Considerado por diversos autores como o maior conflito armado da história da humanidade, a Segunda Guerra Mundial marcou o século XX. As suas perdas irreparáveis são motivos de lembrança para milhares de pessoas que ainda mantêm viva a memória da guerra.
Porém, quando tratamos do assunto “Guerra Mundial”, é comum apenas lembrar de onde ela estava mais presente, isto é, nos solos, nos mares e nos ares europeus. Por vezes, esquecemos que, como um conflito mundial, a guerra esteve de forma direta ou indireta em todos os lugares do mundo.
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E neste texto, a Politize! traz uma das histórias mais interessantes do período. A participação de um país que flertava com ambos os lados do conflito, mas que tomou a sua decisão quase no final da guerra.
E você, sabia que o Brasil esteve na Segunda Guerra Mundial?
Antecedentes no Brasil
A Segunda Guerra aconteceu entre os anos de 1939 e 1945, tendo como seu maior palco de operações a Europa. Entretanto, o foco do nosso texto é discutir como foi a entrada do Brasil no conflito e, mais adiante, comentar suas histórias e seus resultados para o povo brasileiro.
A guerra foi travada entre dois blocos: o Eixo, que contava com Alemanha, Itália e Japão; os Aliados, cujas principais forças eram França, Reino Unido e União Soviética, aos quais os EUA se uniria em 1941.
Na época, o Brasil era governado por Getúlio Vargas em pleno período do Estado Novo. E com o início do conflito em setembro de 1939, o país se caracterizou como um país neutro, sem adotar qualquer postura sobre quem apoiar ou a que lado se juntar, já que se relacionava comercialmente de forma saudável com ambos os lados, tendo contratos tanto com a Alemanha quanto com os EUA.
Com os alemães, havia, por exemplo, tratados comerciais de algodão, couro e tabaco. Já com os norte-americanos, existia um tratado comercial envolvendo café, manganês e alguns frutos.
Esses contatos de importação e exportação aproximavam o Brasil de outros países do mundo, o que facilitava a conversa e possíveis outros interesses dos países que estavam participando ativamente da guerra.
A importância do território brasileiro
O território brasileiro neste contexto da Segunda Grande Guerra ganha uma importância fundamental, não apenas por questões de matérias-primas, mas também pela sua localização geográfica.
O litoral nordestino, dentre todo o continente americano, tem maior proximidade do continente africano. De Fernando de Noronha até o Senegal, por exemplo, são apenas oito horas de avião.
Seja pelo ar, ou pelo oceano, as viagens até o norte da África, que permite uma maior aproximação do sul da Europa – o continente central do conflito – a partir do litoral nordestino, se tornaram atraentes para ambos os lados.
Além disso, a mesma rota poderia ser uma alternativa de fuga para a América do Sul, caso algo desse errado, ou até mesmo se a guerra se expandisse para o Atlântico.
Em contrapartida, o Brasil de Getúlio Vargas, com seus planos desenvolvimentistas, tinha a intenção de construir uma usina siderúrgica e de reforçar o exército com novos armamentos para a defesa nacional. E, visto o interesse estrangeiro pelo território brasileiro, Vargas procurou usar isso ao seu favor.
Durante os anos seguintes do conflito, o governo brasileiro começou a duvidar de que o próprio governo brasileiro deveria tomar um posicionamento uma hora ou outra, visto a expansão do conflito e o contexto em que o mundo estava se adaptando.
Vargas e Roosevelt, Brasil e EUA
Em dezembro de 1941, a história presenciou um dos ataques surpresa mais caóticos dentro da Segunda Guerra: o ataque à Pearl Harbor. Foram registradas 2330 mortes.
Este ataque de tropas aéreas japonesas contra uma base da marinha americana foi decisivo para que o conflito tomasse novos rumos. Os Estados Unidos, na mesma semana do ataque, declarou guerra contra o Eixo e, pouco tempo depois, já estava com um corpo do exército em batalha no solo Europeu.
O ataque à ilha no Havaí também foi decisivo para o governo brasileiro. Após a manhã do torpedeamento japonês, o governo de Vargas – até então neutro – se solidarizou com as vítimas e enviou uma nota de condolências para o governo do então presidente estadunidense Franklin Roosevelt.
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Essa nota presidencial fez com que os países dialogassem sobre o interesse brasileiro na construção de uma siderúrgica nacional e o interesse americano pelo litoral nordestino, devido a sua proximidade com o continente africano.
O governo Vargas anunciou a parceria com os EUA para a construção da siderúrgica e o recebimento de novos artefatos para a defesa nacional. Em troca, os EUA poderiam usar uma base aérea localizada na cidade de Parnamirim, no Rio Grande do Norte, que ficou conhecida como “O Trampolim da Vitória”.
Essa aproximação não deixou os alemães nada contentes, e por ordens vindas diretas de Adolf Hitler, alguns submarinos alemães que estavam rondando pelo Atlântico atacaram alguns navios na costa do litoral brasileiro.
Os ataques alcançaram cerca de 31 embarcações brasileiras, entre navios mercadores, de carga, petroleiro e navios de passeio, somando cerca de 1055 vidas brasileiras perdidas.
Esse episódio, enfim, fez com que o presidente brasileiro tomasse a sua decisão sobre os assuntos pendentes e sobre a guerra que já estava em caráter mundial.
Como o Brasil foi parar na Segunda Guerra
Os ataques aos navios brasileiros foi o ponto decisivo para que o governo brasileiro pudesse, de fato, entrar na guerra. A revolta popular sobre os ataques foi grande, já que o Brasil estava se considerando neutro sobre o conflito e não estava com intenções de participar da guerra até então. Foi então que o governo começou a querer resolver este problema.
Em agosto daquele ano, Vargas declarou estado de beligerância contra a Itália e contra a Alemanha e em 31 de agosto de 1942 o Brasil declara – oficialmente – guerra contra os países do Eixo.
Pouco tempo depois, as autoridades brasileiras começaram a planejar a ida para a Europa para “vingar os brasileiros mortos”.
Força Expedicionária Brasileira – FEB
Mesmo com a declaração de guerra formal, os brasileiros não estavam imediatamente prontos para o combate e começaram a aparecer alguns problemas. O Exército brasileiro não tinha equipamentos nem homens suficientes para enviar à guerra.
Portanto, foi necessário um preparo para que os brasileiros pudessem combater na guerra. Após diversas ideias e conversas, incluindo a participação do Brasil na conferência de Casablanca e a visita de Roosevelt para um encontro com Vargas no Rio Grande do Norte, ficou acertado como seria a participação brasileira na guerra.
Em janeiro de 1943, o Brasil tinha a confirmação de que estaria presencialmente na guerra para conquistar o objetivo de vingar as perdas nos navios brasileiros e se juntar aos Aliados na frente da guerra.
Para esta missão, foi formado um grupo chamado de “corpo expedicionário”, um grupo do exército brasileiro apenas focado para esta participação. Com os novos equipamentos fornecidos pelo governo norte-americano, os treinamentos dos “pracinhas” se iniciou.
As condições na Europa eram muito diferentes do que eles estavam acostumados no Brasil. O clima, as montanhas e até mesmo o comportamento dos equipamentos foram diferentes. Além de todo o esforço antes da guerra, eles precisaram se adaptar a novas realidades rapidamente chegando lá.
O Brasil na Guerra – Itália
A demora do Brasil para ir à guerra deixou alguns críticos à vontade para adotar uma frase que seria símbolo da expedição brasileira na Europa. Diziam eles: “seria mais fácil uma cobra fumar do que a FEB embarcar”. E, de fato, após um longo período de preparação, a cobra fumou.
A FEB reuniu cerca de um pouco mais de 25 mil homens, divididos em cinco grandes batalhões de cinco mil homens cada, que contaram com a ajuda dos navios de transporte norte-americano para irem até seu destino. Foi apenas em julho de 1944 que o primeiro escalão brasileiro partiu para a Itália junto do 4º Corpo do V Exército americano.
O contingente brasileiro esteve presente no território italiano, auxiliando os Aliados nas tomadas das cidades do sul para marchar em direção ao norte da Itália. Somente quando chegaram lá, os soldados souberam o que tinha acontecido durante os anos de guerra.
Muita destruição e movimentação de várias pessoas de diversas nacionalidades nas cidades por onde os Aliados já tiveram a conquista. O frio e a escassez de mantimentos foram alguns dos maiores problemas que os brasileiros enfrentaram, já que o tratamento com as tropas estadunidenses sempre tinha sido exemplar.
Em setembro de 1944 os brasileiros ajudaram na tomada de Massarosa, Camaiore e Monte Prano. E logo no início de 1945, os soldados tomaram Montese, Castelnovo e Monte Castelo.
Em maio de 1945, as tropas alemãs se renderam em toda a Itália e a guerra terminou para os brasileiros. Ao todo, foram pouco mais de 400 vidas brasileiras perdidas durante as batalhas no território italiano. A FEB permaneceu na Itália até meados de junho, e logo após retornou ao Brasil.
Retorno e consequências
Num todo, a participação do efetivo brasileiro foi satisfatória, se equiparando às melhores unidades dos Aliados envolvidas nas batalhas da Itália.
O início foi repleto de dificuldades, mas elas foram superadas rapidamente pelos soldados e seus comandantes. O desempenho foi melhorando a cada embate, ou seja, os brasileiros aprenderam na prática.
A fama e a notoriedade dos combatentes nunca tiveram uma grande repercussão no cenário nacional. Apenas as patentes mais altas que estiveram presentes na Itália se coroaram em cargos importantes na política brasileira na década de 1960, chegando até a presidência do país durante a ditadura militar.
Aqueles soldados que lutaram e ajudaram a recuperar o território italiano nunca tiveram a recompensa e caíram no esquecimento. O recrutamento da FEB foi, em sua maioria, formado por homens de classes sociais inferiores, mais empobrecidas e de escolaridade inferior.
A reintegração dos combatentes foi adequada, na sua maioria, com o soldado retornando para a sua família e para o seu trabalho. Mas uma boa parcela encontrou diversas dificuldades por conta das más lembranças da guerra. Alguns deles sofreram com alcoolismo e praticaram violência doméstica, segundo relatos.
Por fim, parafraseando o profº dr. Francisco César Ferraz, é possível chegar em um consenso de que “é mais correto dizer que não foram os brasileiros que foram à guerra, mas sim a guerra que chegou até os brasileiros”.
Curiosidades
- Durante a batalha de Monte Castelo, foi registrado a temperatura de -20ºC. Foi um dos piores invernos na década de 1940 na Itália;
- No Rio de Janeiro, existe o Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial, que conta com os restos mortais dos brasileiros e com um museu com alguns objetos utilizados por eles;
- Algumas cidades italianas, que os brasileiros passaram, homenageiam os combatentes nomeando praças e ruas como “Brasil”;
- A banda sueca de Heavy Metal Sabaton homenageia a FEB na música “Smoking Snakes”. No refrão, eles utilizam um trecho em português: “cobras fumantes eterna é a sua vitória”;
- No filme “Estrada 47”, escrito e dirigido por Vicente Ferraz, conta um pequeno trecho de um grupo de brasileiros durante uma passagem por um campo minado.
E você, aprendeu algo novo sobre a participação brasileira da Segunda Guerra Mundial? Nos conte nos comentários! E para saber mais sobre as histórias da política brasileira, continue lendo os textos da Politize!
Referências:
- BARONE, João. 1942: O Brasil e sua guerra quase desconhecida. – 2ª ed – Rio de Janeiro: HarperCollins, 2018.
- FERRAZ, Francisco César Alves. Os Brasileiros e a Segunda Guerra Mundial. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2005.
- GILBERT, Martin. A Segunda Guerra Mundial: os 2.174 dias que mudaram o mundo; tradução FARIA, Ana Luísa; PEREIRA, Miguel Serras. – 1ª ed – São Paulo: LeYa, 2019.
- NETO, Lira. Getúlio: Do governo provisório à ditadura do Estado Novo (1930-1945). – 1ª ed – São Paulo: Companhia das Letras, 2013.
- Toda Matéria – O Brasil na Segunda Guerra Mundial.