Em julho de 2022, o presidente Jair Bolsonaro foi acusado de ter cometido crime de lesa-pátria por atacar o processo eleitoral brasileiro e prejudicar a imagem do país junto a representantes de outras nações em evento do Itamaraty. Mas, afinal de contas, o que é um crime de lesa-pátria? Isso configura uma traição ao Estado brasileiro?
Vem com a gente pra entender um pouco mais sobre o assunto!
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Antecedentes históricos do crime de lesa pátria
O crime de lesa pátria tem em seu histórico distante de formação o delito de lesa majestade, também conhecido como “crimen laesae maiestatis“. Especialmente durante o século XVIII, condutas que pudessem constituir ameaças aos reis absolutistas eram severamente punidas, tendo em vista a necessidade de proteção do “corpo do soberno”.
De acordo com o que ensina o jurista Arno Dal Ri Júnior (2006 apud DAL RI JÚNIOR, 2005), o discurso político da época transmitia a noção de Rei como personificação do próprio Estado. Uma expressão que ilustra bem essa situação é a frase “L’État c’est moi!” (O Estado sou eu), dita por Luís XIV, rei da França. Nesse contexto, portanto, um atentando contra o monarca era um atentado contra o Estado – e vice-versa!
Uma das pessoas mais conhecidas por ter sido julgada pelo crime de lesa-majestade foi Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Participante da Inconfidência Mineira, Tiradentes foi condenado por traição à majestade juntamente com os demais inconfidentes, embora tenha sido o único submetido à pena capital.
Com o surgimento dos ideais Iluministas e suas críticas às monarquias absolutistas, o crime de lesa majestade passou a ter, aos poucos, uma nova roupagem mais voltada para a lesão à ordem política em si. À luz de um novo viés jusfilosófico, caminhou-se para o sentido de proteção e segurança do Estado, materializado, agora, no delito de “lesa-república”.
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O delito de lesa-pátria na lei brasileira atual
No Brasil, em setembro de 2021, tivemos a inclusão de alguns delitos no Código Penal por meio da lei n.º 14.197/2021. Além de revogar a Lei de Segurança Nacional, lei n.º 7.170/1983, criticada por muitos por ser um resquício do período ditatorial, a nova norma inseriu ao final do Código Penal Brasileiro os chamados “Crimes contra o Estados Democrático de Direito”.
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As previsões incluídas na lei penal englobam condutas ilegais que atentam contra a soberania nacional, contra as instituições democráticas, contra o funcionamento das instituições democráticas no processo eleitoral e contra o funcionamento dos serviços essenciais.
Alguns dos novos delitos são o de atentado à soberania (art. 359-I), abolição violenta do Estado democrático de direito (359-L), golpe de Estado (art. 359-M), interrupção do processo eleitoral (art. 359-N) e violência política (art. 359-P).
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Essas condutas previstas como delitos buscam proteger bens jurídicos vinculados à manutenção da ordem e segurança das instituições democráticas e do Estado de Direito no Brasil. Um exemplo claro disso é o já mencionado artigo 359-M, que prevê como delito o ato de “tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído“. O crime de golpe de Estado é punido atualmente com uma pena de reclusão de 4 a 12 anos, à qual se acrescenta, ainda, uma punição pelos atos de violência praticados.
As diferenças entre o crime de lesa-pátria e o crime de traição
Atenção! O Código Penal Militar traz um delito que, em um primeiro momento, pode parecer semelhante ao delito de lesa-pátria que acabamos de comentar: o crime de traição. Mas é importante deixar claro que são condutas diferentes e que envolvem sujeitos e circunstâncias diversas daquelas previstas aos crimes contra a segurança das instituições e da ordem política do país previstas no Código Penal.
O crime de traição é previsto no artigo 355 do Código Penal Militar brasileiro. Essa norma descreve a conduta de “tomar o nacional armas contra o Brasil ou Estado aliado, ou prestar serviço nas forças armadas de nação em guerra contra o Brasil“. Este crime é a única hipótese em que se admite pena de morte em nosso país atualmente, conforme prevê o art. 5º, XLVII, “a”, da Constituição Federal de 1988.
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É possível observar que são circunstâncias diferentes, sendo o crime de traição um delito vinculado aos crimes de guerra previstos no Código Penal Militar e que diz respeito ao favorecimento ao inimigo. É diferente, portanto, dos crimes contra a ordem e as instituições democráticas que comentamos antes, embora também cause danos ao nosso país.
E aí, ficou mais claro o que é considerado crime de lesa-pátria? Contra pra gente nos comentários!
Referências:
- DAL RI JÚNIOR, Arno. Entre lesa-majestade e lesa-república: a transfiguração do crime político no Iluminismo. Revista Sequência, no 51, p. 107-140, dez., 2005.
- NUCCI, Guilherme de S. Código Penal Militar Comentado. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021.
- NUCCI, Guilherme de S. Manual de Direito Penal. 18.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022.
2 comentários em “Da monarquia à república: entenda mais sobre o crime de lesa-pátria”
Diante de tudo que estamos vendo desde de 01/01/23
Com esse desgoverno, esse apoio da justiça militante e com determinações para se arvorar de uma “verdade” criada, os mais de 65% de brasileiros irão contar com qual instituição?
Aquela que deveria garantir a ordem e harmonia foi também coabitada.
Essa narrativa trocada de democracia que existe só para o lado E
É
Errado. Todos os dias temos penas capitais no Brasil. Só que o Estado finge não ver.