Em setembro do ano passado, foi sancionada pelo Governo Federal a lei 13.874, conhecida como a “lei da liberdade econômica”. De acordo com o governo federal, o objetivo com a implantação destas normas é desburocratizar vários processos econômicos e trazer mais segurança e liberdade para as empresas.
Porém, vários setores da sociedade viram a lei como uma afronta aos direitos trabalhistas, por conta de trechos polêmicos contidos em seu texto. A ONG Repórter Brasil ouviu uma série de associações, procuradores, advogados e sindicatos, que apontaram vários malefícios da lei para os trabalhadores brasileiros, como a abertura de brechas para o fim das folgas para os trabalhadores rurais, maior dificuldade para o trabalhador receber indenizações e afrouxamento das normas fiscalizadoras, o que poderia dificultar a inclusão de empresas na lista do trabalho escravo, além de vários outros artigos que reduzem os direitos de maneira velada.
Neste texto, explicaremos a você um pouco mais sobre essa lei e que impacto ela pode ter em seguros privados.
Entenda melhor a lei de liberdade econômica
A lei da liberdade econômica foi resultado da Medida Provisória 881/2019, de autoria da Presidência da República, originalmente proposta em abril de 2019. Em consulta pública no portal do Congresso Nacional, 21.851 pessoas se manifestaram contra a lei, enquanto 19.993 se posicionaram a favor.
A medida tramitou até o início de maio. 301 emendas foram apresentadas e 81 delas foram aprovadas no texto final, que ficou pronto em julho. O Senado aprovou a MP em agosto, após debates acalorados. Enquanto a senadora Soraya Thronicke, do PSL sul-mato-grossense, afirmou que a MP seria uma “alforria” para os empresários brasileiros, o senador amapaense Randolfe Rodrigues, da REDE, colocou a lei como uma “revogação da Lei- Áurea”.
Entre os principais pontos da lei estão a implantação da carteira de trabalho eletrônica, o fim do fundo soberano, poupança nacional criada em 2008, após superávit primário, a valorização jurídica de documentos digitalizados, a liberação para atividades de baixo risco, que ficam dispensadas de obter alvará de funcionamento e algumas mudanças no registro de ponto dos funcionários, como a que o torna obrigatório apenas para empresas com mais de 20 empregados.
O impacto da lei nos seguros privados
Em meio a tantas polêmicas, um dos pontos não tão falados desta lei diz respeito às mudanças que ela poderá trazer para o setor dos seguros privados no país. Para entender um pouco melhor estas mudanças, é preciso traçar um panorama de como atua a regulamentação deste setor.
Primeiramente, é importante explicarmos o que são seguros privados: são todos os seguros contratados espontaneamente, por uma empresa ou pessoa, através de uma outra empresa, a seguradora.
Todas as empresas fornecedoras de seguros privados que atuam no Brasil, a exceção daquelas do ramo da saúde, são fiscalizadas e regulamentadas por dois órgãos públicos: o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP). Isto abrange o seguro de moto, seguro de carro, seguro contra incêndio, seguro de responsabilidade civil, seguro pessoal, entre outros.
Mas, a intervenção da SUSEP e do CNSP nos modelos de contrato operados pelas seguradoras é grande. Todos os contratos passam por revisão dos órgãos, o que acaba gerando certa padronização entre todas as empresas do ramo, não abrindo margem para concorrência e inovações.
Com todas as recentes transformações sociais, causadas principalmente pela tecnologia, e que acabaram culminando em modelos inovadores e diferenciados de empresas, os moldes antigos dos seguros acabaram não condizendo mais com a realidade, ou seja, não suprindo mais as necessidades das empresas, deixando várias lacunas na questão dos seguros.
O parágrafo único do artigo 421 da nova lei traz o seguinte texto: “nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual”, ou seja, os órgãos públicos perderão o poder de intervenção nos contratos privados, firmados entre duas empresas, duas pessoas ou uma pessoa e uma empresa. A expectativa é que, com isso, cada empresa tenha mais liberdade para elaborar seus próprios moldes de contrato e, assim, conseguir suprir as necessidades dos novos modelos de negócios, principalmente das startups.
Com essa modificação significativa em vigor, o poder da SUSEP e da CNSP fica reduzido à mera fiscalização das normas, perdendo a capacidade intervencionista. Portanto, estes órgãos passarão a se dedicar a analisar os níveis de liquidez das empresas seguradoras, ou seja, se elas têm ou não condições de arcar com os seus compromissos com os segurados.
A expectativa do mercado é que as empresas só tenham a ganhar com essas modificações. O presidente da Associação Brasileira de Gerência de Riscos (ABGR), Walter Polido, afirmou que a nova lei conta com vários dispositivos que beneficiarão o crescimento do setor dos seguros privados. Com os órgãos restritos à fiscalização, a tendência é que todos os segurados tenham seus interesses garantidos, sem riscos de prejuízos por falta de liquidez das seguradoras e, mais importante, terão condições de negociar seus próprios moldes do contrato de maneira a suprir as necessidades atuais das empresas.
Já Walfrido Warde, advogado especialista em Direito Empresarial, vê este trecho da lei como algo perigoso, pois o princípio da intervenção mínima cria constrangimentos para as pessoas que desejam entrar com ações legais contestando termos de algum contrato.
E você? O que pensa a respeito dessa nova lei e seus impactos? Comente a sua visão!