O cenário de pandemia causado pelo novo coronavírus reacendeu uma pauta na política brasileira: a taxação sobre grandes fortunas. Diante do cenário de crise econômica causado pela Covid-19, que acentuou as desigualdades sociais e aumentou a pobreza no mundo, notícias apontavam, por outro lado, que a fortuna de bilionários brasileiros cresceu US$ 34 bi na pandemia.
Para lidar com esse cenário, uma das propostas fiscais para “distribuir a conta da crise econômica” é o imposto às grandes fortunas. Essas políticas já foram implementadas e abandonadas por uma dezena de países – como França e Alemanha – mas sempre voltam ao debate em períodos de crise.
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Mas…como funcionaria na prática?
O Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) está previsto na Constituição Federal de 1988, no inciso VII do Artigo 153. Todavia, embora seja uma medida constitucional, o imposto nunca foi regulamentado e instituído no Brasil.
O imposto seria cobrado, portanto, sobre aqueles patrimônios considerados grandes fortunas, ou seja, ficaria estabelecida uma alíquota (porcentagem) que define em quanto o patrimônio deve ser tributado. A definição de “grandes fortunas”, por sua vez, gera bastante controvérsia, pois pode ter diferentes pontos de vista no debate.
Segundo a matéria da Oxfam, esse é um imposto que somente uma parcela da população com uma renda muito alta pagaria. Dessa forma, não teria impacto sobre a maioria dos cidadãos brasileiros. O IGF deve, portanto, começar no topo da pirâmide – identificar o 0,1% da população que tem a maior renda do país, tributar seus ativos e estabelecer regras mais rígidas contra sonegação do imposto. Ou seja, em síntese, quando falamos sobre taxar grandes fortunas, não estamos falando sobre cidadãos com casa própria ou um carro, mas sim sobre o 0,1% mais rico da população brasileira.
Já falamos aqui no Politize! sobre a desigualdade social no Brasil e também em capitais como São Paulo e Rio de Janeiro. Vimos que a desigualdade social é um problema permanente em todo o mundo, mas principalmente em países considerados em desenvolvimento, nos quais essa situação é um problema sistêmico e urgente.
Nesse contexto, quase 1/3 da renda total do país acaba se concentrando em uma camada social que representa apenas 1% da população. Já os 10% mais ricos do Brasil concentram 41,9% da renda total. Segundo a Oxfam, a implementação do IGF não faria com que os mais ricos deixassem de ser ricos e poderia significar um ganho importante em políticas públicas para os mais pobres.
Argumentos contra e a favor do Imposto sobre Grandes Fortunas
O debate a respeito do IGF é recheado de opiniões sobre o sucesso ou não dessa política tributária. O principal ponto contra o IGF trata-se da fuga de capitais. A fuga de capital ocorre quando as pessoas residentes de um país levam seu capital para outro país, ou seja, levam suas fábricas ou aplicam seu dinheiro no exterior. Um dos motivos pelos quais pode ocorrer essa fuga é por conta do pagamento de impostos, pois os proprietários de ativos buscam minimizar os pagamentos para o governo. Além dessa razão, a fuga de capital também pode ser ocasionada por cenários de instabilidade política e desvalorização cambial.
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Para o economista Pedro Humberto, essa justificativa para não taxar grandes fortunas é frágil. Segundo ele, “Como o número de contribuintes é pequeno, a Receita Federal pode ter instrumentos para combater a evasão fiscal. (…) Com a tecnologia atual, você tem muito mais chance de pegar quem evade, quem sonega a fortuna, no caso”. Ou seja, a Receita Federal não teria que fiscalizar uma grande parcela da população, uma vez que poucos contribuiriam com o IGF e a tecnologia existente poderia auxiliar nessa operação.
Outra crítica ao imposto sobre grandes fortunas é o fato de ser uma medida intervencionista, ou seja, uma interferência governamental na economia do país. Todavia, André Calixtre, mestre em Desenvolvimento Econômico, afirma que o IGF está na origem do liberalismo econômico mais tradicional, uma vez que moderar os excessos na distribuição de patrimônio pode garantir que as pessoas concorram em pé de igualdade na sociedade.
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Pelo lado de quem apoia o imposto ainda, segundo o artigo “O imposto sobre grandes fortunas como instrumento de redução das desigualdades sociais e regionais”, o IGF é um instrumento indispensável e capaz de realizar justiça tributária e social no Brasil, além de ser um imposto que a arrecadação poderia ser aplicada em saúde, educação, infraestrutura básica, programas de incentivo ao emprego e políticas de combate à pobreza, garantindo direitos fundamentais de sobrevivência aos brasileiros.
Como foi aplicado no contexto internacional
Argentina
O IGF foi introduzido na Argentina em 1974. O imposto, que é federal, passou por diversas mudanças ao longo dos anos. O tributo foi sendo reduzido desde a chegada ao poder do empresário Maurício Macri, crítico da cobrança. Anteriormente, a cobrança era de até 1,25% para patrimônios brutos que excedessem 305 mil pesos argentinos. Neste ano, passa a valer a cobrança de 0,25% sobre o patrimônio bruto que superar 1,050 milhão de pesos argentinos (cerca de R$ 170 mil). Atualmente, o imposto representa cerca de 0,3% do PIB.
Noruega e Suíça
Nesses dois países europeus, o imposto sobre fortuna é descentralizado, sendo arrecadado pelos governos regionais e cobrado apenas de pessoas físicas (ou seja, as empresas não são taxadas). Na Noruega, o imposto está presente desde a década de 1960 e as alíquotas para os cidadãos que possuem mais que 1,48 milhão de coroas norueguesas (aproximadamente R$ 926.173,00) são de 0,7%. Por ano, a arrecadação do tributo representa 0,5% do PIB do país e recai sobre cerca de 15 mil contribuintes, num país de 5,4 milhões de habitantes.
Na Suíça, as alíquotas são progressivas e variam de 0,3% a 1%, com limite de isenção de 180 mil euros (aproximadamente R$ 1.186,35). Segundo dados de 2015, o IGF atinge cerca de 1,2% do PIB.
França
No país, a alíquota vai de 0,5% a 1,5% para cidadãos com patrimônio líquido acima de 1,3 milhão de euros (aproximadamente R$ 8.563). Além disso, há uma faixa mínima de progressão de até 10 milhões de euros (aproximadamente R$ 65 milhões), a partir da qual a alíquota é sempre de 1,5%.
No país ainda há uma regra que impede que a cobrança do imposto exceda 75% da renda individual declarada. Desde 2018, no governo de Macron, o IGF passou a incidir apenas sobre imóveis.
Alemanha
A Alemanha é um país que, por muito tempo, cobrou o Imposto sobre Grandes Fortunas. Todavia, em 1997, o governo considerou os resultados da tributação pouco atraentes e decidiu encerrar a cobrança. Atualmente, o país conta apenas com o Imposto de Renda, assim como acontece no Brasil
Uruguai e Colômbia
No Uruguai, a tributação está em vigor há 31 anos e o IGF é cobrado tanto de pessoas quanto de empresas, com um limite de bens e ativos financeiros de até 113 mil euros (R$ 742 mil). As alíquotas são progressivas variando de 0,5% a 1,5% e, para o caso de empresas, a alíquota pode chegar a 2,8%. A receita representa cerca de 1% do PIB do país.
Na Colômbia, o Imposto sobre Patrimônio foi introduzido em 2002 e reformulado em 2014. As alíquotas variam de 0,125% a 1,5% e sobre um valor de patrimônio que excede mais de 266 mil euros (aproximadamente R$ 1,7 milhão). A arrecadação representa cerca de 0,65% do PIB.
Itália, Bélgica e Holanda
A Itália estabeleceu o IGF recentemente incidindo sobre a riqueza financeira dos cidadãos italianos no exterior. O limite da isenção é de 5 mil euros (aproximadamente R$ 32,4 mil), com uma alíquota única de 0,2%.
A Bélgica introduziu um pequeno imposto de 0,15% sobre o patrimônio financeiro dos cidadãos do país, o qual incide em fortunas a partir de 500 mil euros (aproximadamente R$ 3,2 milhões).
Já na Holanda as alíquotas são progressivas, variando de 0,2% a 1,68%, e a faixa de isenção é de 30 mil euros (R$ 207 mil). Segundo dados oficiais, esse imposto arrecada 0,6% do PIB do país.
E aí, conseguiu entender o debate a respeito do Imposto sobre Grandes Fortunas? Qual a sua opinião? Conta pra gente nos comentários!
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