Ao longo de sua história, o Brasil e a sociedade brasileira puderam vivenciar episódios anedóticos e complexos, cujas razões só podem se explicar através do entendimento e consideração dos caracteres multifacetados que os baseiam. Nesse sentido, o tema deste texto está situado no período imperial, mais precisamente entre 1831 e 1840, período este que ficou conhecido como A Regência. É a partir deste momento da nossa história que podemos ter condições de compreender um episódio pouquíssimo estudado, mas carregado de curiosidade, qual seja, o assim chamado Golpe da Maioridade.
Entre outros fatos que ilustram a especificidade da história da formação do nosso país, podemos citar: a forma como ele foi colonizado, os problemas do período imperial e a chegada da família real, as múltiplas revoltas e revoluções que delinearam desenvolvimentos posteriores e a Proclamação da República pouco antes da entrada do século XX.
A despeito dessa longa, plural e agitada história, o Brasil tem sido pauta de livros e teses as mais aclamadas e respeitadas, o que nos ajuda a compreender mais um pouco daquele que é o processo que culmina com os variados problemas atuais de nosso país.
Já ouviu falar sobre esse curioso acontecimento do Brasil Império? Continue na leitura para entender um pouco mais!
O que foi o Golpe da Maioridade?
O Golpe da Maioridade foi o nome dado ao episódio no qual Pedro de Alcântara, o futuro Dom Pedro II, é, por meio de um ato judicial, considerado maior de idade e, portanto, apto a ocupar o trono deixado vago por seu pai, Dom Pedro I, em 1831.
O termo golpe é utilizado na historiografia brasileira justamente para caracterizar a contradição de tal medida. Embora a sua consolidação tenha sido justificada pelos termos judiciais da época e ampla parte da sociedade fosse a seu favor, a maioridade antecipada de Dom Pedro II ocorrera por questões políticas.
À época, liberais e conservadores, como Antônio Carlos de Andrada (irmão de José Bonifácio) e Aureliano Coutinho (Visconde de Sepetiba), viam a medida como necessária para garantir a estabilidade do país em meio à crise política e institucional.
Tendo 14 anos à época, Pedro de Alcântara é coroado imperador em 1840 e passa a concentrar os poderes políticos em suas mãos, estendendo seu reinado até finais do século XIX.
Principal objetivo do Golpe da Maioridade
De acordo com Boris Fausto, o período Regencial foi um dos mais conturbados e importantes da história do Brasil. Nesses nove anos de regência, esteve em discussão as pautas mais importantes, tais como a unidade territorial do país, o grau de centralização ou descentralização política do Império, a autonomia das províncias e a organização das Forças Armadas.
Desse modo, a ascensão antecipada de Dom Pedro II foi uma solução elaborada pelas elites político-econômicas para responder aos inúmeros conflitos criados pelas reformas empreendidas no período regencial, como o Ato Adicional, considerado a primeira alteração na Constituição de 1824.
Outro aspecto a se considerar é o de que as próprias classes dirigentes não expressavam um consenso sólido sobre o arranjo institucional a ser construído. Não havia um conhecimento claro de que o Estado era um ente organizador dos interesses divergentes entre essas elites.
As principais disputas deste período giravam em torno da limitação dos poderes discricionários da monarquia e da disposição de maior autonomia e liberdade aos poderes locais e provinciais.
No entanto, pelas próprias dinâmicas que decorreram das reformas institucionais, bem como pelas difíceis condições de vida enfrentadas pela maior parte das classes subalternizadas, o período regencial foi marcado por revoltas nas províncias.
Diante da crise político-institucional resultante, a ideia de um retorno à unidade interna começou a se consolidar e se difundir através da figura do monarca.
Não obstante à divisão entre os setores conservadores e liberais em disputa sobre a subida ou não de Dom Pedro ao trono, este, a 23 de julho de 1840, é coroado novo Imperador do Brasil.
Segundo Lilia Schwarcz, o termo Golpe da Maioridade é corretamente usado, pois sob o pretexto de “apaziguar” um país assolado por conflitos de interesses e revoltas provínciais, Pedro II é coroado imperador do Brasil antes de sua maioridade legal para garantir a sua entronização, ao passo que Pedro I, dirigindo-se à Portugal com a sua filha, visava garantir o reinado da Metrópole a essa.
Como ocorreu o Golpe da Maioridade?
Assunto intermitente na Câmara e no Senado imperiais, a maioridade de Dom Pedro II nunca resultou em avanços concretos até o período no qual Pedro de Araújo e Lima tornou-se príncipe regente. Durante seu período de comando do império, os liberais engrossaram as fileiras para a apresentação de um abaixo-assinado cujo objeto era justamente a antecipação de sua maioridade.
Tal documento fora às mãos do futuro Dom Pedro a 22 de julho de 1840, e no dia seguinte, 23 de julho, a sua maioridade fora consumada efetivamente.
Um fato curioso acerca do abaixo-assinado é que hoje foi tornado domínio público e sua forma digital pode ser acessada facilmente através da página do governo brasileiro referente ao arquivo nacional.
Contexto político antes do Golpes da Maioridade
O golpe da maioridade colocou fim a um período bastante turbulento da nossa história. Frequentemente considerada um mero “hiato” entre os reinados, a Regência foi importante porque delineou traços essenciais que a nação brasileira tomaria posteriormente.
A própria abdicação do pai de Dom Pedro II representou um período de transição importante que a sociedade brasileira vivenciaria. Alguns classificam este acontecimento como uma revolução, já que marcou o fim de uma era de imposições e despotismo do monarca português e o início de um período de relativa liberdade, abertura e progresso, especialmente quando consideramos a relação entre o Estado centralizador e as províncias brasileiras.
Contudo, o maior grau de autonomia das províncias não acabou com todos os problemas criados pela centralização efetuada pelo Império, até porque o período regencial provou as dificuldades de se pautarem medidas mais liberais pelos dirigentes políticos. Embora reformas tivessem sido sancionadas, a sombra do absolutismo sempre esteve presente, e as disputas entre as oligarquias locais promoveram o surgimento de incontáveis revoltas.
Deste modo, retomando o que fora dito acima, o golpe da maioridade fora o mecanismo político-institucional escolhido pelas elites dominantes para trazer um maior equilíbrio e centralidade aos antagonismos que afloraram naquele momento.
Consequências do Golpe da Maioridade
Embora se vislumbrasse, após o golpe da maioridade, um período de relativa estabilização e equilíbrio no país, as condições históricas impuseram o exato oposto. Na prática, os conservadores haviam perdido a disputa contra os liberais, os quais somaram seu apoio à subida de Dom Pedro II ao trono. Porém, em novas eleições posteriores, conhecidas como eleições do cacete, a violência política e a manipulação eleitoral prevaleceram.
O recém-empossado Dom Pedro II diluiu as eleições e, com isso, os conservadores tiveram possibilidades de reorganizarem um novo gabinete para as eleições. Quem ganhou com este novo processo foi somente o monarca, que a partir daí passou a comandar a nação utilizando todas as prerrogativas legais de que dispunha.
Posteriormente, outros acontecimentos impeliram a novos conflitos e abalos, como a Guerra do Paraguai em meados de 1860.
E aí, gostou da leitura sobre o Golpe da Maioridade? Mande suas dúvidas e comentários para ampliarmos o debate!
Referências
- Aventuras na História – Um adolescente no Poder: Há 184 anos, ocorria o Golpe da Maioridade.
- FAUSTO, Boris. História do Brasil. 13ªed, 2ªreimpr. São Paulo: Edusp, 2010.
- Governo brasileiro – Pedido de Maioridade de D. Pedro II
- Nexo Jornal – Golpes e Contragolpes
- Senado Federal – A declaração da maioridade de Sua Magestade Imperial o Senhor D. Pedro II, desde o momento em que essa idea foi aventada no corpo legislativo ate’ o acto de sua realisação.