Já falamos aqui no Politize! sobre o impacto dos resíduos sólidos no meio ambiente. Pensando nisso, foi instituída a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), uma Lei Federal (12.305/2010) que dispõe sobre os princípios, objetivos e instrumentos para alcançar o correto gerenciamento de resíduos. Saiba agora como funciona essa lei e como o país está cuidando dos seus resíduos!
Metas e planejamento… no papel somente!
Dentre as medidas que a PNRS almeja alcançar, estão as seguintes diretrizes:
- A erradicação dos lixões e destinação final de resíduos em aterros sanitários até 2014 (o prazo não foi atendido, estuda-se uma prorrogação até 2021);
- Estabelecer novos instrumentos no gerenciamento de resíduos, como a gestão integrada de resíduos, a logística reversa e a responsabilidade compartilhada do gerenciamento;
- Instituir os planos nacional, estaduais, municipais e locais de gestão integrada de resíduos sólidos;
- Ordem de prioridade de geração de resíduos em:
- não geração
- redução
- reutilização
- reciclagem
- tratamento
- disposição final ambientalmente adequada.
Ou seja, tanto as políticas públicas quanto as nossa atitudes diárias devem seguir esta ordem de produção de resíduos. O melhor é não gerar, mas caso gerarmos, reduzir ao máximo a quantidade de resíduos, e assim por diante).
No papel faz sentido, mas as coisas estão caminhando mesmo?
A Política Nacional de Resíduos Sólidos mostra pontos importantes que, se respeitados, trarão grandes avanços para o setor de resíduos sólidos no Brasil. No entanto, falta efetivar um plano nacional com ações práticas, já que a política em si dá apenas diretrizes para a elaboração deste. Cláudia Lins, consultora ambiental da Confederação Nacional dos Municípios afirma que um dos principais empecilhos para se obter resultados significativos é a falta de um planejamento com metas locais, assim os estados e municípios poderiam se espelhar e contribuir localmente para alcançar os objetivos estipulados nacionalmente pela PNRS.
O Relatório de Avaliação por Área de Gestão (nº 9) de Resíduos Sólidos do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU), lançado ao final de 2017, destaca diversas evidências de que os resultados pós PNRS não foram eficientes:
- A ausência da institucionalização do Plano Nacional de Resíduos Sólidos.
- A falta de ajuda, principalmente em recursos financeiros, do Ministério do Meio Ambiente (MMA), aos estados, municípios e consórcios para elaboração dos planos locais de resíduos sólidos.
- A versão atual do Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão de Resíduos dos Sólidos (SINIR) não contêm informações suficientes e atualizadas para auxiliar na formulação dos planos conforme decreto regulamentador da PNRS (Decreto 7404/2010).
- As deficiências na ações de incentivo a formação de consórcios de manejos de resíduos sólidos, devido a desavenças políticas entre gestores da cidade, dificuldade de acerto quanto ao rateio das despesas entre as cidades e formalização de acordos nas câmaras municipais, entre outros.
- O baixo aproveitamento nas capacitações oferecidas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), como exemplo do curso “Orientações para elaboração de Plano Simplificado de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos”. Até 2016 foram 4900 inscritos, mas somente 1264 (26%) concluíram o curso.
- A ausência de clareza sobre o real papel do Ministério das Cidades na efetivação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Há uma alta transversalidade entre as diversas instituições do governo na aplicabilidade da PNRS, muitas vezes não ficando claro a verdadeira função de cada setor.
- Incentivo financeiro insuficiente pelo Ministério das Cidades para medidas estruturais (obras) e estruturantes(apoio técnico, político ou gerencial). Além disso, há uma concentração do dinheiro fornecido à construção de galpões, para separação e armazenamento de material reciclagem, e unidades de transbordo, esquecendo de muitas outras obras necessárias para se encerrar os lixões.
Há algumas divergências entre os diversos setores e os catadores de resíduos, por exemplo. Setores com grande geração de resíduos, como os de medicamentos e eletroeletrônicos, ainda não praticam a logística reversa, política em que fabricantes e distribuidores se responsabilizam pela coleta dos resíduos. Outro ponto importante – muito esquecido pelas autoridades públicas – é o planejamento para reduzir, recuperar e reciclar os resíduos sólidos. Existem políticas públicas que incentivam a destinação correta deles, mas poderiam ser pensadas políticas para incentivar a não geração e a redução dos resíduos.
Como dito anteriormente, além do Plano Nacional, os municípios têm que produzir os seus próprios planos municipais, com a finalidade de ajudar o país a alcançar as metas estabelecidas na PNRS. Sendo assim, os municípios estão correndo para estabelecer bons programas de gerenciamento com a finalidade de se tornarem sustentáveis e mais eficientes, focando principalmente na reciclagem de resíduos sólidos urbanos. No entanto, além dos instrumentos de punições aos infratores, é de suma importância capacitar e educar a sociedade. Sem educação ambiental e valorização de cada ação do gerenciamento, o objetivo dificilmente será alcançado.
Os desafios na coleta seletiva de resíduos sólidos
Ainda há diversos entraves para o avanço da coleta seletiva nas cidades. Os principais desafios são:
- Valor da própria coleta de R$389,46 por tonelada de resíduo, quatro vezes mais do que os R$95,00 da coleta convencional, segundo dados de 2016 do CEMPRE – Compromisso Empresarial para Reciclagem.
- Tributação: produtos reciclados podem ser tributados mais de duas vezes, como matéria primária, matéria secundária ou ainda no transporte para aterros e descartes.
- Baixa Produção: os materiais reciclados não contam com uma indústria profissionalizada. E, também, as cooperativas de reciclagem não conseguem atender a demanda.
- Efetivação da PNRS: aplicar o disposto na Política Nacional de Resíduos Sólidos implica na elaboração do plano com metas e diretrizes, regulação e fiscalização para cumprimento das legislações municipais, estaduais e federal.
- Fatores comerciais externos: a queda do valor de algumas matérias primas fazem com que os materiais reciclados tenham o mesmo valor de materiais novos. Um exemplo foi a grande queda do valor do barril de petróleo de 2011 a 2016, barateando o plástico.
- Pouca ação do poder público: faltam incentivos fiscais e subsídios para a utilização de matéria reciclada.
- Falta de padronização: há normas que padronizam os materiais recicláveis. No entanto, elas não são respeitadas no país.
- Falta de consciência por parte da sociedade tanto para separar e destinar corretamente, quanto para consumo de produtos ambientalmente sustentáveis.
O avanço de políticas públicas voltadas para estes problemas é fundamental para solucionar o entrave da reciclagem.
Quer entender mais sobre consumo consciente? Confira o conteúdo do Projeto Direito ao Desenvolvimento: Consumo Consciente, Produção Sustentável: o caminho para o ODS 12!
Mas a reciclagem é importante só para o meio ambiente?
A reciclagem é um instrumento importantíssimo na Política Nacional de Resíduos Sólidos não só na esfera ambiental, mas também por exercer um impacto social e econômico. A Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) lançou, em 2017, o Panorama dos Resíduos Sólidos em 2016, documento que faz uma avaliação dos resíduos sólidos no Brasil. Ele destaca que foram produzidas 78,3 milhões de toneladas de resíduos sólidos, com queda de 2% em comparação ao panorama de 2015. Esta queda não se deve a uma melhor gestão dos resíduos, mas sim a uma queda de consumo devido à crise econômica, segundo a própria Abrelpe.
Portanto, não aconteceram avanços significativos no setor da reciclagem para estes resíduos. A avaliação da própria Abrelpe diz que dos 3.878 municípios que apresentam iniciativas, quase a totalidade deles não tem programas que garantam a total eficiência dos projetos, sendo iniciativas limitadas e parciais. Muitos desses projetos ainda estão sendo implantados, com recursos limitados.
Na parte econômica, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Máquina e Equipamentos (Abimaq), a economia brasileira perde cerca de R$ 120 bilhões por ano pela má destinação de resíduos sólidos que poderiam ser reciclados.. Pensando socialmente, isto acarretaria na geração de milhares de empregos. Ou seja, o tripé da sustentabilidade é contemplado, tanto ambientalmente, quanto econômica e socialmente.
Então, por que os planos e projetos necessários não são efetivados ou implementados?
E como o resto do mundo lida com resíduos sólidos?
O enfoque em muitos países desenvolvidos é a não geração dos resíduos! A nossa política ambiental fundamenta um plano para a destinação adequada para aterros sanitários, para substituir os lixões a céu aberto. Na contramão disso, os países na Europa querem extinguir os aterros sanitários, focar na logística reversa e proibir a construção de novos aterros sanitários – já que a taxa de reciclagem é alta, os aterros tornaram-se desnecessários.
Na Europa, a média de reciclagem dos resíduos sólidos é superior a 50% e movimenta um mercado de 1% do PIB da União Europeia. Os principais expoentes na reciclagem – Alemanha, Áustria, Países Baixos, Suécia e Bélgica – destinam menos de 5% dos seus resíduos para aterros sanitários. O que alavanca esses percentuais são as seguintes práticas:
- incentivos e subsídios para quem estiver em conformidade ou utilizar matéria prima de reciclados no seu processo industrial;
- alta consciência da população;
- políticas severas, na esfera penal, para quem não estiver de acordo com a legislação.
Leia mais: Meio ambiente e os municípios: os principais desafios
Então, há uma luz no fim túnel, certo?
Claro! O Brasil tem um corpo técnico qualificado para efetivação da Política Nacional Resíduos Sólidos, agentes da sociedade civil engajados com a problemática e ainda possibilidades econômicas interessantes para o crescimento da indústria de reciclagem. Como levantado anteriormente, falta efetivar um planejamento, com metas de curto, médio e longo prazo, desde as esferas municipais, ou de consórcios, até a esfera nacional. Falta também consumar dois dos pontos de grande destaque da política: a responsabilidade compartilhada e a logística reversa. Seria necessário, além disso, obrigar os grandes geradores da iniciativa privada a arcarem com os resíduos produzidos e se responsabilizem pela destinação ambientalmente adequada, ou seja, reciclagem e tratamento, em vez de superlotar os nossos aterros – ou pior, os lixões ainda existentes.
Não vamos ficar esperando somente que ação venha do setor público, você pode ser o agente da mudança!
No próximo texto vamos abordar iniciativas populares que mudaram a gestão dos resíduos sólidos! Seja por valorização dos coletores de lixo, pela melhoria da coleta seletiva, pela conexão dos geradores com os coletores e muito mais.
E aí, conseguiu entender o como o Brasil lida com a PNRS? Compartilhe, opine e, qualquer dúvida, deixe um comentário aqui pra gente!
Aviso: mande um e-mail para contato@politize.com.br se os anúncios do portal estão te atrapalhando na experiência de educação política. 🙂
Referências do texto: confira aqui onde encontramos dados e informações!
Política Nacional de Resíduos Sólidos
Regulamento Técnico para o Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde
Guia do Estudante – O problemas dos lixões no Brasil
Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos
O Tempo – Brasil perde 120 bilhões por ano ao não reciclar lixo
Abralatas – Reciclagem do Brasil em números
G1 – Lei que dá destino a embalagens e resíduos industrializados não pegou