A extrema direita em diversos países tem utilizado discursos que se apresentam radicais e que podem pôr em xeque o Estado Democrático de Direito e as suas instituições políticas formais, sendo caracterizado o neofascismo.
A dificuldade de caracterizar esses discursos tanto é para os analistas políticos como para o resto dos leitores. O que é o neofascismo? Onde surgiu? Como ele tem se manifestado pelo mundo afora?. A Politize! vai te explicar essa ideologia em seis pontos.
1. Características do Neofascismo
O neofascismo é uma ideologia política recente e o seu surgimento é uma versão contemporânea à ideologia do fascismo que teve sua ascensão na primeira metade do século XX.
Sobre o fascimo original, sabe-se que é aquele que está diretamente ligado ao fascimo italiano de Mussolini e ao nazi-fascismo alemão de Hitler. Por outro lado, o neofascimo é referido a movimentos políticos e ideológicos que têm aproximações com as características do fascismo originário, contudo, com adaptações às realidades político-sociais contemporâneas.
As características são:
- Autoritarismo;
- Intolerância
- Militarismo;
- Nacionalismo extremo;
- Culto à personalidade do líder.
A ideologia neofascista está normalmente relacionada a supremacia ético-racial, uma rejeição aos direitos individuais e a democracia liberal, e, sobretudo, se mostram ser adversários da esquerda, minorias raciais e ao movimento feminista.
A sua manifestação pode se apresentar de diversas formas, sendo elas: partidos políticos, grupos paramilitares e até mesmo indivíduos da sociedade civil que espalham as suas ideias. Assim, essa ideologia apresenta preocupações sociais com significância em relação a direitos humanos, à estabilidade social e à democracia.
2. Pontos de encontro e diferenças entre o fascismo e o neofascismo
Em todas essas ideologias, mesmo com suas proximidades, há substantiva diferença entre elas que valem ser ressaltadas para que se compreenda o neofascismo como uma ideologia à parte do fascismo original.
Veja também nosso vídeo sobre o que é fascismo!
Contexto de surgimento dessas ideologias
O fascismo original surgiu na Europa, mas especificamente no período entre guerras nas décadas de 1920 e 1930 em um panorama de instabilidade econômica, política e social em que a Itália e a Alemanha se encontravam após a Primeira Guerra Mundial.
Por outro lado, o neofascismo tem o seu surgimento no pós-Guerra Fria, porém com um contexto de problemas e questões políticas, sociais e econômicas distintas.
A forma em que esse tipo de governo se apresenta
O fascismo original, aquele da primeira metade do século XX, tem por característica de possuir a forma de regimes autoritários, em que há a presença na figura de um líder carismático, assim como Mussolini foi na Itália e Hitler na Alemanha.
O neofascismo pode se apresentar de outras maneiras, que também inclui o aparecimento de líderes autoritários, como também se apresentar na forma de movimentos políticos, grupos extremistas ou ideologias que podem ser pregadas através das redes sociais.
Apesar de haver algumas similaridades que aproximam essas ideologias, como o autoritarismo, existem questões dentro de suas respectivas crenças e ideais que as diferem.
O fascimo original tem profundas e fortes aderências ao corporativismo como forma de ação governamental.
O neofascismo possui no campo da ação questões como a prevalência das ideias de anti-globalização e forte oposição à imigração.
Formas de se comunicar
Com o advento da tecnologia que hoje há disponível, o neofascismo faz uso dela como forma de disseminar suas ideias e cooptar seguidores de maneira que não estava disponível no tempo histórico do fascimo original, em que a sua divulgação acontecia em âmbito mais localizado e mais difícil de ser difundido.
Dessa forma, o neofascimo pode ser influenciado por tendências e eventos de políticas globais, como a ascensão de governos populistas, crescente polarização política e aparecimento de líderes autoritários de diferentes partes do mundo.
O que pode ocasionar diferentes vertentes e adaptações do neofascismo por conta dos contextos políticos e culturais.
3. Neofascismo italiano
Após a queda de Benito Mussolini com o fim da Segunda Guerra Mundial, o Partido Republicano Fascista foi dissolvido em 1945 e oficialmente banido em 1947, dessa maneira o regime fascista abre espaço para a instauração da democracia liberal como a conhecemos hoje.
Contudo, ao longo das décadas que viriam, houve ressurgimentos de movimentos e grupos neofascistas espalhados pela Itália. Podendo apresentar diferentes abordagens e composição, ainda assim compartilham princípios fascistas.
O neofascismo italiano não é de forma alguma rígida e pode variar em sua organização e influência em diversas regiões e momentos históricos.
O partido Fratelli d’Italia (“Irmãos da Itália”), da primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, tem em sua origem política o fascismo e essa é uma das preocupações de italianos mais moderados em torno do movimento sob o pretexto de um não distanciamento de suas origens.
Meloni foi da juventude do Movimento Social Italiano (MSI) na qual em 1994, o então primeiro-ministro Silvio Berlusconi, cooptou políticos neofascistas para dentro da coligação, dessa forma iniciando maior legitimidade dentro da esfera da opinião pública. Como resultado, em 2008 Meloni foi nomeada como ministra do governo e hoje primeira-ministra.
Esse partido tem apresentado propostas que visam a supressão de direitos individuais, como casamento e adoção por casais homoafetivos, assim como uma postura anti-imigração das crises humanitárias que tem acontecido no oeste asiático.
4. Neofascismo estadunidense
A historiadora Tatiana Pogg argumenta que em grupos neofascistas norte-americanos se observa a presença de retóricas que envolvem o racismo, antissemitismo e anticomunismo dentro de seus diversos movimentos ao longo da história, embora esses mesmo elementos não faça necessariamente parte do fascismo, mas sim da história do fascimo estadunidense.
Essas características podem estar diretamente relacionadas a grupos de supremacia brancos, organizações nacionalistas radicais, milícias armadas e, também, a certa ala da extrema-direita estadunidense.
Além de toda retórica que leva elementos de autoritarismo, populismo de direita que são elementos do neofascismo, nos EUA essa mesma ideologia prepondera ações governamentais, como restrição à imigração, ataques aos meios de comunição e as instituições democráticas, e o culto à personalidade em torno de certo líderes políticos.
Donald Trump, ex-presidente republicano estadunidense, reproduziu esses mesmos discursos que visam minar direitos de grupos minoritários, deslegitimar figuras da oposição, dessa maneira uma perseguição política dos que ele via como inimigos internos por vias segundo padrões sociais, ideológicos e raciais.
5. Neofascismo indiano
Dentro do imaginário coletivo supostamente não haveria correlação entre o neofascimo com a extrema direita indiana por não possuir os mesmo contextos como na Europa e na América, mas é nesse campo que o neofascimo atua: nos diversos ambientes e contextos políticos e sociais.
Na Índia, há preocupações com a rápida ascensão do nacionalismo hindu e do supremacismo hindu, que estão em particular relação com o Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS) e ao partido político Bharatiya Janata Party (BJP), que está atualmente no poder.
Algumas das críticas que o governo indiano e esses grupos levam é pela promoção de uma agenda que visa acabar com os valores seculares e pluralistas que foi estabelecido pela constituição indiana, e a discriminação de minorias religiosas, diretamente aos mulçulmanos.
Narendra Modi, Líder do Lok Sabha (“Partido do Povo”) e agora reeleito para o terceiro mandato como primeiro-ministro da índia, possui ao longo do seu governo controversas políticas.
Entre essas ações políticas: a Lei de Emenda da Cidadania (CAA) e o Registro Nacional de Cidadãos (NRC), que sofreram críticas por serem discriminatórias contra mulçulmanos e contrárias aos princípios democráticos e seculares estabelecidos no país.
Além do mais, o que se tem observado na Índia é a erosão das liberdades civis, o uso do nacionalismo como ferramenta de angariar apoio político e o controle massivo da mídia do país.
6. Neofascismo brasileiro
Nos últimos anos reacendeu a discussão sobre o neofascimo no Brasil em função de acontecimentos na política mainstream.
As mídias sociais, os veículos de comunicação, os núcleos de pesquisa das universidades têm deslocado a atenção à ascensão do bolsonarismo. Associado a figura política de Jair Bolsonaro e aos apoiadores, tem por característica promover a retórica nacionalista, autoritária e principalmente anti-esquerda.
As declarações anterior e durante o seu governo, como a defesa da ditadura militar da segunda metade do século XX no Brasil, o apoio à violência policial, o discurso anti-ambientalista, retórica contra minorias e discursos anti-ciência, levam a perceber o neofascismo tanto na retórica como na prática.
Isso levanta preocupações sobre o nível de intolerância crescente e a radicalização de certos segmentos da sociedade civil, que estão sendo alimentados por esses discursos que polarizam a sociedade como um todo.
O que o Brasil e o mundo assistiram durante o governo Bolsonaro os diversos ataques que o mesmo fez contra as instituições democráticas, como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional, minando a separação entre os poderes federativos e que ameaça o Estado de Direito.
Um dos instrumentos utilizados pelo bolsonarismo é o uso da desinformação que é constantemente espalhada através das redes sociais, como Whatsapp e Facebook, como forma de manipulação da opinião pública e comitantemente deslegitimar opositores políticos.
E aí, gostou de entender melhor sobre o neofascimo? Restou alguma dúvida ou quer acrescentar um ponto não discutido? Se sim, deixe nos comentários!
Referências:
- BBC – O Fascismo ainda está vivo na Itália?
- Brasil247 – Neofascismo: um fenômeno planetário – o caso Bolsonaro
- Correio do Povo – Reeleição na potência ascendente
- Diplomatique – Trump e Bolsonaro: ecos da mesma lógica
- Diplomatique – Neofascismo: nova roupagem ou último refúgio do liberalismo?
- Jornal da USP – Neoliberalismo, a base para a emergência do neofascismo
- POGG, Tatiana. FACES DO EXTREMO: Uma análise do neofascismo nos Estados Unidos da América 1970-2010. 2012. 440 f. Tese (Doutorado em Histótia) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2012.
- Politize! – Estado Democrático de Direito: entenda o que é esse termo
- Politize! – Primeira Guerra Mundial: os conflitos europeus tomam o globo
- Politize! – Guerra Fria: a guerra ideológica entre duas potências
- Politize! – Segunda Guerra Mundial: como impactou a história?