A perspectiva geopolítica determina que o comportamento político e as relações de poder entre os Estados podem ser analisados com base no ambiente físico, nos recursos e nas distâncias geográficas. A temática relativa ao gasoduto Nord Stream inclui todos estes pontos, além disso, propõe uma relação complexa entre a Rússia e a União Europeia.
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Apesar do Conselho Europeu estabelecer metas para reduzir drasticamente a emissão dos gases de efeito estufa e alcançar a neutralidade climática até 2050, atualmente, aproximadamente 21% da matriz energética europeia provém do consumo de gás, principalmente, para produção de energia e aquecimento das casas.
Achou interessante e gosta do assunto sobre geopolítica? Saiba que a Rússia tem as maiores reservas de gás natural do mundo e se tornou um grande produtor e exportador na década de 1970, após o desenvolvimento de seus campos de gás na Sibéria. Continue conosco e acompanhe a dinâmica energética por trás do Nord Stream!
O que é o Nord Stream e onde fica localizado?
O Nord Stream é um gasoduto que conecta a Rússia e a Europa via Mar Báltico. Possui 1.224 kms de extensão, com origem na cidade de Viburgo (Vyborg) e alcança o norte da Alemanha, na cidade de Greifswald.
O Nord Stream 2 possui aproximadamente 1.230 kms de extensão e está localizado paralelo ao primeiro – que leva o mesmo nome. Sua origem é em Ust-Luga (Rússia) – e seu destino também é na cidade de Greifswald, na Alemanha. Cada gasoduto tem capacidade de transportar 55 bilhões de metros cúbicos de gás natural por ano.
A construção do Nord Stream teve início em 2010 e foi finalizada em abril de 2012 (considerando as duas linhas do gasoduto). Obteve o apoio público da chanceler alemã Angela Merkel, do presidente russo Medvedev e do primeiro-ministro francês François Fillon.
Atualmente, a Nord Stream AG – empresa que o administra – conta com 5 companhias participantes, sendo a companhia russa Gazprom a responsável pela maior parte – 51%. As outras são: Wintershall Dea (alemã), E.ON (alemã), Gasunie (holandesa) e a ENGIE (francesa).
Já o Nord Stream 2 teve o início de suas obras em maio de 2018 e a conclusão em setembro de 2021. Lembrando que, o Nord Stream 2 não entrou em funcionamento, devido a licença de operação que foi adiada por questões burocráticas e regulamentações europeias, ademais, com a guerra na Ucrânia fica difícil prever se entrará em atividade.
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A queda de fornecimento de gás natural russo e a recente crise energética na Europa
Se tratando de consumo de gás natural, o principal uso se dá para produção de energia e aquecimento das casas. Veja abaixo a distribuição da utilização do gás na União Europeia – dados de 2021.
Em 2020, 43% das importações de gás natural da União Europeia foram provindas da Rússia. Em fevereiro de 2022 (data do início da guerra russo-ucraniana), essa porcentagem era de um pouco mais de 35%. Os últimos números de 2022 apontam que quase 13% das importações de gás da União Europeia têm origem da Rússia.
Uma série de fatores contribuíram para a recente crise energética na Europa, problemas estes que tiveram início ainda em 2021. O tempo extremamente frio e o problema na rede elétrica no Texas (EUA) colaboraram para redução no envio de gás natural liquefeito (GNL) para a Ásia e Europa, onde a demanda pelo produto geralmente aumenta no inverno.
Mais tarde no mesmo ano, as ondas de calor no verão na Europa, Ásia e Estados Unidos, levaram a um aumento na demanda por ar-condicionado, ampliando ainda mais o consumo de energia. A América Latina também enfrentou secas, o que ocasionou em menos energia hidrelétrica produzida para transportar GNL para a Europa.
A produção de energia de matriz renovável, em especial a geração eólica, foi limitada devido a condições de vento abaixo do ideal. A redução da participação da energia eólica na geração de eletricidade fortaleceu a demanda por gás e carvão.
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De forma associada, a implantação de pacotes de estímulo econômico proporcionou uma melhor recuperação econômica e aumento da demanda de energia do setor industrial.
Em 2021, cargas de GNL foram enviadas às economias que estavam se recuperando dos efeitos da pandemia – a China se tornou o maior importador de GNL no início do mesmo ano e, no segundo trimestre, a União Europeia aumentou o consumo de gás em 25%.
O problema da Europa foi agravado pela guerra da Rússia contra a Ucrânia, que contribuiu para pressionar o fornecimento de gás natural russo, que consequentemente, levou a altas taxas de inflação. Líderes da União Europeia – como Ursula Von der Leyen e Charles Michel– já declararam que a Rússia tem usado a política de energia como arma.
Em março de 2022, os 27 líderes da União Europeia decidiram conjuntamente reduzir gradativamente a dependência do bloco por combustíveis fósseis de origem russa, justificado pela invasão russa à Ucrânia e os objetivos estipulados na agenda climática para alcançar a neutralidade até 2050.
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A Declaração de Versalhes, de 11 de março de 2022, traça às estratégias dos chefes de governo e de estado em relação a capacidade de defesa, dependência energética e estruturação sólida da economia. Os líderes obtiveram o entendimento em diminuir progressivamente as importações de gás, petróleo e carvão da Rússia, atuando:
- na redução da dependência de combustíveis fósseis;
- na diversificação de fontes e rotas de energia, inclusive para gás natural liquefeito (GNL) e biogás;
- na aceleração do desenvolvimento de energias renováveis e hidrogênio;
- na melhora das redes de energia da União Europeia;
- no aumento da eficiência energética e na gestão de consumo.
Desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, as importações de gás natural russo pela União Europeia foram reduzidas. Países como Noruega e Argélia aumentaram suas exportações de gás natural por conta da demanda europeia. Também houve aumento das importações de GNL de países como Catar e Nigéria e, principalmente, dos EUA.
Novos contratos de fornecimento de energia têm sido desenvolvidos com novos parceiros comerciais. Confira os exemplos abaixo:
- Os EUA e Canadá têm aumentado o suprimento de gás natural liquefeito;
- Foi firmada a cooperação com o Azerbaijão para aquisição de gás;
- Foi celebrado o memorando de entendimento entre União Europeia, Israel e Egito para abastecimento de gás para o bloco europeu.
A explosão no Nord Stream
Como podemos ver, o aumento intenso do preço da energia elétrica na Europa possui diversos fatores, no entanto, esta elevação de preço é fortemente justificada pelo preço do gás, que devido a sua maior escassez, afetou o preço da produção de eletricidade.
Durante o ano de 2022, a Rússia reduziu o fornecimento de gás para a União Europeia. Em junho, havia cortado 75% do abastecimento; em julho e agosto, o Nord Stream ficou fechado para realizações de manutenções. Em setembro, foram detectadas explosões no Mar Báltico, no local de instalação do gasoduto e vazamentos foram reportados.
O Nord Stream 1 e 2 foram impactados e pesquisas posteriores encontraram restos de explosivos na região, indicando sabotagem – de acordo com investigações preliminares sobre o caso conduzidas pela Suécia.
Há diversas teorias indicando quem foram os autores das explosões: poderiam ter sido ocasionadas por um grupo pró-Ucrânia, mas que não teria vínculo direto com o presidente Volodymyr Zelensky ou oficiais ucranianos. Outra teoria aponta a presença de mergulhadores da marinha americana, informando que estes haviam plantado os explosivos.
Há também relatos que navios russos foram vistos próximos do Nord Stream antes das explosões ocorrerem, o que sugere que a operação tenha sido cumprida pela marinha russa.
Continua sendo difícil confirmar os autores dos atos, o próprio procurador sueco, Mats Ljungqvist, que conduz as investigações afirma que dada as circunstâncias, é difícil confirmar quem cometeu o crime. As autoridades europeias e russas afirmam acerca da importância de encontrar os responsáveis pela explosão.
Conflito de interesses com os Estados Unidos
Os americanos já criticavam a importação do gás russo por parte da Europa, em especial, por parte da Alemanha. Em 2018, durante a cúpula da OTAN em Bruxelas, o ex-presidente Donald Trump afirmou que a Alemanha estava “refém” da Rússia devido a dependência energética dos alemães.
Nos dias atuais, os EUA auxiliaram a União Europeia em sua crise energética. Uma vez que o bloco europeu recebeu menos gás da Rússia e era necessário suprir a demanda energética. A contar do interesse norte americano em apoiar seus aliados e marcar um forte posicionamento contra a invasão russa à Ucrânia.
Antony Blinken (Secretário de Estado dos EUA), informou que os EUA e a União Europeia estão “trabalhando juntos agora para proteger o suprimento de energia da Europa contra choques de oferta, incluindo aqueles que podem resultar de mais agressão russa contra a Ucrânia”.
O gráfico da Comissão Europeia demonstra o aumento das importações de gás natural liquefeito dos EUA para a União Europeia entre os períodos de janeiro de 2021 e novembro de 2022.
Considerando as datas de novembro de 2021 e o mesmo mês de 2022, nota-se que o aumento de GNL para a Europa com origem americana foi de 117,5%, mas com flutuações maiores ao longo do ano de 2022.
No primeiro semestre de 2022, os EUA conquistaram a posição de maior exportador de GNL no mundo, de acordo com a Administração de Informações sobre Energia dos EUA (EIA). Substituindo a Ásia como o principal importador de GNL dos EUA, o Reino Unido e a UE receberam 71% dessas exportações.
Qual a situação do Nord Stream 2 atualmente?
Apesar do anúncio da Gazprom a respeito da conclusão das obras em setembro de 2021, com a explosão dos dutos e a invasão da Rússia à Ucrânia, prosseguir com a operação do Nord Stream 2 parece inviável. Levando em conta que a construção custou aproximadamente 9,5 bilhões de euros.
O Nord Stream 2 foi construído para suprir as necessidades energéticas da Europa, russos e alemães justificaram o projeto por termos econômicos. O projeto tinha como objetivo ajudar a Alemanha a aumentar seu abastecimento reequilibrando as matrizes energéticas, mas a maior parte do gás seria canalizado para Áustria, Itália e países da Europa Central e Oriental.
O raciocínio da Alemanha foi acerca da necessidade de redução do carvão e da energia nuclear para ampliar sua transição energética, usando o gás como fonte de energia até que pudesse gerar ou importar energia renovável.
Os apoiadores do gasoduto argumentaram que este movimento aumentaria a segurança do abastecimento na Europa e apoiaria as metas de emissão de gases do aquecimento global.
Para a Rússia havia o interesse comercial, porque aumentaria as suas vendas de gás natural e garantiria maiores contratos, justificando os grandes investimentos. Por outro lado, prejudicariam países como a Ucrânia, que são trânsito de gasodutos, que deixariam de receber dividendos pela transição do gás.
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Nota-se a estratégia russa em comercializar o seu gás na Europa, conquistando mercado e mantendo sua influência por meio de uma política energética, retirando uma vulnerabilidade e contornando o problema da passagem do gás natural pela Ucrânia. Mesmo com a guerra, parte do gás natural da Europa é transportado via Ucrânia.
A curto ou médio prazo, a operação do Nord Stream 2 provavelmente não ocorrerá, com possibilidade de não ser consolidada a longo prazo.
O chanceler alemão Olaf Scholz anunciou que a certificação de operação do gasoduto fosse suspensa em retaliação à decisão da Rússia de reconhecer independência de regiões separatistas no leste da Ucrânia e à agressão contra a Ucrânia.
E aí, ficou alguma dúvida a respeito do Nord Stream e de sua influência na política energética europeia? Fique à vontade para compartilhar com a gente! Deixe suas dúvidas e opiniões nos comentários!
Referências:
- BBC News – Nord Stream 1: How to Russia is cutting gas supplies to Europe
- BBC News – Rússia corta gás à Europa em meio a guerra e disputa por preços
- Conselho Europeu – Energias Limpas
- CNN Brasil – Procurador sueco destaca dificuldade para determinar quem sabotou o Nord Stream
- Conselho Europeu – Declaração de Versalhes, 10 e 11 de março de 2022
- CNN Brasil – EUA tornam-se o maior exportador mundial de gás natural liquefeito
- Clean Energy Wire – Nord Stream 2 – Symbol of failed German bet on Russian gas
- Deutsche Welle – Nord Stream 2 e a luta pelo poder entre Ocidente e Rússia
- Deutsche Welle – Por que o gás dos EUA não vai resolver a crise na Europa
- Eurodefense Portugal – O gasoduto Nord Stream 2 – A disputa geopolítica na Europa
- European Union Agency for the Cooperation of Energy Regulators – Gas factsheet
- European Council: Infographic – Where does the EU’s gas come from?
- Exame – Vazamento de Nord Stream entre Rússia e Europa foi causado por sabotagem, diz investigação sueca
- Exame – Rússia apoia acusações contra EUA por suposta sabotagem do gasoduto Nord Stream
- European Council – Energy prices and security of supply
- European Institute for Security Studies – Europe’s Energy Crisis Conundrum
- El País – Trump acusa Alemanha de ser “refém” da Rússia
- Euronews – Russian gas flowing through Ukraine can only stop when EU countries stop imports: Naftogaz CEO
- Euronews – Azerbaijão vai fornecer energia à Hungria e Von der Leyen enaltece afastamento russo
- Euronews – Navios russos perto do gasoduto Nord Stream antes das explosões, afirma documentário
- G1- Nova apuração sugere que grupo pró-Ucrânia sabotou gasoduto
- G7- Guerra Ucrânia-Rússia: O que é o gasoduto Nord Stream 2 e como a crise pode afetá-lo?
- Nord Stream AG – Operations
- Parlamento Europeu – The Nord Stream 2 pipeline – Economic, environmental and geopolitical issues
- The Week: Europe’s energy crisis, explained
- UOL – Líder da UE celebra acordo histórico por gás com Egito e Israel
- UOL – Como gás chegará dos EUA à Europa para diminuir dependência da Rússia?
- UOL – Von der Leyen: Rússia usa energia como “arma”, e Europa deve estar preparada