O Plano Collor, lançado em 1990, foi uma tentativa de conter a hiperinflação que assolava o Brasil, por meio de medidas drásticas como o confisco da poupança e o congelamento de preços. O plano também tinha a proposta de reduzir a intervenção estatal e abrir a economia, mas seus efeitos foram temporários e geraram forte recessão.
Continue a leitura para entender o que foi o Plano Collor, seu contexto histórico, seus objetivos, as principais medidas adotadas e os impactos que contribuíram para mudanças na política econômica brasileira nos anos seguintes.
Contexto histórico
Nos anos que antecederam a implementação do Plano Collor, o Brasil enfrentava uma crise econômica profunda, caracterizada por inflação crescente e instabilidade política.
Durante a década de 1980, o país conviveu com uma inflação elevada, que se tornou hiperinflação a partir de 1989, quando os preços passaram a subir de forma descontrolada, tornando a vida cotidiana insustentável. No final da década, a inflação ultrapassou 1.000% ao ano, e, no início de 1990, antes do Plano Collor, atingiu 82,39% ao mês.
O governo de José Sarney, que liderou a transição democrática após o regime militar, tentou controlar a inflação por meio de planos heterodoxos, como o Plano Cruzado (1986), o Plano Bresser (1987) e o Plano Verão (1989). Embora o Plano Cruzado tenha reduzido a inflação temporariamente, nenhum deles conseguiu estabilizar a economia no longo prazo.
A hiperinflação descontrolada gerou instabilidade econômica e social, corroendo o poder de compra da população e minando a confiança no sistema financeiro. Diante desse cenário, cresceu a pressão por mudanças econômicas.
Collor chegou ao poder prometendo um combate firme à inflação, associado a uma agenda de modernização econômica e redução do peso do Estado, além de um forte discurso contra a corrupção e os privilégios no setor público.
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Mas afinal, o que foi o Plano Collor?
O Plano Collor foi um conjunto de medidas econômicas adotadas pelo governo de Fernando Collor de Mello, lançado em março de 1990, com o objetivo de combater essa hiperinflação e estabilizar a economia brasileira.
Ele foi implementado em um contexto de grande instabilidade econômica, marcada pelo déficit público e crise no sistema financeiro.
A hiperinflação, que corroía o poder de compra da população e desestabilizava a economia, era vista como um ciclo vicioso alimentado pela grande quantidade de dinheiro em circulação. O confisco das poupanças, uma medida impopular e controversa, era justificado pela necessidade de reduzir a demanda por bens e serviços, controlando a inflação.
Para os defensores do Plano Collor, as medidas, apesar de seus impactos sociais, eram um mal necessário para evitar um colapso ainda maior. Argumentavam que a hiperinflação, se não fosse controlada, levaria à desvalorização completa da moeda, à paralisação da economia e à perda total do poder de compra da população.
Além disso, sustentavam que o plano criaria as bases para uma economia mais estável e aberta ao mercado global, o que poderia aumentar a eficiência da indústria nacional e atrair investimentos estrangeiros.
Defensores do Plano Collor
Pode-se mencionar como uma das defensoras do plano, a ministra da Economia Zélia Cardoso de Mello, que adotou políticas de choque para reduzir a liquidez da economia, sem seguir uma orientação estritamente liberal.
O economista Antônio Kandir, que mais tarde se tornaria ministro do Planejamento no governo FHC, defendia a necessidade de uma política fiscal rígida para conter o déficit público, mas não teve papel central na formulação do plano.
Já Ibrahim Eris, presidente do Banco Central na época, foi um dos principais responsáveis pela execução do confisco das poupanças, uma das medidas mais controversas do pacote econômico.
O plano recebeu apoio de setores empresariais, que viam no congelamento de preços e na abertura comercial uma oportunidade de aumentar sua competitividade. Em março de 1990, a base política de Collor incluía os partidos PFL, PDS, PTB e PL, que apoiavam suas reformas econômicas.
O confisco, nesse contexto, era visto como um “choque” necessário para “limpar” o sistema financeiro, reduzir a quantidade de dinheiro em circulação e dar início a um novo ciclo de estabilidade econômica.
Críticos do Plano Collor
Os principais opositores ao Plano Collor incluíram partidos de esquerda, sindicatos e movimentos sociais, que criticava fortemente o confisco das poupanças, argumentando que essa medida, além de injusta, não era essencial para o combate à inflação.
Para eles, o problema da hiperinflação era resultado de uma série de fatores, como a desorganização do sistema financeiro, o déficit público e a falta de controle dos gastos governamentais.
Os opositores ao Plano Collor defendiam que outras medidas, como o controle de gastos públicos, a redução da dívida pública e a implementação de políticas de renda mínima para proteger os mais vulneráveis, poderiam ter sido mais eficazes no combate à inflação, sem gerar um impacto tão negativo na vida da população.
Entre os críticos estavam sindicatos trabahistas como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), partidos de esquerda como o Partido dos Trabalhadores (PT) e Partido Democrático Trabalhista (PDT).
O PMDB, por sua vez, tinha parlamentares críticos ao plano, mas também lideranças que apoiaram medidas econômicas de ajuste. O partido era um dos maiores da época e possuía uma base política diversificada, variando entre oposição moderada e apoio estratégico ao governo em determinados momentos.
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Objetivos do Plano Collor
Os principais objetivos do Plano Collor eram:
1. Combater a hiperinflação: O plano visava estabilizar os preços e controlar a inflação, que havia alcançado níveis alarmantes, através de medidas drásticas, como o confisco das poupanças, a redução dos gastos públicos e a desindexação da economia.
2. Promover a libertação econômica: O governo buscava abrir a economia brasileira, reduzindo a intervenção estatal e estimulando a competição no mercado. Os economistas liberais, que apoiavam o Plano Collor, argumentavam que a intervenção estatal na economia, com protecionismo e subsídios, gerava distorções no mercado, incentivava a inflação e impedia o crescimento econômico.
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A abertura, nesse contexto, era vista como um passo fundamental para a reestruturação da economia, com foco na redução do papel do Estado e na liberalização do mercado. Enquanto a oposição defendia um processo gradual e equilibrado, com medidas de proteção para as empresas nacionais e para os trabalhadores. Argumentavam que a abertura abrupta, sem mecanismos de proteção, poderia levar ao fechamento de empresas, ao aumento do desemprego e à perda de competitividade da indústria nacional.
3. Reestruturar o sistema financeiro: O plano pretendia modernizar o sistema bancário e financeiro, aumentando a eficiência e a transparência.
4. Estabilizar a economia: o governo almejava criar as condições necessárias para um crescimento econômico sustentável
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Quais foram as medidas do Plano Collor?
O plano foi divido em: Plano Collor I (16 de março de 1990 a 30 de janeiro de 1991), Plano Collor II (31 de janeiro de 1991 a 9 de maio de 1991) e Plano Marcílio (10 de maio de 1991 a 26 de fevereiro de 1994).
Plano Collor I
O programa econômico anunciado em 16/3/1990, dia seguinte à posse de Fernando Collor de Mello na presidência da República, tinha o nome oficial de Plano Brasil Novo. A medida decisiva do Plano Collor foi o bloqueio da liquidez da maior parte dos haveres financeiros, com exceção do papel-moeda por meio da Medida Provisória 168, 15/3/1990, depois Lei nº 8.024, 12/4/1990.
As principais características são:
- A troca da moeda brasileira de cruzado-novo para cruzeiro, mas sem corte de zero; os cruzados-novos bloqueados poderiam ser usados por 60 dias para pagamento de impostos, taxas, contribuições e obrigações previdenciárias e por 180 dias podiam ser transferidos entre pessoas físicas e jurídicas;
- Confisco ou congelamento de 80% do valor que excedesse 50 mil cruzeiros da poupança dos brasileiros com juros de 6% ao ano mais correção monetária, e seriam liberados em 12 parcelas mensais depois de 18 meses; esse confisco gerou grande revolta popular, pois afetou diretamente o poder de compras;
- Criação do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) com pagamento de 8%;
- Processo de abertura comercial e redução de subsídios estatais, visando aumentar a competitividade da economia. No entanto, essa transição foi abrupta e afetou diversas empresas que não conseguiram se adaptar à concorrência externa;
- Congelamento de preços e salários por 45 dias afetou diversos setores como o de alimentos (redução da produção e escassez de alguns alimentos), industrial (redução de produção e do investimento) e serviços(redução da qualidade dos serviços e à perda da competitividade);
- Quanto às privatizações, apesar do anúncio de um plano para vender 68 estatais, apenas 18 foram efetivamente privatizadas ao longo de seu governo e dos governos seguintes, incluindo a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) e a Embraer.
Apesar de ter reduzido a inflação no curto prazo (de 82,4% em março para 7,6% em maio de 1990, o que ainda era uma taxa elevada), o Plano Collor I não conseguiu manter essa estabilidade no longo prazo. Além disso, o pacote econômico foi extremamente impopular, principalmente devido ao chamado ‘confisco’ de parte do valor depositado na poupança dos brasileiros
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Plano Collor II
Com a inflação mensal já ultrapassando os 20%, o Plano Collor II foi lançado em janeiro de 1991. Entre suas medidas, estavam novos congelamentos de preços e o fim das operações de overnight (prática de aplicação financeira de curtíssimo prazo), que foram substituídas por mecanismos como o Fundo de Aplicações Financeiras (FAF) e a Taxa de Referência de Juros (TRJ).
Além disso, foi criada a Taxa de Referência de Juros (TRJ) para regular as taxas no mercado financeiro, e houve aumento de tarifas públicas, como energia, transporte ferroviário e serviços dos Correios. O plano também restringiu saques em aplicações financeiras, limitando retiradas de overnight, CDBs e fundos a R$ 6.125 (NCz$ 25 mil) ou 20% do saldo total, prevalecendo o maior valor.
Nas primeiras cinco semanas do Plano Collor II, a taxa de juros caiu temporariamente, e o governo ainda conseguiu vender títulos públicos, embora com custos elevados. O plano também buscou estabilizar a taxa de câmbio, sem afetar drasticamente as exportações.
Além disso, parte da dívida dos estados foi absorvida por meio de uma forte expansão monetária em fevereiro. No curto prazo, o congelamento de preços e os reajustes salariais interromperam a queda do nível de atividade econômica. Ainda assim, a inflação voltou a subir em maio, evidenciando a fragilidade das medidas adotadas.
Plano Marcílio
Em maio de 1991, diante do fracasso do Plano Collor II (com a inflação mensal em 7,4%), Zélia Cardoso de Mello foi substituída por Marcílio Marques Moreira no Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento. Sua gestão implementou um conjunto de medidas conhecido como Plano Marcílio, caracterizado por uma política econômica mais ortodoxa, com alta taxa de juros para conter a inflação e atrair capital estrangeiro, além de um rigoroso ajuste fiscal.
Apesar dessas medidas, a inflação permaneceu elevada, e os efeitos sobre o crescimento econômico foram limitados. O governo também negociou um empréstimo de US$ 2 bilhões com o Fundo Monetário Internacional (FMI), condicionado a cortes de gastos públicos e ajustes na política econômica.
O Plano Marcílio não teve credibilidade junto ao mercado e à população, que já estavam frustrados com os fracassos dos planos anteriores e os impactos negativos das medidas econômicas.
Apesar da tentativa de controle fiscal e da política monetária mais rígida, os juros elevados contribuíram para a recessão econômica, aprofundando o desemprego e a crise industrial, que já vinham se agravando desde o Plano Collor I.
Embora tenha sido o menos intervencionista dos três planos, suas medidas tiveram impacto limitado no combate à inflação, que permaneceu elevada. Em 1993, a inflação voltou a subir rapidamente, chegando a 48% ao mês em junho de 1994, pouco antes da implementação do Plano Real, que finalmente estabilizou a economia brasileira.
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Consequências do Plano Collor
As consequências do Plano Collor foram profundas e duradouras. Embora tenha reduzido a inflação no curto prazo, as medidas adotadas não foram sustentáveis e contribuíram para a recessão econômica. O confisco das poupanças gerou grande insatisfação popular, enquanto a recessão levou ao aumento do desemprego e à desaceleração da indústria. Além disso, denúncias de corrupção contra o governo minaram ainda mais seu apoio político.
A oposição ao plano defendia alternativas como maior controle dos gastos governamentais, uma reforma tributária progressiva, com maior tributação sobre a renda e o patrimônio e menor carga sobre o consumo, além da criação de políticas de renda mínima para proteger os mais vulneráveis da inflação.
Também havia propostas de incentivo à indústria nacional, por meio de investimentos em pesquisa e desenvolvimento, incentivos fiscais e qualificação profissional, visando fortalecer a competitividade no mercado global.
A crise econômica, aliada às denúncias de corrupção e à insatisfação popular, gerou um clima de instabilidade política, culminando no impeachment do presidente Collor em 1992.
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Resultados do Plano Collor
A experiência do Plano Collor demonstrou os riscos de políticas econômicas de choque, evidenciando a necessidade de equilíbrio entre o controle da inflação e a minimização dos impactos sociais. Embora tenha reduzido a inflação de mais de 80% ao mês para menos de 8% em maio de 1990, esse efeito foi temporário, e a economia entrou em recessão.
O plano deixou um legado negativo para a economia, a política e a sociedade brasileira, devido à recessão, ao confisco da poupança e à perda de credibilidade do governo. No entanto, a falha das tentativas anteriores de estabilização reforçou a necessidade de uma estratégia mais estruturada, o que influenciou o desenvolvimento do Plano Real, implementado em 1994, que finalmente conseguiu estabilizar a moeda e controlar a inflação.
O Plano Collor foi um capítulo marcante na história econômica do Brasil, refletindo os desafios e as complexidades de combater a hiperinflação.
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Referências
- ANDRADA, AFS. Quem, afinal, apoiou o Plano Collor?
- Atlas Histórico do Brasil – Plano Collor
- BBC News Brasil – Entre infartos, falências e suicídios: como foi o confisco da poupança no governo Collor, há mais de 30 anos
- Brasil Escola – Governo Collor
- Brasil Escola – Plano Collor
- CARVALHO, CE. O fracasso do Plano Collor: erros de execução ou de concepção?
- CARVALHO, C. E. O Plano Collor no debate econômico brasileiro. Pesquisa & Debate Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política, [S. l.], v. 11, n. 1(17), 2012. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/rpe/article/view/1199
- CASARÕES. G.S.P. A economia politica do Governo Collor: discutindo a visibilidade de governos minoritarios sob o presidencialismo de coalização. Dissertação de mestrado da Universidade de São Paulo, 2008. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-20032009-154749/publico/GUILHERME_STOLLE_PAIXAO_CASAROES.pdf
- Fundação Perseu Abramo – Conjura e tática
- História do Mundo – Plano Collor
- Investidor Sardinha – Plano Collor: o que foi, medidas e o que aconteceu com o dinheiro?
- KONZEN, G. C. F. Uma análise econômica do governo Collor de 1990 até o seu impeachment. Repositório Internacional UNISC. Dsiponível em :https://repositorio.unisc.br/jspui/bitstream/11624/2856/1/Gislaine%20Cristina%20Ferreira%20Konzen.pdf
- Mais retorno – Plano Collor: saiba o que é e como funciona
- Mundo Educação – Plano Collor
- O globo – Privatizações ganharam força a partir dos anos 90
- PEREIRA, L.C.B. O GOVERNO COLLOR E A MODERNIDADE EM TEMPOS INCERTOS. NOVOS ESTUDOS Nº 29 – MARÇO DE 1991. Disponível em: https://eaesp.fgv.br/sites/eaesp.fgv.br/files/pesquisa-eaesp-files/arquivos/bresser_-_o_governo_collor_e_a_modernidade_em_tempos_incertos.pdf
- Quero bolsa – O que foi o Plano Collor? Veja resumo
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