Se você é um estudante de escola, instituto ou universidade pública, já deve ter ouvido alguém falando pelos corredores sobre os cortes orçamentários na educação que estão acontecendo em 2019. Nesse contexto, cabe dizer que essa é uma temática atual e frequente, que está sendo pauta das discussões de quem desfruta deste direito previsto no artigo 205 da Constituição Federal: a educação.
Mas você sabe como os cortes começaram, em quais setores da educação eles ocorreram e os impactos nas instituições e na produção científica brasileira? Não? Então continue conosco, pois o Politize! vai te deixar por dentro dos principais tópicos envolvendo esse assunto.
Se você quiser analisar a história e saber mais sobre os cortes da educação no ano de 2015, o Politize! tem um post sobre esse contexto.
Quando os cortes na educação começaram?
É difícil determinar a data específica do início dos cortes orçamentários na educação, pois o Brasil está passando por um período de crise econômica e, por conta disso, tem buscado diminuir seu investimento em diversas áreas. Em 2016, durante o governo de Michel Temer, foi aprovada a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241. Esta PEC congelou o teto de investimentos do governo em diversas áreas, como educação e saúde, por 20 anos. Na prática, a PEC 241 determinou um limite máximo de investimento nessas áreas.
O termo “proposta de emenda constitucional” é complicado? Que tal dar uma olhada no nosso artigo sobre o que é uma PEC?
Nesse sentido, a PEC 241 é um marco do início de cortes mais severos à educação, já que ela modifica a Constituição Brasileira com intuito de limitar os gastos do Estado. O então Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse na época que não havia a possibilidade de prosseguir economicamente no Brasil gastando muito mais do que a sociedade poderia pagar por meio de impostos. Dessa maneira, a PEC 241 foi uma tentativa do governo de diminuir os gastos do Estado.
Em abril 2019, já no mandato do atual presidente Jair Bolsonaro, o Ministro da Educação Abraham Weintraub, declarou o contingenciamento de 1,7 bilhão de reais dos 49,6 bilhões de reais do orçamento das universidades públicas, com a possibilidade de reintegração deste valor no segundo semestre, caso a arrecadação de impostos voltasse a crescer.
Segundo o Ministério da Educação (MEC), esta medida foi tomada porque a arrecadação de impostos está menor do que o previsto pelo Governo. Apesar da declaração de Weintraub, o Secretário de Educação Superior do MEC, Arnaldo Barbosa de Lima Júnior, afirmou que os cortes devem valer também para o segundo semestre de 2019.
Como uma das consequências deste contingenciamento, em setembro, o presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (CAPES), Anderson Ribeiro Correa, anunciou o bloqueio de mais de 11,8 mil bolsas de pós-graduação.
Quais setores da educação foram mais impactados?
Os cortes ou contingenciamentos – termo utilizado pelo Ministro da Educação, Abraham Weintraub – foram aplicados nos gastos discricionários das universidades. Desta forma, atualmente (depois dos cortes), 85% do dinheiro público investido em educação está sendo utilizado para gastos obrigatórios, como pagamento de salários de professores.
No entanto, uma instituição pública de ensino também precisa de financiamento em outras áreas para que possa funcionar normalmente. Entre essas outras áreas, estão, por exemplo, as ações afirmativas, que dão a oportunidade para que cidadãos em situação de vulnerabilidade econômica entrem no ensino superior, e o financiamento para produção científica. É aí que as chamadas “despesas discricionárias” entram.
O que são despesas discricionárias?
Essas despesas discricionárias incluem as contas de água, energia e limpeza da instituição que são necessárias para o funcionamento e manutenção do prédio público. Além disso, as universidades oferecem aos estudantes em situação de vulnerabilidade econômica, acolhidos por meio de cotas sociais, as chamadas “bolsas de auxílio permanência” que também entram nessa categoria de despesas.
Outros exemplos de despesas discricionárias são os restaurantes universitários, que oferecem alimentação aos estudantes por um valor mais baixo ou isento – em casos de comprovação de renda familiar bruta abaixo de 1,5 salário mínimo. O restaurante universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), por exemplo, atende cerca de 12 mil estudantes por dia, segundo dado divulgado pela Sindicato dos Professores das Universidade Federais de SC.
As bolsas de pesquisa e extensão também são despesas discricionárias. A Constituição Brasileira, em seu artigo 207, prevê a indissociabilidade da pesquisa, extensão e ensino em instituições públicas de ensino superior. Na prática, isso significa que esses três pilares devem ser trabalhados de maneira equivalente nas instituições.
Embora sejam despesas discricionárias, isso não significa que trate-se de despesas dispensáveis. Na prática, o orçamento dedicado a manutenção da estrutura das Universidades, como limpeza e segurança, por exemplo, é essencial para a realização das atividades cotidianas dessas instituições. Diversas Universidades, à exemplo da UFPE, UFPR e UFRGS, declararam que não possuem condições de continuar se o corte orçamentário não for revertido.
Universidades públicas e a produção científica brasileira
Atualmente, as universidades públicas, segundo pesquisa feita pela Clarivate Analytics e publicada pela CAPES, são responsáveis pela produção de mais de 95% da pesquisa científica no Brasil, que desempenha um papel importante na geração de tecnologias e no desenvolvimento econômico do país.
Segundo o presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich, as pesquisas acadêmicas beneficiam a população brasileira e contribuem para a riqueza nacional. De acordo com ele, “novos fármacos são produzidos, alternativas energéticas são propostas, novos materiais são desenvolvidos e empresas brasileiras obtêm protagonismo internacional em diversas áreas de alto conteúdo tecnológico, como cosméticos, compressores e equipamentos elétricos”, entre outros.
O presidente da CAPES afirmou que o bloqueio foi realizado para garantir o pagamento das bolsas que estão em andamento. De acordo com Correa, o contingenciamento representa uma economia de R$ 544 milhões nos próximos quatro anos. Não foram divulgadas informações sobre uma possível data de retomada do pagamento das bolsas. Os bolsistas já cadastrados na CAPES não terão os pagamentos suspensos.
O que dizem o movimento estudantil e a oposição política?
É provável que você tenha ouvido falar nas mobilizações estudantis que vem ocorrendo desde o início do ano, correto? Em todo o país estão realizadas manifestações contra os cortes na educação, que ficaram popularmente conhecidas como “Tsunami da Educação“.
A mobilização estudantil demanda uma reversão dos cortes e devolução do orçamento da educação, além de opor-se ao programa Future-se, proposto pelo Governo Federal.
Sugestão: para entender melhor, confira também nosso post sobre o Future-se!
O movimento estudantil, bem como a oposição política, entendem os cortes orçamentários são uma decisão arbitrária do Governo, que vem realizando críticas às Universidades públicas. A oposição política argumenta que o ocorre, na realidade, é um remanejamento do dinheiro da educação para outras áreas, especialmente com o intuito de aprovar a reforma da previdência. Há também o argumento que a redução dos gastos do governo deveria ocorrer em outras áreas, como nos benefícios concedidos a bancos e empresas, não na educação, que é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal.
Corte ou contingenciamento: qual a diferença?
Em um contexto de disputa de narrativas entre a oposição – que aponta cortes na educação – e o governo – que diz que foram realizados contingenciamentos (como no vídeo que o Ministro Abraham Weintraub publicou em sua conta no twitter), cabe diferenciar esses dois conceitos importantes. A diferença entre os termos é a possibilidade de reintegração do recurso.
Dessa forma, contingenciamentos são caracterizados pela retirada temporária do recurso, com intuito de poupá-lo e utilizá-lo de maneira consciente em alguma situação de anormalidade ou crise econômica, por exemplo. De outro lado, cortes são caracterizados pela retirada definitiva do recurso. As duas medidas são utilizadas com frequência por governos em tempos de crise financeira.
E você? Qual a sua opinião sobre esse assunto? Compartilhe esse texto e deixe seu comentário!
REFERÊNCIAS
“Lei orçamentária de 2019” – Câmara; – “Produção científica no Brasil: um comparativo entre universidades públicas e privadas” – EDUCERE; – “Medidas da UFSC frente aos bloqueios orçamentários” – UFSC; – “Corte ou contingenciamento” – El País; – “Entenda a PEC 241” – El País; – “Artigo 205 da Constituição Federal” – Senado; – “Pesquisa no Brasil” – Clarivate Analytics; – UNE convoca protestos contra cortes – Poder 360; – Bloqueio de verba é ilegal – Folha de São Paulo