Imagem de uma mão segurando uma sacola de crochê e produtos sustentáveis

Um consumo sustentável é possível?

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O consumo sustentável parte da ideia de que devemos fazer escolhas mais conscientes ao comprar. Em outras palavras, significa consumir com a noção de que os recursos do planeta são finitos e que nossas decisões impactam o meio ambiente. Ao longo deste texto, discutiremos o que é consumo sustentável, os debates em torno do termo, suas limitações e o que podemos fazer para contribuir com um futuro de menor impacto ambiental.

O que significa consumo sustentável?

Termos como “consumo sustentável”, “desenvolvimento sustentável“, “injustiça ambientalemudança climática aparecem cada vez mais em noticiários e debates públicos, especialmente à medida que eventos extremos decorrentes da crise climática se tornam mais frequentes.

No caso do consumo sustentável, trata-se de um conceito que propõe um conjunto de estratégias a serem adotadas a nível individual. Consumo sustentável, ou consumo consciente, significa considerar a origem do produto, como foi produzido, e o grau de necessidade de adquiri-lo.

Significa, em outras palavras, ter a consciência sobre os processos e os recursos (naturais ou não) utilizados para a fabricação daquilos que consumimos.

A prática de um consumo sustentável, ou consciente, envolve, portanto, a conscientização sobre toda a cadeia produtiva envolvida na fabricação de um bem específico — desde as matérias-primas utilizadas até as condições de trabalho e a durabilidade do produto.

A ideia é mensurar o impacto combinado desses elementos e ponderar as consequências sociais e ambientais de uma compra, escolhendo a opção que cause menos danos.

O consumo sustentável é, dessa forma, apresentado como parte de uma solução para enfrentar a crise climática, incentivando escolhas que minimizem impactos negativos ao meio ambiente e às pessoas.

Ilustração de duas mulheres comprando roupas sustentáveis. Texto: Um consumo sustentável é possível?
Consumo sustentável. Imagem: Freepik.

Questionamentos sobre consumo sustentável

Ao enfatizar a responsabilidade individual, a abordagem do consumo sustentável mostra-se limitada se for considerada como a única estratégia para lidar com a crise climatica.

Isso porque a transferência de responsabilidade para os consumidores ignora o fato de que, como indivíduos, somos apenas uma parte de um sistema muito mais amplo e complexo de uso desenfreado de recursos naturais.

Apesar de ser um grande problema a ser enfrentado no esforços de enfrentamento à crise climática, o consumismo não pode ser considerado apenas como consequência de escolhas pessoais.

O estilo de vida consumista reflete algo maior e mais complexo, no caso, uma organização econômica e social que incentiva o consumo excessivo.

Nesse sentido, os autores Ulrich Brand e Markus Wissen, em Modo de vida imperial (2021), destacam que a liberdade de escolha individual está intrinsecamente ligada à organização das sociedades capitalistas e suas estruturas de raça, classe e gênero.

Ou seja, nossas escolhas cotidianas – inclusive as de consumo – não estão alheias aos ideais de nossa sociedade. No capitalismo, houve uma padronização do consumo que reflete um modo de vida hegemônico a ser perseguido e desejado.

Podemos perceber isso ao observar que ter um carro, um celular do último modelo, comprar roupas e demais itens constantemente são indicadores de status em nossas sociedade.

Sendo o capitalismo um modelo de produção que se baseia no acumúlo incessante de riquezas, o consumismo atua como importante pilar na manutenção dessa lógica, beneficiando os detentores de poder econômico ou, em outras palavras, aqueles que possuem os meios de produção.

Sendo assim, a questão do consumismo não deve ser analisada apenas do ponto de vista das escolhas a nível individual, mas também exige uma mudança por partes das indústrias e corporações que produzem os bens que consumimos.

Limitações do consumo sustentável

Dessa forma, quando analisamos de um ponto de vista mais amplo, considerando a complexidade das mudanças do clima, há três principais limitações no conceito de consumo sustentável:

  1. Foco individual: a responsabilidade recai sobre os indivíduos, ignorando o papel central das grandes corporações e do 1% mais rico, que têm grande impacto na degradação ambiental.
  2. Igualdade ilusória: o consumo sustentável trata todos os consumidores como iguais, desconsiderando as grandes diferenças entre os impactos ambientais de uma pessoa muito rica e uma pessoa de baixa renda. Espera-se que ambos ajam de maneira sustentável, independentemente das desigualdades que enfrentam.
  3. Manutenção da lógica de consumo: a proposta de consumo sustentável muitas vezes é cooptada e passa a ser utilizada como forma de justificar ou atenuar a percepção sobre o consumo desenfreado. A ideia ainda opera dentro da estrutura produtiva que incentiva o consumo, muitas vezes com práticas de greenwashing que apenas reforçam a lógica capitalista.

Como argumenta Ailton Krenak (2020), a sustentabilidade, da maneira como é apresentada, serve para justificar a exploração contínua da natureza pelas grandes corporações.

Rita Von Hunty, educadora crítica, professora e youtuber, reforça essa crítica, afirmando que dentro do capitalismo não pode haver consumo ou desenvolvimento realmente sustentável, já que o sistema se baseia na acumulação infinita.

A importância de um consumo sustentável

Por outro lado, mesmo com todas as limitações, devemos evitar uma posição de derrotismo que nos leve a desistir de engajar com práticas sustentáveis no dia a dia.

Apesar de ser importante identificar as limitações de uma proposta, principalmente para que seja possível demandar mudanças estruturais em nossa sociedade, não devemos descartar o nosso papel de adotar medidas ao nosso alcance para diminuir nosso impacto no meio ambiente.

Nesse sentido, o consumo sustentável é uma importante iniciativa reconhecida até mesmo como um dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Estes objetivos fazem parte da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável estabelecida pela ONU na Assembleia Geral de 2015.

Com 17 objetivos ao todo, essa agenda global é um chamado para que países – desenvolvidos e em desenvolvimento – em conjunto com empresas, instituições e organizações da sociedade civil, adotem medidas promover o desenvolvimento econômico e a redução da desigualdade mundial de forma harmônica com a preservação de nossos ecossistemas.

O consumo sustentável aparece no Objetivo 12, que visa promover a produção e o consumo sustentáveis. Dentre as metas listadas estão:

  • Até 2030, a redução pela metade do desperdício de alimentos per carpita mundial, englobando toda a cadeia de produção, do varejo ao consumidor
  • Alcançar a gestão sustentável e o uso eficiente dos recursos naturais
  • Incentivar, principalmente as empresas de grande porte e transnacionais, a adotarem práticas sustentáveis e a incorporar informações e indicadores de sustentabilidade em seus relatórios
  • Apoiar países em desenvolvimento a fortalecer suas capacidades científicas e tecnológicas para atingirem padrões mais sustentáveis de produção e consumo
  • Garantir que pessoas em todos os lugares tenham acesso a informação e conscientização para um estilo de vida em harmonia com a natureza
  • Racionalização de subsídios aos combustíveis fósseis.

Além do consumo sustentável: ações mais amplas

Como vimos acima, o consumo sustentável é uma importante iniciativa que deve ser adotada para que seja possível alcançar um futuro mais justo e sustentável.

Porém, há limitações quando o consumo sustentável é entendido como uma prática de responsabilidade apenas dos consumidores. Essas limitações nos convidam a refletir sobre a necessidade de tomar, em conjunto, medidas mais amplas (como proposto pelo ODS 12).

Dessa forma, além de práticas pessoais, precisamos também exigir uma maior responsabilização e conscientização por parte de indústrias como as de combustíveis fósseis, tecnologia, química, têxtil; e do agronegócio, que estão entre os maiores poluidores, por exemplo.

Governos, por outro lado, devem adotar políticas públicas que avancem em monitoramento, fiscalização e transparência dos impactos ao meio ambiente, caminhando em direção à justiça ambiental.

A questão, portanto, não é apenas consumir de forma mais sustentável ou em menor quantidade, mas mudar fundamentalmente a maneira como produzimos.

Consumo sustentável e desigualdade social

No contexto de consumo sustentável, surgem questões cruciais: quem pode, de fato, escolher produtos sustentáveis? Quem tem acesso ao consumo consciente? Exigir que todos consumam de forma sustentável sem levar em conta desigualdades econômicas é uma imposição injusta.

Muitas pessoas que não podem acessar produtos “verdes” já vivem com impactos ambientais mínimos, vestindo roupas de segunda mão, consertando itens e utilizando menos recursos. Porém, essas práticas não são uma escolha, mas uma imposição pela falta de acesso econômico.

Ao focar no indivíduo, o consumo sustentável penaliza quem menos contribui para a crise climática, ao mesmo tempo em que exime aqueles que mais poluem e têm maior poder econômico.

O consumo sustentável e a crise climática: uma questão de raça, gênero e classe

A discussão sobre a crise climática e suas soluções deve estar enraizada em justiça e equidade. Raça, classe e gênero são categorias que precisam ser consideradas nesse debate, pois as causas e os efeitos da crise climática são desiguais.

Nem todos os seres humanos têm o mesmo impacto no meio ambiente. Os povos indígenas demonstram modos de vida que não ameaçam o ecossistema. As populações mais vulneráveis, por outro lado, são as mais afetadas por desastres ambientais, enquanto contribuem muito pouco para a crise climática.

Trabalhadores de baixa renda, por exemplo, enfrentam condições insalubres e têm menos acesso a bens e serviços sustentáveis, estando mais expostos aos impactos ambientais adversos.

Conclusão

Quando refletimos sobre o consumo sustentável, surgem questões importantes: quem realmente tem condições de consumir produtos verdes, slow-fashion, ou de escolher conscientemente o que compra? De quem podemos cobrar um consumo sustentável? E com qual propósito?

Ter o poder de consumir com escolhas sustentáveis é, em muitos casos, um privilégio. As pessoas que não têm acesso a produtos sustentáveis dentro da lógica de mercado são, em grande parte, aquelas que já vivem com um impacto ambiental mínimo. São as mesmas que vestem roupas de segunda mão, consertam o que possuem, não viajam de avião, e muitas vezes não têm carro — não por uma escolha, mas por falta de acesso.

Focar exclusivamente no indivíduo acaba por penalizar quem menos contribui para a crise climática, e que, paradoxalmente, é o mais vulnerável aos seus efeitos. Portanto, ao criticar o modo de vida atual, é essencial considerar quais grupos são mais afetados e como podemos promover uma reparação justa. Devemos ampliar o debate para além das ações individuais, exigindo mudanças sistêmicas e uma maior responsabilização daqueles que, de fato, têm o maior impacto no planeta.

Isso, no entanto, não significa adotar uma posição derrotista no que diz respeito às nossas ações. Elas importam e, nesse sentido, adotar um consumo sustentável é uma das ações importantes que podemos tomar para contribuir com as demais iniciativas que visam enfrentar a crise climática.

E aí, gostou de saber mais sobre a consumo sustentável e suas problemáticas? Gostaria de discutir mais sobre o tema? Se sim, deixe seu comentário!

Referências

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Conteúdo escrito por:

Ruijter, Anna. Um consumo sustentável é possível?. Politize!, 13 de março, 2025
Disponível em: https://www.politize.com.br/consumo-sustentavel/.
Acesso em: 13 de mar, 2025.

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