Uma das grandes discussões político-econômicas dos últimos tempos refere-se a qual deve ser o tamanho do Estado. Não estamos falando das dimensões territoriais de um país, mas sim sobre o alcance da atuação dos governos nacionais. Ao longo da história, pensadores de diversas doutrinas propuseram diferentes ideais de Estado, cada um com diferentes papéis, direitos e deveres. Neste texto, faremos uma comparação entre as duas categorias de governo que mais figuram nos debates atuais: um Estado com grande área de atuação (a que chamaremos de “Estado de bem-estar social”) e um com menor área de atuação (a que daremos o nome de “Estado liberal”).
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ORIGENS E HISTÓRIA
Com o advento do iluminismo, entre os séculos XVII e XVIII, surgiu a ideologia liberal. A partir dela, foram desenvolvidas inúmeras teorias, tanto políticas, quanto econômicas, que, favoráveis à liberdade dos indivíduos em seu grau máximo, defendiam que se limitasse o poder de interferência dos Estados na vida e nas escolhas de seus cidadãos.
Assim, segundo John Locke, considerado pai do liberalismo, cabia somente aos governos garantir três direitos básicos aos homens: vida, liberdade e propriedade. Adam Smith, pioneiro do liberalismo econômico, defendeu a não-intervenção estatal na economia, em sua obra A Riqueza das Nações. Firmando-se os pilares liberais na Europa, os regimes absolutistas foram, um a um, caindo. Paralelamente, os países europeus, ao longo dos séculos XVIII e XIX, iniciaram seus processos de industrialização.
É possível afirmar que, até os primeiros anos do século XX, os Estados liberais, tendo o Reino Unido e os Estados Unidos como principais representantes, prevaleceram no mundo ocidental. No entanto, a Primeira Guerra Mundial (1914-1919) e a crise econômica de 1929 abalaram as estruturas político-econômicas vigentes até então. Assim, surgiu uma brecha para a ascensão de propostas alternativas.
Em 1936, o economista britânico John Maynard Keynes, defensor do intervencionismo, publicou o livro “A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda”. Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o Estado norte-americano passou a aderir com mais intensidade aos ideais intervencionistas, adotando a doutrina keynesiana.
Um modelo análogo foi idealizado pelo economista sueco Gunnar Myrdal e posto em prática por países europeus. Deu-se a esse modelo o nome de welfare state (em português, Estado de Bem-estar Social). Trata-se de um governo protagonista na manutenção e promoção do bem-estar político e social do país e de seus cidadãos.
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CARACTERÍSTICAS
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Apesar de a contextualização histórica apresentar os princípios básicos dos dois modelos de Estado abordados, é necessário, para que os conceitos de cada um sejam realmente compreendidos, um maior aprofundamento de suas características.
No Estado de bem-estar social, é dever do governo garantir aos indivíduos o que se chama, no Brasil, de direitos sociais: condições mínimas nas áreas de saúde, educação, habitação, seguridade social, entre outras. Ademais, em momentos de crise e de desemprego, o Estado deve intervir na economia de forma que se busque a manutenção da renda e do trabalho das pessoas prejudicadas com a situação do país. Isso foi feito, por exemplo, nos EUA, na década de 1930, em que os níveis de desemprego ultrapassaram a taxa de 25%. Outro ponto central do welfare state é a existência de leis trabalhistas, que estabelecem regras nas relações entre empregado e empregador, como salário mínimo, jornada diária máxima, seguro-desemprego, etc.
Em um Estado liberal, por outro lado, a lógica é diferente: não se pode garantir como direito algo que dependa da força de trabalho alheia. Desse modo, saúde e educação, por exemplo, não são considerados direitos, mas, sim, mercadorias. Além disso, diferente dos keynesianos, os liberais acreditam na autorregulação dos ciclos econômicos. Os mercados seriam capazes de se ajustar por conta própria. Logo, intervenções do Estado são prejudiciais à economia dos países. Defende-se o livre mercado e a concorrência, além da inexistência de empresas públicas ou de quaisquer tipos de associação entre governo e parceria privada.
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NAS ÚLTIMAS DÉCADAS
Dos anos 1950 até as décadas de 1970 e 1980, os governos dos países protagonistas na economia mundial mantiveram políticas características dos welfare states. Os graves efeitos da grande depressão e das guerras da primeira metade do século XX foram revertidos e, em termos gerais, a pobreza foi reduzida. Nos EUA, por exemplo, a taxa de pobreza, que alcançou o patamar de 34% da população em 1950, reduziu-se a 12% no primeiro quinquênio de 1970 – situação semelhante ocorreu em países europeus. Todavia, a partir da década de 1980, diversos países do globo (principal, mas não somente, os subdesenvolvidos) passaram por fortes crises econômicas, o que gerou a necessidade de uma reformulação das políticas macroeconômicas em vigência.
Em 1989, economistas norte-americanos formaram o chamado Consenso de Washington, e formularam uma série de medidas macroeconômicas a serem seguidas pelos países membros do Fundo Monetário Internacional (FMI). O caráter das medidas é liberalizante: abertura comercial, privatização de estatais, redução dos gastos públicos, reforma tributária, entre outras. Ao longo da década de 1990, diversos países (inclusive o Brasil, no governo FHC) adotaram parcial ou integralmente as determinações do Consenso de Washington, um fenômeno a que se deu o nome de neoliberalismo.
Desse modo, hoje, não é mais possível catalogar um Estado como “liberal” ou “de bem-estar social”, de forma binária. A escala é gradual: há países menos liberais e, portanto, mais voltados à categoria de bem-estar social, e vice-versa. Uma das maneiras mais utilizadas para que se determine a posição de cada país nessa escala é avaliando as suas “despesas de bem-estar social” (gastos relativos ao PIB com as áreas de bem-estar social). Alguns países de alto IDH possuem altas despesas sociais, como Suécia, Dinamarca e Alemanha, assim como há países de alto IDH que gastam pouco nessas áreas, a exemplo de Coreia do Sul, Irlanda e Nova Zelândia. Dessa forma, não é possível afirmar que um modelo funcione melhor do que o outro: há diversos outros fatores que podem ser determinantes na qualidade de vida de um país.
Referências
Harvard: Consenso de Washington – FMI: economia keynesiana – Paul Spicker: welfare states – Instituto Liberal: Adam Smith – Enciclopédia Britannica: iluminismo
2 comentários em “Estado de bem estar social e Estado liberal: qual a diferença? ”
Muito bom!
Politize de PARABENSS!!!
Estado de bem-estar social e o Estado liberal diferem principalmente na sua abordagem em relação ao papel do governo na sociedade e na economia.
O Estado de bem-estar social, também conhecido como Estado providência, caracteriza-se pela intervenção ativa do governo na economia e na vida social, visando garantir o bem-estar e a segurança social dos cidadãos. Isso inclui políticas como assistência médica universal, previdência social, educação gratuita e serviços públicos abrangentes. O Estado de bem-estar social busca reduzir as desigualdades sociais e promover a igualdade de oportunidades por meio de políticas redistributivas e de proteção social.
Por outro lado, o Estado liberal, também chamado de Estado mínimo ou Estado laissez-faire, tem uma abordagem mais limitada em relação à intervenção governamental na economia e na vida dos cidadãos. No Estado liberal, o governo desempenha um papel mínimo na regulamentação econômica e na prestação de serviços sociais, favorecendo a liberdade individual, o livre mercado e a iniciativa privada. Nesse modelo, as responsabilidades sociais e econômicas são, em grande parte, deixadas para o setor privado, com ênfase na liberdade de escolha e na competição.