Em um país marcado pela desigualdade de gênero, o Partido da Mulher Brasileira (PMB) se afirma como uma voz em defesa dos direitos das mulheres. Fundado em 2008 e registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2015, o PMB se propôs a “garantir maior representação das mulheres no congresso e na sociedade, buscando promover mudanças progressistas no Brasil”.
Ao longo dos anos, o PMB passou por algumas crises internas relacionadas a disputas de poder e divergências ideológicas. Apesar das adversidades, o partido continua sendo um ator político, com participação em eleições nacionais, estaduais e municipais, tendo à frente a presidente maranhense Suêd Haidar.
Nesse artigo, a Politize! explora qual o contexto de surgimento, a trajetória política e a atuação atual na política do PMB.
A origem do PMB
O PMB foi fundado pela nordestina e militante social Suêd Haidar, que construiu uma trajetória política de base, já tendo sido filiada ao PDT – participando da sua criação em 1979 -, e ao PCdoB, onde se lançou como pré-candidata ao Senado. Ela conta que sua candidatura não foi formalizada, tendo sido usada apenas para que o partido tivesse tempo de televisão.
De acordo com Suêd, esse acontecimento foi o que a motivou a criar o Partido da Mulher Brasileira, a 35º legenda registrada no país e a única a ser fundada por uma mulher. Ele foi criado em 2008, mas obteve registro do TSE apenas em setembro de 2015, adotando o número eleitoral 35.
Em entrevistas, Suêd já contou que, na sua infância, nos anos 1960, quando tinha entre 9 e 10 anos de idade, trabalhava numa pedreira com o irmão mais velho. Mesmo quebrando a mesma quantidade de pedras, ela ganhava menos que ele e essa diferença de pagamento a revoltava.
As bandeiras levantadas por ela, logo que fundou o PMB, podem ter sido motivadas também pela sua história de vida. Posicionava-se contra a desigualdade salarial em relação aos homens, que exercem a mesma função no mercado de trabalho, por uma maior participação feminina na política e pelo combate à violência doméstica.
De acordo com Suêd, o PMB não é feminista, é feminino. A legalização do aborto e a inclusão das discussões de gênero nos planos educacionais, por exemplo, não são, nem pretendem ser pautas do partido.
“Essa questão da violência contra mulher não pode ser discutida numa sala de aula com crianças de 10 anos de idade.”, declarou Suêd.
No site do PMB, esses são os três principais posicionamentos elencados:
- Um Estado simples, leve e eficiente;
- Fim dos privilégios e das mordomias com o dinheiro público;
- Um Brasil com mais oportunidades e conectado ao mundo.
Crises e contradições do partido
Falta de representatividade feminina
“Eu, como homem, tenho o prazer de estar neste partido, para lutar pelos direitos sociais de todas as pessoas que vivem nesta terra, principalmente as mulheres. O que seria de nós, homens, se não fosse uma mulher ao nosso lado, para nos trazer alegria e prazer?”, disse o senador Hélio José (DF), em 2015.
Desde sua origem, o PMB é marcado por controvérsias entre seu nome e sua postura ideológica. A ideia do partido era aumentar a participação das mulheres nas instituições políticas. O estatuto da legenda estabelecia que 70% dos cargos de direção da sigla fossem ocupados por mulheres, mas a maioria de seus filiados e líderes sempre foram homens.
O PMB passou por diversas mudanças ideológicas. Inicialmente, o partido defendia pautas como a igualdade de direitos entre homens e mulheres, o fim da violência doméstica e a participação feminina na política. Depois, se aproximou de grupos religiosos e conservadores, abandonando muitas de suas pautas em prol das mulheres.
Em 2015, dos 22 parlamentares filiados ao PMB, apenas dois eram mulheres, deputadas federais. O partido foi usado muitas vezes como “barriga de aluguel” por parlamentares que abandonaram as agremiações pelas quais se elegeram para se filiar ao PMB e depois buscar um terceiro partido.
Em 2017, o deputado Weliton Prado (MG), que havia sido eleito pelo PT e migrado para o PMB, se desligou do partido e, assim, a agremiação ficou sem representantes no Congresso, quadro que se mantém até hoje.
Já em 2018, a legenda foi a que mais registrou candidatas para as eleições daquele ano (39,4% do total de seus quadros). Nesse mesmo ano, o partido não conseguiu eleger nenhum deputado federal – o que o fez perder direito ao Fundo Partidário – e apenas uma deputada estadual.
Em 2020, as candidaturas do PMB para as prefeituras tinham 14 mulheres e 49 homens. E, nas últimas eleições, apenas 20% dos candidatos do partido eram mulheres.
Em 2022, os partidos de esquerda e de centro-esquerda foram os que mais investiram em lançar mulheres ao pleito. Entretanto, apenas sete (UP, PCdoB, PSTU, PSOL, PT, PCB e PV) alcançaram um percentual superior a 36% nas candidaturas femininas. Já as siglas que apresentaram o menor percentual de candidaturas femininas foram PRTB, Agir, Novo, PMB (31,48%), DC, PTB, Avante e PL.
Prestação de contas
Ao longo de sua trajetória, em termos eleitorais, o PMB nunca teve um grande desempenho. Enfrentou diversos desafios, como a baixa representatividade nas eleições e a dificuldade em obter financiamento. Para atrair nomes, a legenda teria prometido o repasse de 50% do dinheiro do fundo partidário para os diretórios regionais, que seriam comandados pelos parlamentares.
Maria do Socorro Braga, pesquisadora em comportamento político da Fapesp e professora da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), conta que parte do crescimento de legendas pequenas como o PMB se deve às coligações.
Sem as coligações, os partidos não poderão mais se aproveitar do chamado voto proporcional, quando o voto em um candidato ajudava a eleger o candidato de outra legenda. Com a mudança, a tendência é que parte desses partidos desapareça por não ter o desempenho esperado.
Sem contar nas falhas das prestações de contas ao TSE. Seis diretórios nacionais de partidos (PL, Novo, PCdoB, PCB, PMB e PSTU) comprovaram menos de 10% dos seus gastos do ano eleitoral de 2022. Eles apresentaram documentos que representam uma parcela muito pequena daquilo que dizem ter gasto.
O levantamento foi feito em agosto de 2023 pelo Movimento Transparência Partidária. As siglas podem ser punidas com a devolução dos recursos irregulares e receber uma multa de até 20% sobre esse valor considerado irregular. Há ainda a possibilidade de suspensão do recebimento do fundo partidário por até 12 meses, dependendo da gravidade da irregularidade nas contas.
Polêmicas envolvendo o PMB
O PMB já foi palco de diversas crises internas, principalmente por causa de disputas de poder e divergências ideológicas. O partido também já teve algumas figuras polêmicas filiadas ao partido:
- Cristiane Brasil, ex-deputada federal, filha de Roberto Jefferson, ex-deputado federal pelo PTB;
- Hélio José, ex-senador, também chamado de Hélio Gambiarra, que, em 2010, foi acusado de abusar sexualmente da própria sobrinha menor de idade. Ele negou a acusação, a denúncia foi rejeitada pela Justiça, mas o Ministério Público ainda recorre;
- Jerônimo Guimarães Filho, o ex-vereador Jerominho, foi candidato do PMB à prefeitura do Rio de Janeiro, em 2020. Jerominho foi preso de 2007 a 2018, acusado de comandar a maior milícia carioca.
Em 2024, juízes do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC) julgaram a representação ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral e determinaram, por unanimidade, a suspensão do registro do diretório estadual do PMB devido à não prestação de contas relativas às eleições de 2020.
Com essa decisão, além da suspensão do registro, o órgão partidário fica impedido de receber recursos financeiros do diretório nacional do PMB, oriundos do Fundo Partidário (FP) e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).
De Haddad a Bolsonaro: evolução eleitoral e ideológica do PMB
Em 2015, no seu início, o PMB tinha como principal quadro político o senador Major Olímpio (PSL), um dos principais nomes do bolsonarismo em São Paulo. Ele se desfiliou do PMB em 2016 por não ter sido indicado para a diretoria estadual do partido.
Em 2018, o PMB não lançou candidato próprio à presidência, nem incentivou o voto formalmente em nenhum nome na primeira parte da disputa. Mas, no segundo turno, declarou apoio à candidatura de Fernando Haddad (PT), que foi derrotado por Bolsonaro (PSL) com 55% dos votos.
Desde então, começaram de fato as transformações dentro do partido. Em abril de 2021, a legenda anunciou a mudança de Partido da Mulher Brasileira para Brasil 35. Na época, Suêd Haidar, negou que seria para agradar Bolsonaro, embora tenha confirmado negociações entre o partido e o então presidente do Brasil, na época.
O ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, chegou a se filiar ao Brasil 35, adotando o mote “nem esquerda, nem centrão: conservador” para falar sobre o partido. A bandeira em destaque na cerimônia de filiação não era a do Brasil, mas a do Império, utilizada antes da proclamação da República.
Quando o projeto de Bolsonaro, de criar seu próprio partido, o Aliança Pelo Brasil, começou a ir por água abaixo, o presidente e sua base procuraram uma agremiação já existente. O PMB chegou a ser sondado como alternativa, pois era um dos menores do Brasil, sem representação no Congresso, nem governadores ou prefeitos de capitais.
Em março de 2022, o partido tentou mudar o nome apenas para Brasil, mas foi rejeitado pelo TSE, sob a justificativa de que poderia gerar confusão e induzir o eleitorado ao erro. Em maio do mesmo ano, entrou com novo pedido de mudança na Justiça Eleitoral, agora para se chamar Por Mais Brasil. Mas ainda sem sucesso.
Conclusão
O PMB é um partido com uma história marcada por contradições. Apesar de ter sido fundado para defender os direitos das mulheres brasileiras, recebe muitas criticas dos movimentos de mulheres e ainda é um partido de maioria masculina.
Essa discrepância entre o nome do partido e sua postura ideológica, gera críticas e questionamentos sobre o verdadeiro compromisso do PMB com a causa das mulheres e sua falta de representatividade.
“As mulheres são a metade da população brasileira, mas ainda não ocupam o lugar que merecem na sociedade. O PMB luta para mudar essa realidade.”, disse Suêd Haidar, presidente e fundadora do PMB.
Até hoje, quase 10 anos desde o registro do PMB, o partido pretende mudar a centralidade de sua política de inclusão das mulheres para uma política de uma legenda mais conservadora, como indica a mudança de nome para Brasil 35.
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Referências:
- Agência Pública – Partido da Mulher Brasileira não levanta a bandeira feminista
- Brasil de Fato – Mulheres na política: número de filiadas é expressivo, mas não se traduz em candidatas
- Carta Capital – A que veio o Partido da Mulher Brasileira?
- Correio Braziliense – Partido da Mulher Brasileira é reativado no interior de Minas Gerais
- Época – “Não somos feministas”, diz a presidente do Partido da Mulher Brasileira
- Estadão – Partidos gastam mais do que comprovam para a Justiça Eleitoral; veja quais são eles
- Gazeta do Povo – Como o ex-Partido da Mulher abandonou o progressismo, virou conservador e atraiu Weintraub
- Gênero e Número – Partido com maior proporção de mulheres candidatas, PMB ainda não reconhece protagonismo feminino
- Jornal Opção – Não pode ser normal homem presidir o Partido da Mulher Brasileira
- Metrópoles – Partido da Mulher Brasileira tenta, de novo, mudar de nome
- Plural – Partido da Mulher Brasileira tem mais de 70% de homens na disputa para Câmara
- PMB – Coragem para fazer
- Senado – Partido da Mulher tem mais homens e é antiaborto
- TRE-SC determina a suspensão do registro do diretório estadual do Partido da Mulher Brasileira (PMB)
- TSE – Por Mais Brasil
- TSE – Registro do Partido da Mulher Brasileira
- Uol – Partido da Mulher Brasileira tem líderes homens e miliciano como candidato
- Uol – Saiba quais partidos têm mais candidaturas de mulheres; esquerda lidera