A política de drogas no Brasil vem sendo debatida em múltiplas esferas do poder: tanto o STF, quanto o Senado Federal pautaram propostas diferentes para a Lei de Drogas em vigor no país.
A pauta, entretanto, foi pausada no Supremo Tribunal Federal e segue sem data para retomada do julgamento por um pedido de vista feito pelo ministro Dias Toffoli. Já no Senado, a PEC foi aprovada em primeiro e segundo turno e agora segue para discussão e votação na Câmara dos Deputados.
Quer entender a diferença entre as propostas do Senado e do STF? Como será a tramitação da PEC das Drogas até a sua promulgação? Por que o Congresso está votando uma lei ao mesmo tempo que o STF? Acompanhe este texto da Politize!.
Veja também nosso vídeo sobre a descriminalização das drogas!
Objetivo da PEC das Drogas
A PEC 45/2023, em trâmite no Senado, tem como objetivo criminalizar o porte e a posse de drogas ilícitas, independentemente da quantidade. A autoria é do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente da Casa.
Caso seja aprovada, a PEC deixará explícita na Constituição que não deverá haver tratamento diferenciado a depender da quantidade ou tipo de substância. A proposta é uma resposta dos parlamentares ao Supremo Tribunal Federal (STF), que decidiu pautar a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, em pequena quantidade.
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Como será a tramitação dessa lei
As Propostas de Emenda à Constituição (PECs) têm cinco discussões em plenário antes da deliberação em primeiro turno. Após esses debates, há mais duas sessões de discussões para ser votada em segundo turno. Para ser aprovada, a proposta deve ter, no mínimo, dois terços de aprovação dos senadores, o que computa 54 votos, após dois turnos de votação.
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Em março de 2024, a proposta foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em votação simbólica e só teve quatro votos contrários, atribuídos pelos senadores: Humberto Costa (PT-PE), Fabiano Contarato (PT-ES), Marcelo Castro (MDB-PI) e Jaques Wagner (PT-BA).
O passo seguinte do rito regimental foi iniciar a discussão no Plenário, entre os senadores, durante cinco sessões em primeiro turno para, em seguida, passar por outro debate antes de ser votado em segundo turno.
Em abril de 2024, foi realizada a quinta sessão de discussão referente ao primeiro turno e, além dessas sessões, ficou decidido que seria realizado um debate temático sobre a PEC.
Sessões de debates temáticos cumprem o objetivo de tratar de algum tema relevante de interesse nacional previamente fixado. Nesse sentido, no dia 15 de abril de 2024, os senadores ouviram especialistas sobre o tema durante o debate temático.
Foram convidados para a sessão temática nomes como: o médico Drauzio Varella e a presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Silvia Souza. Somente após este processo, a PEC foi encaminhada para votação em primeiro turno.
Em seguida, após votação em primeiro turno, os senadores podem aprovar a quebra de interstício, ou seja, a revogação do prazo regimental. Isto implicaria na realização de duas sessões de debate em plenário para o segundo turno, obrigatórias para deliberação para emendas constitucionais. Caso isto ocorra, os parlamentares poderão encerrar a votação e votar a PEC no mesmo dia.
No dia 16 de abril de 2024, senadores aprovaram em primeiro e segundo turno, a PEC que criminaliza a posse e o porte de drogas ilícitas, não importa a quantidade.
De acordo com o regimento interno, deve haver um intervalo mínimo de três sessões plenárias entre um turno e outro, entretanto, os senadores concordaram em votar o segundo turno na mesma sessão.
Após aprovação do Senado, o texto segue para a Câmara dos Deputados, onde será discutido e passará também por comissões temáticas, antes de ser analisada em plenário da Casa.
Sendo aprovada pela Câmara, sem alteração na redação, a PEC poderá ser promulgada e seu texto passará a valer. Caso haja algum ajuste na redação, a pauta voltará para o Senado.
O texto só será promulgado quando as duas Casas Legislativas aprovarem a mesma redação.
Caso a PEC seja aprovada antes do fim do julgamento no Supremo, a Corte deverá incluir o texto do Congresso em sua análise. Entretanto, a proposta também poderá ser questionada judicialmente no STF.
Como foi a votação no Senado?
Ao todo, foram 53 votos favoráveis e 9 votos contrários à PEC no primeiro turno. Já no segundo turno, o saldo da votação foi de 52 a favor e 9 contra.
Para ser aprovado, eram necessários pelo menos 49 votos favoráveis.
Veja como votou cada partido no primeiro turno:
PARTIDOS | SIM | NÃO | AUSENTE |
PSD | 10 | – | 5 |
PL | 10 | – | 2 |
MDB | 5 | 3 | 3 |
PT | – | 6 | 2 |
UNIÃO | 6 | – | 1 |
PODEMOS | 4 | – | 3 |
PP | 6 | – | – |
PSB | 4 | – | 1 |
REPUBLICANOS | 4 | – | – |
PDT | 1 | – | 1 |
Sem Partido | – | – | 1 |
PSDB | 1 | – | – |
NOVO | 1 | – | – |
Veja como votou cada partido no segundo turno:
PARTIDOS | SIM | NÃO | AUSENTE |
PSD | 10 | – | 6 |
PL | 10 | – | 2 |
MDB | 5 | 3 | 3 |
PT | – | 6 | 2 |
UNIÃO | 6 | – | 1 |
PODEMOS | 4 | – | 3 |
PP | 6 | – | – |
PSB | 4 | – | 1 |
REPUBLICANOS | 4 | – | – |
PDT | 1 | – | 1 |
Sem Partido | – | – | 1 |
PSDB | 1 | – | – |
NOVO | 1 | – | – |
A tramitação no Senado durou quase um mês, já que a rodada de debates iniciou em 17 de março.
Por que o Congresso está votando a PEC das Drogas?
O Senado pretende fazer pressão no STF, pois acreditam que, se a PEC for aprovada pelo Congresso Nacional, o Supremo terá que rever o objeto central de seu julgamento sobre o porte de maconha.
O parlamento também acredita que, ao explicitar na Constituição, a criminalização do consumo e do tráfico, acabará também o debate da flexibilização de penas para usuários.
Nesse sentido, Pacheco acredita que a PEC seja necessária para definir as consequências jurídicas de ambas condutas, discordando que o Supremo deva debater este tema. Segundo ele, cabe ao Parlamento decidir o que é crime e o que não é.
Qual a diferença das opiniões do STF e do Congresso?
O senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), iniciou a votação no Senado Federal após o STF iniciar a votação pela descriminalização da maconha para uso pessoal.
A discussão sobre a Lei de Drogas que acontece no STF, interrompida em março, tem 5 votos favoráveis à descriminalização e 3 votos contrários. A dificuldade de haver consenso na Corte acontece porque há divergências quanto aos critérios objetivos de definição da quantidade que distingue traficante de usuários, além da definição de consequências jurídicas para o consumo.
A motivação do Supremo veio da ação da Defensoria Pública de São Paulo a respeito do caso de Francisco Benedito de Souza que, em 2010, foi flagrado com três gramas de maconha e foi, portanto, condenado à prestação de serviços comunitários. A Defensoria Pública alegou que esse tipo de condenação fere o princípio constitucional e da vida privada.
Por este motivo, o STF iniciou a discussão, ainda em 2015, sobre a constitucionalidade ou não do trecho da Lei de Drogas (o artigo 28 da Lei 11.343, de 2006), que criminaliza o porte e a posse para uso pessoal, e propôs a definição da quantidade que define quem é usuário e quem é traficante.
Por outro lado, senadores acreditam que este tema não cabe ao STF, por isso, debatem a PEC que defende o oposto à proposta do STF: defendem a criminalização do porte de drogas em qualquer quantidade e acreditam que esta seja uma questão de saúde e segurança pública.
Leia mais: Você sabe o que é uma PEC?
Há uma pequena parcela de senadores que discorda da PEC 45/2023, pois defendem o papel do STF no julgamento da pauta e não querem a inclusão do assunto na Constituição.
Qual é a atual Lei de Drogas?
A Lei de Drogas, Lei nº 11.343/2006, trouxe mudanças para a política de drogas no Brasil. Esta legislação determina que é crime adquirir, guardar e transportar drogas para consumo pessoal, entretanto, não pune a prática com prisão. A Lei determina penas alternativas, como advertência, prestação de serviços comunitários e frequência em cursos educativos.
O problema visto nesta lei, é que ela não define a quantidade que distingue traficante e usuário, o que deixa a avaliação com critérios subjetivos. Nestes termos, fica sob a responsabilidade do juiz do caso, definir se a droga é para consumo pessoal ou para tráfico. Os critérios para isto são:
- Quantidade de droga;
- Natureza da droga;
- Condições que ocorreu a apreensão;
- Circunstâncias sociais e pessoais;
- Conduta do acusado;
- Antecedentes do envolvido.
Veja o que diz o artigo 28 da Lei 11.343:
“Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I – advertência sobre os efeitos das drogas;
II – prestação de serviços à comunidade;
III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.”
Opiniões sobre a PEC das Drogas
A proposta do Senado vai na contramão da política de drogas adotada tanto no Brasil, como em outros países que têm investido em: redução de danos, assistência social e integração comunitária, além de guiar-se pelos direitos humanos.
Essas experiências vivenciadas por outros países fez com que a Organização das Nações Unidas (ONU) reconhecesse os impactos negativos das abordagens repressivas, como o encarceramento em massa da população, a letalidade policial ou o agravamento dos problemas de saúde pública.
A proposta de mudança do Senado foi alvo de críticas de entidades de defesa dos direitos humanos, que têm classificado a PEC como um “retrocesso inacreditável” e inconstitucional. Em carta enviada a Pacheco, o ex-presidente da Comissão Arns (Comissão de Defesa dos Direitos Humanos D. Paulo Evaristo Arns) e ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, dizia que:
“Se aprovada, a ‘PEC dos Usuários’, o Senado Federal passará a mensagem de que pessoas que usam drogas não merecem ser tratadas com políticas públicas de saúde, educação e assistência social, mas sim com punição e encarceramento.”
Além disso, entidades e organizações da sociedade civil, acreditam que o texto, além de inconstitucional, também reforça o racismo estrutural. Aqueles que são contrários à PEC, destacam que a proposta ignora pesquisas científicas produzidas até então,insere na Constituição uma política que infringe direitos fundamentais e reforça desigualdades sociais.
De acordo com o relator da PEC, senador Efraim Filho (União-PB), a aprovação do texto está de acordo com o que pensa e defende a opinião pública. Segundo o parlamentar, a descriminalização das drogas oferece danos à saúde pública e também à segurança pública.
“Um tema que é extremamente importante para a sociedade brasileira, para a família brasileira. O tema das drogas tem inserção na saúde pública e na segurança pública. Ele afeta a vida das famílias. O Senado está preocupado com isso, já teve uma votação na CCJ, e dará a palavra final na terça-feira com a votação da PEC. Esperamos um quórum amplo e uma sólida maioria a favor do texto”, foi o que declarou o relator durante o Plenário.
Além disso, durante a discussão do texto na CCJ, Efraim Filho afirmou que a PEC é uma resposta do Senado ao STF, pois:
“Essa PEC foi discutida várias vezes em reunião de líderes da casa. Era um posicionamento que precisava ficar muito forte, uma vez que o foro adequado para debater o tema é aqui, o parlamento. A PEC encontra respaldo em sintonia com o que pensa a sociedade brasileira”, afirmou o senador em Plenário.
E aí, conseguiu entender o que propõe a PEC das Drogas? Deixe sua opinião nos comentários!
Referências:
- Infomoney – Senado deve votar PEC das Drogas, em 1º turno, em sessão na terça-feira
- G1 – Senado vota nesta semana PEC que criminaliza porte de qualquer quantidade de droga
- Diário de Pernambuco – Senado aprova sessão temática e atrasa deliberação sobre PEC das Drogas
- Poder 360 – Congresso analisa vetos e Senado vota PEC das Drogas nesta semana
- Mídia Ninja – Movimentos antiproibicionistas se mobilizam contra PEC das Drogas proposta por Pacheco
- Brasil de Fato – Organizações protestam nesta segunda (15) contra PEC que criminaliza usuário de drogas
- CNN Brasil – Senado deve iniciar votação da PEC das Drogas nesta terça
- UOL – Senado aprova PEC das Drogas em resposta ao STF