INCISO XLIV – PROTEÇÃO À ORDEM CONSTITUCIONAL E À DEMOCRACIA
O inciso XLIV do artigo 5º da Constituição Federal define como inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e a democracia. Assim, esse inciso busca proteger os princípios democráticos e a própria Constituição, garantidora da ordem social.
Quer saber mais sobre essa proteção e por que ela é tão importante, bem como a sua história e sua aplicabilidade prática? Continue conosco! A Politize!, em parceria com a Civicus e o Instituto Mattos Filho, irá descomplicar mais um direito fundamental nessa série do projeto “Artigo Quinto”.
Para conhecer outros direitos fundamentais, confira a página do projeto, uma iniciativa que visa tornar o direito acessível aos cidadãos brasileiros.
O QUE É O INCISO XLIV?
O inciso XLIV do artigo 5º, promulgado pela Constituição Federal de 1988, define que:
constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
O objetivo deste inciso é proteger a própria Constituição Federal e o Estado Democrático de Direito, recriminando ações que ameaçam a democracia. Nesse sentido, essa é uma garantia de extrema importância para a manutenção da sociedade, visto que é por meio dela que a ordem democrática constitucional é mantida.
O inciso XLIV do artigo 5º caracteriza o crime de perturbação à ordem constitucional e ao Estado Democrático com duas peculiaridades: a inafiançabilidade e a imprescritibilidade. A inafiançabilidade retira a possibilidade de pagamento de fiança pelo infrator para responder ao processo em liberdade. A imprescritibilidade, por sua vez, não permite que o crime sofra os efeitos do tempo, ou seja, que ele prescreva.
Isso porque, em regra, há um limite de tempo para que um acusado responda e seja punido por um crime e, quando esse limite é ultrapassado, não é mais possível punir o infrator. Dessa forma, sendo este delito imprescritível, o infrator responde por seu crime a qualquer tempo.
HISTÓRICO DA PROTEÇÃO À ORDEM CONSTITUCIONAL E À DEMOCRACIA
A Constituição brasileira de 1988 mantém e amplia a diretriz das Constituições anteriores relativa aos direitos fundamentais. Esses direitos, por sua vez, dividem-se em capítulos dedicados aos direitos e deveres individuais e coletivos, aos direitos sociais e aos direitos políticos. Os direitos individuais e coletivos estão enunciados no artigo 5º, em setenta e nove incisos e em quatro parágrafos.
Se compararmos a atual Constituição com os textos das anteriores – de 1967 e da EC nº 01/69 –, podemos pensar que houve um aumento de garantias (até então, eram trinta e seis parágrafos que tratavam deles). Contudo, muitos dos direitos e liberdades previstos são praticamente os mesmos, contando apenas com desdobramentos e particularidades que visam coibir abusos de direito.
Além disso, diversos direitos e garantias que faziam parte da legislação comum passaram a ter status constitucional. O que mudou foi o efetivo compromisso do Estado brasileiro com o texto constitucional, que passou a reger um verdadeiro Estado de Direito em vez de mascarar a ilegitimidade de um governo autoritário.
Nossa atual Constituição é conhecida como a Constituição Cidadã, nomeação que tem uma carga histórica, marcada pelo processo de redemocratização do Brasil. Após 21 anos sem eleições diretas no período da ditadura militar (1964-1985), tivemos, em 1985, o primeiro Presidente da República eleito de forma democrática. Isso ocorreu porque já havia na sociedade um grande anseio por mudanças, que desaguou no movimento “Diretas Já”.
Assim, o texto constitucional reflete esses anseios sociais por um Estado Democrático de Direito. Após mais de vinte anos de opressão, buscou-se a valorização da liberdade da população e dos seus direitos individuais, coletivos e difusos.
O deputado Carlos Alberto Oliveira (PDT-RJ) foi autor deste dispositivo específico e, para a sua aprovação, teve de retirar do texto a parte que impedia a anistia para esse crime, tendo a votação o resultado de 281 votos favoráveis, 120 votos contra e 20 abstenções.
A IMPORTÂNCIA DESSE MANDADO DE CRIMINALIZAÇÃO E SUA APLICAÇÃO NA PRÁTICA
Este inciso do artigo 5º da Constituição Federal é de grande importância, pois determina a criminalização de condutas que invadam os direitos garantidos pelo Estado Democrático de Direito, por meio do desmantelamento de nosso Estado e da própria Constituição.
A ditadura militar foi um dos períodos mais nefastos de nossa história recente e qualquer organização, seja civil, seja militar, que se aproxime de crimes potencialmente lesivos à atual ordem do Estado brasileiro deve ser punida.
No Brasil, foi criada pela ex-presidenta Dilma Rousseff, após a edição da Lei n. 12.528/2011, a Comissão Nacional da Verdade, para investigar as violações de direitos humanos ocorridas no período ditatorial.
Conforme dados da Comissão Nacional da Verdade, 191 brasileiros que resistiram à ditadura foram mortos, 210 estão até hoje desaparecidos e foram localizados apenas 33 corpos, totalizando 434 militantes mortos ou desaparecidos. Além disso, os agentes dos órgãos de repressão do Estado, até agora identificados, são responsáveis pela tortura e pelo assassinato de 337 pessoas.
Dessa maneira, a Comissão Nacional da Verdade trabalhou em prol do resgate das informações dos que lutaram contra o regime ditatorial para que sejam reconhecidos e concedidos os direitos que a história lhes reserva. Essa iniciativa busca deixar viva na memória do povo e dos governantes a importância da democracia e do Estado democrático de Direito.
O inciso busca também inviabilizar a formação de poderes paralelos, que possam enfraquecer o Estado, como facções paramilitares ou organizações criminosas. Exemplos desse tipo de organização são o Primeiro Comando da Capital (PCC), o Comando Vermelho, a Família do Norte (FDN), entre outros.
CONCLUSÃO
Como visto, o inciso XLIV do artigo 5º é de extrema importância para a nossa sociedade, pois preserva a ordem constitucional e a democracia com o intuito de que episódios de repressão, como os da ditadura militar, não voltem a acontecer.
Assim, cabe a nós, cidadãos, zelar também por tais princípios, elegendo candidatos que governem de maneira a representar os interesses do povo e a garantir o exercício da cidadania e os princípios democráticos.
- Esse conteúdo foi publicado originalmente em abril/2020 e atualizado em setembro/2023 com objetivo de democratizar o conhecimento jurídico sobre o tema de forma simples para toda população. Para acessar maiores detalhes técnicos sobre o assunto, acesse o Livro do Projeto Artigo Quinto.
Autores:
- Fernanda Araújo José
- Mariana Mativi
- Matheus Silveira
Fontes:
- Instituto Mattos Filho;
- Artigo 5° da Constituição Federal – Senado;