O meio ambiente é um dos temas mais urgentes e cruciais do nosso tempo. Desde a saúde humana até a biodiversidade, sua preservação afeta todos os aspectos da vida no planeta. O Direito Ambiental oferece importantes ferramentas para a sustentabilidade, como os princípios do usuário-pagador e do protetor-recebedor. Através desses conceitos, o Direito auxilia na construção de um futuro mais verde a partir de uma abordagem econômica para a conservação ambiental.
Quer entender melhor? Venha com a gente!
Entenda: Justiça ambiental: o que é isso?
Meio ambiente: os princípios que regem a sustentabilidade
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 225, prevê que a todos pertence o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, classificando-o como um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Sua defesa e preservação compete ao Poder Público e à coletividade.
Nestes mais de 35 anos desde a promulgação da Lei Maior, foram muitos os avanços legislativos voltados à proteção ambiental. A conscientização de que os recursos naturais são limitados permitiu a reconstrução de modelos desenvolvimentistas clássicos.
Ao novo projeto de desenvolvimento econômico, integrou-se a ideia da sustentabilidade como o único meio viável para se evitar a degradação ambiental a níveis comprometedores à vida no planeta.
Aprofunde: Direito Ambiental: entenda o conceito em 5 pontos.
Para orientação da atividade legislativa e sua adequada aplicação, há os princípios orientadores do Direito Ambiental. Dentre eles, hoje destacaremos o do poluidor-pagador, usuário-pagador e protetor-recebedor.
Porém, para entender a lógica de suas existências, é importante compreender, primeiro, as externalidades ambientais. Vamos juntos, então!
Veja também nosso vídeo sobre desmatamento, mudanças climáticas e seus direitos!
Externalidades ambientais
Externalidades ambientais são os efeitos colaterais de uma atividade empreendedora que recaem sobre o meio ambiente. Elas podem ser de natureza social, econômica ou ambiental.
Toda atividade econômica produz externalidades, que podem ser positivas ou negativas.
Serão positivas quando melhorarem a qualidade ambiental. Por exemplo: uma indústria instalada em imóvel abandonado, antes utilizado para o descarte inadequado de resíduos sólidos.
Serão negativas quando piorarem a qualidade e aumentarem o risco ambiental, impondo aos prejudicados as consequências do dano e a reparação. Por exemplo: uma indústria que realiza o descarte inadequado de resíduos sólidos e polui o rio da região.
Internalização das externalidades ambientais
Em regra, as externalidades não são contabilizadas pela atividade econômica. Isto é, não é adicionado ao custo do produto, ou do serviço, os benefícios e prejuízos decorrentes da atividade. E é aqui que surge o problema.
Nas palavras de Lyssandro Norton Siqueira, o empreendedor:
“(…) não é diretamente compensado pelos benefícios causados, nem cobrado pelos prejuízos acarretados”. (SIQUEIRA, Lyssandro Norton. Qual o valor do meio ambiente?, p. 36).
A preocupação maior do Direito Ambiental é com as externalidades negativas. Isso porque, nessas hipóteses, o custo da poluição é suportado pelo Estado e pela sociedade, concedendo ao empreendedor indevido benefício.
Além disso, como não há maiores consequências, o empreendedor não se estimula à busca de alternativas “limpas” para o exercício da atividade. Assim, tudo tende a permanecer em prejuízo ao meio ambiente.
Para corrigir a questão, surgem os princípios do poluidor-pagador, usuário-pagador e protetor-recebedor. Juntos, eles distribuem os ônus e bônus ambientais de forma proporcional entre os atores sociais.
Veja mais: Você sabe o que são Recursos Naturais?
Vamos entender cada um deles?
Poluidor-pagador
Previsto como um dos objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente, o princípio do poluidor-pagador visa a “imposição ao poluidor e ao predador da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados” (artigo 4º, VII, Lei n.º 6.938/81).
Possui duas finalidades: uma de caráter preventivo e outra de caráter repressivo. A primeira, é evitar a ocorrência do dano ambiental. A segunda, obrigar o causador do dano a recuperar o meio ambiente e pagar pelos prejuízos causados.
Nas lições de Antônio Herman Vasconcellos Benjamin, a ideia é que:
“(…) a atividade de preservação e conservação dos recursos ambientais seja mais barata que a de devastação, pois o dano ambiental não pode, em circunstância alguma, valer a pena para o poluidor.” (BENJAMIN, Antônio Herman Vasconcellos. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. In: Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 227.)
Isso significa que ao empreendedor deve ser atribuído todos os custos de sua atividade produtiva, e não só aqueles voltados à aferição de lucros. Trata-se de medida proporcional, eis que transfere os “custos da poluição” suportados pelo Estado e pela sociedade para os responsáveis pela atividade poluidora.
Leia também: O que são crimes ambientais?
Exemplo real: Sistema de logística reversa — artigo 33 da Lei n.º 12.305/2010 (Política Nacional dos Resíduos Sólidos)
O sistema de logística reversa obriga os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes a estruturar um programa de retorno de determinados produtos, após o uso pelo consumidor, para o descarte adequado.
São eles:
I — agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso;
II — pilhas e baterias;
III — pneus;
IV — óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; V — lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista;
VI — produtos eletroeletrônicos e seus componentes.
Nessas hipóteses, os consumidores devem devolver o produto aos comerciantes ou distribuidores. Estes, por sua vez, devem devolvê-los aos fabricantes e importadores, para que deem destinação ambientalmente adequada. (É por isso que, em supermercados e farmácias, há postos de coleta de pilhas e baterias!)
Aprofunde: O “brilho que fere”: entenda sobre o lixo radioativo.
Usuário-pagador
O princípio do usuário-pagador também é um dos objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente, que visa a imposição “ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.” (artigo 4º, VII, Lei n.º 6.938/81).
Neste caso, há a utilização privativa de um recurso natural (lembre-se que o meio ambiente é um bem de uso comum do povo). Isso gera ao usuário o dever de zelo pelo não esgotamento do recurso, preservando-se o direito dos demais também utilizá-lo futuramente.
A cobrança, portanto, não é uma punição, mas uma medida educativa para promover a racionalização do uso, evitando abusos diante do custo zero.
Exemplo real: Cobrança pelo uso da água — artigos 19 e 20 da Lei n.º 9.433/97 (Política Nacional de Recursos Hídricos)
A Política Nacional de Recursos Hídricos impõe a cobrança de valores dos usuários que utilizam quantidades de água com potencial para alterar a qualidade e quantidade desse recurso natural na bacia hidrográfica.
São hipóteses:
Art. 12. (…)
I — derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;
II — extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou insumo de processo produtivo;
III — lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;
IV — aproveitamento dos potenciais hidrelétricos;
V — outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo de água.
Segundo o artigo 19 da lei, há três motivos para a cobrança: (i) reconhecer a água como bem econômico, dando ao usuário uma indicação de seu real valor; (ii) incentivar o uso racionalizado do bem; (iii) obter recursos financeiros para o financiamento dos programas previstos nos planos de recursos hídricos.
Veja mais: Escassez hídrica: um conceito global.
Protetor-recebedor
O princípio do protetor-recebedor, previsto no artigo 6º, II, da Lei n.º 12.305/2010 (Política Nacional dos Resíduos Sólidos), é uma variação do princípio do poluidor-pagador.
Seu sentido pode ser extraído a partir de uma interpretação contrária à lógica do poluidor-pagador: se quem danifica deve pagar, quem protege deve receber.
Com isso, protege-se o meio ambiente amplamente, não só punindo pelos prejuízos e obrigando à reparação, mas incentivando a prevenção através da concessão de benefícios econômicos, fiscais e tributários.
A Lei n.º 12.651/12, em seu artigo 41, autoriza o Poder Executivo federal a criar programa de apoio e incentivo à conservação do meio ambiente, abrangendo a possibilidade de:
I — pagamento ou incentivo a serviços ambientais como retribuição, monetária ou não, às atividades de conservação e melhoria dos ecossistemas e que gerem serviços ambientais;
II — compensação pelas medidas de conservação ambiental necessárias para o cumprimento dos objetivos desta Lei;
III — incentivos para comercialização, inovação e aceleração das ações de recuperação, conservação e uso sustentável das florestas e demais formas de vegetação nativa;
Exemplo real: ICMS ecológico
A Constituição Federal prevê que 25% do produto da arrecadação dos Estados com o imposto sobre a circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, deve ser repassado aos Municípios (artigo 158).
Para a distribuição dos valores, autoriza os Estados a dispor em lei estadual os critérios para tanto. Um dos critérios adotados por alguns deles é a defesa e criação de áreas protegidas.
A regra é simples: quanto mais áreas protegidas e melhor conservadas estiverem, maior será o valor recebido.
Leita também: Você sabe o que é desenvolvimento sustentável?
O Paraná foi o primeiro estado brasileiro a instituir o ICMS Ecológico, em 1989. Atualmente, 18 dos 26 Estados brasileiros possuem a iniciativa.
Veja também: Código Florestal e a preservação ecológica no Brasil: entenda.
Agora que chegamos ao final, espero que você tenha conseguido compreender a importância dos princípios tratados. Não esqueça de dizer nos comentários o que achou do assunto!
Referências:
- BECHARA, Erika. Princípio do poluidor pagador. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direitos Difusos e Coletivos. Nelson Nery Jr., Georges Abboud, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/334/edicao-1/principio-do-poluidor-pagador
- Brasil. Supremo Tribunal Federal (STF). Direito ambiental [recurso eletrônico] / Supremo Tribunal Federal. – Brasília : STF, Secretaria de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão da Informação, 2023. eBook (327 p.).
- MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2017.