Na sociedade brasileira constantemente nos deparamos com marcas da desigualdade social. Dentre tantos debates que buscam explicar essas existências, torna-se relevante considerar um dos aspectos dessas perpetuações: acumulação de capital.
Esse processo consiste em um fenômeno em que determinados grupos concentram riquezas e é um fator inerente ao sistema capitalista.
Além disso, a acumulação de capital é facilitada pelas construções sociais, históricas e econômicas, tanto no Brasil, quanto no mundo.
Saiba mais: origens do sistema capitalista.
Definindo capital
Para entendermos melhor a formação de grupos que possuam capital acumulado, é necessário primeiro compreender o que é capital. O economista Adam Smith (1723- 1790) define capital como “parte do estoque do qual se espera produzir retorno“.
Ao enumerar o que pode ser capital, o autor considera:
- Instrumentos de trabalho;
- Imóveis voltados para o trabalho;
- Dinheiro;
- Instrumentos relacionados à terra e ao cultivo;
- Artigos fabricados e provisões em posse dos produtores.
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Isto é, capital não se restringe a dinheiro, mas a investimentos que, também a longo prazo, são capazes de gerar rendimentos.
Já, os intérpretes do pensador alemão Karl Marx (1818-1883) entendem o capital como parte de uma relação social de produção.
Portanto, o capital seria um meio de produção monopolizado por certa parte da sociedade, enquanto outra parcela possui a força de trabalho. Para eles, essa força de trabalho seria explorada, através da mais-valia, para que houvesse a acumulação de capital.
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Os diferentes tipos de capital
Diante dessas definições, é importante salientar que existem diferentes tipos de capital. Dentro dessa variedade, estão o capital produtivo e o financiero. O primeiro tem como propósito gerar lucro por meio da produção.
Já o capital financeiro corresponde a títulos e ações que podem ser convertidos em dinheiro. Este é o capital relativo ao capitalismo financeiro, que se inicia no século XX, e que concebe uma nova dinâmica de acumulação.
Existem ainda tipos de capitais que não são referentes a aquisições materiais. É o caso do capital cultural e social, conceitos desenvolvidos pelo sociólogo francês Pierre de Bourdieu.
Apesar desses capitais se tratarem de um acesso a bens culturais, ou a educação, eles são, igualmente, um recurso que gera privilégios. Para mais, Bourdieu considera que a detenção de um capital levaria a uma acumulação do mesmo cada vez maior.
As origens da acumulação de capital na economia de mercado
A história da acumulação de capital está intimamente atrelada ao capitalismo. Seu inicio remonta o período de transição do feudalismo para o capitalismo, que desenrola-se por um longo período.
O seu início é delimitado por alguns historiadores como a partir do século XVI. No feudalismo a economia era de subsistência, dessa forma, não havia acumulação de capital. Com a desintegração desse modelo, o que vigorou foi o mercantilismo.
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Da acumulação primitiva à flexível
As formas de acumulação no mercantilismo são nomeadas por Karl Marx como acumulação primitiva. Nessa estrutura produtiva, a acumulação de capital ocorre através do Estado controlando a economia, que é voltada para o mercado interno, havendo mais exportação do que importação.
Além disso, a acumulação também provém do metalismo, processo de exploração das colônias, visando a aquisição de metais preciosos.
Com a revolução industrial, a acumulação de capital se reproduz sobretudo através da exploração do trabalhador fabril, que ocorre pela produção de valor excedente. Esse excedente é fruto da chamada mais-valia que possibilita a acumulação de capital.
Nesse formato, o modelo é denominado de fordismo. Ele se caracteriza por: divisão do trabalho, muitas horas de trabalho, atividades repetitivas e exigência de poucas habilidades manuais tradicionais.
A partir do capitalismo financeiro, a acumulação de capital é fruto também do capital especulativo. O capitalismo contemporaneo é marcado pelo aparecimento de formas abstratas de acumulação de riqueza, que não dependem de um processo produtivo mas que envolvem um lucro imediatista.
Outro ponto é que o capital especulativo não funciona a partir da geração de emprego, em que o trabalhador produz uma mercadoria. Por se tratar de uma forma de economia mais abstrata e instável, pois depende de apostas no mercado, ele também é mais suscetível à crise.
Além disso, o sociólogo David Harvey considera que existe nos dias de hoje uma hegemonia da acumulação flexível, que tem origem na recessão dos anos 70. Período em que o modelo fordista começou a entrar em crise.
Para o autor, as conseqüências desse processo foram o desemprego e as condições de trabalho mais flexíveis. A alta rotatividade de empregos em unidades de produção descentralizadas permitem que um tempo menor para o retorno do capital, o que torna esse modelo mais competitivo.
No Brasil, a gradual superação do fordismo e novo modelo de acumulação flexível teria gerado uma condição de expansão dos assalariados médios no setor de serviços, ocorrido nas últimas décadas do século XX.
Acumulação de capital e a prática monopolista
O capitalismo financeiro também chamado de capitalismo monopolista, em virtude da formação dos oligopólios. Fenômeno em que em que poucas empresas possuem controle do mercado, o que provoca a acumulação de riqueza por grupos pequenos.
Alguns estudiosos do tema acreditam que o capitalismo monopolista é uma tendência. O que corrompe até mesmo a ideia de competitividade entre as empresas, algo valorizado no pensamento liberal.
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Sendo assim, a intensificação da acumulação de riquezas na mão de grupos seletos, motivado pelos oligopólios e monopólios é desproporcional a redistribuição da riqueza.
O autor Thomas Piketty afirma que os países desenvolvidos possuem a taxa de acumulação de renda maior que as de crescimento econômico. Com isso, gerações acumulariam mais riquezas do que os demais na corrida capitalista.
Por isso, a ideia da meritocracia, usada para defender o fato de alguns possuírem mais que outros, seria desmanchada. Uma vez que riquezas acumuladas seriam passadas através da herança, permitindo que este grupo tenha um acesso muito fácil a ferramentas que permitam ainda mais o acúmulo de riqueza.
Para Piketty a solução que acarretaria alguma mudança é a taxação de grandes fortunas, o que teria que ser realizado globalmente.
Diante desse plano, para minimizar a concentração de renda produto da acumulação de capital, podem ser pensadas políticas redistributivas eficazes. Obviamente, mudanças na estrutura produtiva de uma sociedade são extremamente complexas.
E aí, conseguiu entender um pouco mais sobre acumulação de capital? Conta nos comentários o que você achou do nosso conteúdo!
Referências:
- ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 2006
- AZEVEDO, L. F. DE .; FONSECA, P. C. D.; MISSIO, F. J.. Distribuição de renda e regime de crescimento econômico no Brasil: avaliação e propostas. Brazilian Journal of Political Economy, v. 42, n. 1, p. 25–47, jan. 2022.
- BOURDIEU, Pierre. A distinção: Crítica social do julgamento. Porto Alegre: Zouk, 2007
- MARX, Karl. A mercadoria. In: MARX, Karl. O Capital: Crítica da economia política. Livro I: O processo de produção do capital. Trad. Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013
- SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigação sobre sua natureza e suas causas. São Paulo: Abril Cultural, 1983. SMITH, Wendell R.
- HARVEY, David. “Cap. 7: Introdução”, “Cap. 8: O fordismo” e “Cap. 9: Do fordismo àacumulação flexível”. In: Condição pós-moderna. São Paulo: Edições Loyola, 2008. Pp. 117-134 e 135-162
- Eco. UNICAMP – A lei geral de acumulação capitalista e as crises cíclicas
- Mundo Educação – Mercantilismo: o que foi, características, resumo
- Dicionário Financeiro – O que é e como funciona o capital especulativo?
- Brasil Escola – Capitalismo: origem, características e críticas
- IHU Online – A pulsão de vida do capitalismo é sua pulsão de morte: a acumulação