No século XV, foi dado o primeiro passo para a difusão de informações. A prensa móvel, a invenção do alemão Johannes Gutenberg, originou a comunicação de massa ao permitir que um mesmo conteúdo fosse reproduzido em larga escala e assim alcançasse muitas pessoas. Na sociedade contemporânea, o jornalismo é uma das principais atividades responsáveis por informar e moldar a opinião pública. No entanto, ao contrário do que pensa grande parte da população, o jornalismo não informa com isenção e neutralidade. Os meios de comunicação possuem seus critérios de abordagem de temas e utilizam certos mecanismos para elaborar suas mensagens, como o enquadramento de notícias.
A RELAÇÃO ENTRE IMPRENSA E POLÍTICA
Antes de entender o que é o enquadramento noticioso, é importante conhecer melhor o papel que o jornalismo exerce na sociedade. Em geral, a atividade jornalística é responsável por mediar assuntos de interesse popular e informar dados e acontecimentos importantes para cada grupo social, de acordo com seus aspectos culturais. Essa mediação acontece por meio de diferentes gêneros jornalísticos, como a notícia, a reportagem e o artigo de opinião.
Um dos principais campos sociais abordados na imprensa é a política. Repare, por exemplo, que frequentemente os acontecimentos da política nacional são manchetes de jornais, assuntos mais acessados nos portais de notícias e matérias de destaque em programas de rádio e TV. Todo discurso que a imprensa veicula sobre política, e sobre qualquer outro assunto, é influenciado por contextos sociais, crenças e, principalmente, interesses econômicos, já que os grandes veículos de comunicação da imprensa brasileira são empresas privadas.
O discurso midiático muitas vezes gera efeitos diretos na tomada de decisões. O processo de impeachment e a Operação Lava Jato são exemplos de ocasiões em que a imprensa interferiu no rumo de resoluções políticas com publicações de denúncias, declarações polêmicas e delações. Eleições também são momentos em que a imprensa exerce grande influência, já que o teor das informações divulgadas podem construir imagens positivas ou negativas sobre os candidatos e influenciar a escolha dos cidadãos.
O QUE É O ENQUADRAMENTO NOTICIOSO?
Na maior parte do estudo de Jornalismo, considera-se que nenhuma informação divulgada na mídia é uma verdade absoluta. Cada notícia é resultado de uma perspectiva sobre um acontecimento e o relato sobre esse mesmo episódio pode ser feito sob outros pontos de vista sem que sejam ditas mentiras.
Como foi dito anteriormente, uma das estratégias de abordagem jornalística é o enquadramento. Trata-se do processo em que os jornalistas escolhem palavras para a elaboração de uma ideia, hierarquizam informações, aprofundam ou não a discussão sobre um assunto e selecionam dados e imagens para compor uma matéria. Tudo isso molda a forma como uma realidade é construída e, consequentemente, compreendida pela população.
Na prática, acontece assim: vamos supor que um governante é acusado de estar envolvido em esquemas de corrupção e, imediatamente, posta um texto em suas redes sociais se defendendo da acusação. Um jornal noticia o acontecimento com o título “Governante é acusado de participar de esquemas de corrupção”. Paralelamente, outro jornal publica uma matéria com o título “Governante defende sua integridade e afirma que não tem envolvimento com escândalos de corrupção”. Trata-se de um exemplo simples em que os dois títulos possuem informações verídicas – a acusação e a declaração do governante – e abordam o mesmo assunto. Porém, os enquadramentos são diferentes. O corpo da notícia abaixo de cada título também vai possuir enquadramentos distintos, seguindo a perspectiva inicialmente apresentada.
As atitudes dos cidadãos em relação à notícia também podem ser moldadas de acordo com o enquadramento utilizado. Hoje em dia, os estudos sobre jornalismo não consideram mais a ideia de que as pessoas absorvem diretamente o conteúdo da mídia sem fazer qualquer tipo de leitura crítica. Porém, é praticamente consensual dentro do Jornalismo que a imprensa é responsável por promover debates sobre certos assuntos e também o esquecimento de outros, que não são frequentemente abordados nos meios de comunicação.
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MAS, AFINAL, COMO PODEMOS IDENTIFICAR O ENQUADRAMENTO NOTICIOSO?
Antes de tudo, vamos retomar uma informação importante: um dos critérios que definem o enquadramento de uma notícia é o interesse político e econômico do veículo de comunicação. Sendo assim, o primeiro passo para desvendar a angulação de uma matéria é conhecer as características dos grupos responsáveis pela mídia em questão. Sites como o do Fórum Nacional em Defesa da Democratização da Comunicação possuem conteúdos direcionados para a sociedade civil que podem apresentar informações como essa.
Outra forma de perceber o enquadramento de uma notícia é buscar fontes de informação em veículos de naturezas diferentes. Se você costuma ler notícias de grandes veículos de comunicação nacionais, é importante que você também separe um tempo para ler sobre um mesmo assunto em sites de jornais internacionais que atuam no Brasil ou em veículos independentes e produzidos por comunidades e organizações populares. Com essa prática, é possível comparar diferentes abordagens e trabalhos jornalísticos.
Por fim, uma forma muito utilizada por cientistas da comunicação é observar os termos utilizados na composição de uma notícia. Por exemplo, em casos de manifestações de rua, a mídia costuma se referir aos participantes desde ativistas, manifestantes ou baderneiros e vândalos. A escolha de palavras indica um juízo de valor sobre o acontecimento e qual a mensagem que a imprensa espera passar para a sociedade.
Na maioria das vezes, o enquadramento que uma matéria jornalística possui não é percebido pelo público. Portanto, o conhecimento sobre os processos e critérios de construção da notícia é relevante para que cidadãos possam interpretar criticamente as informações que recebem e terem mais segurança para formarem suas opiniões.
Fontes
CASTILHO, M. M.; GUIMARÃES, I. P; HENRIQUES, M. N.; SILVEIRA, A.C.M. Enquadramento Jornalístico. In: XIII CONGRESSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO SUL, 13. 2012, Chapecó. Anais… Chapecó: Universidade Comunitária da Região de Chapecó, 2012. p. 3.
LEAL, Paulo Roberto Figueira; MOREIRA, Talita Lucarelli; OLIVEIRA, Luiz Ademir de. Convergências e contrapontos: análise da cobertura da marcha da família com deus pela liberdade em 1964 e das manifestações de junho de 2013 na Folha de São Paulo. In: XIII Congresso Brasileiro de Comunicação Política e Marketing Eleitoral, promovido pela Sociedade Brasileira dos Profissionais e Pesquisadores de Comunicação e Marketing Político – POLITICOM, 13. 2015, São Paulo. Anais… São Paulo: Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, 2015. p. 4.