O Massacre do Carandiru e suas versões

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Corredor alagado de sangue na Casa de Detenção de São Paulo, após a intervenção da Polícia Militar. / Niels Andreas

No dia 02 de Outubro de 2019, o massacre do Carandiru completará 27 anos, mas a sua história ainda é lembrada e questionada pela população que se viu intrigada em face das inúmeras versões acerca de um acontecimento ainda pouco esclarecido. Afinal, o que foi o Massacre do Carandiru?

O que era o Carandiru?

A Casa de Detenção de São Paulo, popularmente conhecida como Carandiru (nome homônimo à seu bairro), foi inaugurada em 1920 com o custo de 14 mil contos de réis, um valor muito significativo para época. Nos seus 20 primeiros anos de funcionamento, era considerada um modelo para outros países por manter boas condições de higiene e assegurar trabalho e educação aos apenados. Ganhando o título de cartão postal da cidade, passou a ser aberta a visitação pública.

Seus primeiros problemas começaram a aparecer em 1940 com a superlotação da penitenciária. Na tentativa de melhorar a situação, em 1959, durante o governo de Jânio Quadros, foi inaugurado um anexo, com péssimas condições de higiene, que aumentava sua capacidade da prisão para 3.250 detentos.

A rebelião de 1992

A penitenciária do Carandiru era dividida em pavilhões e cada um possuía suas peculiaridades. O pavilhão 8, por exemplo, era o mais temido porque abrigava presos reincidentes de crimes e que conheciam todas as regras da casa. Já o pavilhão 2 era o local em que se acomodavam os recém chegados. Ali eram registrados, tinham seus cabelos cortados, recebiam roupas e tinham acesso às primeiras palestras sobre as regras da detenção.

O Pavilhão 9, por sua vez, era onde ficavam os réus primários (presos pela primeira vez). Foi justamente lá que ocorreu o estopim do massacre, durante uma partida de futebol entre detentos. A briga de dois prisioneiros de facções rivais não era uma exceção para a rotina da casa, mas tomou proporções enormes, se espalhando por todo o Pavilhão 9 e gerando uma rebelião dos prisioneiros. 

Com a finalidade de controlar essa rebelião, cerca de 300 policiais adentraram o local sob o comando do Coronel Ubiratan. Como resultado da invasão, 111 presos foram mortos, segundo dados oficiais do Governo do Estado de São Paulo.

massacre do carandiru infográfico
Fonte: Brasil de Fato

As diferentes versões

Apesar de se saber qual a origem do massacre, ainda não há um consenso para explicar o que realmente aconteceu naquele 2 de outubro de 1992 após a entrada da polícia na penitenciária. E é aí que as histórias começam a se diferenciar…

A versão oficial dada pela polícia relata que a situação estava fora do controle no pavilhão 9 e o Diretor da Casa de Detenção, José Ismael Pedrosa, acionou a Polícia Militar, que chegou com um efetivo de 300 homens. Depois de tentativas frustradas de negociação entre o diretor e os presos para finalizarem a rebelião, o Coronel Ubiratan teria decidido invadir o local um número menor de 86 policiais. Segundo a polícia, a situação fugiu totalmente do controle, necessitando a intervenção do restante dos PMs, que teriam sido recebidos com objetos cortantes e tiros. Dessa forma, o combate resultou em mortos (inicialmente divulgados pela PM como apenas 8), que seriam aqueles que trocaram tiros com a polícia – ou seja, alegou-se que eles agiram em legítima defesa.

Já a história contada pelos presos sobreviventes e por grupos dos Direitos Humanos difere das informações oficiais. Segundo eles, o número de mortos seria mais de 200 pessoas mortas por mais de 300 policiais. Eles alegaram que após a conversa com o Diretor do Carandiru, os presos decidiram pôr fim a rebelião, e muitos tinham entregado suas armas permanecendo dentro de suas celas. Mesmo sem apresentarem reações violentas, a PM teria matado os presos.

O perito criminal Osvaldo Negrini, que esteve no local da chacina, em depoimento, afirmou que não houve confronto entre policiais e detentos, porque os presos do Pavilhão 9 não tiveram a possibilidade de reagir. De acordo com ele, a grande quantidade de tiros encontrados nos corpos dos presos, especialmente na cabeça e no tórax, juntamente com as marcas na parede da cela, é um sinal que os policiais já teriam chegado atirando, impossibilitando a reação dos apenados. Além disso, apenas 26 dos 111 mortos contabilizados pela perícia se encontravam fora das celas.

Organizações de Direitos Humanos afirmam que essas características analisadas pela perícia são típicas de extermínio e mostram que os policiais não estavam atirando para se defender ou controlar a rebelião, mas com o objetivo de assassinar os detentos.

Osvaldo Negrini afirma ainda que houve tentativas de prejudicar seu trabalho, pois no dia do massacre a luz do local foi cortada, dificultando o andamento da operação. Nas outras duas ocasiões em que ele retornou ao local, tudo estava limpo, não deixando possíveis pistas dos acontecimentos. Além disso, conta-se que os presos foram obrigados pelos policiais a carregarem os corpos dos mortos e empilharem em outro andar, atrapalhando o trabalho da perícia por alterar a cena do crime.

As condenações do massacre

Em 8 de março de 1993, o Ministério Público acusou 120 policiais militares de homicídio, tentativa de assassinatos e lesão corporal de 111 detentos. Em março de 1998, 85 policiais se tornaram réus no processo, dentre eles o Coronel Ubiratan, que, em 2001, foi condenado a 623 anos de prisão por 102 mortes. No entanto, em 2006, a sua defesa recorre e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) o absolve.

Em Abril de 2013, 23 PMs foram condenados a 156 anos de prisão cada um pelas mortes de 13 apenados, e em Agosto do mesmo ano, 25 PMs das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar foram condenados a 624 anos de prisão cada um pela morte de 52 detentos.

Contudo, a notícia que chama a atenção da população ocorre em Setembro de 2016, quando a 4ª Câmera do TJ-SP anulou as condenações dos policiais alegando que não foi possível individualizar a conduta de cada condenado.

Em 2018, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) invalida decisão do TJ-SP e determina que os desembargadores refaçam o julgamento de 2016,  já que – de acordo com o então ministro Joel Ilan Parciornik – não havia sido analisados os questionamentos do Ministério Público, chamados de embargos de Declaração. Contudo, ainda não há data prevista para a ocorrência de novo julgamento. Ficou decidido que outros júris só poderão acontecer após decisão do STJ sobre recursos do Ministério Público e das defesas dos réus.

Para saber mais!

Há uma teoria que diz que o Primeiro Comando da Capital teria surgido como uma forma de resposta ao massacre com o objetivo de combater os exageros e as opressões policiais que acontecem nas prisões. Mas isso é apenas uma das teorias! Se você não sabe qual a história do PCC e porque ele se tornou uma organização criminosa tão famosa leia nosso post que explica o que é o PCC e outras facções criminosas.

E se você gostou de entender a história do massacre do Carandiru, nós do Politize! temos uma dica para te dar: não deixe de ler o livro Estação Carandiru do Dr. Dráuzio Varella, que relata 10 anos de atendimento voluntário na Casa de Detenção de São Paulo e conta detalhes da organização e comportamento da população carcerária.

Indicamos também a superprodução Carandiru: O filme, um dos mais famosos do cinema brasileiro, dirigido pelo cineasta Hector Babenco, com um elenco representado por artistas como Rodrigo Santoro, Lázaro Ramos, Wagner Moura, entre outros. O filme conta a história antes e depois do massacre de 1992.

E aí, gostou desse post? Queremos saber a sua opinião!

Referências: veja onde encontramos essas informações!

http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-03/beto-carandiru-perito-diz-que-detentos-nao-tiveram-chance-de-reacao

http://www.osaopaulo.org.br/noticias/diferentes-versoes-sobre-o-2-de-outubro-de-1992

https://acessajuventude.webnode.com.br/historia-do-carandiru/

https://www.youtube.com/watch?v=99st4G_vcgE

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/01/opinion/1538418889_678885.html

https://canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br/artigos/391469954/sim-precisamos-falar-sobre-o-massacre-do-carandiru

https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/stj-invalida-decisao-que-anulou-juri-do-massacre-do-carandiru.ghtml

https://pt.wikipedia.org/wiki/Carandiru_(filme)

https://www.brasildefato.com.br/2017/09/29/terra-das-chacinas/

https://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=11141

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Conteúdo escrito por:
E graduanda de Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Moya, Isabela; Pires, Marilza. O Massacre do Carandiru e suas versões. Politize!, 5 de junho, 2019
Disponível em: https://www.politize.com.br/massacre-do-carandiru/.
Acesso em: 20 de nov, 2024.

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