O Norte do Brasil é uma região rica em biodiversidade que ocupa lugar de destaque no cenário político e ambiental do país. Apesar disso, muitas vezes é retratada de forma superficial ou estereotipada.
Para entender o cenário político do Norte do Brasil, precisamos nos aprofundar na trajetória política da região, conhecer lideranças regionais e os desafios ambientais e sociais locais.
Neste texto, vamos explorar o perfil político do Norte, analisando desde a formação histórica da região até os principais desafios e perspectivas políticas. Acompanhe o texto para descobrir como essa região, rica em recursos naturais e influências culturais, desempenha um papel essencial no Brasil.
Contextualização: o Norte e suas peculiaridades
A região Norte inclui os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Além disso, é a maior em extensão territorial do Brasil, cobrindo cerca de 45% do território nacional. Porém, essa vasta extensão é habitada por apenas 8% da população brasileira, o que faz com que a densidade demográfica seja uma das mais baixas do país.
O que influenciou a ocupação humana no Norte foi a presença da Floresta Amazônica, pois determinou a forma como as populações indígenas e, posteriormente, os colonos portugueses e estrangeiros, se estabeleceram. Exemplo disso é a existência de comunidades ribeirinhas e seu uso frequente de rios para o transporte de pessoas e/ou cargas.
Aliás, você sabia que mais da metade da Floresta Amazônica está localizada no território brasileiro? Esta é a região que concentra a maior biodiversidade do país.
Desde o período colonial, a região foi explorada de maneira extrativista, com ciclos econômicos que deixaram marcas profundas na sua estrutura social e política.
Historicamente, o Norte se destacou por ser uma fronteira de exploração e desenvolvimento. O ciclo da borracha, que teve seu auge entre o final do século XIX e o início do século XX, foi um dos principais motores da economia local, principalmente nos estados do Amazonas e Pará. A borracha foi o que tornou a região um eixo econômico e colocou o Brasil, ainda que temporariamente, em uma posição de supremacia mundial na produção do látex.
De modo geral, o Norte do Brasil é dono de cinco cidades que possuem conjuntos urbanos tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), sendo considerados agregadores de valores culturais e sociais relevantes para o desenvolvimento do país.
O ciclo da borracha e sua influência política
O ciclo da borracha foi um marco não apenas econômico, mas também político para o Norte do Brasil. Foi durante esse período que a extração do látex, matéria-prima para a produção de borracha, transformou a Amazônia em um dos principais centros econômicos do mundo.
O sucesso econômico trouxe desenvolvimento urbano e modernização para cidades como Manaus, que chegaram a ser descritas como “a Paris dos trópicos” devido a sua infraestrutura de luxo, como o Teatro Amazonas e a instalação de bondes elétricos e serviços públicos avançados para a época.
No entanto, a ascensão econômica durante o ciclo da borracha também gerou uma desigualdade notável. Enquanto uma pequena elite se beneficiava da exploração do látex, a maioria da população local, composta por seringueiros, indígenas e migrantes pobres, vivia em condições precárias.
O declínio do ciclo da borracha, após a introdução de seringueiras na Ásia pelos britânicos, levou a um colapso econômico na região, mas os impactos políticos desse período ainda são sentidos. A elite política que emergiu durante o ciclo manteve uma forte influência sobre a política local, o que, em muitos casos, resultou em políticas públicas que favoreciam o extrativismo e o latifúndio, ao invés da preservação ambiental ou da justiça social.
Histórico político do Norte: a formação de líderes e movimentos
Com a instauração do regime militar em 1964, o Norte passou a ter maior visibilidade no cenário nacional, em parte devido à estratégia do governo de explorar os recursos naturais da Amazônia para impulsionar a economia nacional.
Políticos como Jarbas Passarinho e Alacid Nunes, ambos do Pará, surgiram como líderes influentes durante esse período, sendo responsáveis por implementar políticas que favoreciam a integração da Amazônia ao restante do Brasil, por meio de grandes projetos de infraestrutura, como a construção da rodovia Transamazônica.
No entanto, esse período de integração forçada teve um custo elevado para as populações indígenas e tradicionais da região. A abertura de estradas, a expansão da fronteira agrícola e a concessão de terras públicas para empresas privadas resultaram em conflitos de terra, desmatamento e violência contra povos indígenas.
Apesar das críticas, a construção da rodovia Transamazônica abriu novas rotas comerciais e facilitou o acesso de comunidades remotas aos grandes centros urbanos, trazendo consigo oportunidades de emprego e desenvolvimento econômico para áreas historicamente isoladas.
Esse cenário deu origem a importantes movimentos de resistência, sendo o mais emblemático o liderado por Chico Mendes, seringueiro e ambientalista do Acre, que lutou contra o desmatamento e a exploração predatória dos recursos naturais.
Chico Mendes se tornou uma figura internacionalmente conhecida por sua defesa dos direitos das populações tradicionais e pela preservação da Amazônia. Seu assassinato, em 1988, trouxe à tona a violência sistêmica que permeia os conflitos fundiários na região. Sua morte também resultou no fortalecimento de movimentos sociais na Amazônia, que passaram a desempenhar um papel central no debate político regional e nacional.
Por outro lado, o setor agrícola e mineral também é responsável pela criação de empregos e infraestrutura em áreas historicamente isoladas. A criação de políticas de desenvolvimento sustentável é o que poderia promover um equilíbrio entre o crescimento econômico e a preservação ambiental.
A redemocratização e o cenário político atual
Com a redemocratização do Brasil em 1985, o Norte passou por uma transformação política significativa. A abertura política permitiu que novos líderes surgissem e que movimentos sociais ganhassem maior protagonismo.
Já a política regional continuou marcada por uma forte presença de elites tradicionais e pelo domínio de partidos conservadores, que priorizam muitas vezes os interesses do agronegócio e da mineração.
Nas últimas décadas, a política do Norte tem oscilado entre uma alternância de poder entre líderes conservadores e progressistas. No Acre, por exemplo, a influência de figuras como Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente e defensora da causa ambiental, contrasta com o domínio de políticos ligados ao agronegócio e ao setor madeireiro em outros estados da região.
A ascensão de Jair Bolsonaro à presidência trouxe uma nova dinâmica ao cenário político do Norte. Bolsonaro encontrou forte apoio na região, especialmente entre setores ligados ao agronegócio, à mineração e às igrejas evangélicas. A flexibilização do porte de armas, a regularização de terras invadidas e a defesa da expansão econômica na Amazônia são alguns dos fatores que explicam a popularidade do presidente entre uma parcela significativa da população nortista.
Segundo pesquisa do Ibope (2019), após o primeiro decreto de Bolsonaro flexibilizando porte de armas, revelou que o Sul e o Norte foram as regiões de maior apoio popular à ampliação do acesso a armamentos.
O Norte foi uma das regiões com maior aprovação do governo Bolsonaro, com 41% dos eleitores considerando sua gestão “ótima” ou “boa” em 2022. Esse apoio, no entanto, não é unânime, pois movimentos indígenas, ambientalistas e lideranças progressistas se opõem às políticas de desregulamentação ambiental e expansão do agronegócio, pautas defendidas pelo ex-presidente.
Para muitos produtores e empresários da região, por outro lado, a flexibilização de leis ambientais e a regularização de terras são vistas como passos essenciais para atrair investimentos e melhorar a infraestrutura local, o que poderia, em sua visão, trazer progresso econômico para uma das áreas mais isoladas do país.
O papel da religião na política regional
Outro fator de grande relevância no cenário político do Norte é a influência crescente das igrejas evangélicas. A região é o berço da Assembleia de Deus, uma das maiores denominações evangélicas do Brasil, e o pentecostalismo tem ganhado cada vez mais espaço na política local. Segundo o Datafolha (2020), 39% da população da região Norte se identifica como evangélica, o que faz dessa parcela um grupo de grande peso nas decisões políticas.
Segundo especialistas ouvidos pela BBC, as igrejas evangélicas, especialmente as pentecostais, têm desempenhado um papel importante na construção de uma base de apoio a candidatos políticos. As pautas morais, como a defesa da família tradicional e a oposição ao aborto, são alguns dos pontos que ressoam entre esse eleitorado. Além disso, as igrejas evangélicas têm se mobilizado ativamente em torno de questões sociais, como o combate às drogas e a violência, temas que também influenciam o voto dos nortistas.
Desafios e oportunidades para a política do Norte
A política do Norte do Brasil possui dois grandes desafios: o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e a preservação ambiental, e a inclusão social de suas populações mais vulneráveis.
A região, que abriga a maior floresta tropical do mundo, desempenha um papel central nas discussões globais sobre mudanças climáticas e conservação da biodiversidade, sendo escolhida para sediar a 30ª Conferência sobre Mudanças Climáticas (COP-30), que será realizada em Belém–PA, em novembro de 2025.
No entanto, o desmatamento e a exploração de recursos naturais continuam a avançar e seguem sendo um desafio não apenas para a região, mas para todo o país.
Em termos de desenvolvimento econômico, o Norte enfrenta desafios estruturais, como a falta de infraestrutura, o isolamento de muitas comunidades e a dificuldade de acesso a serviços básicos, como saúde e educação. Esses fatores contribuem para a manutenção de altos índices de pobreza e desigualdade na região, dificultando a plena integração do Norte ao desenvolvimento econômico do restante do país.
O Norte do Brasil é uma região de contrastes profundos, tanto em termos sociais, quanto políticos. Enquanto enfrenta desafios significativos, como o desmatamento e os conflitos fundiários, também é uma região de oportunidades e de grande relevância no contexto.
Essas análises mostram que a política no Norte é influenciada por uma combinação de fatores históricos, econômicos, sociais e culturais. A exploração da natureza, a disputa pelo território e as discussões acerca do clima transformam a política da região em um debate profundo e complexo.
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Referências
- BBC News Brasil – Por que Norte é região que mais aprova Bolsonaro
- Gov.Br – Tradições, cultura e ciclos marcam a história do Norte do Brasil
- Câmara Legislativa – Confira os deputados eleitos na Região Norte
- Thalita de Oliveira Casadei – Ocupação e povoamento do Norte do Brasil
- Veja – História política do Brasil Republicano – Região Norte