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A política no Nordeste do Brasil: análise do perfil político nordestino

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O Nordeste foi palco da colonização portuguesa por mais de três séculos, período marcado pela escravidão e pela exploração dos recursos naturais. Essa herança deixou marcas profundas na sociedade nordestina, moldando relações sociais, econômicas e políticas.

Em sua história cultural, a região recebeu influências de indígenas, africanos e europeus. Essa mistura se reflete na música, como o forró e o frevo; na culinária, com pratos como acarajé e o vatapá; e nas festividades com o Carnaval, São João e as festas religiosas.

Neste texto, vamos te ajudar a compreender como o perfil político do Nordeste foi sendo moldado ao longo dos anos, para isso é necessário entender o contexto histórico marcado por lutas sociais, desigualdades persistentes e a ascensão de lideranças políticas. Vamos lá?

Ilustração do mapa da região Nordeste. Fonte: Depositphotos.

Contextualização

A região Nordeste do Brasil contém nove estados, sendo eles: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia que desempenharam um papel fundamental na história brasileira. Seus aspectos econômicos e sociais formaram a identidade da região.

Os dados do Censo Demográfico 2022, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicaram que a Bahia, com 14.136.417 habitantes, mantém a maior população do Nordeste e a quarta maior população do Brasil, representando 26,91% dos residentes do país, equivalente a 54,6 milhões de pessoas.

O contexto histórico do Brasil está ligado ao do Nordeste por ser a primeira área a ser colonizada pelos portugueses, com a chegada de Pedro Álvares Cabral, em 1500. Os colonizadores organizaram o território brasileiro por capitanias hereditárias, entre as 15 criadas a que mais se destacou foi a de Pernambuco.

Em março de 1549, o período colonial teve um novo marco na história. Nomeado pela Coroa como o primeiro governador-geral do Brasil, Tomé de Sousa (1503-1579), chegou ao litoral brasileiro com a missão de fundar a primeira capital brasileira, a São Salvador da Bahia de Todos os Santos – atual Salvador.

Na época, a cidade foi escolhida pelo fato da região Nordeste ter a maior extração de pau-brasil, bem como ser a principal produtora de açúcar. Além disso, sua localização facilitava a exportação desses produtos. Salvador permaneceu como capital até 1763, quando  houve a descoberta do ouro e o enfraquecimento da produção da cana-de-açúcar.

Durante os séculos XVI e XVII, a região se destacou pela produção de açúcar, especialmente em Pernambuco e na Bahia. A produção extensiva de açúcar foi uma das principais atividades econômicas do período colonial, chamado de ciclo do açúcar.

Entre 1630 e 1654, o Nordeste passou por invasões holandesas, especialmente em Pernambuco, onde os holandeses estabeleceram a colônia de “Nova Holanda”.

A região também foi alvo de diversos movimentos sociais e revoltas, como a Revolta dos Malês (1835) e a Guerra de Canudos (1896-1897), as duas na Bahia; que refletiam as tensões sociais e econômicas da época.

A economia do Nordeste sempre esteve fortemente ligada à agricultura, como a produção de algodão; cana-de-açúcar, que falamos mais acima; e mais recentemente, frutas e soja.

O turismo é outra fonte de renda importante, é no Nordeste que se concentra algumas das praias consideradas as mais bonitas do Brasil. Além disso, a cultura rica e os festejos populares, como o Carnaval de Salvador e o São João de Caruaru atraem visitantes do mundo inteiro.

Mas, se engana quem pensa que na região só possui essas atividades econômicas. O setor industrial também tem apresentado crescimento, principalmente no ramo de alimentos, calçados e de roupas. As principais indústrias do Nordeste se concentram em Recife, Salvador e Fortaleza.

Em fevereiro de 2024, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou a Pesquisa Industrial Mensal (PIM), em que foram analisadas 15 áreas de produção industrial no Brasil. O estudo apontou o crescimento das indústrias no país comparados ao mesmo mês em 2023, sendo que o Rio Grande do Norte liderou a expansão com 67,3%. O aumento na produção de óleo diesel e gasolina automotiva, podem ter sido os motivos para o crescimento do setor industrial.

Apesar do aumento da economia nordestina, o território ainda sofre com alguns problemas sociais, como a desigualdade de renda e o baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que trava o desenvolvimento da região. Por isso, programas sociais e políticas públicas têm sido implementados para melhorar essas condições, mas ainda há muito a ser feito.

Agora que você já conhece os principais pontos históricos, econômicos e sociais do Nordeste brasileiro, vamos falar sobre a política da região.

Histórico político do Nordeste

No período colonial, a base da economia era a produção de açúcar que gerou um sistema escravista, concentrando a riqueza e poder nas mãos dos senhores de engenho.

Após a queda da economia açucareira, a ascensão do algodão e depois do gado, novos interesses surgiram, incluindo outros protagonistas da economia, como comerciantes, pecuaristas e industriais.

A mudança da economia no país fez com que o Nordeste fosse influenciado pelo coronelismo, sistema em que grandes proprietários de terras, os “coronéis”, exerciam controle político e social sobre suas regiões.

Era Vargas (1930-1945 e 1951-1954)

Em 1930, quando Getúlio Vargas assumiu o poder, implementou um governo centralizado, enfraquecendo as oligarquias regionais. A Revolução de 1930 e o posterior Estado Novo (1937-1945) buscaram consolidar o poder central e diminuir a autonomia dos estados, incluindo o do Nordeste.

O último momento da Era Vargas, foi marcado por autoritarismo com instruções federais nos governos estaduais e a nomeação de interventores alinhados com Vargas, além da censura na imprensa e na arte.

Já em 1945, a criação da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF), a implementação de políticas trabalhistas e de previdência social foram tentativas de integração da região ao projeto nacional de desenvolvimento.

Nesse período, em resposta às condições de vida difíceis nas áreas rurais, o movimento de trabalhadores rurais começou a ganhar força.

Quarta República (1945-1964)

Durante o século XX, a industrialização e a urbanização trouxeram novas classes sociais e ideias, desafiando as estruturas tradicionais de poder. Movimentos sociais e sindicatos ganharam força, lutando por melhores condições de vida e trabalho.

No início de 1950, as Ligas Camponesas tiveram um impacto profundo na política regional, sendo cruciais para a organização dos trabalhadores rurais e para a luta por reforma agrária, que influenciaram a agenda política nacional.

A primeira Liga foi formada em Pernambuco, em 1954. Esse movimento de luta pela reforma agrária no Brasil teve como principal incentivador o advogado e deputado pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), Francisco Julião (1915-1999).

Vale destacar que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que surgiu em 1984, é considerado um continuador das lutas desempenhadas pelas ligas camponesas.

O processo de industrialização e o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek contribuíram para que o Brasil passasse de um país agrário para uma economia com valor pela indústria. Dessa forma, a concentração industrial e a expansão econômica intensificaram a acumulação de capital no Sudeste.

As diferenças entre o Nordeste e o Centro-Sul do Brasil cresciam de forma desproporcional, a seca na região também agravou a desigualdade, sendo necessárias ações do governo federal para diminuir o desemprego rural e o êxodo da população. Com base em ideias do economista Celso Furtado, foi criado em 15 de dezembro de 1959, pela Lei nº 3.692, a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).

A criação da Sudene contou com a participação de empresários industriais, políticos interessados no desenvolvimento industrial da região, representantes de forças populares e de esquerda, como Francisco Julião, das Ligas Camponesas e membros da Igreja Católica, como D. Eugênio Sales e D. Helder Câmara.

Nessa época, a oligarquia agrária nordestina (latifúndio e seus coronéis) já tinha dominado o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) e a Inspetoria de Obras Contra as Secas.

Após a criação da Sudene, foram recebidas várias denúncias que revelaram a corrupção na administração da ajuda dada pelo governo federal através das frentes de trabalho, existência de trabalhadores fantasmas e construção de açudes nas fazendas dos coronéis.

No governo do presidente João Goulart (1961 a 1964), grande aliado de Brizola, a reforma agrária esteve no centro do embate político que antecedeu o golpe militar.

Porém, segundo a análise do sociólogo Francisco de Oliveira, a partir do golpe militar de 1964, a Sudene não teve sucesso em seus objetivos. Os empregos industriais criados não foram suficientes, a pobreza não diminuiu e as migrações continuaram.

Ditadura Militar (1964-1985)

O regime militar desempenhou alguns projetos de infraestrutura no Nordeste, buscando integrar a região ao desenvolvimento nacional, como a construção de estradas e usinas hidrelétricas. Porém, os projetos beneficiaram mais os grandes empresários e latifúndios do que a população local.

Para evitar a oposição, a ditadura militar centralizou o poder e reduziu a autonomia dos estados e municípios. No Nordeste, os governadores foram frequentemente nomeados pelo regime, sem eleições diretas, mantendo os interesses militares.

No Nordeste, a repressão atingiu áreas urbanas e rurais, onde os conflitos agrários e as lutas pela reforma agrária eram intensos. Os movimentos sociais, sindicais e estudantis foram perseguidos; os ativistas foram presos, torturados e exilados.

Panorama atual

Desde a redemocratização do Brasil em 1985, a região Nordeste tem apresentado padrões políticos distintos e dinâmicos, refletindo tanto as tradições locais quanto às mudanças no cenário nacional. Nos primeiros anos, a política nordestina ainda era fortemente marcada por figuras tradicionais e práticas clientelistas.

Nas décadas de 1990 e 2000, no entanto, a região começou a experimentar mudanças significativas. O Partido dos Trabalhadores (PT), sob a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva, conseguiu construir uma base de apoio sólida no Nordeste.

O governo de Lula (2003-2010) e posteriormente de Dilma Rousseff (2011-2016) implementou várias políticas sociais que beneficiaram a região, como o Bolsa Família e programas de infraestrutura, o que fortaleceu ainda mais a presença do PT no Nordeste. Essa base de apoio foi importante para as vitórias eleitorais do PT nas eleições presidenciais de 2002, 2006, 2010 e 2014.

Nos últimos 10 anos (20142024), o cenário político no Nordeste teve crescimento de outros partidos, como o Partido Socialista Brasileiro (PSB), o Partido Progressista (PP) e o Democratas (DEM), além do fortalecimento de candidaturas de direita e extrema-direita, refletindo uma tendência nacional.

Na eleição presidencial de 2022, no primeiro turno, Jair Bolsonaro recebeu 1,32 milhão de votos a mais do que na última eleição. Esses números mostram que a região do Nordeste passa por uma disputa pelo poder com diferentes partidos e lideranças buscando conquistar o eleitorado.

A região luta por maior participação nos espaços de poder federal e por políticas públicas que atendam às suas necessidades específicas. Dessa forma, os estados que compõem o Nordeste desempenham um importante colégio eleitoral, capaz de influenciar o resultado das eleições presidenciais.

O futuro da política regional dependerá das dinâmicas nacionais, da capacidade dos partidos de se conectarem com as demandas da população e da atuação de novas lideranças.

Eleições de 2022

Nas eleições de 2022, Lula (PT) venceu a disputa pela presidência do Brasil, recebendo a maior porcentagem de votos nos estados do Nordeste, com 69,34%. Seu adversário, Jair Bolsonaro (PL), obteve 30,66%. Entretanto, o partido de Lula não conseguiu maior representação de senadores eleitos.

Os eleitores nordestinos escolheram três senadores do PT: Wellington Dias (Piauí), Camilo Santana (Ceará) e Teresa Leitão (Pernambuco). Os outros seis senadores eleitos pertencem a diferentes partidos: Efraim Filho (União Brasil-PB), Laércio Oliveira (Progressistas-SE), Renan Filho (MDB-AL), Flávio Dino (PSB-MA), Rogério Marinho (PL-RN) e Otto Alencar (PSD-BA).

Para governador, o PT conseguiu eleger representantes em quatro estados: Elmano de Freitas (Ceará), Jerônimo Rodrigues (Bahia), Rafael Fonteles (Piauí) e Fátima Bezerra (Rio Grande do Norte). O PSB teve dois representantes eleitos: Carlos Brandão (Maranhão) e João Azevêdo (Paraíba).

Em outros três estados foram eleitos governadores de diferentes partidos: Raquel Lyra (PSDB) em Pernambuco, Fábio Mitidieri (PSD) em Sergipe e Paulo Dantas (MDB) em Alagoas.

Dessa forma, os estados do Nordeste possuem representantes eleitos filiados a partidos políticos de diferentes espectros ideológicos: do centro, como o MDB; do centro-direita, como os Progressistas; da direita, como a União Brasil, o PL e o PSDB; e da esquerda, como o PT e o PSB.

No entanto, há partidos cujo posicionamento pode variar mais para a direita ou para a esquerda, dependendo de quem estão apoiando.

Análises e perspectivas

A política do Nordeste é um tema que atrai a atenção de diversos estudiosos e analistas devido à sua complexidade e à importância estratégica dessa região para o país.

Sobre os movimentos sociais, a socióloga Maria da Glória Gohn analisa a atuação de organizações de base e movimentos sociais, como o MST. Ela destaca que esses movimentos têm protagonizado um papel importante na luta por direitos e na transformação da política regional.

Na análise de Maria da Glória, os movimentos sociais são “ações sociais coletivas de caráter sociopolítico e cultural que viabilizam distintas formas da população se organizar e expressar suas demandas”.

O historiador Durval Muniz de Albuquerque Júnior, em seus estudos sobre a construção da identidade nordestina, discute como a cultura e a identidade regional influenciam a política. Ele argumenta que a representação do Nordeste como uma região distinta, tem implicações políticas importantes, criando um senso de solidariedade e mobilização em torno de questões regionais.

Em 2022, o Brasil de Fato Pernambuco conversou com a cientista política Priscila Lapa. Com base em seu estudo sobre as eleições presidenciais, ela analisou que o Bolsa Família foi o destaque eleitoral no Brasil durante muito tempo.

Para Priscila Lapa, o aumento da bancada centro-direita para representantes do legislativo nos estados do Nordeste, se deve porque a política nacional está em uma fase mais conservadora e também pelo efeito do fim das coligações, em que partidos não podem mais se unir para somar votos e conquistar mais cadeiras no Legislativo de municípios, estados e na Câmara dos Deputados.

Essas análises mostram que a política no Nordeste é influenciada por uma combinação de fatores históricos, econômicos, sociais e culturais. Podemos entender que as marcas do coronelismo, as políticas de desenvolvimento, os movimentos sociais e a identidade regional criaram um panorama político complexo e dinâmico.

E aí, conseguiu entender tudo sobre o perfil político do Nordeste? Deixe nos comentários a sua opinião e continue lendo outros textos da série “Muitos Brasis”

Referências:

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Conteúdo escrito por:
Baiana, jornalista em formação pela UFSB, apaixonada por filmes e séries.

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