Você sabe dizer como o sistema de eleições proporcionais estrutura a eleição de deputados e vereadores no Brasil e em outros lugares do mundo?
Quando se fala em sistemas eleitorais, abre-se um leque de possibilidades, já que existem centenas de modelos para eleger representantes políticos mundo afora.
O Brasil, desde antes da retomada da democracia, adota o sistema de eleições proporcionais para todos os legislativos. Esse sistema, aliás, é um dos mais utilizados nas democracias contemporâneas.
Mas quais são as origens e características do sistema de eleições proporcionais? Como ele funciona na prática? Existem variações dentro de um mesmo modelo? Quais regras interferem em seus resultados? Enfim, o que faz com que seu voto se transforme em cadeiras nos poderes legislativos do Brasil e de outros países?
Quer saber as respostas para essas perguntas? Neste conteúdo, a Politize! explica essas e outras questões sobre o funcionamento das eleições proporcionais.
Leia também: Poder Legislativo: o que é e como funciona?
Origem e definição das eleições proporcionais
A origem do sistema proporcional remonta à Europa da segunda metade do século XIX. Naquela época, as instituições representativas de diversos países europeus sofriam transformações.
A expansão do direito ao voto e a inclusão política de minorias (como operários) provocou discussões sobre qual seria o melhor modelo eleitoral para garantir a representação desses grupos e o maior respeito às escolhas dos eleitores. A Bélgica foi o primeiro país a adotar o sistema de eleições proporcionais em seus pleitos nacionais.
Mas o que é uma eleição proporcional? É o sistema que busca garantir a proporcionalidade entre os votos do eleitorado e a distribuição das cadeiras no Parlamento.
Um dos problemas identificados na Europa do século XIX era que o modelo majoritário adotado por parte dos países europeus à época apresentava distorções (tal modelo privilegia os candidatos mais votados).
Ou ele não dava conta de garantir a representação de grupos sociais minoritários, ou ele impedia a ascensão política de indivíduos com menor influência ou recursos. O modelo de eleições proporcionais, então, foi a alternativa encontrada para contornar essa situação.
Como as eleições proporcionais funcionam na prática?
Em eleições proporcionais, os partidos políticos ocupam uma posição central. São os partidos que apresentam a lista de candidatos que vão disputar as eleições.
Em seguida, os eleitores escolhem um candidato da lista ou votam diretamente no partido. É importante dizer que o cálculo por trás da transformação dos votos em cadeiras nos Parlamentos pode variar de acordo com o país.
O cálculo utilizado no Brasil é baseado em uma fórmula chamada Cota de Hare, ou simplesmente Quociente Eleitoral.
O Quociente Eleitoral é a divisão do número de votos válidos em uma dada eleição pela quantidade de cadeiras em disputa. Além disso, ele busca garantir a proporcionalidade entre votos e cadeiras.
Por exemplo, suponha que você vive em uma cidade onde, na última eleição, 100 mil eleitores votaram em algum candidato ao legislativo municipal. Suponha, também, que havia 10 cadeiras sendo disputadas.
O Quociente Eleitoral de sua cidade, portanto, é 100 mil dividido por 10, que é igual a 10 mil. A cada vez que um partido alcançar esse valor de 10 mil votos ele terá direito a uma cadeira na Câmara Municipal.
Veja também: quais os cálculos feitos para o sistema de eleições proporcionais?
De toda forma, como foi citado no início desta seção, os sistemas de eleições proporcionais podem variar. Sendo assim, é hora de falar sobre essas variações.
Como o tamanho da população pode afetar o sistema de eleições proporcionais?
Como o sistema de eleições proporcionais depende do tamanho da população, modificações no número de cadeiras no legislativo podem ocorrer com a variação da população.
O resultado do Censo de 2022, por exemplo, revelou mudanças na população dos estados. Desse modo, alguns estados devem ganhar e outros perder cadeiras na Câmara dos Deputados para as próximas eleições. Essa seria uma ação inédita, uma vez que a última modificação nesse sentido ocorreu eu em 1993, ano em houve o último redesenho das vagas. Não ocorreram redistribuição de cadeiras após os resultados dos censos de 2000 e 2010. A iniciativa de fazer o redesenho da distribuição das cadeiras cabe à própria Câmara.
De acordo com projeções do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, Rio de Janeiro, Bahia, Rio Grande do Sul, Piauí, Paraíba, Pernambuco e Alagoas perderiam cadeiras. Já os estados de Santa Catarina, Pará, Amazonas, Minas Gerais, Ceará, Goiás e Mato Grosso ganhariam assentos.
Quais são as variações do sistema de eleições proporcionais?
Existem dois tipos de sistemas proporcionais: o sistema de listas e um modelo chamado de Voto Único Transferível. No caso desse segundo modelo, o eleitor ordena seu voto em uma lista de preferência. Se seu candidato favorito não estiver entre os mais votados, o voto do eleitor é transferido para o segundo colocado na lista.
Esse é um sistema complexo e muito pouco utilizado. Exemplo de países que o usam são Irlanda e Malta.
Na maioria das vezes, o modelo utilizado entre as nações que possuem o sistema proporcional é o de listas. Esse modelo se divide em três formas: aberta, fechada e flexível. Por ser mais popular, sendo inclusive o adotado no Brasil e em boa parte da América Latina, ele será detalhado a seguir.
Leia também: O voto em lista fechada
Sistema proporcional de lista aberta
No sistema de lista aberta, é a sociedade, na figura de cada eleitor, que define quais candidatos serão eleitos. Nesse modelo, cada partido apresenta uma lista de candidatos e o eleitorado vota no nome de algum dos concorrentes (João, Pedro, Maria etc.). Dessa maneira, o eleitor ordena a lista dos candidatos favoritos de cada partido.
Os votos são computados e, de acordo com o quociente eleitoral, as cadeiras que cada partido terá direito são definidas. Esses assentos serão destinados aos candidatos mais votados.
Por exemplo, se um partido qualquer, em uma dada eleição, conquistar dois assentos no Parlamento, essas cadeiras serão ocupadas pelos dois candidatos mais votados da agremiação.
Esse sistema é empregado em países como Brasil, Polônia, Finlândia e Peru.
Sistema proporcional de lista fechada
A característica central do sistema de lista fechada é que a sociedade não vota em nomes, mas em partidos (PSDB, PT, PSL etc.).
Os primeiros nomes da lista pré-ordenada por cada agremiação terão prioridade na ocupação dos assentos que ela vier a conquistar.
Por exemplo, se um partido qualquer, em uma disputa eleitoral, conseguir três cadeiras no Parlamento, os três primeiros nomes da lista pré-ordenada pelo próprio partido terão direito a esses assentos. Aqui, não é o eleitor quem ordena a lista, e sim os partidos políticos.
Esse sistema é adotado em países como Portugal, Espanha, Uruguai e Argentina.
Veja também nosso vídeo sobre a quantidade de partidos políticos!
Sistema proporcional de lista flexível
É possível dizer que o sistema de lista flexível é uma mistura dos dois outros sistemas. Nesse caso, os partidos continuam ordenando a lista de candidatos antes das eleições, assim como ocorre no modelo de lista fechada. Entretanto, há uma maneira de os eleitores intervirem.
Se os eleitores concordarem com a lista do partido, tudo bem, eles podem votar diretamente no partido que desejarem. Porém, se os eleitores não estiverem de acordo com a lista partidária, eles podem votar no nome de algum candidato.
Nesse último caso, a depender do número de votos que um candidato conquistar para si, ele pode ser eleito, independente de sua posição na lista pré-ordenada pelo seu partido.
Por exemplo, suponha que um partido fictício, chamado Partido do Povo, apresente uma lista pré-ordenada contendo quatro candidatos na seguinte ordem: 1° Maria, 2° José, 3° Pedro e 4° Flávia.
No sistema de lista flexível, os eleitores podem votar diretamente no Partido do Povo, ou, caso não gostem da lista pré-ordenada, podem votar no nome de algum dos quatro candidatos.
Caso algum dos candidatos localizados nas últimas posições da lista ultrapasse uma determinada cota de votos, que varia de acordo com o país, ele pode ser eleito. Suponha que a candidata Flávia, quarta colocada na lista, tenha ultrapassado essa cota. Mesmo que não esteja nas primeiras posições, ela teria direito a uma cadeira no Parlamento.
Esse modelo é adotado por nações como Bélgica, Áustria, Estônia e Indonésia.
O que mais pode interferir nos resultados das eleições proporcionais?
Além das fórmulas e variações descritas nas seções anteriores, existem mais três elementos institucionais que podem alterar os resultados de uma eleição proporcional.
(1) Magnitude do distrito (M): basicamente, esse elemento se refere à quantidade de cadeiras em disputa. A magnitude e a proporcionalidade do resultado de uma eleição são aspectos positivamente relacionados.
Quanto maior a magnitude do distrito maior a proporcionalidade, o que aumenta as chances de um pequeno partido conquistar um assento no Parlamento.
(2) Cláusulas de barreira: consiste no valor mínimo de votos que um partido precisa alcançar para conquistar um lugar no Parlamento, ter acesso a postos importantes no Legislativo e aos recursos do Estado.
Alguns países estipulam que para eleger algum político os partidos e/ou candidatos devem receber ao menos um determinado percentual de votos na eleição. Um dos objetivos desse mecanismo é diminuir a representação de partidos pequenos e/ou pouco votados e facilitar a governabilidade.
(3) Coligações: são alianças entre partidos no momento da eleição visando agregar o número de votos que recebem, aumentando as chances de conquistarem cadeiras no Parlamento.
Nesses casos, dois ou mais partidos se unem na eleição e disputam as cadeiras como um partido só. Desse modo, conseguem agregar mais votos e podem alcançar o número mínimo de votos para conquistarem ao menos uma cadeira. No Brasil, esse sistema foi adotado até as eleições de 2018. De 2020 em diante, ele não foi mais permitido.
Por fim, quais as vantagens e desvantagens do modelo de eleições proporcionais?
É bom lembrar que nenhum sistema eleitoral no mundo é perfeito. Todos possuem vantagens e desvantagens. O ideal é encontrar o sistema que mais se ajuste às realidades e características sociais de cada país. Veja a seguir vantagens e desvantagens do sistema de eleições proporcionais:
3 vantagens das eleições proporcionais
- O modelo proporcional facilita a representação de minorias. Em países com grande diversidade cultural, esse modelo pode dar mais legitimidade à representação política;
- O sistema de eleições proporcionais, em sua modalidade de lista aberta, tende a valorizar mais a escolha do eleitor, em detrimento dos interesses partidários;
- Em alguns sistemas de lista fechada, como o da Argentina, é necessário que seja garantida na lista pré-ordenada pelos partidos uma alternância de gênero de 2 para 1. Ou seja, é preciso que na lista duas mulheres sejam seguidas por um homem (ou vice-versa). Isso permite uma representação de cerca de 30% de mulheres na Câmara dos Deputados.
Veja também nosso vídeo sobre representatividade feminina na política!
3 desvantagens das eleições proporcionais
- De acordo com uma das poucas leis da Ciência Política, a Lei de Duverger, modelos proporcionais tendem ao multipartidarismo. Uma das características de sistemas com muitos partidos é que a governabilidade tende a ser dificultada;
- Não havendo regras que impeçam esse efeito, como cláusulas de barreira, eleições proporcionais podem permitir que candidatos com pouquíssimos votos sejam eleitos;
- O modelo proporcional de lista fechada pode favorecer cúpulas partidárias, dando ainda mais poder às lideranças dos partidos. Em países onde agremiações políticas, muitas vezes, possuem “donos”, como o Brasil, isso pode impossibilitar a existência de sistemas mais democráticos de recrutamento e seleção de candidatos.
O que você achou das eleições proporcionais? Você acredita que o sistema proporcional é o melhor para o Brasil? Caso queira testar os seus conhecimentos sobre o sistema eleitoral brasileiro, confira esse Quiz elaborado pela Politize!
Referências:
- GUARNIERI, Fernando. (2015). Voto estratégico e coordenação eleitoral: testando a Lei de Duverger no Brasil. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 30(89): 77-92.
- Estado de Minas – Censo 2022 pressiona Câmara dos Deputados por redivisão de vagas
- NICOLAU, Jairo. (2012). Sistemas Eleitorais. 6° ed. Rio de Janeiro: Editora FGV.
- O Globo – Mapa dos sistemas eleitorais no mundo
- Politize! – Como são eleitos os prefeitos?
- TRE-SC – Saiba a diferença entre voto válido, nulo e em branco
- TSE – Saiba como calcular os quocientes eleitoral e partidário nas Eleições 2016
- VIEIRA, Fabrícia A. (2018). Sistemas Eleitorais Comparados. 1° ed. Curitiba: Intersaberes.