Acolhimento institucional de crianças e adolescentes no Brasil: o que é e como funciona?

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Acolhimento institucional de crianças e adolescentes no Brasil: o que é e como funciona?
09 mar 2022
09 / mar / 2022

Acolhimento institucional de crianças e adolescentes no Brasil: o que é e como funciona?

Durante a infância e a adolescência, não são apenas os fatores biológicos e físicos que influenciam no desenvolvimento das crianças e adolescentes, mas também as condições do ambiente em que estão inseridos.

Nesse sentido, a família pode ser considerada como essencial para esse desenvolvimento, já que é o primeiro contato social e o primeiro ambiente vivenciado por esses indivíduos, tendo como responsabilidade a proteção e cuidado deles. 

Contudo, nem sempre a família consegue garantir um ambiente adequado e seguro para as crianças e adolescentes. Assim, como o Estado também tem a responsabilidade de prover a proteção integral desse grupo, é previsto o acolhimento institucional das crianças e adolescentes que se encontram em situações de risco. E é sobre isso que vamos falar neste texto do Equidade.

O projeto Equidade é uma parceria entre o Politize!, a Civicus e o Instituto Mattos Filho, voltada a apresentar, de forma simples e didática, os Direitos Humanos e os importantes temas que eles envolvem, desde os seus principais fundamentos e conceitos aos seus impactos em nossas vidas. E então, preparado(a) para entender sobre acolhimento institucional de crianças e adolescentes no Brasil? Segue com a gente!

Se quiser, escute nosso podcast complementar ao assunto do texto:

O que é o acolhimento institucional?

O acolhimento institucional de crianças e adolescentes foi instituído no Brasil com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, como uma medida na efetivação da proteção integral da população infantil.  

Sendo assim, o acolhimento institucional de crianças e adolescentes é uma medida protetiva aplicada pelo Estado que busca abrigar e acolher esses indivíduos em casos de ameaça ou violação dos seus direitos fundamentais.

Com isso, são diversos os motivos que conduzem a criança e o adolescente ao acolhimento. Como, por exemplo, a negligência e/ou abandono dos pais ou responsáveis, a dependência química dos pais ou dos responsáveis, a situação de rua da criança ou do adolescente, conflitos familiares, a violência doméstica e/ou sexual, entre outros.

Nesse sentido, o acolhimento institucional é previsto no artigo 101, inciso VII do ECA, como uma ação para validar o seu artigo 98, que expressa o seguinte:

“As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados”.

Além disso, ressalta-se que esse tipo de medida deve ser aplicado somente quando todas as alternativas de permanência no ambiente familiar estiverem esgotadas.

Assim, o acolhimento tem caráter temporário e excepcional, fornecendo um lugar adequado para o desenvolvimento cognitivo, social e afetivo das crianças e adolescentes até que seja possível o seu retorno à família.

Dessa forma, essa política de atendimento procura estabelecer ações educativas voltadas à garantia da cidadania desses indivíduos, em um modelo de efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes com base no princípio do interesse superior da criança e na sua formação enquanto cidadão.

Imagem de um criança sozinha sentada em uma escadaria com um boneco representando o acolhimento institucional de crianças e adolescentes no Brasil

Com isso, o acolhimento de crianças e adolescentes é feito por meio de abrigos institucionais, casa-lar e casa de passagem. Vamos ver melhor sobre esses ambientes.

Abrigo institucional

Consiste em uma unidade institucional semelhante a uma residência e inserido na comunidade local. O ambiente deve ter capacidade para abrigar no máximo 20 crianças ou adolescentes e deve oferecer atendimento e recursos para o fortalecimento das relações familiares e comunitárias dos indivíduos abrigados. 

Casa-Lar

É uma unidade com estrutura de residência privada em que pelo menos uma pessoa trabalha como educador/cuidador do ambiente, com capacidade para abrigar até 10 crianças ou adolescentes.

Sendo assim, esse serviço de acolhimento institucional procura simular um ambiente familiar, estimulando o desenvolvimento de relações, hábitos e atitudes de autonomia e convívio com as pessoas da comunidade. 

Casa de passagem

Corresponde a uma unidade institucional com capacidade para atender até 50 pessoas, podendo abrigar não só crianças e adolescentes, mas também os seus familiares. As casas de passagem se caracterizam por seu curto período de acolhimento, de permanência máxima de 90 dias.

Dessa forma, esse tipo de acolhimento tem caráter imediato e emergencial, com profissionais preparados para receber indivíduos necessitados 24h por dia.

No caso das crianças e dos adolescentes, é feito o atendimento para que os encaminhamentos necessários sejam feitos. Como, por exemplo, a recondução ao ambiente familiar.

A diferença entre acolhimento institucional e acolhimento familiar

Além do acolhimento institucional, outro mecanismo também utilizado para garantir a proteção de crianças e adolescentes em situação de risco ou de violação de seus direitos é o acolhimento familiar.

O acolhimento familiar é também uma medida protetiva em que ao invés de as crianças e adolescentes serem atendidos por unidades institucionais, eles são acolhidos por uma família que não a sua.  

Esse tipo de acolhimento é regulamentado pela Lei 12.010, também conhecida como Lei Nacional de Adoção, promulgada em 2009 no país. Nesse sentido, a lei dá preferência ao acolhimento familiar em relação ao acolhimento institucional, visto que estimula a convivência familiar e o desenvolvimento das crianças e adolescentes envolvidos.

As famílias acolhedoras devem estar cadastradas no Programa Família Acolhedora, onde recebem treinamentos e capacitação para estarem aptas a acolher crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. 

Além disso, a Lei Nacional de Adoção e as Orientações Técnicas para os Serviços de Acolhimento de Crianças e Adolescentes, também publicado em 2009 pelo governo federal, determinam os princípios que devem ser seguidos em caso de acolhimento institucional ou familiar. Dentre eles, destaca-se: 

  • Preservação dos vínculos familiares e reintegração familiar;
  • Integração em família substituta, quando não há hipótese viável de integração com a família natural ou extensa;
  • Participação na vida da comunidade local;
  • Desenvolvimento de atividades educativas;
  • Preparação gradativa para o desligamento;

Importante não confundir o acolhimento familiar com a adoção, visto que essa medida é temporária e dura até o momento em que a criança ou adolescente pode ser reintegrado à sua família de origem. Vamos ver melhor as suas diferenças.

A diferença entre acolhimento familiar e adoção

Muitas vezes, há confusão sobre o entendimento em relação à adoção e ao acolhimento familiar, sendo interpretados como a mesma coisa. Contudo, apesar de ambas terem como finalidade a proteção de crianças e adolescentes, essas medidas são distintas.

Isso porque, ao contrário do acolhimento familiar, a adoção é permanente e se trata de um processo judicial que possibilita que uma pessoa ou casal se torne legalmente responsável por uma criança ou adolescente no qual não possuem ligação genética.

O processo adotivo também é regulado pelo ECA e pela Lei Nacional de Adoção, que estabelecem as regras e os requisitos para realizar o procedimento. Sendo assim, é permitida a adoção para qualquer pessoa maior de 18 anos, independente do seu estado civil.

Além disso, os postulantes à adoção devem passar por um período de preparação psicossocial e jurídica, orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude.

Destaca-se também que a adoção pode ser feita por casais ou uma só pessoa homossexual, visto que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece a união homoafetiva como núcleo familiar e as leis mencionadas não fazem restrições em relação à orientação sexual.

Então, para resumir, o acolhimento familiar é uma medida provisória em que uma família acolhe por um determinado tempo uma criança ou adolescente em situação de risco para que possa se desenvolver e ser reintegrado à sua família de origem. 

Já a adoção, tem caráter definitivo e irreversível e consiste na integração de uma criança ou adolescente em uma nova família.

A importância do acolhimento institucional

Na busca pela garantia e implementação dos direitos das crianças e dos adolescentes, os serviços de acolhimento possibilitam um plano de atendimento individual para amparar as especificidades de cada criança ou adolescente acolhido. 

Imagem de um criança sozinha andando em uma estrada vazia segurando um bicho de pelúcia, representando o acolhimento institucional de crianças e adolescentes no Brasil

Isso porque cada caso é especial e as suas causas e consequências diferem entre si. Sendo assim, esse atendimento é feito mediante profissionais especializados disponibilizados pelo Estado para acompanhar todo o processo de acolhimento. 

Por isso, a Lei Nacional de Adoção estabelece a necessidade de revisão da medida protetiva a cada 6 meses, com a finalidade de fortalecer os laços familiares e afetivos.

A lei também determina que o acolhimento institucional não deve ultrapassar o período de 2 anos, exceto quando comprovada a necessidade para atender ao interesse da criança.

No Brasil, de acordo com o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento, em 2021 havia aproximadamente 30 mil crianças e adolescentes acolhidos.

Os adolescentes com mais de 15 anos de idade formam o maior grupo, representando aproximadamente 8 mil acolhidos (26,6%). Além disso, o sistema aponta que havia cerca de 32 mil crianças e adolescentes cadastrados como pretendentes à adoção no país. 

Contudo, ressalta-se que esses dados podem não refletir a realidade, especialmente por esses serviços serem disponibilizados apenas para 2.010 municípios (que abrangem a grande maioria da população), enquanto 3.560 municípios de pequeno porte não contam com esse serviço.

Mesmo assim, são milhares de crianças e adolescentes atendidos anualmente no país. Dessa forma, como aponta a mestre em serviço social Vanessa Rombola (2011), é importante que a entidade de acolhimento seja concebida como um espaço que proporcione o desenvolvimento de crianças e adolescentes, e não como um local de exclusão. 

Conclusão

O interesse superior da criança e do adolescente e a prioridade absoluta na defesa dos seus direitos são princípios basilares para a existência dos serviços de acolhimento institucional. Nesse sentido, essa medida se mostra necessária no combate à negligência, ao abandono e ao descaso com a população infantil do país.

E não apenas isso, mas também por buscar promover as condições essenciais para que as crianças e adolescentes tenham a oportunidade de desenvolverem as suas capacidades de forma integral. 

Sendo assim, mesmo consistindo em uma medida excepcional e temporária, o acolhimento institucional contribui para a efetivação dos direitos fundamentais desses indivíduos. Um importante fator possibilitado por esse serviço, por exemplo, é a garantia do ensino e da permanência escolar de crianças e adolescentes acolhidos. 

Isso porque a violação do direito à educação nesse período da vida possui impactos negativos na formação humana desse grupo. Por isso, no próximo texto do Equidade vamos falar sobre a educação infantil, entendendo a sua importância e função na vida das crianças e dos adolescentes.

Ah! E se quiser conferir um resumo super completo sobre o tema “Direitos das Crianças e dos Adolescentes“, confere o vídeo abaixo!

Autores:

Anna Paula Jacob Gimenez
Bárbara Correia Florêncio Silva
Caroline Sayuri Ogata Graells
Eduardo de Rê
Giovanna de Cristofaro
Mariana Dragone Pires
Mariana Scofano Martins

Fontes:

1- Instituto Mattos Filho;

2- ALMEIDA, Creuza. Acolhimento familiar x adoção. Jus, artigo online, 2021. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/92873/acolhimento-familiar-x-adocao-saiba-as-diferencas>. Acesso em: 18 de novembro de 2021.

3- Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), 1990.

4- FONSECA, Patrícia. O Impacto do acolhimento institucional na vida de adolescentes. Rev. Psicopedagogia, 34 (105): 285-96. 2017.

5- Lei nª 12.010 (Lei Nacional de Adoção), 2009. 

6- MACHADO, Vanessa R. A atual política de acolhimento institucional à luz do estatuto da criança e do adolescente. Revista de Serviço Social, Londrina, v. 13, nº 2, p. 143-169, 2011. Disponível em: <https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/ssrevista/article/view/10431/9121>. Acesso em: 18 de novembro de 2021.

7- MARTINS, Lara et al. Acolhimento familiar: caracterização de um programa. Revista Paidéia, 20(47), p. 359-370, 2010.

8- Orientações Técnicas para os Serviços de Acolhimento de Crianças e Adolescentes, 2009.

9- SECRETARIA DA JUSTIÇA, FAMÍLIA E TRABALHO. Serviço de Acolhimento Institucional. Governo do Estado do Paraná. Disponível em: <https://www.justica.pr.gov.br/Pagina/Servico-de-Acolhimento-Institucional>. Acesso em: 17 de novembro de 2021.

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