A historiadora Holoisa Starling (2022) afirma que a aliança entre a participação pública das mulheres e a democracia é antiga. No entanto, ela discute o apagamento que figuras femininas históricas sofreram ao longo do tempo. Nesse texto, você vai conhecer uma dessas mulheres que, por muito tempo, foi invisibilizada. Bárbara de Alencar desafiou as convenções de seu tempo ao se posicionar como uma defensora dos ideais libertários e republicanos em uma época em que a presença feminina na política era ainda mais desafiadora.
Sua luta, antes apagada da história oficial, tem ganhado reconhecimento recentemente, e seu nome agora figura no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria.
Quem foi Bárbara de Alencar?
Bárbara de Alencar, pernambucana, nascida em 1760, destacou-se como figura política ao tornar-se uma defensora dos ideais libertários no Brasil. Influenciada por pensadores iluministas, lutava pela indepêndencia do país.
Contudo, por muito tempo, sua atuação foi ignorada por uma história que não reconhece a ação feminina nas conquistas políticas. Nesse sentido, é importante chamar atenção para essa grande figura que tem ganhado espaço recentemente!
As informações sobre Bárbara originam-se do livro “Independência do Brasil: as mulheres que estavam lá” por Starling e Pellegrino.
Panorâma de sua atuação
Sua liderança na Revolta do Crato, aos 57 anos, resultou em violências marcadas pela condição de mulher atuando politicamente. Bárbara de Alencar foi libertada após D. João VI ser pressionado pelos ideais liberais da Revolução do Porto.
Os revoltosos reivindicavam a volta da corte e uma constituição em Portugal, evidenciando, assim, o ideal liberal se contraporem ao sistema absolutista vigente.
Engajada nas lutas republicanas, apoiou a busca de seus filhos por uma república brasileira, enfrentando perseguições até sua morte. Bárbara, uma mulher resiliente, deixou um legado significativo na história política brasileira.
É reconhecida como a primeira mulher a presidir uma república independente no Brasil: a República do Crato.
O interesse político de Bárbara de Alencar
Bárbara de Alencar, filha de mãe indígena e pai português, teve um papel fundamental na política da cidade de Crato. Esse município é situado no estado do Ceará, sertão nordestino. Aos 32 anos, ele encontrou um amigo que proporcionou-lhe um mergulho nas ideias de pensadores iluministas como Voltaire, Montesquieu e Rousseau.
Essas referências a fizeram uma admiradora e ativista em prol da causa libertária no Brasil pelo fim da monarquia.
O pessoal político de Bárbara de Alencar
A filósofa Simone de Beauvoir (2021), em suas reflexões sobre a socialização de homens e mulheres, traz a discussão de que ações cotidianas, entendidas como privadas, estão impregnadas de concepções políticas. Esse entendimento nos ajuda a pensar na história de Bárbara. Em sintonia com seus ideais libertários, ela matriculou seus filhos na instituição de ensino mais inovadora do período colonial, que se tornou um centro de disseminação das ideias iluministas.
Em 1809, após a morte do marido, Bárbara assumiu o papel de referência em seu lar, desafiando a norma da época, centrada na figura paterna. No entanto, mesmo antes disso, ela já contrariava os estereótipos de gênero, andando desacompanhada e tomando decisões em sua casa. Por isso, era entitulada de “mulher-macho” na visão de seus opositores.
Seu ativismo político
Aos 57 anos, Bárbara emergiu como líder à frente de um movimento revolucionário separatista, defendendo uma bandeira liberal e republicana. Na Revolta do Crato, organizada com a participação de seus familiares, um de seus filhos convocou o povo à revolta.
Assim, proclamando a independência da vila do Crato em relação a Portugal. Embora tenham temporariamente tomado o controle da cidade, a contra-revolução ganhou força meses depois, sufocando o movimento e prendendo seus membros.
Bárbara conseguiu fugir para a casa de uma conhecida. Esta, percebendo a busca da coroa, queimou vários arquivos. Isso incluiu registros de Bárbara, dificultando o reconhecimento de sua contribuição.
A violência política contra Bárbara
Durante sua fuga, a revolucionária foi encontrada e presa. Enfrentou acusações infundadas de amasia com um padre, difamando sua memória. Já que era impossível apagar sua atuação política, tentaram destacar essa história para que esta sobressaísse sua fundamental ação revolucionária.
Na cidade para onde os prisioneiros eram conduzidos, cavou-se um fosso destinado a ser o cárcere da revolucionária. Inicialmente, planejava-se inscrever naquele local uma mensagem que rezava: “aqui gemeu longos dias Bárbara de Alencar”.
O confinamento de Bárbara demandou estratégias para fazer com que ela não fosse um exemplo a ser seguido. A narrativa a tinha como um temor a ser evitado. Submetida a torturas e encerrada em sua cela, o julgamento de 1818 assumiu uma tonalidade de gênero. Esse movimento destacou seus crimes através de critérios associados à sua condição de mulher.
Prática antiga, nome recente
Hoje, o que aconteceu com Bárbara é entendido como “Violência Política Contra as Mulheres”. Segundo Krook e Sanín (2016), esse fenômeno visa afastar mulheres da política. Marielle Franco sofreu ataques após sua morte. Viviane Golnçaves (2022), cientista política, descreveu isso como um “segundo aniquilamento” como uma tentativa de deslegitimar sua trajetória.
Assim, podemos traçar um paralelo entre Marielle e Bárbara, que também sofreu tratamento semelhante. Dessa forma, observa-se que à violência destinada às mulheres políticas é uma prática antiga no Brasil.
Legado e fim de sua vida
Anos depois, veio à tona a Revolução Liberal do Porto, que levou à libertação dos presos políticos no Brasil por D. João VI. Assim, Bárbara e seus filhos saem da prisão. Embora D. Pedro I tenha proclamado a independência, os revolucionários continuaram a questionar, defendendo uma independência republicana.
Bárbara, já mais velha e debilitada pelo tempo, torturada, apoiou moral e financeiramente seus filhos na busca pela ideia republicana. Sofreu perseguições pelo resto de sua vida, tornando-se a primeira mulher a presidir a república do Crato, no imaginário sertanejo. Em 2012, essa mulher de luta foi incluída no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria. Quase dois séculos após sua morte, em 1832, ela foi finalmente reconhecida e homenageada pelo Estado brasileiro que, no passado, a perseguiu.
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Referências:
- Agência Câmara de Notícias – Câmara aprova inclusão de líderes pernambucanos no Livro de Heróis da Pátria
- Agência Senado – Conheça os Heróis e Heroínas da Pátria
- BEAUVOIR, S. O segundo sexo. [s.l.] Nova Fronteira, 2021
- GONÇALVES, V. O duplo aniquilamento de Marielle Franco: fake news como estratégia para liquidar o inimigo. Revista Mediação, v. 22, n. 30, 2020
- STARLING, H. M. M.; PELLEGRINO, A.; SILVA, C. DA (Eds.). Independência do Brasil: as mulheres que estavam lá. Rio de Janeiro, RJ: Bazar do Tempo, 2022