Este texto foi atualizado em 27 de maio de 2024.
Este é o terceiro texto de uma trilha de conteúdos sobre reforma política. Confira os demais posts nesta trilha:
- Reforma política: construindo a política que queremos
- Reforma Política: 7 propostas essenciais que você deve conhecer
- Entenda tudo sobre o sistema de voto distrital!
- Voto Distrital Misto e Distritão (VOCÊ ESTÁ AQUI!)
- O voto em lista fechada
- Como funciona o Fundo Partidário?
- Quais as regras do financiam
- Reforma Política: como ficará o mandato parlamentar?
- Reeleição: deve-se proibir ou manter?
- Reforma Política: o que sobra!
Ao terminar de ler este conteúdo você terá concluído 33% desta trilha. Conteúdo atualizado em agosto de 2021.
O voto distrital possui algumas versões diferentes. Vamos tratar de duas delas aqui: o distrital misto e o distritão, também conhecido como voto único não transferível (SNTV).
Em 2017, as novidades no sistema eleitoral diziam mais respeito ao distritão: a comissão da Câmara que trata sobre assuntos de mudança eleitoral aprovou, em agosto de 2017, a mudança para o distritão no texto-base da reforma política, com 17 votos a favor e 15 contra.
A decisão implicaria na aplicação desse sistema para as eleições de 2018 e de 2020 para deputados federais, deputados estaduais e vereadores. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) seguiu para o Plenário da Câmara dos Deputados, porém, não foi aprovada dentro do prazo necessário para ser efetiva ainda nas eleições de 2018.
Já em agosto de 2021, a PEC 125/11 da Reforma Eleitoral foi votada no plenário da Câmara dos Deputados e o sistema do distritão foi rejeitado por 423 votos contrários e 35 favoráveis, removendo a sua possível implementação já para as eleições de 2022.
Mas afinal, qual a diferença entre o sistema distrital misto e o distritão? Como funcionam? Como uma imagem vale mais que mil palavras, primeiro a imagem, depois algumas poucas palavras para explicar os dois tipos de voto distrital.
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Caso prefira, nós também temos um vídeo sobre esse assunto.
Voto distrital misto
O sistema de voto distrital misto é uma mistura entre o sistema majoritário, que faz uso do voto distrital puro, e o sistema proporcional.
Em um sistema distrital misto, metade das vagas dos deputados e vereadores continuaria a ser preenchida de acordo com o sistema proporcional atual, em que os candidatos mais votados de cada partido ou coligação são eleitos – não necessariamente o candidato com mais votos no geral.
Já a outra metade passaria a ser escolhida pelo sistema distrital, de maioria simples. O estado ou o município seria “recortado” em regiões de acordo com o número de cadeiras disponíveis, formando assim os distritos.
Cada distrito teria uma cadeira, para qual elegeria um candidato. O voto distrital faz com que o voto do eleitor vá direto ao candidato, fazendo com que o candidato mais votado de fato se eleja – como funciona com candidatos para presidente, governador, prefeito, senador.
Ou seja, se houver 10 vagas para cargos eletivos a serem preenchidas numa eleição para deputado ou para vereador, 5 delas seriam preenchidas por meio da votação proporcional e as outras 5 por meio da votação distrital.
Como fica o eleitor com o voto distrital misto?
O eleitor teria dois votos, um para um candidato que estiver concorrendo dentro de seu distrito, outro para um candidato que estiver concorrendo na eleição ampla (no estado ou município). No voto distrital, o eleitor só poderia votar nos candidatos de dentro de seu distrito. No voto proporcional, em quaisquer candidatos concorrendo às vagas amplas.
Argumentos a favor do voto distrital misto
Os defensores do distrital misto argumentam que um sistema que mistura voto de maioria e voto proporcional consegue atender, ao mesmo tempo, os interesses regionais e os interesses da população na totalidade.
Argumentos contra o voto distrital misto
O voto distrital misto é criticado porque ainda mantém parte do sistema proporcional, o que já é a realidade de hoje. Além disso, essa mistura de dois sistemas, ao invés de facilitar, poderia confundir os eleitores.
Qual seria o impacto?
Uma simulação realizada pelo Centro de Liderança Pública (CLP) – e publicada pelo Portal do Estado de S. Paulo – mostra como ficariam as eleições de 2018 para deputado federal caso o voto distrital misto já tivesse sido implementado. Segundo o estudo, haveria uma renovação de cerca de 25% da Câmara. Isso significa que dos 513 deputados, 382 provavelmente manteriam sua vaga e 131 deputados não seriam eleitos.
Distritão
No distritão, cada estado ou município seria um distrito, ou seja, não haveria separação em distritos menores. Diferente do sistema proporcional, em que são eleitos os mais votados dentro de cada partido, no distritão, são contados os votos para os candidatos.
Os deputados e vereadores mais votados seriam os eleitos, sem levar em conta os votos no partido ou legenda. As sobras dos votos não seriam mais aproveitadas para distribuir cadeiras entre os partidos.
Podemos fazer comparação com uma corrida, em que tudo é muito simples: quem chegar na frente sobe ao pódio (a Câmara de Deputados ou de Vereadores); os demais ficam de fora.
Argumentos a favor do voto distritão
O distritão tem a vantagem de acabar com os puxadores de voto, trazendo o fim ao “efeito Tiririca” gerado pelo sistema de votos proporcional. O “efeito Tiririca” acontece pelo seguinte motivo: um partido de grande expressividade e relevância, que recebe muitos votos, ganhará o direito de ter um número de cadeiras proporcional aos votos que recebeu.
Isso faz com que, muitas vezes, candidatos menos votados sejam levados aos cargos, pois em seu partido houve um candidato bastante votado. Em 2010, Tiririca recebeu 1,35 milhão de votos – um número muito alto para a média, conseguindo, além da sua cadeira, vaga para mais 3,5 colegas de partido ou coligação.
Argumentos contra o voto distritão
O distritão é criticado por diversos motivos. Alguns têm a ver com as críticas recebidas pelo voto distrital original. O distritão cria distorções na votação, pois partidos bem votados podem ter poucos deputados e vereadores, e outros nem tão bem votados podem ter vários; como só os votos dos candidatos que vencem são aproveitados, uma grande quantidade de votos é desperdiçada com os candidatos que não serão eleitos.
Além disso, o distritão reduz a importância dos partidos nas eleições, pois não são mais contabilizados os votos depositados nas siglas ou legendas.
Também aumenta o personalismo das campanhas, ou seja, a figura e o carisma dos candidatos se tornam mais importantes que os partidos e suas ideologias; as campanhas viram uma disputa de personagens, e não de partidos ou propostas.
A crítica mais relevante é a de que o distritão beneficiaria os candidatos mais ricos ou com “patrocínios”, apoios e mais tradição na política – em detrimento dos novos ou independentes, dependentes de financiamento coletivo.
A disparidade seria muita. Há que se levar em conta que os partidos maiores, que têm mais dinheiro e recebem financiamento privado de milhões de reais, teriam muito mais oportunidade de alavancar seus candidatos frente a partidos menores e menos expressivos, ou mesmo os de viés mais independente.
O distritão está em 2% dos países no mundo
Há diversos sistemas eleitorais ao redor do mundo, mas o distritão não é a escolha mais popular para a votação de representantes das Câmara baixa (no caso do Brasil, a dos Deputados Federais) e alta (o Senado). Dos 200 países que tiveram seus sistemas eleitorais analisados pelo Instituto Internacional da Democracia (Idea), apenas 2% adotam o distritão como o modelo para eleger seus representantes legislativos. Os países que adotam esse modelo são: Jordânia, Afeganistão, Ilhas Pitcairn e Vanuatu.
Confira neste link: mapa com todos os países e os sistemas eleitorais que adotam para suas casas legislativas!
O modelo distrital e suas variações são utilizadas em 39% dos países, mas o distritão, tal qual o é, se limita àqueles países. O Japão já teve experiências eleitorais com o modelo do distritão, que durou de 1948 a 1993. O abandono desse sistema neste país foi justificado por ele favorecer a disputa individual entre os candidatos e por estimular a corrupção e o uso de caixa dois.
Quer entender melhor os sistemas eleitorais em debate? Acesse!
Continue na trilha da reforma política: Post 5: Voto em lista fechada
Referências:
- Câmara dos Deputados – Câmara exclui “distritão” da PEC da reforma eleitoral; acompanhe
- Estadão – Como o voto distrital misto pode mudar as eleições no País
- G1 – Comissão da Câmara aprova ‘distritão’ e fundo de R$ 3,6 bilhões para campanhas
- International IDEA – The Electoral Systems of the World
- International IDEA – Electoral System Design: The New International IDEA Handbook
- Politize! – Você sabe o que é uma PEC?
- Politize! – Reforma política: construindo a política que queremos