Trabalho infantil no brasil

ODS8

Trabalho Infantil no Brasil: como proteger as crianças e adolescentes?

Na sua infância, qual era sua principal atividade? E suas obrigações? Você trabalhava? Você pode estar achando essas perguntas um pouco estranhas, afinal, criança, a princípio, não deveria trabalhar. Mas, infelizmente, essa é a realidade de muitas delas, que são exploradas através do trabalho infantil no Brasil.

Você concorda que lugar de criança é na escola aprendendo e brincando, tendo seu tempo de desenvolvimento respeitado? Apesar disso, diversas crianças são exploradas e privadas de sua infância. Isso tem várias razões e as consequências são devastadoras. 

Algumas atitudes já estão sendo tomadas para erradicar a exploração de crianças. Na Agenda 2030, o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) número 8 estabelece meta específica visando acabar com todas as formas de trabalho forçado, incluindo o trabalho infantil. 

Antes de iniciar o assunto, precisamos entender o conceito de trabalho infantil e qual o contexto desse tema no cenário brasileiro. Quer saber mais? Então, segue com a gente!

O projeto Direito ao Desenvolvimento é uma realização do Instituto Mattos Filho, produzido pela Civicus em parceria com a Politize! para abordar os principais avanços e desafios legais enfrentados em relação à Agenda 2030. 

Trabalho infantil: o que é? 

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), em sua Convenção nº 138, definiu o trabalho infantil como: “aquele que constitui um perigo para a saúde, segurança ou moral das crianças”.

Existem trabalhos perigosos e insalubres para a vida e integridade das crianças e adolescentes, que são as atividades consideradas como piores formas de trabalho infantil, e que são proibidas de serem realizadas por menores de 18 anos.

O Decreto nº 6.481 de 12 de junho de 2008 estabelece a “Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil” (Lista TIP), de acordo com a Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, dentre as quais se destacam:

  • todas as formas de escravidão ou práticas análogas;
  • a exploração sexual comercial, produção de pornografia ou atuações pornográficas;
  • a utilização, recrutamento e oferta de adolescente para outras atividades ilícitas; 
  • o recrutamento forçado ou compulsório de adolescente para participação em conflitos armados. 

Essas são algumas das piores formas de trabalho infantil, que prejudicam o desenvolvimento físico, mental, moral e social das crianças e geralmente são realizados em condições precárias, com remunerações baixas ou sem remuneração, e muitas das vezes são atividades perigosas. 

Em regra, o trabalho infantil afeta o direito à educação, à saúde e ao lazer, contribuindo para perpetuação do ciclo de pobreza e colaborando para aumentar a desigualdade socioeconômica. 

No Brasil, é proibido que crianças trabalhem, exceto em casos específicos, como o trabalho artístico infantil. As demais formas de trabalho violam os direitos humanos das crianças. 

O artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) considera criança o indivíduo com até 12 anos de idade incompletos. Salvo se a criança ou o adolescente até 14 anos estiver desenvolvendo trabalho artístico, autorizado nos termos das leis aplicáveis, é proibido o trabalho nessa faixa etária. Entre os 14 e 18 anos de idade, o trabalho é permitido apenas na condição de aprendiz, nos termos das leis aplicáveis.

Imagem composta por duas crianças (meninos) trabalhando, uma abaixada e outra carregando uma picareta, em espaço aberto, com entulhos e uma barraca ao fundo, representando a situação precária em que muitas crianças vivem
O trabalho infantil é uma forma grave de violação dos direitos das crianças. Crédito: Pexels

O cenário do Trabalho Infantil no Brasil e no mundo 

A exploração laboral de crianças é uma violação que ocorre desde a época a escravidão no Brasil. A primeira lei diretamente relacionada ao tema foi implementada no Brasil em 1891 – Decreto n.º 1.313 – determinando que a idade mínima para o trabalho seria de 12 anos. Todavia, em 1919, a OIT interveio proibindo o trabalho realizado por crianças menores de 14 anos. 

Além disso, um grande marco histórico para o tema foi a criação do Primeiro Juizado de Menores, em 1923. No ano seguinte, foi aprovada a “Declaração de Genebra”, primeiro documento a tratar oficialmente dos direitos das crianças. Esse documento viria originar a criação da “Convenção dos Direitos da Criança”, em 1989. Em 1950, a UNICEF se instalou no Brasil, oferecendo programas e ações de proteção à saúde das crianças e à infância. 

Em 1973, por meio da Convenção 138 da OIT, ficou definida a idade mínima de 15 anos para admissão de jovens em atividades laborais. Já em 1988, por meio da Constituição Federal, em seu art. 7°, XXXIII, o Brasil proibiu definitivamente o trabalho realizado por menores de 14 anos. Trabalhos perigosos e noturnos passam a ser proibidos para menores de 18 anos. 

 Ao longo da história, vários fatos marcantes ocorreram e diversas ações foram promovidas para erradicar o Trabalho Infantil no Brasil e no mundo:

  • 1990 – Promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA);
  • 1992 – Criação do Conanda – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, responsável por elaborar políticas públicas e gerenciar recursos destinados ao cumprimento das normas presentes no ECA;
  • 1996 – Criação do “Programa de Erradicação do Trabalho Infantil” (PETI) no Brasil;
  • 1998 – Idade mínima para trabalho passa a ser de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos;
  • 2006 – Conanda assina a Resolução 113, que prevê o fortalecimento do “Sistema de garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente”, envolvendo a atuação governamental em parceria com a sociedade civil;
  • 2010 – Criação do “Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador”;

Causas e Consequências do Trabalho Infantil

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que quase 5% das crianças e adolescentes do país se encontravam em situação de exploração no Brasil, no ano de 2022. Isso representa um total de 1,9 milhões de crianças e adolescentes vivendo essa realidade. 

Também em 2022, cerca de 750 mil crianças e adolescentes brasileiros exerciam atividades descritas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP). A pesquisa também demonstra que com o passar do tempo, a incidência do trabalho infantil também aumenta, ficando maior entre os adolescentes de 16 e 17 anos. Há também mais meninos que meninas em situação de trabalho infantil no Brasil

Só no início de 2023, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) registrou o resgate de 702 crianças e adolescentes vítimas do trabalho infantil no Brasil, entre os meses de janeiro e abril. O Mato Grosso do Sul está no topo da lista das regiões com mais casos. Entre abril e junho do mesmo ano foram resgatadas mais 416 crianças. No total, foram feitos 2564 resgates durante 2023. 

Os números são bem expressivos. Mas você saberia dizer por qual motivo essas situações são tão recorrentes? E, ainda, quais consequências elas geram para essas crianças e para o desenvolvimento do país? Veja abaixo alguns pontos importantes. 

Principais Causas

Dentre as principais causas que tornam as crianças e adolescentes vulneráveis a essa exploração, se destacam os fatores sociais e econômicos:

  • Famílias em situação de pobreza e pais sem escolaridade e sem acesso a empregos decentes;
  • Fatores culturais (principalmente relacionado ao trabalho agrícola);
  • Processo de migração, em especial para áreas urbanas;
  • Busca pelo acesso a itens básicos e a bens de consumo: celular, roupa, alimentos, videogames etc;
  • Discriminação racial;
  • Crises econômicas e desastres naturais.

Consequências do Trabalho Infantil

Entre 2012 e 2022, ocorreram cerca de 21 mil acidentes com adolescentes de 14 a 17 anos, segundo dados do Observatório da Prevenção e da Erradicação do Trabalho Infantil. Quando crianças e adolescentes são expostos ao trabalho infantil, suas vidas e sua saúde são colocadas em risco.

Além disso, o trabalho infantil é um grande causador da evasão escolar, de modo que há o impacto direto na educação e, consequentemente, gera dificuldade para essas crianças em se posicionarem no mercado de trabalho durante a vida adulta. Isso porque muitas crianças acabam abandonando a escola por conta do trabalho.

O trabalho infantil também está ligado à vulnerabilidade social. Crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil ficam expostas à violência, ao tráfico humano e à violência sexual. O início precoce no mundo do trabalho também pode facilitar o acesso às drogas.

É importante destacar que a exploração infantil também faz com que suas vítimas, no futuro, fiquem mais vulneráveis a serem vítimas do trabalho análogo à escravidão.

Tudo começa no contexto da vulnerabilidade socioeconômica: a criança pobre é submetida ao trabalho infantil como opção de subsistência para melhorar a realidade econômica da família. 

Contudo, o trabalho infantil leva ao agravamento da situação. O baixo rendimento ou a evasão escolar gera o analfabetismo, o que acentua ainda mais a exclusão social e profissional desses jovens, reforçando o ciclo de vulnerabilidade. A UNICEF Brasil aponta que no mundo, quase 28% das crianças de 5 a 11 anos e 35% dos meninos e meninas de 12 a 14 anos em situação de trabalho infantil estão fora da escola.

De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua) sobre Trabalho de Crianças e Adolescentes, em 2019, havia 1,8 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil.

Tudo isso gera um forte impacto no desenvolvimento socioeconômico do país, uma vez que crianças fora da escola representam adultos sem preparação e qualificações para o mundo do trabalho. 

A consequência disso é o aumento da desigualdade social e o enfraquecimento da economia do país, por conta da baixa escolaridade, danos psicológicos, baixos salários e baixo poder de compra, exposição à violência e riscos de acidentes.

Medidas e desafios na erradicação do Trabalho Infantil no Brasil

Programa Jovem Aprendiz (Lei n.º 10.097/2000): proporciona oportunidade de emprego decente, remunerado e supervisionado para jovens, além de preparo e treinamento profissional para o mercado de trabalho, possibilitando que continuem estudando no ensino regular, havendo limitação de horário para que o trabalho não interfira negativamente na formação educacional.

Programa Bolsa Família: não é uma ação voltada diretamente para combater o trabalho infantil, mas fornece proteção social e auxílio financeiro para as famílias, evitando que as crianças abandonem a escola e trabalhem na infância.

Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): legislação específica que cuida dos direitos das crianças e adolescentes, protegendo-os do trabalho infantil e garantindo o direito à saúde, educação e assistência. 

Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec): ação do governo federal brasileiro que oferece cursos técnicos voltados para a educação profissional e tecnológica (EPT).

Apesar dos projetos e leis já existentes que tratam sobre o Trabalho Infantil no Brasil, ainda há muito o que avançar. Os principais desafios nesse processo são o combate à pobreza e a oferta de educação de qualidade a todas as crianças e adolescentes. 

Em relação à educação, o ODS 4 estabelece metas para o desenvolvimento de estratégias que garantam acesso aos estudos de forma plena para todos, focando na qualificação de professores, construção de infraestrutura adequada e no processo de alfabetização.

Ademais, a superação desses desafios passa pelo esforço coletivo entre governos, empresas privadas, organizações da sociedade civil (OSCs) e líderes engajados das comunidades, para promoção de ações de sensibilização e educação da sociedade em relação ao tema. Também é preciso cobrar os órgãos responsáveis pela fiscalização, para que estejam sempre atentos aos sinais de exploração infantil.

Conclusão 

A erradicação do trabalho infantil no Brasil e no mundo é uma meta essencial para garantir o bem-estar e o desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes. Proteger a infância, garantindo às crianças um futuro digno e livre de exploração é uma missão de todos. 

O ODS 8 é uma ferramenta excelente para o cuidado com nossas crianças, e a educação é uma grande aliada. Até 2017, por exemplo, foram empregados legalmente 3.051.942 adolescentes no Brasil por meio do Programa Jovem Aprendiz. Esses jovens receberam remuneração adequada, adquirindo experiência e habilidades profissionais, enquanto continuavam seus estudos.

 Os projetos e leis são essenciais para o cumprimento das metas do ODS 8, mas você também pode fazer parte disso. Sabe como? Se presenciar alguma situação de exploração e trabalho infantil, denuncie! Disque 100 ou procure o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) mais próximo

Todas as crianças e adolescentes têm o direito à infância livre de exploração e violência. Vamos juntos por essa causa! Ah! E não deixe de acessar nossos vídeos e podcasts. Você também pode se inscrever no site para não perder nenhuma novidade. Até a próxima! 

Veja Também nosso infográfico sobre a realidade do trabalho infantil no Brasil:

Autores:

Carla da Silva Oliveira

Isabella Proença Soares

José Daniel Gatti Vergna

Fontes: 

  1. Instituto Mattos Filho
  2. Ano Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil 2021 (Organização Internacional do Trabalho)
  3. Conexão entre o Trabalho Escravo e o Trabalho Infantil
  4. Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) – Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania 
  5. Convenção 138 da OIT (Organização Internacional do Trabalho)
  6. Convenção sobre os Direitos da Criança – UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância)
  7. Decreto nº 6.481, de 12 de junho de 2008 – Presidência da República do Brasil
  8. Estatísticas sobre Trabalho Infantil – Criança Livre de Trabalho Infantil
  9. Estatuto da Criança e do Adolescente – Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania 
  10. Histórico do Trabalho Infantil – Criança Livre de Trabalho Infantil
  11. IPEA – ODS 4
  12. Lei nº 10.097, de 19 de dezembro de 2000 – Presidência da República do Brasil
  13. Manual de perguntas e respostas sobre Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador – Ministério do Trabalho e Emprego
  14. MTE afastou 2.564 crianças e adolescentes do trabalho infantil em 2023 – Ministério do Trabalho e Emprego
  15. PNAD Contínua – IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
  16. Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) – Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, família e combate à fome
  17. Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) – Ministério da Educação 
  18. Resolução nº 113 de 19/04/06 Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania
  19. SmartLab – Trabalho Infantil – SmartLab
  20. Trabalho Infantil nos ODS – FNPETI

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