Este é o quarto texto de uma trilha de conteúdos sobre Migrações no Brasil e no mundo. Confira os demais posts da trilha: 1 – 2 – 3 – 4 – 5
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Já falamos nesta trilha sobre alguns dos motivos que levam uma pessoa a migrar, sobre as novas regras brasileiras quanto a recepção de imigrantes e acerca das diferenças entre os conceitos de migrante, asilado e refugiado. Hoje, iremos tratar mais especificamente da relação entre migração e religião, que atualmente aparece com frequência nos noticiários brasileiros e internacionais.
RELIGIÃO COMO MOTIVO PARA EMIGRAÇÃO
Em algumas situações, a religião pode ser uma variável determinante para que a decisão de migrar seja tomada. Alguns casos em que há relação direta são apresentados a seguir:
Perseguição religiosa no país de origem
Comum em regimes autoritários que não permitem aos cidadãos exercerem sua crença. Um exemplo histórico é o dos judeus no Estado nazista alemão, durante a Segunda Guerra Mundial. A perseguição também pode vir de grupos civis, não-estatais.
No Brasil, por exemplo, prega-se oficialmente a liberdade religiosa. No entanto, foram registradas 543 denúncias de violações de direitos por discriminação religiosa entre 2011 e 2014, através do Disque Direitos Humanos. Em 216 casos foi informada a religião da vítima, sendo 35% provenientes do candomblé e umbanda, 27% evangélicos, 12% espíritas, 10% católicos, 4% ateus, 3% judeus, 2% muçulmanos e 7% de outras religiões.
No globo como um todo, os cristãos são os mais perseguidos: em 2016, cerca de 90 mil cristãos foram assassinados por suas crenças. Aproximadamente um terço das mortes foram atribuídas a grupos islâmicos extremistas, como o ISIS e Boko Haram. Somente no Iraque, a população cristã passou de 1,5 milhões de pessoas em 2003 para menos de 300 mil em estimativas atuais. A emigração do país e o recebimento dessas pessoas em outros Estados, com status de refugiados, contribuiu para a queda.
Intenção de levar sua religião para novos territórios
Inúmeras invasões territoriais já tiveram como motivo principal ou secundário a crença de que se deveria ensinar sua religião ao maior número de pessoas possível, ou destruir as demais religiões existentes no local. A vinda de jesuítas ao Brasil para a catequização da população indígena pode ser encarada como um exemplo desse tipo de migração.
As cruzadas, ocorridas entre os anos de 1095 e 1291, também poderiam se encaixar nesse caso. Organizadas por potências cristãs europeias, as cruzadas consistiram em deslocamentos para combater o domínio islâmico na Terra Santa e recuperar o poder sobre territórios sagrados, tais como Jerusalém.
Crença de que certo território pertence às pessoas de sua religião
O exemplo mais conhecido dessa espécie de migração tem um nome específico: sionismo. Os judeus integrantes do movimento sionista acreditam que a terra de Jerusalém lhes foi prometida, conforme consta na Torá, seu livro sagrado. Assim, iniciaram um deslocamento em direção a esta terra, que ganhou força em princípios do século XX e especialmente a partir do pós-Segunda Guerra Mundial, momento em que os judeus foram massivamente perseguidos.
Em 1947, a ONU declarou a repartição do então território da Palestina, onde se localiza a cidade de Jerusalém, propondo uma divisão que garantiria 51% do solo aos judeus, formando Israel, e deixando 49% a Palestina, povoada majoritariamente por árabes. Entretanto, os países árabes vizinhos à Palestina não aceitaram o acordo, considerando que prejudicava a população árabe já existente na região. O conflito Israel-Palestina persiste até os dias de hoje, sem solução.
E as peregrinações a locais sagrados? Em geral, como não há intenção de habitar e/ou trabalhar permanente ou temporariamente nesses locais, tais deslocamentos não podem ser chamados propriamente de migração. No entanto, alguns centros de fé atraem milhares de fiéis todos os anos, sendo interessante sua menção. Como exemplos, temos a Meca, cuja religião muçulmana prega a obrigatoriedade da visita ao menos uma vez na vida, as peregrinações de Fátima, de Santiago de Compostela, de Lourdes, entre outros.
Leia mais: Islamismo X Terrorismo
RELIGIÕES DOS MIGRANTES NO MUNDO
Quase metade dos migrantes no mundo são cristãos, cerca de um quarto tem origem muçulmana e o outro quarto se divide entre hindus, budistas, judeus, outras religiões e pessoas não religiosas. Cristãos e muçulmanos são também as maiores populações religiosas no globo em geral, portanto, não surpreende o fato de também constarem entre as maiores populações de migrantes. Alguns grupos tem um peso menor em termos de migração, quando comparado a sua população em geral. Os hindus, por exemplo, são cerca de 10 a 15% da população global, mas representam menos de 5% dos migrantes internacionais.
Em termos de comparação com a população total, os judeus são os religiosos que mais migram: cerca de 25% dos judeus habitam hoje em países diferentes dos que nasceram. Para efeitos de comparação, somente 5% dos cristãos e 4% dos muçulmanos seguem esse padrão.
Os Estados Unidos são o país que mais acolhe migrantes cristãos, enquanto o México é o Estado com maior número de emigrantes cristãos. A Arábia Saudita é o país que mais recebe imigrantes muçulmanos, sendo a maior parte de países vizinhos. Israel é o destino mais procurado por judeus, com destaque para imigrantes provenientes da Rússia. A Índia é a maior origem e destino de migrantes hindus. A China tem o maior número de emigrantes não religiosos do globo, e o segundo maior número de emigrantes budistas (o maior número de emigrantes budistas é proveniente do Vietnã).
INTOLERÂNCIA RELIGIOSA
Independente do fato de terem migrado por motivos relacionados à sua religião ou não, com frequência os migrantes religiosos sofrem perseguições ou discriminações também nos países de acolhida. As restrições governamentais a práticas religiosas e as hostilidades sociais direcionadas a religiosos aumentaram em 2015, conforme pesquisa da Pew Research. As regiões consideradas mais intolerantes nesses dois aspectos foram o Oriente Médio e o norte da África, mas a Europa aparece como uma das regiões que mais aumentou seus níveis de intolerância nos últimos anos, principalmente em relação a muçulmanos e judeus.
França e Rússia tiveram um destaque negativo, com mais de 200 casos de uso de força governamental contra grupos religiosos. Tais números refletem principalmente as leis que visam o exercício público da religião, como a proibição do uso da burca na França ou, na Rússia, o tratamento de alguns muçulmanos e grupos – como Testemunhas de Jeová – como extremistas, prendendo-os sem o devido processo legal.
TENDÊNCIAS GLOBAIS
É preocupante que ataques a mesquitas, discursos de ódio e violência direta contra muçulmanos tenham aumentado em países europeus. Além de atualmente receberem refugiados de países como Síria e Iraque, de maioria muçulmana, estimativas apontam para um aumento da população muçulmana no continente, chegando a cerca de 10% da população total em 2050, caso as tendências atuais de crescimento populacional se mantenham. Se o relacionamento com os imigrantes de diferentes religiões não for modificado, tal postura poderá ocasionar conflitos ainda maiores.
Atividades terroristas relacionadas à religião também tiveram um aumento nos últimos anos: em 2014, 82 países registraram ocorrências do tipo, contra 73 em 2012 e 2013. Em 2014, 60 desses países sofreram com mortes e pessoas feridas por consequência desse terrorismo relacionado a atividades religiosas, um aumento de 20 países se comparado a 2012.
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Fontes: BBC; Brasil Escola UOL ; Fox News; Aid to the Church in Need; Puertas Abiertas; Pew Research Center 1; Pew Research Center 2 ; Pew Research Center 3; Pew Research Center 4 .