Educação inclusiva: o que é e como aplicá-la?

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Educação inclusiva: o que é e como aplicá-la?
27 out 2021
27 / out / 2021

Educação inclusiva: o que é e como aplicá-la?

Dificilmente questionamos o quão importante e necessária é a educação, e o conhecimento por ela proporcionado, para a prosperidade de uma sociedade. Na verdade, é comum vermos debates e discussões no meio público e na mídia sobre a necessidade de valorizá-la mais, com maiores recursos e condições para garantir sua qualidade.

Isso porque a falta do ensino, ou a sua precariedade, pode comprometer a independência de uma pessoa e a sua vida como um todo, dificultando não só a sua inserção na sociedade, mas também o seu desenvolvimento como ser humano.

Nesse sentido, quando pensamos no coletivo, a carência da educação pode comprometer o futuro de toda uma geração. 

E quando pensamos no ensino para Pessoas com Deficiência (PcD), a situação é ainda mais desafiadora. De acordo com a Agência Brasil, com base em dados do Censo Escolar de 2019, mais da metade das escolas públicas de ensino fundamental e médio no país não são adequadas para crianças e jovens com deficiência.

Assim, uma das formas de buscar a integração dessas pessoas no sistema educacional é a educação inclusiva. Neste texto do Equidade vamos buscar entender o que significa a educação inclusiva, qual a sua importância e como podemos colocá-la em prática.

O projeto Equidade é uma parceria entre o Politize!, o Instituto Mattos Filho e a Civicus, voltada a apresentar, de forma simples e didática, os Direitos Humanos e os principais temas que eles envolvem, desde os seus principais fundamentos e conceitos aos seus impactos em nossas vidas. E então, preparado (a) para entender sobre o que é educação inclusiva e como aplicá-la? Segue com a gente!

Se quiser, escute nosso podcast complementar ao assunto do texto:

A origem da educação inclusiva

Historicamente, a escola nem sempre foi um ambiente aberto a todos. Muitos grupos sociais vulneráveis tiveram dificuldades para ter acesso à educação. Um desses grupos é formado pelas pessoas com deficiência.

No Brasil, essas pessoas tiveram a sua cidadania e os seus direitos plenamente reconhecidos apenas com a promulgação da Constituição Federal de 1988

Contudo, mesmo com direitos sendo conquistados, a maneira como o direito à educação era efetivado não resultava, na prática, na inclusão total dessas pessoas no sistema educacional em conjunto com as demais pessoas. 

Isso porque antes da Conferência Mundial de Salamanca sobre Educação para Necessidades Especiais, em 1994, o combate à discriminação das PcD no ensino se dava por meio da chamada educação especial. 

A educação especial buscava proporcionar o ensino às pessoas com deficiência de maneira exclusiva, funcionando muitas vezes como um complemento à educação geral.

Dessa forma, essa prática educacional era voltada somente para pessoas com deficiência, em vista de seus impedimentos e necessidades. 

De acordo com o professor em educação da Universidade de Manchester, Mel Ainscow, esse tipo de serviço muitas vezes resultava em um sistema escolar separado e paralelo aos alunos com deficiência, que eram considerados como necessitados de atenção especial.

A existência de sistemas de educação separados começou a ser questionada do ponto de vista dos direitos humanos e em relação à inclusão social dos estudantes com deficiência.

Especialmente após o modelo social da deficiência aflorar a partir do final do século XX, enxergando que a sociedade deveria se reorganizar e se adaptar para incluir as PcD. 

Assim, em 1994, na Conferência Mundial de Salamanca sobre Educação para Necessidades Especiais, foi elaborada a Declaração de Salamanca, que reforçou o compromisso de implementar a educação para todos.

O documento reconheceu a necessidade de proporcionar educação às pessoas com deficiência dentro do sistema regular de ensino, com base na inclusão escolar e social. 

Com isso, surgiu a concepção da educação inclusiva e, como consequência, esforços ao redor do mundo passaram a ser tomados para mudar a prática educacional em direção à integração plena.

Você sabia que a IA pode ser uma grande aliada na promoção de uma educação mais inclusiva e acessível? Para entender como o uso desse recurso está alinhado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e como pode contribuir para um sistema educacional mais inclusivo, acesse: Inteligência Artificial e sustentabilidade: o poder transformador da tecnologia

O que é educação inclusiva?

A educação inclusiva pode ser entendida como uma abordagem de ensino que prevê a adaptação do sistema educacional de forma a garantir o acesso, a permanência e as condições de aprendizagem para todas as pessoas com deficiência.

Isso significa que a educação inclusiva promove o direito fundamental à educação com base nos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana.

Com isso, busca-se a eliminação de qualquer discriminação ou preconceito contra PcD no âmbito escolar, promovendo a valorização da diversidade humana e a efetiva participação dessas pessoas no sistema educacional. 

Sendo assim, segundo a doutora em educação Rosita Edler Carvalho (2005), “trata-se de equiparar oportunidades, garantindo-se a todos – inclusive às pessoas em situação de deficiência e aos de altas habilidades/superdotados, o direito de aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver” (p. 30).

Imagem de uma pessoa com deficiência visual lendo em braille com a ajuda de outra pessoa, representando a educação inclusiva

Aqui no Brasil, programas e medidas voltadas à educação inclusiva começaram a ser realizadas especialmente no século XXI.

Em 2001, o Conselho Federal de Educação instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, estabelecendo que o sistema de ensino deveria matricular os alunos indiscriminadamente, cabendo às escolas se organizarem para receber os alunos com deficiência. 

Já no ano de 2008, o Ministério da Educação instituiu a Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI), com o objetivo de garantir a inclusão escolar dos alunos com deficiência a partir do acesso ao ensino regular.

Para isso, busca assegurar a formação de professores para o atendimento educacional especializado e a acessibilidade arquitetônica, nos transportes, nos mobiliários e nas comunicações e informações do sistema de ensino.

Além disso, em 2014 foi elaborado o mais recente Plano Nacional de Educação, que estabelece as diretrizes para o desenvolvimento nacional da educação.

Nele, foi posto como meta universalizar o acesso à educação básica adequada e especializada para crianças e jovens com deficiência, com a garantia de um sistema educacional inclusivo.

Isso significa que a educação inclusiva já é um objetivo a ser executado no país. Mas o que é preciso fazer para aplicá-la na prática? É o que veremos a seguir.

Como aplicar a educação inclusiva

Além das políticas e dos planos nacionais estabelecidos, a implementação de instituições de ensino inclusivas também depende do suporte de um arcabouço legislativo.

No Brasil, isso é garantido especialmente pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, que prevê a educação inclusiva como um direito das PcD. Mas, além de tudo isso, a educação inclusiva só se consolida com ações práticas dos atores envolvidos no sistema educacional do país.

Isso porque a inclusão plena vai além do compartilhamento do mesmo espaço físico. A maneira como o estudante interage com o ambiente influencia no seu desenvolvimento.

Sendo assim, a prática pedagógica, a organização e a gestão da instituição de ensino são importantes fatores na aplicação efetiva da educação inclusiva.  

Nesse sentido, com base na obra “Introdução Geral à Educação Inclusiva” do psicólogo Emílio Figueira, trazemos algumas ações voltadas para a implementação dessa prática de ensino:

  • Adaptação curricular: adoção de currículos abertos e propostas curriculares diversificadas, bem como a diversificação e flexibilização do processo de ensino-aprendizagem, de modo a atender às diferenças individuais dos alunos.
  • Professores especializados: formação e preparação de professores especializados e capacitados para atender às necessidades do ensino inclusivo, conseguindo estabelecer plena comunicação com os alunos por meio de sistemas alternativos, como língua de sinais, sistema braille, sistema bliss ou similares.
  • Adaptação da instituição de ensino e da sala de aula: a organização estrutural e funcional do ambiente escolar deve se dar de forma a eliminar barreiras que impedem o aprendizado, possuindo recursos físicos, materiais, ambientais, técnicos e tecnológicos que atendam às necessidades de todos.
  • Sistemas de apoio: é importante o estabelecimento de redes de apoio que envolvam atores do ambiente de ensino, como os gestores escolares e docentes, e atores externos, como familiares, amigos, profissionais especializados (médicos, fisioterapeutas, psicopedagogos etc.) que busquem favorecer a autonomia, produtividade e integração dos estudantes com deficiência.
  • Adaptações metodológicas e didáticas: adoção de conteúdos, procedimentos de avaliação, atividades e metodologias que atendam às diferenças individuais dos alunos, como dinâmicas individuais ou em grupo e técnicas de ensino-aprendizagem específicas que beneficiem os estudantes e não restrinjam a sua ativa participação.
Imagem de uma mulher com deficiência física em uma cadeira de rodas lendo junto com uma criança representando a educação inclusiva

Mas apesar da educação inclusiva ser um direito e uma garantia legal no Brasil, a realidade do sistema educacional nacional ainda não é de total inclusão e integração das pessoas com deficiência no país.

A realidade da educação das pessoas com deficiência no Brasil

É bem verdade que o número de estudantes com deficiência matriculados nas escolas brasileiras aumentou nos últimos tempos.

Segundo a Agência Brasil, com base em dados do Inep, entre 2014 e 2018 houve um aumento de 33,2% no número de matrículas de alunos com deficiência, sendo que 92,1% do total estão incluídos em classes comuns. 

Contudo, muitas escolas no país ainda carecem de estrutura para serem consideradas inclusivas, dificultando o acesso à educação para pessoas com deficiência.

De acordo com o Anuário Brasileiro da Educação Básica, de 2019, apenas 44,2% das escolas urbanas são acessíveis para pessoas com mobilidade reduzida, sendo que na zona rural esse número cai para 17,9%.

Também segundo o Anuário, somente 31,5% das escolas urbanas possuem salas de recursos multifuncionais para Atendimento Educacional Especializado (AEE). Na zona rural esse percentual é ainda menor, de 16,1%.

Outro importante fator diz respeito à formação e capacitação de professores, que ainda demonstra ser um desafio para o sistema educacional brasileiro. Segundo o Censo Escolar de 2019, somente 6% das professoras e professores da educação básica têm formação adequada para dar aulas para estudantes com deficiência.

A defasagem também se encontra na preparação, visto que, também segundo o Censo, mesmo os professores que atuam exclusivamente com alunos com deficiência, apenas 42% foram capacitados para isso.

Especificamente em relação ao ensino superior, mesmo com a Lei nº 13.409/2016, que contempla as pessoas com deficiência com cotas para o ingresso em universidades federais, segundo o Inep, em 2018 haviam apenas 43.633 PcD matriculados em instituições de ensino superior, menos de 1% do total de estudantes matriculados. 

Conclusão

Muito mais do que apenas um caminho para ingressar no mercado de trabalho, a educação possui um papel fundamental na construção e formação da cidadania, sendo uma ferramenta para o desenvolvimento humano tanto em nível individual, quanto coletivo.

Assim, a educação inclusiva consiste em possibilitar que todos tenham acesso ao ensino e ao conhecimento, promovendo o desenvolvimento das pessoas com deficiência e da sociedade com base nos princípios da igualdade e da acessibilidade.

Além disso, a educação inclusiva contribui para o combate à exclusão social das pessoas com deficiência, oferecendo a oportunidade de interação social em períodos cruciais da vida, como a infância e a juventude.

Contudo, a implementação prática da educação inclusiva no Brasil ainda demonstra ser um desafio, em que ações e políticas públicas devem ser reforçadas no sistema educacional para garantir educação de qualidade para PcD.

Na verdade, isso não ocorre apenas no âmbito da educação, muitos são os desafios e obstáculos enfrentados pelas pessoas com deficiência para terem a sua total inclusão e participação na sociedade. Por isso, no próximo texto aqui no Equidade vamos falar mais sobre o capacitismo e os desafios das pessoas com deficiência. Não deixe de conferir!

Ah! E se quiser conferir um resumo super completo sobre o tema “Direitos das Pessoas com Deficiência”, confere o vídeo abaixo!

Autores:

Beatriz Cukierkorn Martins
Beatryz Santoro Pacheco
Caio Carvalho de Matos
Eduardo de Rê
Ernesto Lino de Oliveira
Juliana Meneghelli de Barros
Lucas Custódio Santos

Fontes:

1- Instituto Mattos Filho;

2- ALONSO, Daniela. Os desafios da Educação Inclusiva: foco nas redes de apoio. Nova Escola, 2013. Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/554/os-desafios-da-educacao-inclusiva-foco-nas-redes-de-apoio|>. Acesso em: 27 de julho de 2021.

3- AINSCOW, Mel. Tornar a educação inclusiva: como esta tarefa deve ser conceituada? In: FÁVERO, Osmar et al. (orgs). Tornar a educação inclusiva. UNESCO, Brasília, p. 11-25.

4- CARVALHO, Rosita. Diversidade como paradigma de ação pedagógica na educação infantil e séries iniciais. Revista da Educação Especial, p. 29-34, 2005.

5- FIGUEIRA, Emílio. Introdução geral à educação inclusiva. Figueira Digital, São Paulo, 2019. Disponível em: <https://www.emiliofigueira.com.br/2020/01/livro-gratuito-introducao-geral.html>. Acesso em: 27 de julho de 2021. 

6-  NEVES, Libéria et al. Política de Educação Especial e os Desafios de uma Perspectiva Inclusiva. Educação & Realidade, Porto Alegre, vol. 44, nº 1, 2019.

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