Em 2023, a lei que obriga o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena completou 20 anos. Entretanto, os últimos resultados, liberados pela organização não governamental Todos Pela Educação, mostram uma queda no número de projetos voltados para a educação das relações étnico-raciais.
De acordo com os dados do Todos Pela Educação, o Brasil tem apenas 50,1% das escolas com grade curricular adequada para tratar das temáticas. A taxarepresenta o pior resultado do país nos últimos 10 anos.
Neste texto, a Politize! traz um panorama sobre a educação no Brasil e a relação com questões históricas, raciais e étnicas. Para saber mais, continue a leitura.
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O que a educação das relações étnico-raciais inclui?
Quando se fala em educação das relações étnico-raciais, o que se propõe é trazer para o ambiente escolar conteúdos, pensamentos e materiais que valorizem a diversidade presente no país. Isso significa, entre outras coisas, promover as seguintes ações:
- Socialização e visibilidade das culturas indígenas e africanas;
- Valorização das identidades presentes nas escolas;
- Preparar os educadores para identificar e tratar questões relacionadas a discriminação;
- Criar materiais que celebrem a diversidade e promovam o debate étnico-racial.
Essa perspectiva mostra os pilares para a inserção e criação de currículos voltados para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, que foram estabelecidas como obrigatórias pelas leis 10.639 e 11.645, sancionadas em 2003 e 2008.
Segundo a lei, esses conteúdos devem estar presentes em todo o currículo escolar do ensino fundamental ao médio, mas em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
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Ainda segundo a norma, os conteúdos programáticos visam resgatar a participação das pessoas negras e dos povos indígenas nas áreas social, econômica e política do Brasil. Eles incluem os seguintes tópicos:
- Estudo da História da África e dos Africanos;
- A luta dos negros no Brasil;
- A cultura negra brasileira;
- O negro na formação da sociedade nacional;
- Luta e cultura dos povos indígenas;
- Atuação na formação da sociedade brasileira.
O Dia Nacional da Consciência Negra, comemorado em 20 de novembro, também passou a compor o calendário escolar.
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A lei da educação das relações étnico-raciais está sendo cumprida?
Este ano, o Todos Pela Educação divulgou dados colhidos a partir do questionário do Sistema Nacional de Avaliação Básica (Saeb), feito com diretores de escolas. Os dados correspondem ao ano de 2021 e apontam que apenas 50,1% das escolas têm projetos ou currículo que compreendam o ensino dos conteúdos previstos nas leis.
O número aponta para o decrescimento, sendo o mais baixo dos últimos 10 anos. Veja o gráfico a seguir:
Quando se fala em Secretarias Municipais de Educação os números ficam ainda mais longe do ideal. De acordo com o levantamento feito pelo Instituto Alana e Geledés Instituto da Mulher Negra, sete em cada dez secretarias não realizaram ou fizeram poucas ações para incluir o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas.
A partir do governo Temer, sentiu-se a falta de incentivo nessa área. Foi nesse período que surgiu o debate em torno do Escola Sem Partido e a supressão de temáticas que envolvem racismo e desigualdade.
Esses números mostram não adequação das escolas às leis. Além de apontar que ainda existem dificuldades para abordar esses conteúdos e para o enfrentamento do racismo na escola.
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Dificuldades para o cumprimento da lei e racismo nas escolas
Mesmo com as leis, o ensino dos conteúdos possuem empecilhos que perpassam várias áreas. Especialistas em educação apontam a necessidade de medidas que possam complementar e fortalecer as leis. Entre elas estão:
- Formação continuada para os professores: o objetivo é capacitar constantemente esses profissionais para abordar as questões raciais e étnicas;
- Material didático adequado: é fundamental que as escolas e professores sejam supridos de materiais didáticos que possuam os temas;
- Apoio pedagógico: as escolas e os professores devem receber apoio e orientação de como implementar as ações dos entes governamentais. A falta de conhecimento de como aplicar a lei foi uma das justificativas dadas para a não implementação das determinações;
- Fiscalização: outro fator apontado para melhorar a aplicação da lei é justamente a fiscalização das entidades e das ferramentas necessárias para aplicá-la.
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Importância da lei
Pensando em uma dimensão cidadã da educação, as leis são uma importante forma de garantir que as culturas indígenas e afro-brasileiras sejam ensinadas e conhecidas. Desse modo, acabam compondo uma forma de combater o racismo e promover a diversidade e o conhecimento sobre as contribuições desses povos para a formação do país.
Além disso, há um estímulo em proporcionar uma educação decolonial e mais próxima a realidade brasileira, uma vez que se afasta de uma visão eurocêntrica no ensino da história e cultura afro-brasileira e de povos indígenas.
A educação tem o papel de oportunizar debates e provocar reflexões sobre a conjuntura vigente. Portanto, facilitar o debate sobre questões étnico-raciais é analisar e colocar como foco os problemas sociais que envolvem esses públicos.
Tendo em vista o racismo estrutural no Brasil e outras violências sofridas tanto por pessoas negras quanto por indígenas, debater essas questões na escola pode contribuir para uma mudança de cenário no futuro.
E aí, conseguiu entender um pouco mais sobre a importância de conteúdos étnico-raciais na escola?
Referências:
- Agência Brasil – Mais de 70% das cidades não cumprem lei do ensino afro-brasileiro
- Brasil de Fato – Educação antirracista: 20 anos da implementação da lei 10639
- BRASIL. Ministério da Educação. Orientações e Ações para Educação das Relações Étnico-Raciais, Brasília, 2006.
- CNTE – Lei que obriga ensino de história e cultura africana completa duas décadas e sem avanços sob Temer e Bolsonaro – CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
- G1 – País tem pior índice em 10 anos de escolas públicas com projetos para combater racismo, aponta levantamento
- G1 – Sete em cada 10 secretarias municipais de educação descumprem lei que obriga ensino sobre história e cultura afro-brasileira nas escolas
- Planalto.gov – Lei 10.639
- Planalto.gov – Lei 11.645
- Rádio Senado – Lei que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira completa 20 anos
3 comentários em “A educação das relações étnico-raciais está sendo aplicada?”
Não seria interessante apresentar exemplos práticos sobre como estas ações/atividades podem ser desenvolvidas? Inclusive são feitas algumas atividades, mas sempre no lugar da folclorização e lugar comum: desfiles, penteados, maquiagens, danças, comidas, mas nenhuma ação política efetivamente.
É MUITO IMPORTANTE TRABALHARMOS O RACISMO EM SALA DE AULA
Gostei das informações gostaria de receber sempre que possível mais informações, Sou estudante do 7º período de Letras, Candomblecistas, me considero Afrodescendente e humano, muito obrigado.