No Brasil, as leis e normas criadas pelos políticos precisam estar sempre de acordo com a Constituição Federal. Para garantir que isso aconteça, existem diversos mecanismos, entre os quais está a Ação Direta de Inconstitucionalidade, ou ADI.
Neste artigo, vamos entender o que é uma ADI, por quem ela pode ser feita e como tem sido usada ao longo da história brasileira.
ADIs e o controle de constitucionalidade
A Constituição é a norma máxima de nosso país, o conjunto de princípios fundamentais que regem todas as leis da sociedade brasileira. Ela determina como o Estado é organizado, como os poderes são divididos e quais direitos e deveres os cidadãos possuem.
As leis criadas pela Câmara e pelo Senado e os atos normativos editados pelo presidente não podem contrariar os preceitos da Constituição Federal. O mesmo acontece em cada estado: leis estaduais e atos normativos de governadores devem seguir o que diz a respectiva constituição estadual.
E você sabe qual a importância do presidente da Câmara dos Deputados?
Para garantir que isso aconteça, existe o chamado controle de constitucionalidade. Ele pode ser difuso, quando é feito pela aplicação das leis por parte de juízes em casos concretos; ou pode ser concentrado, quando o Supremo Tribunal Federal analisa a matéria legislativa e decide se ela está ou não em consonância com a Constituição que a rege.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade consta no artigo 102 da Constituição e é uma das ferramentas de controle concentrado. É uma ação judicial proposta ao STF para que este decida se determinada lei ou ato normativo é constitucional.
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Há uma lista limitada de pessoas e entidades que podem propor uma ADI. São elas:
- Presidente da República;
- As mesas do Senado, da Câmara e das Assembleias Legislativas;
- Ordem dos Advogados do Brasil (OAB);
- Procurador-geral da República;
- Partidos políticos;
- Entidades sindicais de âmbito nacional.
Da votação à aplicação de uma ADI
Uma vez enviada ao STF, a ADI é analisada por um dos ministros, que será seu relator. Ele busca informações sobre o tema e ouve as opiniões do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República.
A análise dá origem a um relatório, que é enviado aos outros ministros. Passa-se então à votação, desde que haja pelo menos oito membros da corte presentes. A opção mais votada (declarar ou não a inconstitucionalidade da lei ou norma) torna-se a decisão final.
Não é possível recorrer dessa decisão, a não ser por meio de embargo de declaração, que é um recurso para esclarecer contradição ou omissão em julgamento de um juiz ou de um órgão colegiado, como o STF.
De acordo com a Constituição, a decisão tomada pelo Supremo tem efeito vinculante aos poderes Judiciário e Executivo em todas as esferas, além de ser retroativa. Dessa forma, em caso de inconstitucionalidade, a lei ou norma julgada torna-se nula em todas as ações dos poderes Judiciário e Executivo, inclusive para casos anteriores à conclusão da ADI.
As ADIs que marcaram a história
Para entender como as ADIs funcionam na prática e sobre quais temas podem tratar, trazemos alguns exemplos de ações que tiveram grande repercussão.
ADI 3.937, de junho de 2008
Proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria, a ação pedia a proibição do uso de amianto pela indústria. O material era usado na fabricação de caixas d’água, telhas, pastilhas de freio, entre outros, e causa diversas doenças – como infecções e câncer no pulmão – a quem tem contato direto com ele. O Supremo Tribunal Federal considerou seu uso inconstitucional e o proibiu em todo o país.
ADI 4.277, de maio de 2011
Uma das ADIs que causou maior repercussão no Brasil, ela pedia a inconstitucionalidade do não reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. O STF julgou a ação procedente e, a partir de então, a união homoafetiva passou a ser reconhecida pelo Estado brasileiro e considerada unidade familiar.
ADI 4.815, de junho de 2015
A Associação Nacional dos Editores de Livros (ANEL) propôs a ação pedindo que os artigos 20 e 21 do Código Civil, que tratam da obrigatoriedade de autorização prévia de biografados para produção de biografias, fossem considerados inconstitucionais. Por unanimidade, o Supremo acatou o pedido e tornou essa autorização desnecessária. O caso gerou muita discussão por conta de ações de artistas contra autores que os biografaram.
ADI 4.650, de setembro de 2015
Uma das ADIs com maior impacto sobre a política brasileira, a ação foi proposta pela OAB e pedia que fossem consideradas inconstitucionais as doações de pessoas jurídicas para partidos e políticos em eleições. A partir das eleições municipais de 2016, passou a ser proibida essa contribuição no Brasil.
ADI 5.540, de maio de 2017
A ação, movida pelo partido Democratas, tratou da obrigatoriedade de autorização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais para investigar o então governador do estado, Fernando Pimentel. O STF decidiu que essa obrigatoriedade era inconstitucional e, portanto, o governador poderia ser investigado sem o consentimento da casa. A decisão afeta casos semelhantes em outros estados brasileiros.
As ADIs e o governo Bolsonaro
Como visto acima, muitas vezes as Ações Diretas de Inconstitucionalidade tratam de temas de interesse nacional, ganham notoriedade e influenciam a vida de milhões de pessoas.
Isso tem acontecido com mais frequência nos últimos meses, envolvendo em diversas ocasiões o Executivo federal. Medidas tomadas pelo governo Bolsonaro foram alvo de 58 ADIs em 2019.
Para efeito de comparação, isso aconteceu cinco vezes em todo o governo Lula (2003-2010), duas vezes nos mandatos de Dilma (2011-2016) e 14 com Michel Temer (2016-2017).
Especialmente polêmicas foram as ações referentes à atuação do poder público no combate à pandemia de COVID-19. Em abril de 2020, ao julgar a ADI 6.341, o STF determinou que estados e municípios têm autonomia para tomar medidas de saúde pública, como restrições a comércios e lockdowns, sem interferência do governo federal – o que não o exime da responsabilidade de tomar ações contra o coronavírus.
Quase um ano depois, Jair Bolsonaro propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.764 para tentar suspender decretos da Bahia, do Distrito Federal e do Rio Grande do Sul que estabeleciam medidas restritivas no enfrentamento da pandemia de covid-19
O ministro Marco Aurélio Mello, no entanto, não aceitou o trâmite da ação, argumentando que uma ADI não pode ser movida em nome do presidente da República – pois, o presidente da República tem legitimidade apenas para propor a ação -, devendo ser assinada pela Advocacia Geral da União.
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REFERÊNCIAS
CNJ – CNJ Serviço: como funciona o controle de constitucionalidade
DireitoNet: Controle de constitucionalidade (Geral)
Normas Legais: Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI
Planalto: EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 3
Senado Federal: Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin)
SAJ ADV: Ação Direta de Inconstitucionalidade e controle do STF
STF: Legislação Anotada – Leis Infraconstitucionais
* O conteúdo foi produzido com a colaboração do advogado Vinicius Bento da Silva.