Trajetória e queda de Bashar al-Assad: o governante da Síria por 24 anos

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Bashar al-Assad liderou a Síria por mais de duas décadas, sendo herdeiro de uma dinastia política que governou o país por mais de 50 anos. Durante seu governo, ele enfrentou expectativas de reformas democráticas e pressão internacional, mas sua trajetória ficou marcada por um regime autoritário, repressão violenta e o colapso final de seu poder em 2024. 

A queda de Assad trouxe mudanças profundas para a Síria e para o Oriente Médio, levantando questões sobre o papel da comunidade internacional na reconstrução de nações em crise. 

Neste texto, a Politize! vai te trazer os principais eventos da trajetória de Assad, os fatores que sustentaram seu regime e os desafios que surgiram após sua deposição. Acompanhe a leitura!

Quem foi Bashar al-Assad?

Bashar al-Assad nasceu em 11 de setembro de 1965, em Damasco, na Síria. Filho de Hafez al-Assad, ele cresceu em uma família que consolidou seu poder através do partido Baath. Assad inicialmente não tinha intenções de seguir a carreira política, focando em sua formação em medicina, mas retornou à Síria em 1994 após a morte de seu irmão Bassel, que era o herdeiro político designado. 

Esse fato redirecionou sua trajetória, levando-o a assumir papéis militares e políticos. Em 2000, após a morte de Hafez al-Assad, Bashar ascendeu à presidência, sendo visto inicialmente como uma figura reformista.

A família Assad consolidou um regime baseado no controle rígido do partido Baath e em uma rede de alianças com líderes militares e econômicos. Sua postura inicialmente moderada alimentou expectativas de que ele lideraria uma abertura política e modernizaria a economia síria. 

Essas esperanças, no entanto, foram rapidamente frustradas. Ficou claro que seu governo seguiria os moldes de seu pai, que dentre as atitudes, consistiria na repressão de opositores e a centralização do poder.

Apesar das acusações de repressão, o regime de Assad era visto como um fator estabilizador na proteção de minorias religiosas, como cristãos e alauitas, que temiam a ascensão de grupos extremistas.

Fotografia de Bashar al-Assad.
Bashar al-Assad. Imagem: Wikipédia.

O início da guerra civil

Em 2011, os protestos populares inspirados pela Primavera Árabe chegaram à Síria. Manifestantes exigiam democracia, o fim da corrupção e maior liberdade política. A reação do governo sírio aos protestos foi violenta, utilizando forças de segurança para reprimir os manifestantes. 

Essa repressão transformou os protestos em uma guerra civil prolongada, que devastou o país, deixando mais de 500 mil mortos e deslocando mais de 13 milhões de pessoas, entre refugiados e deslocados internos.

Entenda mais sobre: Guerra civil na Síria

Durante seu governo, Bashar al-Assad transformou a Síria em um dos regimes mais repressivos do mundo. Além de prisões clandestinas, tortura sistemática e assassinatos extrajudiciais, o regime utilizou estratégias de vigilância em massa para monitorar e controlar a população. 

Isso serviu como um catalisador para a intensificação da resistência armada contra o governo. Nesse sentido, organizações como Human Rights Watch e Anistia Internacional acompanham anualmente os crimes cometidos pelo governo sírio. 

Ao longo dos anos, al-Assad enfrentou acusações de matar e prender milhares de pessoas, além de sitiar comunidades inteiras em áreas controladas por rebeldes. Ele também foi acusado de usar armas químicas contra sua própria população, acusações que ele negou repetidamente.

Em 2023, a Organização para a Proibição de Armas Químicas concluiu que havia “motivos razoáveis” para acreditar que o governo sírio utilizou armas químicas em ataques ocorridos em Douma, perto de Damasco, em 7 de abril de 2018. 

Em março de 2020, um cessar-fogo foi declarado após um acordo entre Rússia e Turquia, que historicamente apoiava grupos de oposição na Síria. No entanto, o país continuou a sofrer com bombardeios frequentes e combates, enquanto al-Assad ignorava processos políticos liderados pela ONU para uma transição democrática.

Em outubro de 2023, o ataque do Hamas a Israel alterou profundamente o cenário geopolítico no Oriente Médio. Os rebeldes sírios aproveitaram essa conjuntura para avançar, explorando a fragilidade dos principais aliados de Bashar al-Assad: Irã, Rússia e Hezbollah.

O Irã, envolvido em conflitos diretos com Israel, viu sua influência regional ser significativamente reduzida. O Hezbollah, por sua vez, sofreu grandes perdas, incluindo a morte de importantes líderes durante os confrontos com Israel, enfraquecendo sua capacidade de apoiar Assad. Enquanto isso, a Rússia, comprometida com a invasão da Ucrânia, enfrentava escassez de tropas, munições e outros recursos, limitando sua capacidade de intervenção na Síria.

Essa combinação de fatores deixou o regime de al-Assad vulnerável, criando condições para que a coalizão rebelde avançasse rapidamente em direção a Damasco.

As forças do governo sírio, sem o apoio de tropas do Hezbollah e do Irã, e com suporte limitado dos ataques aéreos russos, desmoronaram rapidamente. Mesmo divisões de elite, como a Quarta Divisão Blindada e a Guarda Republicana, posicionadas em Damasco para prevenir golpes, se dissolveram.

Forças internacionais a favor e contra Bashar al-Assad

Entenda os argumentos favoráveis e contrários ao regime de Assad.

Quem era a favor

O regime de Assad sobreviveu, em grande parte, graças a seus aliados estratégicos. O Irã forneceu recursos financeiros, armas e treinamento para as forças do governo, enquanto a Rússia  fornecia suporte militar direto, incluindo ataques aéreos que permitiram ao regime retomar áreas-chave.

A Rússia também usou seu poder diplomático no Conselho de Segurança da ONU para bloquear sanções contra Assad. Além disso, relatos da Reuters indicam que empresas russas exploraram recursos naturais na Síria, como petróleo e gás, em troca de apoio ao regime. 

O Hezbollah, aliado estratégico de Bashar al-Assad e apoiado pelo Irã, foi o pilar de sustentação do regime durante a guerra civil. Seus combatentes participaram de importantes conflitos armados, enquanto a organização fornecia suporte logístico e militar. 

Contudo, o grupo sofreu grandes perdas, incluindo a morte de líderes-chave durante conflitos com Israel, enfraquecendo sua capacidade de apoiar Assad nos momentos finais do regime. 

A aliança entre o Hezbollah, Irã e Rússia formou o pilar de sustentação do regime, mas as dinâmicas regionais fragilizaram esse bloco. O Irã, desgastado por conflitos com Israel, e a Rússia, comprometida com a invasão da Ucrânia, reduziram sua influência direta. 

O enfraquecimento do Hezbollah e a retirada gradual de seu apoio militar contribuíram significativamente para a queda de Assad e a rápida ofensiva rebelde.

Quem era contra

Durante a guerra civil síria, a Turquia apoiou facções rebeldes — a maioria agora sob a bandeira do Exército Nacional Sírio (SNA) — fornecendo armas, suporte militar e político.

O principal interesse da Turquia tem sido conter a milícia curda YPG, que acusa de ser uma extensão do grupo rebelde curdo PKK, banido no país. Além disso, a Turquia deseja que os cerca de três milhões de refugiados sírios vivendo em seu território retornem para casa.

A YPG é a maior milícia na aliança Forças Democráticas da Síria (SDF), liderada pelos curdos e apoiada pelos EUA, que controla grande parte do nordeste da Síria.

As tropas turcas, com rebeldes aliados, tomaram territórios da YPG e da SDF ao longo da fronteira norte da Síria. Politicamente, a Turquia também teve papel relevante, mediando, em 2020, um cessar-fogo com a Rússia para interromper uma ofensiva do governo sírio em Idlib, reduto dos rebeldes no noroeste do país.

Idlib, dominada pelo grupo militante Hayat Tahrir al-Sham (HTS), foi o ponto de partida para a ofensiva que culminou na queda de Assad. Muitos acreditam que a ofensiva não teria ocorrido sem o aval da Turquia, que nega ter apoiado o HTS.

Com a queda de Assad, os Estados Unidos intensificaram ataques contra acampamentos do Estado Islâmico para impedir que explorassem a instabilidade. No entanto, o presidente eleito, Donald Trump, já afirmou que os EUA deveriam se manter fora do conflito sírio. Atualmente, os EUA mantêm cerca de 900 tropas no país.

O colapso do regime de Bashar al-Assad

O colapso do regime de Assad em 2024 foi resultado de uma combinação de fatores internos e externos. Rebeldes sírios, após anos de luta fragmentada, conseguiram unificar esforços e avançar sobre territórios estratégicos. A cidade de Homs, um dos bastiões do regime, foi capturada em meados de 2024, sinalizando a fragilidade do governo. 

Com a perda de Damasco em dezembro, Assad perdeu o controle efetivo do país. Aliado a isso, o esgotamento econômico e a retirada de apoio logístico do Irã contribuíram para a derrocada final.

Quem são os rebeldes?

São liderados pelo grupo Hayat Tahrir al-Sham (HTS), cujo nome significa Organização para a Libertação do Levante. Anteriormente ligado à Al-Qaeda, a coalizão rebelde passou anos organizando e treinando para a ofensiva. Embora classificado como organização terrorista por vários países, o HTS estabeleceu uma administração autoritária em Idlib, seguindo princípios islâmicos, mas respeitando grupos minoritários, e analistas sugerem que a coalizão recebeu apoio encoberto da Turquia.

O líder do grupo, Abu Mohammad al-Jolani, afirmou que seu principal objetivo é “libertar a Síria deste regime opressor”. Ele tem tentado ganhar legitimidade oferecendo serviços aos residentes de Idlib, seu principal reduto. Os rebeldes agora enfrentam a complexa tarefa de estender seu controle sobre um país marcado por profundas divisões étnicas, sectárias e religiosas.

Por outro lado, organizações internacionais apontam violações de direitos humanos por parte de facções como o HTS. Relatos indicam execuções e repressão a grupos dissidentes em áreas sob seu controle.

Em 27 de novembro, a coalizão lançou sua ofensiva relâmpago, começando pela maior cidade da Síria, Aleppo. Nos dias seguintes, capturou Hama e Homs, cidades estratégicas nunca conquistadas durante a guerra civil. As forças rebeldes do sul foram as primeiras a entrar em Damasco.

Fotografia de combates da oposição sírias comemorando a queda do governo em Damasco.
Combatentes da oposição síria comemorando a queda do governo em Damasco. Imagem: The New York Times.

Após a queda de Damasco, surgiram relatos contraditórios sobre o paradeiro de Assad. Alguns analistas sugerem que ele buscou refúgio no Irã ou na Rússia, enquanto outros acreditam que ele permanece escondido em regiões montanhosas da Síria. 

Impactos regionais

A queda de Assad alterou significativamente a dinâmica de poder no Oriente Médio. Seu governo era um pilar do “eixo da resistência”, composto por aliados como o Irã e o Hezbollah. Sem a Síria como base de apoio, esse bloco perdeu força, o que reconfigura equilíbrios regionais. 

Israel, por exemplo, pode se sentir mais seguro quanto às ameaças do Hezbollah, enquanto a Turquia, que já atua na região, pode buscar expandir sua influência sobre áreas antes controladas pelo regime de Assad. Essa nova configuração também desafia os esforços do Irã para projetar poder na região, enfraquecendo sua posição estratégica.

A queda de Assad gerou reações mistas na comunidade internacional. Governos ocidentais e organizações de direitos humanos viram o colapso como um passo em direção à justiça e à paz. Por outro lado, existem riscos de instabilidade prolongada e vácuos de poder, que podem ser explorados por grupos extremistas.

Os rebeldes anunciaram que um novo governo começará a trabalhar imediatamente após ser formado. Relatos locais indicam que Mohammed al-Bashir, ex-líder de uma administração rebelde no noroeste da Síria, pode liderar o governo de transição.

O governo de transição enfrentará o desafio de unificar uma Síria profundamente fragmentada e reconstruir instituições em meio a acusações de abusos por parte de grupos rebeldes. A questão da legitimidade interna e do reconhecimento internacional será fundamental para evitar um novo ciclo de conflitos.

Deu para entender melhor a sequência de eventos que levou ao poder e depois derrubou Bashar al-Assad na Síria? Se ficou com dúvidas, deixa para gente nos comentários!

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Conteúdo escrito por:
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Gonçalves, Júlia. Trajetória e queda de Bashar al-Assad: o governante da Síria por 24 anos. Politize!, 12 de dezembro, 2024
Disponível em: https://www.politize.com.br/bashar-al-assad/.
Acesso em: 20 de dez, 2024.

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