O século XIX foi palco de inúmeros eventos importantes na história do Brasil. Dentre eles, um dos acontecimentos mais marcantes foi a Proclamação da Independência. Este marco na consolidação do país como uma nação trouxe consigo o início do Primeiro Reinado.
Os anos iniciais do Brasil independente foram guiados por Dom Pedro I, e, neste texto, a Politize! vai te contar em detalhes como se deram os anos do Primeiro Reinado. Qual contexto histórico precedeu a declaração da independência? Como o governo conseguiu se estabelecer? Quais foram os principais acontecimentos no país e na região? Segue com a gente pra descobrir!
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Antecedentes do Primeiro Reinado
Guerras Napoleônicas
A transferência da Corte Real Portuguesa para o Brasil, em 1808, foi fundamental para o estabelecimento do Primeiro Reinado. Em 22 de janeiro, o príncipe regente Dom João chegou a Salvador com grande comitiva, instalando-se definitivamente no Rio de Janeiro.
A vinda da Corte Real ao Brasil foi motivada principalmente pelas Guerras Napoleônicas na Europa. O conflito entre a França e a Inglaterra colocou Portugal em situação diplomática delicada. O principal motivo foi a imposição francesa do Bloqueio Continental, que proibia os países europeus de manter relações comerciais com os ingleses.
Com os avanços territoriais franceses na Europa, a monarquia portuguesa se viu obrigada a decidir entre suspender relações com a Inglaterra ou se tornar inimiga do poderoso Império Francês.
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Para a coroa portuguesa, a decisão não era fácil. Se aliar à Inglaterra significava um grave risco de invasão por parte da França. No entanto, se aliar aos franceses colocava em risco o domínio ultramarino português. A decisão foi por priorizar as posses além-mar, vistas como a parte do império com maior potencial econômico. Portugal, então, se alinhou à Inglaterra.
O Período Joanino
Com a chegada da Corte Real ao Rio de Janeiro e o estabelecimento da nova capital do império na então colônia portuguesa, diversas mudanças passaram a permear a realidade do Brasil. Este momento da história brasileira ficou conhecido como o Período Joanino.
Uma das principais e imediatas decisões de D. João foi a abertura dos portos brasileiros ao comércio internacional. Anteriormente restrito a Portugal, esse ato demonstrava a crescente importância política do Brasil dentro do Império.
O estabelecimento da administração do império no Brasil trouxe, também, constantes investimentos, especialmente no território do atual sudeste. Algumas das ações tomadas ao longo dos anos foram: a construção de estradas, visando reforçar a influência imperial em áreas remotas da colônia; a criação de institutos de ensino superior; e a criação de instituições de governo, como a Imprensa Régia.
As mudanças transformaram a posição do Brasil no Império Português. Ao abrigar a Família Real, ser centro administrativo e receber grandes investimentos, deixou de ser, na prática, uma colônia. Em 1815, essa mudança de status foi reconhecida com a elevação do Brasil à condição de reino, criando-se o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.
Revolução do Porto
O período que antecedeu o Primeiro Reinado apresentou tensões. Enquanto o Rio de Janeiro recebia investimentos e se consolidava em torno de D. João, outras regiões brasileiras não compartilhavam desse desenvolvimento.
Movimentos críticos à Coroa já existiam antes da chegada da Corte, como a Inconfidência Mineira. Em 1817, a Revolução Pernambucana, liderada pela elite da região Norte e Nordeste, evidenciou o descontentamento com a centralização do poder no Sudeste. Embora suprimida, a revolta demonstrou a dificuldade de unificar a América portuguesa.
Simultaneamente, em Portugal, a burguesia mercantil lançou a Revolução do Porto, motivada pelo descontentamento com a situação política. Os rebeldes exigiram o retorno da Corte a Lisboa e uma monarquia constitucional, obtendo sucesso. Com a vitória, D. João retornou a Portugal, deixando seu filho Pedro, o príncipe herdeiro, no Brasil.
O Primeiro Reinado
As consequências da revolução não foram de todo ruins para a elite brasileira. A instituição de uma monarquia constitucional, afinal, também garantia mais poder a eles. Contudo, o embate sobre manter a corte no Brasil ou retorná-la a Portugal mostrou-se tema delicado. Os deputados portugueses tentavam emplacar decretos que minavam a capacidade do Brasil de se manter como território autônomo.
Com o contínuo desgaste entre as partes, os movimentos no Brasil por maior autonomia se intensificaram. Em fevereiro de 1822, foi convocada a Junta de Procuradores das Províncias. Criado por D. Pedro, que almejava reunir as elites brasileiras e criar um contexto de unificação entre os territórios. Movimentos em direção à maior independência do Brasil já floresciam pelo país. Uma Constituinte independente de Portugal foi convocada por D. Pedro. Representantes do imperador foram enviados Brasil afora, visando angariar o apoio dos governantes locais mais distantes.
Os movimentos na colônia, naturalmente, não eram bem vistos em Portugal. A dificuldade em atingir um consenso entre os políticos portugueses e brasileiros levou a radicalização das relações. Portugal demandava a completa submissão do Brasil a Lisboa. O Brasil, por sua vez, não tinha intenção de perder a autonomia conquistada nos últimos anos.
Em 7 de setembro, ao tomar ciência dos últimos movimentos em Portugal, enfim, declarou a independência. Sua coroação como imperador ocorreu pouco depois, em outubro. Iniciava-se, assim, o Primeiro Reinado do Brasil.
A Constituição de 1824
Após a Proclamação da Independência, tornou-se necessário estabelecer as bases do novo Estado. Embora centralizado em D. Pedro, o processo contou com o apoio de governos locais. Assim, era natural o interesse da elite política em participar da definição dos rumos do Brasil.
Na época, o modelo de governo mais comum no Ocidente era o representativo. Considerando a participação da nobreza portuguesa (D. Pedro) e da elite colonial na Independência, adotou-se uma monarquia constitucional. No entanto, vários pontos sobre a governança do país precisavam ser definidos e foram, em sua maioria, debatidos na Assembleia Constituinte, iniciada em maio de 1823.
A Constituição foi outorgada de forma autoritária por D. Pedro I, baseando-se nos debates da Assembleia. Principais pontos da Constituição de 1824:
- Voto censitário: em essência, pessoas livres, detentores de uma renda mínima, consideradas brasileiras e católicas. Embora aparentemente simples, esta definição excluía grande parcela da população: escravos, mulheres, indígenas e pessoas livres de baixa renda não teriam direito ao voto;
- A criação do Poder Moderador: o estabelecimento de limites ao poder do imperador era um assunto de grande importância. O Poder Moderador tinha, dentre suas atribuições, a capacidade de dissolver o Parlamento e a responsabilidade de nomear os Senadores;
- A instituição da fé católica: o catolicismo tornou-se a religião oficial do Brasil.
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Embora representasse uma conquista da independência, a Constituição refletia problemas estruturais da sociedade brasileira. A manutenção da escravidão, pressionada pela elite colonial, contrastava com o Parlamento e o Poder Moderador, este último uma anomalia em um sistema que buscava maior autonomia popular, inspirado em ideais iluministas.
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As contradições do Primeiro Reinado eram evidentes. No entanto, a habilidade política de D. Pedro I permitiu a aprovação e ampla aceitação da Constituição.
Conflitos internos e a Guerra da Cisplatina
A Constituição outorgada nos primeiros anos do Primeiro Reinado não foi o único acontecimento relevante no período. No século XIX, a América Latina moderna ainda era um continente em construção. Embora a elite colonial brasileira apoiasse a independência liderada por D. Pedro I, não havia unidade total entre as províncias em relação ao Imperador.
Durante os primeiros anos do Primeiro Reinado, o imperador enfrentou resistência ao longo do vasto território nacional. Nas províncias ao norte e ao sul, movimentos contrários à independência e alinhados à Coroa Portuguesa existiam em abundância.
Para conter os movimentos dissidentes e consolidar a independência, D. Pedro I usou a força, contando com mercenários e o apoio de setores da população favoráveis ao Império. Houve confrontos na Bahia (1822) e em províncias como Maranhão, Piauí, Grão-Pará e Cisplatina (1823). Até o fim de 1824, essas revoltas estavam contidas.
Entretanto, isso não significava o fim dos desafios à unificação do território brasileiro.
Em 1824, eclodiu a Confederação do Equador, no Norte. Iniciada em Pernambuco, contou com apoio de diversos setores da população local. Entre as motivações, estavam a oposição ao Poder Moderador e a consideração da Constituição como ilegítima.
O movimento foi liderado por Frei Caneca e buscava implementar um modelo de governo federativo. A região que buscava a independência consistia nas províncias que hoje compõem Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Para conter os rebeldes, tropas foram mobilizadas a partir da capital. Frei Caneca acabou preso e, posteriormente, foi executado. Acabou, no entanto, como um dos maiores símbolos de resistência e oposição ao novo governo brasileiro.
A oposição a D. Pedro I persistiu após a derrota da Confederação. Em 1825, iniciou-se a Guerra da Cisplatina, aumentando as críticas ao Imperador. O conflito, encerrado em 1828, resultou em derrota brasileira.
Iniciada em 1825, a Guerra da Cisplatina foi um conflito armado entre Brasil e Buenos Aires pela província Cisplatina. A região de Buenos Aires almejava integrar a Cisplatina ao Estado que começava a surgir, e que viria a se tornar a Argentina. Como o território pertencia ao Brasil, as forças do império se movimentaram até a região. O confronto foi custoso para o país, que perdeu não apenas soldados como também grandes somas em dinheiro. Para uma nação que ainda engatinhava, os impactos foram significativos.
O conflito foi encerrado sob mediação da Inglaterra, e a província Cisplatina terminou por se tornar uma região independente. Nem Brasil nem Buenos Aires controlariam o território. Ele agora seria conhecido como a República Oriental do Uruguai. A derrota brasileira deixou marcas que se mostraram irreparáveis para a posição de D. Pedro no comando do país.
A crescente oposição ao imperador e o fim do Primeiro Reinado
Apesar de todos os desafios enfrentados nos primeiros anos de governo, a primeira legislatura na Câmara dos Deputados se encerrou, conforme previsto, em 1829. Após novas eleições, a maioria dos deputados eleitos eram de oposição.
Os problemas relacionados à centralização do poder no Rio de Janeiro ganharam ainda mais força. Além disso, a insatisfação pelos impactos da derrota na Guerra da Cisplatina ainda eram recentes. Em 1830, mais um fator foi adicionado à crescente lista de insatisfações: o reconhecimento da Inglaterra à independência do Brasil previa o fim do tráfico negreiro a partir daquele ano.
Com o crescimento da oposição ao imperador na Câmara dos Deputados e a crescente rejeição popular ao seu nome, D. Pedro viu-se cada vez mais isolado no poder. Em abril de 1831, decidiu abdicar ao trono e retornar a Portugal. A partir daquele momento, tinha fim o Primeiro Reinado. No Brasil ficou seu filho, também chamado Pedro. Com apenas 5 anos à época, todavia, o herdeiro ao trono não atendia à idade mínima estabelecida na Carta de independência para assumir as rédeas do país.
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Neste contexto se encerrava a primeira etapa da história do Brasil independente. Se iniciava, assim, o período que ficou conhecido como a Regência, no qual regentes governariam o país até que o sucessor ao trono atingisse a maioridade. O Brasil enfrentaria novos desafios à sua unidade e consolidação como nação.
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O Primeiro Reinado foi um período conturbado, mas repleto de acontecimentos importantes que ajudaram a solidificar o Brasil como um país reconhecido internacionalmente. E pra você, qual foi o momento mais importante do Primeiro Reinado? Conta pra gente nos comentários!
Referências:
A confederação do Equador: uma breve história de um movimento revolucionário – Bruno Augusto Dornelas Câmara. Recife, PE : Secretaria de Educação e Esportes, 2024.
Brasil Escola – Primeiro Reinado
História do Brasil Império / Miriam Dolhkinoff. 1. ed., 6ª reimpressão – São Paulo, SP : Contexto, 2024