Candidaturas avulsas: por que são proibidas no Brasil? 

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Candidaturas avulsas

Imagine que você queira concorrer a um cargo eletivo, mas não tenha simpatia por nenhum dos 33 partidos políticos registrados no TSE. O jeito é concorrer à parte, sem se filiar a partido nenhum, certo? O problema é que você não pode fazer isso. As candidaturas avulsas, independentes, são proibidas no Brasil. Na prática, um indivíduo não pode se candidatar a qualquer cargo eletivo caso não esteja filiado a um partido político. 

Mas por que, afinal, essa proibição existe? Neste post, o Politize! te explica qual é a situação das candidaturas avulsas no Brasil e no Mundo, e quais os principais argumentos do debate sobre a liberalização das mesmas. 

As candidaturas avulsas no Brasil

A filiação a um partido político é um dos requisitos obrigatórios que todos os candidatos a qualquer cargo eletivo devem cumprir (veja o artigo 14 da Constituição). Essa regra existe desde 1945, quando foi promulgada a Lei Agamenon, uma reforma do código eleitoral. Desde então, a proibição permanece.

E tiveram tentativas de mudança?

A ideia de liberar candidaturas avulsas surge recorrentemente no Congresso, mas não prospera. Em 2011, o senador Paulo Paim (PT-RS) apresentou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que recebeu parecer contrário do relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Já em 2015, no contexto da reforma eleitoral, o senador Reguffe (PDT-DF) apresentou outra PEC a respeito do mesmo tema. Em ambos os casos, a proposta não foi aprovada.

Em 2017 surgiu uma nova proposta, a PEC 350/2017, de autoria do deputado João Derly (REDE-RS). O objetivo era permitir as candidaturas avulsas, desde que houvesse um apoio mínimo de eleitores na circunscrição (a área em que um candidato concorre). A proposta também foi rejeitada pelo Congresso Nacional.

Em 2017, também, o advogado Rodrigo Mezzomo recorreu de decisões da Justiça Eleitoral que negaram seu registro como candidato avulso à prefeitura do Rio de Janeiro no ano de 2016. Mezzomo alega que a proibição viola o Pacto de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário. Desde então, o tema vem sendo discutido no Supremo Tribunal Federal e em Tribunais Internacionais e, até hoje, não houve efetiva solução ou debate profundo sobre o tema.

O que diz o Pacto de São José da Costa Rica?

O Pacto de São José – oficialmente a Convenção Americana de Direitos Humanos – foi assinado em 22 de novembro de 1969, e ratificado pelo Brasil em setembro de 1992. Dessa forma, de acordo com o artigo 23 do pacto, “todo cidadão deve ter o direito de votar e ser eleito em eleições periódicas autênticas”. Como no Brasil, por conta da  Constituição, tratados internacionais de direitos humanos assinados e ratificados pelo país tem o mesmo valor jurídico que emendas constitucionais, esse foi o argumento de Rodrigo Mezzomo.

Então, candidaturas avulsas devem ser liberadas? Argumentos contra e a favor

Quais seriam os principais argumentos de quem apoia e de quem rejeita as candidaturas sem filiação partidária? Vejamos a seguir:

A favor da candidatura avulsa

São parte de um regime democrático

Ninguém deve ser forçado a se filiar a partido algum. Trata-se, portanto, de uma liberdade democrática que estaria sendo desrespeitada no Brasil. Pelos princípios da democracia, liberar candidaturas independentes seria mais compatível, argumentam os favoráveis.

As candidaturas avulsas teriam efeitos positivos sobre o sistema partidário

Os partidos perderiam o monopólio das candidaturas e, por consequência, se veriam enfraquecidos. Isso poderia ser o início de mudanças importantes nessas entidades, hoje em grande parte fisiológicas e envolvidas em esquemas de corrupção.

A deputada Janaina Paschoal (PSL-SP), por exemplo, justifica sua posição pois, segundo ela, “os partidos políticos se reúnem com o único propósito de se perpetuar no poder e para asfixiarem qualquer indivíduo ou qualquer grupo livre que tente se estabelecer ou estabelecer uma ideia diferente”. Muitos políticos dentro das Casas Legislativas acompanham o entendimento da deputada.

Seria uma forma de promover a participação política

Como é grande a desconfiança da população em relação aos partidos, muitos aspirantes a cargos eletivos passariam a ingressar nesse mundo sem precisar se comprometer com a política partidária.

Contra candidatura avulsa

Os partidos políticos são base essencial da democracia representativa

São eles que agrupam as principais demandas sociais, mobilizam pessoas, representam interesses, organizam eleições e, por fim, apresentam candidatos nas eleições. Por tudo isso, é a partir deles que os políticos devem se apresentar à sociedade.

Provocariam um problema de governabilidade

O Executivo teria de negociar com parlamentares individualmente, já que não haveria mais líderes partidários. Isso traria novas dificuldades para a relação entre governo e Congresso, que já possui conflitos

Para o deputado federal Paulo Teixeira (PT), por exemplo, “A admissão da candidatura avulsa, na minha opinião, vai acentuar esse personalismo que é um dos vícios do sistema político”.

Seriam um problema nas eleições proporcionais de deputados e vereadores

Como aponta o Movimento Voto Consciente, na medida em que o sistema é proporcional e depende dos votos de cada partido, ele teria de ser reformulado, para que os avulsos competissem em pé de igualdade com os candidatos filiados a partidos.

As candidaturas avulsas no mundo

Dados do ACE Project revelam que a maior parte dos países permite que candidatos avulsos concorram nas eleições. Em alguns deles, isso ocorre apenas nas eleições legislativas; em outros, apenas para cargos no Executivo. Assim, 43% dos países pesquisados permitem independentes em ambas as eleições (em vermelho claro no mapa). Alguns exemplos são: Estados Unidos, Portugal, França e Chile. Por outro lado, apenas 9% dos países proíbem totalmente a candidatura avulsa (em azul claro no mapa). O Brasil está nesse grupo, junto com países como Argentina, Uruguai, Suécia e África do Sul.

Em 2017, por exemplo, Emmanuel Macron chegou ao poder na França como candidato independente a partir do movimento político Republique En Marche – somente após a eleição o movimento se tornou na prática um partido político. O ex-presidente da Alemanha, Joachim Gauck (2012-2017), é outro exemplo da prática comum no restante do mundo.

Para você visualizar melhor como os países se comportam sobre as candidaturas avulsas, o Politize! preparou esse infográfico.

Candidaturas avulsas

Que tal baixar esse infográfico em alta resolução? Clique aqui.

Nota sobre os dados da figura: o percentual total ultrapassa os 100%. Isso porque 17 países ou territórios pesquisados se encaixam em duas ou mais opções elencadas pela Rede de Informações Eleitorais; por isso, figuram duas ou mais vezes nos cálculos. São eles:

  • Austrália, Bélgica, Bermuda, Itália, Japão, Países Baixos e Espanha (eleição para Câmara baixa; eleição para Câmara alta);
  • Eslovênia, Wallis e Futuna (território francês) e Polinésia Francesa (território francês) (eleições presidenciais; eleição para Câmara baixa; eleição para Câmara alta);
  • Cazaquistão, Coreia do Sul, Malawi, Panamá, Sérvia e Nova Caledônia (território francês) (eleições presidenciais; eleições para Câmara alta);
  • Quênia (eleições presidenciais e eleições legislativas; eleições para Câmara baixa; eleições para Câmara alta);

Eu não posso concorrer, mas posso permanecer no cargo mesmo sem partido?

Ainda que a mudança de legenda seja uma possibilidade plausível dentro do sistema político brasileiro, uma situação incomum vem acontecendo há alguns meses dentro deste contexto: o Presidente da República em exercício, Jair Bolsonaro, não pertence a nenhuma legenda desde a sua desfiliação do PSL, em 2019

E a resposta é: sim! O sistema político brasileiro possui regras que proíbem a candidatura avulsa, mas uma vez investido no cargo, é possível exercê-lo sem estar filiado a algum partido propriamente dito. 

O próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ratifica este entendimento e, a título de exemplo, autorizou a desfiliação da Deputada Tabata Amaral do PDT sem que ela perdesse o cargo. Este é um exemplo claro de que o TSE não se opõe a servidores sem legenda.

E você, o que acha: o Brasil deveria permitir candidaturas avulsas? Deixe sua opinião nos comentários!

REFERÊNCIAS

STF

Folha de S. Paulo

Câmara Legislativa

Exame: o que está em jogo no debate das candidaturas avulsas

Texto publicado em 31 de agosto de 2016. Atualizado em 22 de julho de 2021
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2 comentários em “Candidaturas avulsas: por que são proibidas no Brasil? ”

  1. CORRIJAM O POST, POR FAVOR
    “Como no Brasil, por conta da Constituição, tratados internacionais de direitos humanos assinados e ratificados pelo país, DESDE QUE APROVADOS NO CONGRESSO PELO QUÓRUM DE EMENDA CONSTITUCIONAL, TÊM o mesmo valor jurídico que emendas constitucionais, esse foi o argumento de Rodrigo Mezzomo.”

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Conteúdo escrito por:
Bacharel em Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Blume, Bruno; Guidorizzi, João. Candidaturas avulsas: por que são proibidas no Brasil? . Politize!, 31 de agosto, 2016
Disponível em: https://www.politize.com.br/candidaturas-avulsas-por-que-sao-proibidas/.
Acesso em: 21 de dez, 2024.

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