As Eleições Gerais de 2022 foram marcadas por uma disputa eleitoral intensa e polarizada, sendo levantados muitos questionamentos acerca do processo eleitoral. Após o resultado final das eleições, chegou ainda ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a solicitação de anular votos computados no segundo turno.
O pedido ao TSE foi realizado pelo Partido Liberal (PL) que contratou uma auditoria para averiguar as urnas eletrônicas. De acordo com o partido político, o laudo técnico da auditoria feita pelo Instituto Voto Legal (IVL) constatou “evidências contundentes de mau funcionamento dos equipamentos”.
Veja também nosso vídeo sobre o Partido Liberal!
Afinal, a anulação de votos é possível? Podemos confiar nas urnas eletrônicas? Outras auditorias foram realizadas pela Justiça Eleitoral? Nesse texto, a Politize! te responde essas e outras questões.
Veja mais: O que é polarização e por que é prejudicial à democracia?
Anular voto é possível?
O voto nulo trata-se de uma forma de invalidar o voto, ou seja, não votar em nenhum dos candidatos. Para registrar esse voto, o eleitor digita um número que não pertence a nenhum candidato ou partido político e aperta o botão “confirma” na urna eletrônica.
Nesse caso, é importante que o eleitor saiba que anular o voto não significa que ele será considerado de modo diferente. Assim como os votos brancos, os votos nulos não entram no cômputo dos votos.
Dessa forma, os votos brancos e nulos são igualmente considerados como inválidos, sendo desconsiderados na contagem final da eleição. Tais votos se diferenciam apenas no modo como o eleitor decide invalidar o próprio voto e como serão registrados estatisticamente.
Afinal, votos nulos podem promover a anulação do pleito e a marcação de novas eleições?
Voto nulo e novas eleições
O art. 224 da Lei nº 4.737 de 15 de Julho de 1965 prevê a necessidade de novas eleições caso a nulidade atinja metade dos votos do país, veja o que diz o Código Eleitoral:
Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.
Essa lei gera diversos equívocos de interpretação e com base nela uma parcela da população brasileira pede anulação das eleições a cada 4 anos. Entretanto, a nulidade a qual o Código Eleitoral se refere não trata da chamada “manifestação apolítica” do eleitor – voto nulo do eleitor na urna eletrônica.
A nulidade prevista em lei diz respeito a constatação de fraude no processo eleitoral, como, por exemplo, eventual cassação de um candidato eleito por compra de votos. Nessa situação, se o candidato tivesse obtido mais da metade dos votos, haveria a necessidade de realizar novas eleições, intituladas suplementares.
Veja mais: Código Eleitoral: mudanças ao longo dos anos
E quando mais da metade dos votos são nulos?
O debate sobre anular votos revela que uma parcela da sociedade brasileira acredita que determinada quantidade de votos nulos poderia invalidar uma eleição, mas isso não é verdade!
Embora anular voto seja uma opção legítima do eleitor brasileiro — garantindo o chamado “voto de protesto” — ele não altera o resultado final das eleições. Portanto, os votos nulos não têm capacidade de anular uma eleição, independente de sua quantidade em um pleito.
Veja também nosso vídeo sobre votos brancos e nulos!
Histórico de votos nulos nas eleições brasileiras
Além da urna eletrônica permitir ao eleitor votar nulo digitando um número que não corresponda a nenhum candidato ou partido, ao apertar a tecla “confirma” é emitido um alerta de que o voto será anulado.
Portanto, a quantidade de votos anulados pelas urnas corresponde ao volume de eleitores que decidiram votar nulo nas eleições. No Brasil, historicamente os resultados dos votos nulos se mantêm semelhantes a cada eleição.
Confira os dados de votos nulos por eleição em primeiro turno:
- 1994 – 7.443.144 (9,55%)
- 1998 – 8.886.895 (10,67%)
- 2002 – 6.976.685 (7,35%)
- 2006 – 5.957.521 (5,68%)
- 2010 – 6.124.254 (5,51 %)
- 2014 – 6.678.592 (5,80%)
- 2018 – 7.206.222 (6,14%)
- 2022 – 3.487.874 (2,82%)
Agora, vejamos os dados referentes a votos nulos em todos os segundos turnos das eleições presidenciais no Brasil desde a redemocratização:
- 1994 – eleição definida em primeiro turno
- 1998 – eleição definida em primeiro turno
- 2002 – 3.930.765 (4,11%)
- 2006 – 4.808.553 (4,71%)
- 2010 – 4.689.428 (4,40%)
- 2014 – 5.219.787 (4,63%)
- 2018 – 8.608.105 (7,43%)
- 2022 – 3.930.765 (3,16%)
Conforme os dados registrados, nas Eleições de 2022 o Brasil registrou o menor número de votos nulos em segundo turno desde as Eleições de 2002, há vinte anos. Por outro lado, o percentual de votos nulos em 2018 foi o maior já registrado.
Para verificar resultados estatísticos de votação a cada eleição, acesse o Portal de Resultados do Tribunal Superior Eleitoral!
Confiabilidade das urnas eletrônicas
O Tribunal Superior Eleitoral destaca que antes, quando o voto era marcado em cédulas e contabilizado pela junta eleitoral, havia de fato a possibilidade de voto em branco ser destinado a outro candidato. Isso porque ao contabilizar os votos, poderia haver fraude e preenchimento das cédulas com o nome de outro candidato.
No entanto, atualmente o processo de votação e apuração de votos é bastante diferente, os dois são realizados de maneira eletrônica. Assim, o que se mantém é uma falsa ideia de que votos brancos e nulos podem beneficiar um candidato — quando, na verdade, tais votos não são válidos.
Pedido de anulação de votos ao TSE
Após as Eleições de 2022, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) junto ao presidente do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto, entrou com um pedido de representação no TSE para solicitar a anulação de votos nas urnas UE2009, UE2010, UE2011, UE2013 e UE2015 no segundo turno. De acordo com o partido, 279 mil urnas apresentaram problemas.
O partido alegou desconformidades e mau funcionamento das respectivas urnas eletrônicas. Por sua vez, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, negou o pedido argumentando que era “esdrúxulo e ilícito” e um atentado contra o Estado democrático de direito.
Além de negar o pedido, o ministro também condenou a legenda a pagar uma multa de R$ 22,9 milhões, pois concluiu que houve má-fé por parte dos requerentes. A decisão alega, inclusive, que o pedido foi usado com o objetivo de fomentar movimentos anti-democráticos, como as obstruções de rodovias e vias públicas no Brasil.
Portanto, ficou estabelecido na decisão que: “(…) nos termos do art. 81, caput, do CPC, condeno a autora por litigância de má-fé, à multa de R$ 22.991.544,60 (vinte e dois milhões, novecentos e noventa e um mil, quinhentos e quarenta e quatro reais e sessenta centavos), correspondentes a 2% (dois por cento) do valor da causa aqui arbitrado”.
E aí, você entendeu o que significa anular votos? E o contexto em que é possível pedir novas eleições? Conta nos comentários!
Referências:
- CNN – Brasil tem menor porcentagem de votos brancos e nulos desde 2002
- CNN – Bolsonaro pede ao TSE anulação de votos em parte das urnas nas eleições de 2022
- CNN – Moraes dá 24 horas para que pedido do PL abranja os dois turnos das eleições
- Correio Braziliense – Moraes diz que pedido do PL de anular votos é “esdrúxulo e ilícito”
- Exame – Tudo sobre Eleições 2022: O que acontece se a maioria dos votos forem nulos?
- Gazeta do Povo – Abstenção no 2.º turno da eleição presidencial é de 20,6%; votos brancos e nulos somam 4,59%
- G1 – Apuração de votos para presidente
- G1 – Percentual de voto nulo é o maior desde 1989; soma de abstenções, nulos e brancos passa de 30%
- Jus Brasil – Código Eleitoral – Lei 4737/65 | Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965
- Tribunal Superior Eleitoral – Esclarecimentos
- Tribunal Superior Eleitoral – Voto nulo e novas eleições
- UOL – Voto branco e voto nulo: qual a diferença e para onde vai cada?
- Veja – O recado do mercado ao pedido de anulação de votos feito pelo PL