Constituição Federal de 1988: história, importância e direitos

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Promulgada em 5 de outubro de 1988, a Constituição Federal, também chamada de Constituição cidadã, é o pilar do ordenamento jurídico brasileiro. É ela que rege todo o ordenamento jurídico brasileiro, sendo a sétima desde a independência do Brasil em 1822, e a sexta desde que o país se tornou uma República.

A CF/88 fez 350 anos em 2023 e é um marco aos direitos dos cidadãos brasileiros, por garantir liberdades civis e os deveres do Estado.

Acompanhe a leitura para entender o contexto histórico da Constituição Federal de 1988 e sua relevância, que permanece até hoje.

Por que a Constituição de 1988 é tão importante?

A Constituição de 1988 marcou o fim da ditadura militar e a volta da democracia no Brasil. Ela é como um grande manual de instruções para o país, garantindo direitos fundamentais, organizando o governo e definindo os deveres do Estado.

Curiosidade: é uma das mais detalhadas do mundo!

A nossa Constituição tem 245 artigos e mais de 1.600 regras. Para você ter uma ideia, a Constituição dos Estados Unidos tem só 7 artigos! Isso porque a nossa tenta resolver desde questões econômicas até sociais, garantindo que ninguém fique para trás.

Mas como o Brasil chegou nesta Constituição? Veja também o nosso infográfico sobre as constituições. Você pode baixá-lo aqui.

infográfico sobre a constituição federal
Imagem: Politize!

Auge e declínio da ditadura militar

Um ponto importante para entender a volta da democracia no Brasil é o Regime Militar. Ele pode ser, didaticamente, dividido em duas fases: a de expansão do autoritarismo (1964-1974) e a de abertura política (1974-1985).

Leia mais: Ditadura Militar no Brasil

A expansão do regime militar (1964-1974)

O AI-2 extinguiu os partidos existentes, permitindo apenas dois: ARENA, pró-governo, e MDB, oposição.

O ARENA era amplamente majoritário no Congresso e dispunha de total apoio do governo, enquanto o MDB estava permanentemente ameaçado de ter seus deputados e senadores cassados.

Nessa época já aumentava a resistência à ditadura, mesmo com a repressão e a censura à imprensa. Apesar de grande parte dos opositores do regime terem optado pelo silêncio, muitos se aliaram ao MDB como forma de resistência àquela situação de controle nacional por parte dos militares, enquanto outros optaram pela realização de movimentos de guerrilha urbana.

Apesar da repressão, surgiram resistências como protestos estudantis e a Frente Ampla, liderada por figuras como Juscelino Kubitschek e João Goulart (no exílio), extinta em 1968. 

Os protestos estudantis foram marcantes, com o acontecimento notável do assassinato a tiros do estudante Edson Luís pela polícia, durante uma manifestação no Rio de Janeiro. Embora houvesse oposição crescente, parte da sociedade via o regime como uma garantia de estabilidade e crescimento econômico.

Veja também: 5 momentos históricos para a democracia brasileira!

Veja também nosso vídeo sobre a ditadura militar!

O período do milagre econômico

Ao se falar sobre a fase de expansão do autoritarismo, é impossível não abordar o famoso milagre econômico. No governo do general Emílio Garrastazu Médici (1969-1974), foram comuns os slogans de “Ninguém segura este país”, “Este é um país que vai para frente” ou, ainda, “Brasil: ame-o ou deixe-o”.

Durante esse governo, houve um crescimento econômico sem precedentes na história brasileira, o que levou o país a ser campeão de crescimento econômico mundial na década de 1970 e fez o Produto Nacional Bruto (PNB)  ser o décimo do mundo.

As causas para esse “milagre” foram internas e, principalmente, externas. O governo concedeu, nesse período, muitos incentivos fiscais, favorecendo novos investimentos por parte de empresários brasileiros, além de investir vultosos recursos em nossa economia. 

Mas os principais responsáveis por esse crescimento foram fatores externos. No início dos anos 1970, o comércio internacional entrou em uma fase muito dinâmica, de modo que as exportações brasileiras aumentaram muito, colaborando para o crescimento. 

Além disso, as autoridades concederam vários privilégios às multinacionais, que passaram a investir em peso no Brasil. Enquanto isso, os bancos internacionais concediam empréstimos gigantescos, o que também alimentou esse rápido crescimento do país. 

O período do milagre foi explorado pelos governos militares por meio de grandes propagandas em prol do regime. A vitória da seleção brasileira na Copa do Mundo de 1970, por exemplo, acabou se tornando um verdadeiro ícone desse momento de nacionalismo e otimismo. Foi também nessa época que foram construídas obras públicas gigantes, como a Transamazônica, a ponte Rio-Niterói e a Usina Hidrelétrica de Itaipu

Vale também mencionar projetos como Mobral, voltado para a alfabetização de adultos, e o Rondon, focado na assistência médico-sanitária à população carente.

O fim do milagre

Apesar desse crescimento ter ocorrido em poucos anos, a economia brasileira entrou em declínio e o milagre econômico ruiu. O quadro de recessão, que surgiu após esse período de crescimento acelerado, continuou após o fim do Regime Militar, mantendo-se até o final do século XX e início do século XXI.

A classe média, que durante o milagre podia comprar automóveis, televisão a cores e equipamentos de som, passou a ter que fazer filas nos supermercados e açougues para comprar alimentos antes que a hiperinflação diminuísse o poder de compra.

Com a crise do petróleo de 1973, a euforia da economia mundial se reduziu, impactando as exportações brasileiras. Sem um mercado interno robusto para absorver os produtos das indústrias, o consumo começou a cair. A classe média, já saturada de bens duráveis como automóveis e televisores, reduziu suas compras, enquanto as classes mais baixas continuaram excluídas do consumo devido aos baixos salários.

Essa queda no consumo resultou em estagnação industrial, arrocho salarial, desemprego generalizado e inflação acelerada, com preços subindo rapidamente. Além disso, a dívida externa aumentou significativamente, agravando a crise econômica e as desigualdades sociais no país.

Segundo Celso Furtado (1959), o fim do milagre econômico foi resultado da falta de atenção aos aspectos sociais do país. Ele argumenta que o regime militar priorizou o crescimento acelerado e grandes projetos industriais, mas negligenciou políticas redistributivas e o combate à pobreza, resultando no aumento das desigualdades sociais e regionais e na insustentabilidade do modelo econômico a longo prazo.

Diferente de Furtado, Marco Antonio Villa defende em sua obra “Ditadura à brasileira: 1964-1985” que o fim do regime não foi resultado exclusivo de pressões populares ou falhas econômicas, mas sim de uma transição negociada e controlada pelos próprios militares. Segundo Villa, o regime teve êxito em preparar uma abertura política gradual para preservar sua influência mesmo após a redemocratização.

A abertura política

A partir do governo Ernesto Geisel (1974-1979), a ditadura começava a se desgastar, com o fim do “milagre” econômico e as pressões da sociedade civil por liberdade e direitos políticos.

Foi nesse contexto que o governo optou por promover a abertura política – nas palavras de Geisel, “distensão lenta, gradual e segura”. O que foi considerado uma estratégia para que o regime sobrevivesse. 

Saiba mais: Redemocratização do Brasil: aprenda a história política do país!

Desse modo, a repressão policial aos poucos diminuiu, os atos institucionais foram suspensos, o movimento estudantil conseguiu reorganizar, os exilados e presos políticos foram anistiados (perdoados) e novos partidos políticos puderam ser criados. 

Manifestação das Diretas Já em Brasília. Foto: Agência Brasil (arquivo).
Manifestação das Diretas Já em Brasília. Imagem: Agência Brasil (arquivo).

Em meio à liberação de novos partidos, ocorrida em 1979, os que apoiavam o governo – antiga ARENA – permaneceram unidos como PDS (Partido Democrático Social).  A oposição, composta pelo MDB, foi se dividindo em outras correntes, como a do PDT (Partido Democrático Trabalhista), PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro) e PT (Partido dos Trabalhadores).

Veja mais: História do PT: conheça o maior partido da esquerda no país

É importante dizer que a Lei da Anistia, aprovada em 1979, também se aplicou aos agentes de órgãos de segurança do Estado que cometeram crimes de abuso do poder, tortura e assassinato.

No ano seguinte, foi aprovada uma emenda constitucional (emenda constitucional nº 15, de 1980) que restabelecia as eleições diretas para governador.

Veja também nosso vídeo sobre os presidentes do Brasil!

O episódio do Riocentro é um ícone dessa época do país: no feriado do dia do trabalhador, 1º de maio, militares ligados aos órgãos de repressão tentaram explodir uma bomba em um show que contaria com a presença de grandes nomes da música popular e milhares de pessoas. Por um “acidente de percurso”, a bomba explodiu no colo do sargento, matando-o e ferindo gravemente o capitão que estava ao seu lado em um carro, e esse episódio contribuiu para o desgaste do governo. 

Em 1984, o deputado Dante de Oliveira apresentou projeto de emenda constitucional para instituir eleições diretas para presidente, o que passou a unificar a oposição. Embora o projeto não tenha sido aprovado, o movimento se tornou enorme, considerado hoje um dos maiores movimentos de massas da história do Brasil.

Mesmo com a pressão popular, as eleições para presidente de 1985 foram indiretas, com o Congresso à frente da escolha do presidente. O PMDB lançou como candidato à presidência o governador Tancredo Neves e à vice-presidência José Sarney, que se desligou do PDS e se filiou ao PMDB. Enquanto isso, o PDS escolheu como candidato Paulo Maluf, e a opinião pública apoiou abertamente a candidatura de Tancredo, que acabou sendo eleito.

A Assembleia Constituinte e Cidadã: o berço da Constituição Federal

Sessão final da Constituinte de 87-88. Foto: Agência Brasil (arquivo). Constituição Federal.
Sessão final da Constituinte de 87-88. Imagem: Agência Brasil (arquivo).

Em 1986, durante a presidência de Sarney, houve eleições para o Congresso Nacional de deputados e senadores, onde os 559 eleitos formaram a Assembleia Constituinte, que elaborou a nova Constituição entre 1987 e 1988.

A maioria dos constituintes era de partidos do chamado Centro Democrático, partidos como PMDB, PFL, PTB e PDS. O presidente da Constituinte foi o deputado Ulysses Guimarães, do PMDB. Entre os constituintes também estavam figuras importantes, como os futuros presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.

O resultado de mais de 19 meses de Assembleia foi a Constituição Federal de 1988, apelidada de cidadã. É uma das mais extensas constituições já escritas, com 245 artigos e mais de 1,6 mil dispositivos

Mesmo assim, ela é considerada incompleta, pois vários dispositivos que dependem de regulamentação ainda não entraram em vigor. Esses dispositivos, conhecidos como normas programáticas, dependem de leis complementares ou ordinárias para serem efetivamente implementados. Exemplos incluem:

  • Reforma tributária: prevista na Constituição, mas ainda não foi plenamente regulamentada;
  • Direitos sociais: alguns dispositivos, como os relacionados ao direito à moradia ou ao transporte, ainda carecem de regulamentação plena para garantir sua efetivação;
  • Segurança pública: a Constituição prevê um sistema de segurança pública que não foi completamente estruturado.

Veja mais: O que você precisa saber sobre a reforma tributária?

Críticos como Paulo Mercadante e Roberto Campos a consideram ultrapassada. Mercadante aponta que o Brasil, ao contrário de tendências globais, adotou um nacionalismo exagerado, enquanto Campos critica sua extensão e intervencionismo, que comprometem a liberdade econômica.

Roberto Campos também argumenta que a CF/88 é desconectada das tendências globais, dificultando a atração de investimentos estrangeiros em um mundo cada vez mais interdependente.

Por outro lado, a Constituição Cidadã, exaltada por intelectuais como Ulysses Guimarães e Celso Antônio Bandeira de Mello, é vista como peça chave para consolidar a democracia e os direitos sociais no Brasil.

3 conquistas da Constituição de 1988

A Constituição de 88 trouxe muitas novidades. Veja só:

1. O voto aos 16 anos

A Constituição de 88 permitiu que jovens entre 16 e 17 anos pudessem votar, o que configurou um marco mundial. Muitos países só deixam as pessoas votarem aos 18 anos, mas aqui você pode começar a participar da democracia antes!

2. Direitos trabalhistas 

Jornada de trabalho de 8 horas diárias e 44 semanais, direito ao 13º salário, proibição de trabalho noturno ou perigoso para menores de 18 anos. Sem esses direitos, muita gente poderia ser explorada. 

3. Direito ao meio ambiente

Você sabia que o Brasil é um dos poucos países que protege o meio ambiente na própria Constituição? O Artigo 225 diz que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”. Isso significa que o governo e a sociedade têm o dever de cuidar da natureza.

O Brasil abriga a Amazônia e uma biodiversidade incrível, portanto essa regra ajuda a preservar nossa riqueza natural.

7 direitos garantidos que você precisa conhecer!

A Constituição de 88 trouxe várias garantias para a população, mas, infelizmente, muitos ainda não são respeitados. Conheça 7 direitos que estão lá, mas que ainda enfrentam desafios:

  • Direito à educação gratuita: a educação pública, gratuita e universal é garantida pela Constituição, mas ainda enfrenta desafios como infraestrutura precária e falta de professores;
  • Direito ao salário mínimo: você sabia que o salário mínimo deveria cobrir alimentação, saúde, moradia, lazer e transporte? Segundo o DIEESE, o salário mínimo ideal em 2023 deveria ser de R$ 6.547, mas o valor oficial foi de apenas R$ 1.320;
  • Direito à saúde pública: a criação do SUS garantiu saúde gratuita, mas enfrenta problemas de financiamento e longas filas;
  • Direito à igualdade: o Artigo 5º declara que “todos são iguais perante a lei”. Isso significa que ninguém pode ser discriminado por sua cor, gênero, religião ou orientação sexual. Apesar desse direito, o Brasil ainda lidera rankings de violência contra mulheres, negros e pessoas LGBTQIA+;
  • Direito à moradia: mais de 6 milhões de pessoas estão sem casa no Brasil, mesmo com o direito à moradia garantido na Constituição. O direito à moradia é garantido, mas milhões de brasileiros ainda enfrentam falta de habitação;
  • Direito à liberdade religiosa: você tem o direito de praticar sua fé (ou não ter religião), sem sofrer preconceito. Mas casos de intolerância religiosa vêm crescendo, com uma média de 3 denúncias por dia no Brasil;
  • Direito ao lazer: a Constituição garante igualdade, liberdade religiosa e lazer, mas casos de discriminação e falta de espaços acessíveis ainda são comuns.

E aí, gostou de aprender um pouco mais sobre a Constituição de 1988? Se tiver ficado alguma dúvida, deixe nos comentários!

Publicado originalmente em 25/03/2022, atualizado em 24/01/2025.

Referências:

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Conteúdo escrito por:

Júlia Christina Gírio Gonçalves

Faço parte da equipe de conteúdo da Politize!.
Gonçalves, Júlia; Resende, Marilia. Constituição Federal de 1988: história, importância e direitos. Politize!, 24 de janeiro, 2025
Disponível em: https://www.politize.com.br/constituicao-federal-1988/.
Acesso em: 27 de jan, 2025.

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