio, também associado à abertura de novas rotas comerciais pelo maior domínio de territórios após as Cruzadas. Assim, as interações econômicas entre Ocidente e Oriente pela região do Mar Mediterrâneo foram sendo expandidas.
Esse contexto ainda deu origem a uma nova burguesia mercantil, que passou a praticar o mecenato junto à nobreza da época. Buscando afirmação social, os mecenas financiavam obras de artistas em ascensão. O patrocínio poderia gerar, inclusive, maior prestígio social e proteção política aos beneficiados.
Outro aspecto fundamental para o fortalecimento e a expansão do Renascimento foi a invenção da imprensa pelo alemão Johannes Gutenberg. Com a máquina, a cópia de livros e manuscritos se tornou mais fácil e barata, o que ampliou o acesso à literatura e a circulação de ideias nas mais diversas camadas da sociedade.
A Igreja Católica, por sua vez, perdia o monopólio sobre o pensamento social e as artes pelo avanço do Humanismo, uma das principais teorias de base do Renascentismo. A partir dela, o olhar teocêntrico da Era Medieval foi dando espaço aos ideais antropocêntricos, que colocavam as preocupações humanas à frente da religião.
Tamanha efervescência permitiu que o Renascentismo não só transformasse o cotidiano da época, como impulsionasse o início da Idade Moderna. Entretanto, apesar de representar alterações graduais e profundas no modo de vida europeu, o movimento não causou uma ruptura completa com as características da Idade Média.
Afinal, o que foi o Renascentismo?
O termo “Renascimento” foi usado pela primeira vez em 1550, pelo pintor e crítico de arte Giorgio Vasari.
Porém, a ideia de Renascentismo que conhecemos hoje se estabeleceu mais de trezentos anos depois pelo historiador Jacob Burckhardt, autor do livro A Cultura do Renascimento na Itália (1867). Segundo ele, o movimento é a fase de florescimento do espírito humano e a “descoberta do mundo e do homem”.
Essa noção de que a Europa passava por uma fase de “renascimento” se justificou pela retomada dos valores e costumes característicos da Antiguidade Clássica. Inspirado nas civilizações gregas e romanas, o Renascentismo buscava a revalorização do pensamento racional e da cultura humanista.
O principal foco do movimento estava na contraposição das concepções medievais do mundo – especialmente os dogmas católicos, classificados como uma espécie de atraso cultural – através de uma nova visão empírica e científica.
Além disso, os artistas renascentistas eram frequentemente cientistas e pensadores, interessados tanto na observação quanto no estudo da anatomia, da matemática e de outras áreas do conhecimento. Vários intelectuais bizantinos também se estabeleceram em solo europeu após a queda de Constantinopla em 1453.
A cronologia do movimento ainda é discutida pelos historiadores. Mas estima-se que o Renascentismo surgiu em terras italianas por volta do século XIV e, até o século XVI, já havia se estendido por toda a Europa. Florença, capital da região toscana da Itália, é considerada sua cidade berço por ter acolhido alguns dos criadores das obras mais renomadas do período.
No entanto, outras cidades italianas, como Veneza e Roma, e europeias, como Paris e Barcelona, se beneficiaram com essas manifestações econômicas e culturais.
Conheça as principais teorias que embasaram o Renascentismo
Representando uma remodelação de ideais, o Renascentismo bebeu de algumas correntes de pensamento na busca por novas maneiras de compreender a realidade. Confira as principais abaixo:
- Humanismo – interessa-se em especial pelas atividades intelectuais do homem, refletindo sobre as potencialidades e os interesses da mente humana;
- Antropocentrismo – nega que a religião seja o foco de todas as coisas, posicionando o homem como centro do universo e obra mais perfeita da criação;
- Classicismo – como já vimos, o conhecimento greco-romano atua como eixo norteador das produções artísticas e intelectuais desenvolvidas no período;
- Cientificismo – defende que a ciência é a única fonte confiável para a resolução das questões humanas. Portanto, todo conhecimento deve ser testado e demonstrado através de experiências científicas para ser legitimado;
- Racionalismo – parceira indissociável da ciência, a razão era vista como a única maneira de explicar o mundo e atingir o verdadeiro conhecimento;
- Individualismo – adepta do conhecimento íntimo do ser humano, que, ao reconhecer seus talentos e realizar suas ambições, estaria construindo sua personalidade. Também prega o prevalecimento dos direitos individuais em detrimento dos direitos coletivos;
- Universalismo – destaque pela expansão do ensino por meio de escolas e universidades na época, propõe a valorização do conhecimento humano em diversas áreas do saber, como filosofia, literatura e física.
As três grandes fases do Renascentismo
Levando em conta a longa extensão do movimento, também é possível dividi-lo em três etapas. Mesmo compartilhando os principais ideais renascentistas, essas fases possuem seus próprios expoentes artísticos e traços definidores.
Trecento
Momento inicial do Renascentismo, essa fase se desenrolou durante os anos 1300 e se concentrou na Itália, sobretudo em Florença. O Trecento, ou Trecentismo, se caracterizou pelo começo da ruptura com o imobilismo da estrutura social medieval e da valorização dos aspectos individuais e humanistas.
Quatrocento
Nos anos 1400, o Renascentismo se expandia por diversas regiões da Europa, difundindo energicamente o racionalismo e o resgate da estética greco-romana.
Até então, a atividade dos mecenas nunca havia movimentado tanto o universo artístico. Justamente por isso o Quatrocentismo é tido como auge do movimento, também sendo chamado de Alta Renascença.
Cinquecento
Enquanto as artes atingiam seu ápice de desenvolvimento técnico e prático, o Renascentismo como um todo entrava em decadência nos anos 1500. Como consequência, os estilos barroco – a arte de contrarreforma iniciada pela Igreja Católica – e maneirista passaram a ganhar força pelo continente europeu.
O papel do Renascentismo no progresso científico
Principalmente através da predominância de ideias humanistas, o movimento favoreceu o surgimento de uma ampla Revolução Científica. Tendo o pensamento crítico como base de observação do mundo, os novos cientistas questionavam a teologia cristã e submetiam diferentes hipóteses a experimentos científicos para buscar sua comprovação.
O movimento enfrentou grande resistência religiosa, despertando críticas e ataques de fiéis e da própria Igreja Católica. Os métodos e técnicas renascentistas ainda fundamentaram o início da ciência moderna, em especial no período do Iluminismo.
É importante reforçar que o Renascimento também trouxe avanços significativos para o campo da medicina. Nessa época, aconteceram estudos anatômicos e sanguíneos, pesquisas sobre as causas da sífilis e do bócio e até o desenvolvimento de bases que, mais tarde, permitiriam a criação de vacinas.
Entre os participantes mais emblemáticos da Revolução Científica renascentista, estão Nicolau Copérnico, responsável pela origem da teoria heliocentrista; Galileu Galileu, que deu sequência e maior profundidade aos trabalhos de Copérnico; e Johannes Kepler, que realizou estudos voltados ao entendimento dos eclipses lunar e solar.
René Descartes, considerado o pai do Racionalismo, e Isaac Newton, chamado de pai da física e da mecânica moderna, são outros pensadores relevantes do período.
Os filósofos do Renascentismo
A partir das teorias que vimos anteriormente, a filosofia do Renascentismo trouxe inovações e gerou impactos na cultura ocidental. Desse modo, os filósofos do período contribuíram com o desenvolvimento inicial da antropologia, o surgimento do Estado-nação e a gradual secularização da ordem pública.
Nas linhas de pensamento renascentistas, encontramos os trabalhos de Michel de Montaigne, conhecido pela defesa de uma educação menos livresca; Giordano Bruno, que atuou como grande apoiador do panteísmo; e Nicolau Maquiavel, estudioso da ciência política e autor do clássico literário O Príncipe (1532).
Artes e Renascentismo: uma das conexões mais lembradas na história mundial
As maiores marcas deixadas pelo Renascentismo são suas diversas expressões artísticas. As produções do período não se restringiam às pinturas e esculturas, afinal, seus artistas também desenvolviam trabalhos em outros campos do conhecimento.
Procurando reproduzir os ideais de beleza greco-romanos, os quadros renascentistas se orientavam pelos princípios de harmonia, equilíbrio, simetria e proporção. Para trazer mais realismo às telas, além da aplicação pioneira de perspectiva, técnicas de luz, sombra e tinta à óleo eram usadas pelos artistas.
De forma geral, podemos identificar três grandes escolas entre as criações do movimento. A Florentina se destacava pela profundidade na aplicação de linhas e sfumato (técnica para uso de tons claros e escuros), enquanto a Veneziana alcançava maiores níveis de emoção pelo predomínio de cor nos desenhos. Já a Romana tentava equilibrar tanto razão e sentimentalismo, quanto linhas e cores.
Alguns dos artistas mais simbólicos do Renascentismo até os dias atuais são Leonardo da Vinci, Michelangelo, Rafael Sanzio, Sandro Botticelli, Hieronymus Bosch e Albrecht Dürer.
Muito usada para divulgação textual do movimento, a literatura do período era composta principalmente por sátiras e críticas aos valores da sociedade medieval, como as práticas de cavalaria, a hierarquia da nobreza e o moralismo católico. Assim, surgiram obras como A Divina Comédia, de Dante Alighieri, Dom Quixote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, e Hamlet, de William Shakespeare.
Já na arquitetura renascentista, o objetivo era a superação do estilo gótico. Tomando a geometria euclidiana como base, a proporção simétrica guiava a criação de fachadas, cúpulas, colunas, arcos e abóbadas.
O outro lado do Renascentismo
Como ocorre com a maioria dos processos históricos, o Renascentismo continua sendo alvo de estudos que descobrem e atualizam dados sobre o período constantemente.
Há certo tempo, alguns teóricos consideram que o movimento é retratado de maneira excessivamente positiva. Essa visão mascararia o fato de muitos problemas sociais experienciados na Idade Média – como a pobreza e corrupção – terem permanecido e até se agravado em certas regiões europeias durante a Renascença.
Para o historiador Jacques Le Goff, por exemplo, as manifestações renascentistas geraram um prolongamento da Era Medieval que só terminou com a realização das Revoluções Industriais e Francesa no século XVIII.
Outro ponto levantado nessas discussões avalia que as ideias propagadas pelos renascentistas e os avanços atribuídos ao movimento não atingiram os membros da sociedade da época igualitariamente.
Isso porque a concentração de riquezas, que possibilitava melhores condições de vida, era realidade apenas para nobres e burgueses, que representavam uma menor parcela da sociedade. Além disso, o índice de analfabetismo também seguiu alto na Europa até o começo do século XX.
Já pensadores marxistas veem os referenciais clássicos e as mudanças causadas pelo período como momentos legitimadores de propósitos elitistas e pré-formadores do poder burguês que entraria em conflito com as classes trabalhadoras no futuro.
Aliás, embora não apresentados e relembrados com a mesma frequência, outros “renascimentos” culturais marcaram a história mundial. É o caso das Renascenças Carolíngia e Otoniana, que ocorreram entre os séculos VIII e XI.
E aí, conseguiu compreender mais sobre a origem e os desdobramentos do Renascentismo? Deixe suas dúvidas e opiniões nos comentários!
Referências:
- WEISINGER, Herbert. Ideas of History During the Renaissance. Journal of the History of Ideas, Filadélfia, Pensilvânia, vol. 6, n. 4, p. 415-435. University of Pennsylvania Press, 1945.
- GARIN, Eugênio. Ciência e vida civil no Renascimento italiano. 1° ed, São Paulo: Editora Unesp, 1997.
- FERREIRA, A. G. F. A Europa e a herança cultural da escola. Revista Educação em Questão, [S. l.], v. 40, n. 26, 2011.
- SAMPAIO, Thiago. Le Goff e a periodização da História. Revista Dimensões, n. 43, 2019.
- Toda Matéria – Renascimento: características, e contexto histórico
- Enciclopédia Itaú Cultural – Renascimento
- Uol Educação – Renascimento: as fases do movimento e a pintura
- História das Artes – Renascimento
- Globo Educação – Humanismo, renascimento e revolução científica
- Beduka – Filosofia do Renascimento: conheça as ideias que colocaram o homem no centro do mundo