A cultura corresponde ao conjunto de tradições, crenças e costumes de um determinado grupo humano. No entanto, um país como o Brasil possui inúmeras variações culturais. Para evitar que somente a cultura de uma parte da população se torne hegemônica, o Estado estabelece políticas voltadas ao setor. Estas medidas visam garantir o direito à cultura por meio de políticas culturais.
Entre estas iniciativa está o Plano Nacional de Cultura (PNC). Ele constitui um instrumento fundamental para a elaboração de políticas públicas que valorizem, reconheçam, promovam e preservem a diversidade cultural do Brasil. Neste texto, a Politize! vai te explicar o que é o Plano Nacional de Cultura e qual é a sua relevância para o cenário cultural brasileiro.
Garantindo o direito à cultura: o que é o PNC?
O PNC foi criado pela Lei nº 12.343 de 2010. Ele constitui um conjunto de princípios, objetivos, diretrizes, estratégias, ações e metas que orientam o poder público na formulação e implementação de políticas culturais. O PNC foi criado para que o Estado cumprisse com o que foi estipulado pelo Artigo 215 da Constituição Federal.
O texto prevê que o Estado deve garantir o direito à cultura a todos os brasileiros. Deve ser assegurado a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional. Cabe ao Estado também apoiar e incentivar a valorização das manifestações culturais dos povos que fizeram parte da história brasileira. Em síntese, portanto, trata-se de entender a política cultural como um direito dos cidadãos e um dever do Estado.
Importante destacar que a desigualdade de acesso à cultura já foi assunto de redação do ENEM. Em 2019, a temática da prova era “Democratização do acesso ao cinema no Brasil“. Dentre os textos orientadores fornecidos estavam estatísticas evidenciando a problemática. Em inúmeras cidades do interior do país não havia sequer uma sala de cinema. Ou seja, o Estado brasileiro vem sendo negligente na garantia do direito à cultura por meio de políticas culturais.
O objetivo do PNC, portanto, é orientar o desenvolvimento de programas, projetos e ações culturais que garantam a valorização, o reconhecimento, a promoção e a preservação da diversidade cultural existente no Brasil.
Criado para ser o “guia” das políticas culturais no Brasil, o PNC foi elaborado após a realização de fóruns, seminários e consultas públicas com a sociedade civil. A partir de 2005 o Plano esteve sob a sopervisão do Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC).
Como implementar as políticas culturais? As metas do PNC
O PNC instituído em 2010 previa ações e diretrizes até 2020, quando seus resultados seriam avaliados. No entanto, diante do cenário pandêmico, uma Medida Provisória (MP) estendeu sua duração em dois anos. Pelo novo prazo, o plano vigoraria até 2022. Porém, uma nova MP aumentou o prazo para quatorze anos de vigência do plano. Assim, o PNC atingirá o seu prazo no final de 2024.
Diante do término do período estipulado, o plano será discutido na IV Conferência Nacional de Cultura. Nesta conferência, especialistas e autoridades do setor avaliarão as políticas culturais adotadas entre 2010 e 2024. Do balanço realizado será discutido um novo PNC para os próximos 14 anos.
O PNC possui metas abrangentes – e um pouco vagas – em sete temáticas:
1. Economia da Cultura:
- Fortalecer a economia da cultura como um setor estratégico de desenvolvimento nacional.
- Gerar renda e trabalho para os agentes culturais.
- Ampliar o acesso a bens e serviços culturais.
2. Educação e Capacitação:
- Promover a educação e a formação em cultura em todos os níveis de ensino.
- Qualificar os profissionais da cultura.
- Estimular a pesquisa e a produção de conhecimento sobre a cultura.
3. Informação e Dados Culturais:
- Democratizar o acesso à informação e aos dados sobre a cultura.
- Criar e fortalecer sistemas de informação cultural.
- Monitorar e avaliar as políticas públicas de cultura.
4. Acesso, Difusão e Criação:
- Ampliar o acesso à cultura para todos os brasileiros.
- Democratizar os espaços e equipamentos culturais.
- Promover a diversidade cultural e a interculturalidade.
- Incentivar a criação artística e cultural.
5. Gestão Pública da Cultura:
- Fortalecer a gestão pública da cultura em todos os níveis de governo.
- Promover a descentralização das políticas culturais.
- Estimular a participação social na gestão da cultura.
6. Direito Autoral e Conexões:
- Protege os direitos autorais e conexões.
- Estimular a criação e a produção cultural.
- Promover a justiça social e cultural.
7. Diversidade Cultural:
- Valorizar a diversidade cultural brasileira
- Combater a discriminação e o racismo.
- Promover o respeito à diferença.
Críticos do Plano dizem que ele estabelece metas demasiado amplas e vagas e que algumas delas beiram a inconstitucionalidade. As metas dentro da temática “Educação e Capacitação” sustentam que o Estado deve promover a formação em cultura em todos os níveis de ensino e qualificar os profissionais da cultura. No entanto, para críticos do Plano, o Estado não pode atribuir a si o dever de fazer algo que dependa da vontade subjetiva dos indivíduos.
Participação social e direito à cultura
A participação social é um pilar fundamental do PNC. A sociedade civil organizada, por meio de seus diversos segmentos, tem o direito de participar da formulação, implementação e avaliação das políticas públicas de cultura.
O direito à cultura é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal. Ele garante a todos os brasileiros o acesso à cultura, à produção e à frutificação de bens e serviços culturais.
Porém, críticos do Plano argumentam que o seu trâmite esteve marcado pela baixa participação popular. O PNC teria resultado de poucas consultas populares e, quando tramitou pelo Congresso Nacional, seu texto foi aprovado com unanimidade e sem deliberações. Vale questionar, portanto, se esta aparente “unanimidade” de 2010 não seria também uma forma de indiferença por parte da classe política.
Falar em políticas culturais no Brasil constitui, portanto, uma tarefa árdua devido a certo desinteresse do poder público. Embora conste como direito constitucional, talvez a preocupação com o direito à cultura não seja tão relevante para agentes públicos.
Cenário atual do PNC: os desafios da implementação de políticas culturais
O PNC está em vigor desde 2010 e vem orientando as políticas públicas de cultura em todo o país. No entanto, o cenário atual apresenta inúmeros desafios para garantir o direito à cultura.
O primeiro deles diz respeito à desvalorização do setor. Em 2019, por exemplo, o Ministério da Cultura foi rebaixado ao status de Secretaria da Cultura junto ao Ministério da Cidadania. Em decorrência, o setor passou a receber menos recursos para financiar políticas e eventos culturais.
Este rebaixamento reflete outro desafio que o PNC enfrentou: a ausência de uma política cultural de Estado imune às mudanças de governo e às divergências político-partidárias. Aliás, muitas das metas estipuladas pelo PNC não foram atingidas devido à falta de coordenação e articulação de políticas culturais por parte das diferentes esferas de governo. Nem sempre prefeitos, governadores e presidente concordam a respeito das políticas culturais a serem implementadas.
Outro obstáculo para a implementação do PNC diz respeito à ausência de espaços de debates sobre políticas culturais em Estados e municípios para além dos eventos festivos tradicionais. Isso significa que as diferentes esferas do Estado brasileiro precisam, antes, fortalecer e ampliar a participação cidadã nas gestões culturais.
Avanços obtidos com o PNC: políticas culturais de valorização da diversidade
Embora tenha estipulado metas demasiado vagas e não tenha especificado as atribuições específicas dos diferentes níveis governamentais, o PNC contribuiu para uma melhoria nas políticas de valorização cultural. Exemplo destes avanços foram os inúmeros Patrimônios Culturais Materiais e Imateriais reconhecidos e tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Nas últimas décadas, o órgão federal rompeu com um histórico de tombamento de edificações ligadas ao passado colonial luso-brasileiro ou com as elites dos períodos monárquico e republicano.
Atualmente, o IPHAN reconhece como patrimônios inúmeras edificações e práticas imateriais de povos indígenas e da população afrobrasileira. Exemplo destas ações foi o tombamento da Pintura Corporal Kusiwa e do Samba de Roda do Recôncavo Baiano como patrimônios imateriais.
Leia também: Secretaria da Cultura: qual a sua função?
Ao reconhecê-los, o IPHAN cumpre com o que está estabelecido pelo Artigo 216º da Constituição Federal de 1988. Segundo ele, “constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”. Estas iniciativas vem colaborando para o reconhecimento do Brasil enquanto um país diversificado em termos étnicos e culturais.
Afinal de contas, reconhecer e valorizar a cultura de todos os povos que fizeram parte da formação histórica do Brasil é um pressuposto para a consolidação de uma sociedade ainda mais plural e democrática.
Agora que você sabe o que é o Plano Nacional de Cultura, reflita e compartilhe com a Politize! Você identifica políticas públicas já instituídas no setor cultural do seu município e Estado? Que tipo de políticas culturais você considera que devem estar presentes no novo plano nacional a ser discutido? Quais os obstáculos que o Estado brasileiro pode vir a enfrentar para garantir o acesso à cultura a todos os brasileiros?
Referências
Início
https://www.scielo.br/j/ep/a/ygwvBJdsZHrqw3CngwGMPfJ
https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/plano-nacional-de-cultura/texto/o-que-e-o-pnc
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12343.htm