Artigo Quinto

PUBLICADO EM:
novembro 12, 2019

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INCISO XXVII – DIREITO AUTORAL

"Aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar”

INCISO XXVII – O DIREITO AUTORAL

O direito autoral é uma garantia concedida ao cidadão pela Constituição Federal de 1988, no inciso XXVII do artigo 5º, e também pela Lei de Direitos Autorais nº 9.610/98

Para entender sua relevância e aplicação na prática é importante lembrar que o artigo 5º é um dos  mais importantes da nossa Constituição. É nele que estão previstos os direitos fundamentais que garantem uma vida digna, livre e igualitária a todos os cidadãos do país. 

Neste texto, falaremos sobre os direitos autorais, garantidos, como dito, pelo inciso XXVII. Para conhecer outros direitos fundamentais, confira a página do projeto Artigo Quinto, desenvolvido pela Politize! e a Civicus em parceria com o Instituto Mattos Filho.

O QUE DIZ O INCISO XXVII?

O inciso XXVII, do artigo 5º, afirma que:

“aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar”;

De forma geral, é exclusivo do criador da obra o direito sobre ela, seja em sua expressão moral ou patrimonial. Assim, o autor tem o direito de reivindicar a autoria da obra, de ter o seu nome ou pseudônimo anunciado nela, de conservar a obra inédita e de assegurar a sua integridade, opondo-se a tentativas de modificá-la ou descaracterizá-la sem o seu consentimento. Também é dele o direito de permitir e escolher a forma de utilização, publicação ou reprodução de suas obras. Portanto, o criador de uma obra artística, literária ou intelectual tem os direitos de uso sobre ela.

Uma obra protegida pelo direito autoral é um trabalho que se originou no espírito de uma pessoa. Ou seja, ele foi criado a partir de seus conhecimentos, experiências ou sentimentos e depois exteriorizado para o mundo como uma ‘obra’. É nesse sentido que os direitos autorais são entendidos como fundamentais e estão previstos na nossa Constituição.

Vale ressaltar que o inciso XXVII do artigo 5º também expõe uma preocupação patrimonial do legislador em favor do autor da obra. Atualmente, esse prazo de proteção estende-se do primeiro instante em que o trabalho foi criado até 70 anos depois do autor falecer– iniciados em 1º de janeiro do ano subsequente ao da sua morte. 

Dessa maneira, os herdeiros do autor também estão protegidos pela lei. Afinal, são eles os responsáveis pela utilização, publicação e reprodução da obra durante esse período de 70 anos. 

HISTÓRICO DO DIREITO AUTORAL NO BRASIL

O primeiro registro de proteção dos direitos autorais no Brasil ocorreu em 1827, com a Lei de 11 de agosto. Essa lei instituiu os cursos jurídicos de São Paulo -SP e de Olinda – PE, e concedeu aos professores o privilégio exclusivo das obras textuais por eles elaboradas, pelo período de dez anos. 

Em 1830, a penalização pelo desrespeito do direito do autor veio no artigo 261 do Código Criminal. Nele, estavam expressos os direitos exclusivos do cidadão de imprimir, gravar, litografar ou introduzir qualquer escrito ou estampa por ele criado enquanto vivesse e para seus herdeiros por dez anos após sua morte.

Os autores encontram proteção constitucional desde a Constituição de 1891 (art. 72, §26) e previsões sobre a matéria foram incluídas em todos os textos constitucionais que a sucederam.

Entretanto, a primeira norma específica sobre os direitos autorais surgiu em 1898, quando a Lei Medeiros e Albuquerque consolidou a proteção legal do direito autoral no país. Ela estabeleceu o direito no âmbito da propriedade literária, científica e artística.

Ainda no plano infraconstitucional, o Código Civil de 1916 complementou essa lei. Entretanto,  com o passar dos anos, os dispositivos sobre o direito do autor começaram a conflitar com a evolução dos meios de comunicação e a reprodução de sons e imagens. A solução foi publicar mais leis e decretos para solucionar tais conflitos. Ao final, a matéria legal era tanta que precisou ser unificada em um único texto: a Lei n. 5.988/1973.

Essa lei foi a referência brasileira sobre o tema até a promulgação da Constituição de 1988. A partir de então, os direitos autorais foram garantidos pelo inciso XXVII do artigo 5º. 

Hoje, além do inciso XXVII, o direito autoral é regulado especificamente pela Lei de Direitos Autorais (a “LDA”), editada em 1998, para abarcar as necessidades dos novos padrões sociais. 

O DIREITO AUTORAL NA PRÁTICA

No Brasil, conforme o artigo 18 da LDA, a proteção autoral independe de registro. Assim, é opção do autor registrar ou não sua obra por meio do órgão público correspondente à natureza da sua criação. Por exemplo: escritores, músicos, poetas e desenhistas devem procurar a Biblioteca Nacional para registrar suas obras – o Escritório de Direitos Autorais é a unidade administrativa responsável pelo serviço de registro. 

No caso de programas de computador – também considerados obras de propriedade intelectual –, a LDA e a Lei de Software (Lei nº 9.609/98) têm um regime diferenciado. O objeto de proteção em um programa de computador é o seu código-fonte, tido como obra literária. Assim, o autor deve procurar o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) para ter o registro. 

Como os registros não são necessários para a garantia da proteção sobre as obras, considera-se que os registros concedidos pelo Estado são de ordem declaratória

Isso significa que representam apenas a declaração da existência dos direitos autorais daquela pessoa sobre aquela obra para o restante do mundo, pois, juridicamente, esses direitos já existiam. Para demonstrar tal direito, facilita bastante obter a referida declaração como meio de prova.

Outra questão, um pouco mais técnica, diz respeito à dupla consideração dos direitos autorais, já que, tradicionalmente – e conforme a LDA –, entende-se que o direito autoral é dividido em direitos morais e direitos patrimoniais. 

Os direitos morais estão vinculados à personalidade do autor e são inalienáveis – ou seja, somente o autor tem permissão para realizar qualquer modificação na sua obra. Já os direitos patrimoniais dizem respeito à utilização e ao controle de reprodução – no caso mais amplo, relativo ao uso econômico da obra – e podem ser vinculados a herdeiros ou transferidos a terceiros.

É nesse último sentido, o patrimonial, que o direito autoral é tido como um benefício que o Estado concede ao autor de uma obra. Assim, o direito exclusivo de exploração econômica pode ser considerado um incentivo à criação dos autores. Afinal, após o prazo de exclusividade – do autor e dos herdeiros –, a obra cai em domínio público e pode ser utilizada independentemente de autorização. 

Em relação ao direito moral, ainda que o autor tenha falecido e tenha expirado o prazo legal de exclusividade sobre a obra, o seu direito de ser reconhecido pela obra sobrevive a qualquer circunstância. Ou seja, a obra sempre carregará o nome do autor e, de certa forma, a sua personalidade.

A IMPORTÂNCIA DA TEMPORALIDADE DOS DIREITOS PATRIMONIAIS

A temporalidade dos direitos patrimoniais, isto é, o prazo legal estipulado para a exploração econômica exclusiva da obra, perpassa toda a vida do autor até 70 anos após a sua morte, podendo ser explorados pelos seus sucessores. Depois disso, a obra ingressa no domínio público, tornando-se livremente acessível a qualquer interessado. 

Podemos dizer, então, que as obras passam a ser consideradas um bem comum da humanidade. Isso é importante para expandir o acesso à cultura a mais pessoas e ampliar o cenário cultural no Brasil.  

Entretanto, o contrário também vale: a temporalidade do direito patrimonial é importante para preservar os interesses da família do autor falecido. Por exemplo, como coloca o desembargador Alfredo Migliori do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP): 

A publicação em revista semanal de trechos de diário pertencente a ex-Presidente da República falecido, sem a autorização de seus familiares, enseja indenização, a título de direitos autorais, aos herdeiros do de cujus, ainda que se trate de obra de acentuada importância histórica, pois era direito da família mantê-la inédita e sem publicação.

A importância deste direito na realidade brasileira

Apenas em 2018, foram registradas 42.998 obras na Biblioteca Nacional. Desse total, 39% eram músicas, 26% eram obras de natureza literária e 22% eram obras audiovisuais.

O fato é que diversos nomes da cultura brasileira são referência internacionalmente, seja na música, na arte ou na literatura. Não é de hoje que somos reconhecidos como um dos países que mais produz cultura no mundo. 

Por exemplo, você sabia que é brasileira a segunda música mais interpretada da história? Composta por Vinicius de Moraes e Tom Jobim em 1962, “Garota de Ipanema” está no rol de músicas mais regravadas de todos os tempos. O assunto é tão sério que, em 2005, a família de Tom Jobim abriu um processo nos Estados Unidos por violação de contrato e direitos autorais. Além do apelo internacional, segundo o Ecad (entidade brasileira responsável pela arrecadação e distribuição dos direitos autorais das músicas aos autores e demais titulares), a música “Garota de Ipanema” é a terceira mais gravada do Brasil, perdendo apenas para Aquarela do Brasil de Ary Barroso e Carinhoso, de Pixinguinha e João de Barro.

Além disso, atualmente, nomes como Anitta e Ivete Sangalo movimentam a economia e milhões de pessoas em um mercado que gera empregos e produz cultura e arte para a sociedade. Sem falar que, durante a pandemia da Covid-19, a cultura e a arte, apesar dos obstáculos à interação social, foram uma das fontes mais importantes de entretenimento social. A cultura ajudou, assim, a aliviar quadros psicológicos negativos desencadeados pelo distanciamento social.

Como se nota, os direitos autorais também se relacionam com o progresso do Brasil, pois podem contribuir para a construção do acervo cultural do país. Além de autores nacionais influenciarem a imagem do Brasil internacionalmente, eles também estão contribuindo para a riqueza cultural da sociedade brasileira no futuro. 

CONCLUSÃO

O direito autoral é uma garantia prevista no inciso XXVII do artigo 5º da Constituição e pela LDA. É basicamente o direito do autor de permitir e escolher a forma de utilização, publicação e reprodução de suas obras da maneira que desejar, além de ter sua autoria reconhecida. 

Como podemos perceber, é por meio desse direito que o acervo cultural do nosso país é garantido. Afinal, além de estipular limites ao uso das obras, ele incentiva os autores a produzir e possibilita a construção de um patrimônio cultural comum ao Brasil. 

  • Esse conteúdo foi publicado originalmente em novembro/2019 e atualizado em agosto/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.

Autores:

  1. Isabela de Sena Passau Alves
  2. Mariana Mativi
  3. Monalisa Ceolin

Fontes:

  1. Jus Brasil: Ação Declaratória
  2. Jus Brasil: A evolução histórica dos direitos autorais 
  3. Sebrae: O que são direitos autorais.
  4. Biblioteca Nacional: Relatório da gestão.
  5. Biblioteca Nacional: Direitos autorais.
  6. Mariana Uyeda Ogawa: Da temporalidade dos direitos patrimoniais do autor.
  7. INPI: Legislação – Programa de Computador

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