Esse texto é de autoria da Agenda Pública, especialista em aprimoramento de serviços públicos e que há mais de 10 anos combina esforços de governos, iniciativa privada e sociedade civil para fortalecer equipes, instituições e territórios, ampliando capacidades, oportunidades e bem-estar para o desenvolvimento sustentável e inclusivo.
Confira os demais textos da trilha sobre serviços públicos:
1. Aprimoramento dos serviços públicos: uma agenda para o Brasil
2. O que são serviços públicos?
3. Como os serviços públicos são financiados?
4. Prestação indireta de serviços públicos: mais com menos
5. Investimento social privado: o que é e o que tem a ver com gestão pública?
6. Como funcionam os serviços de proteção social no Brasil?
7. Qual o papel do Estado no desenvolvimento da economia?
8. Participação social: o que todos podem fazer pelo aprimoramento dos serviços públicos?
No texto “Como os serviços públicos são financiados”, afirmamos que os recursos públicos são finitos. Isso significa que, por mais que haja interesse, a administração pública, sozinha, encontra dificuldades para atender satisfatoriamente todas as demandas sociais.
Quando levamos em consideração as dimensões continentais do território brasileiro, cuja distribuição de recursos é desigual regional e interestadualmente, a dificuldade de conciliar a demanda por serviços públicos com a capacidade de financiamento dos governos, por vezes, é bastante crítica.
Dessa forma, para que as condições mínimas de oferta e acesso a serviços públicos sejam asseguradas à população, muitas vezes, o poder público adota como estratégia a transferência da gestão dos serviços públicos para particulares. Pode acontecer, por exemplo, via parcerias-público-privadas, mediante parceria com organizações da sociedade civil e também por meio de três dispositivos (concessão, permissão e autorização), que já comentamos no primeiro texto da nossa trilha.
Todas as modalidades citadas são exemplos de prestação indireta dos serviços públicos, ou seja, quando a administração pública transfere a execução, mas não a titularidade, do serviço público.
Atuação conjunta com o terceiro setor
O poder público pode celebrar contrato tanto com a iniciativa privada quanto com entidades sem fins lucrativos para a prestação de determinados serviços públicos. São os ditos serviços delegáveis ou impróprios, cuja responsabilidade não é exclusiva do Estado.
Nesse caso, a transferência da gestão de serviços públicos acontece mediante a celebração de um contrato de gestão, firmado entre a administração pública e uma Organização Social (OS). As OSs, cuja atuação é disciplinada pela Lei nº 9.637/98, são entidades privadas, sem fins lucrativos, qualificadas pela administração pública para realizar atividades socialmente relevantes, dirigidas ao ensino, à pesquisa, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à saúde e à cultura.
Dessa forma, o financiamento dos serviços públicos permanece sob responsabilidade do Estado, mas sua provisão é transferida a essas entidades, que assumem o papel de gerenciamento dessas atividades.
O modelo é utilizado, por exemplo, no caso do gerenciamento de equipamentos culturais, como casas culturais, museus e bibliotecas, para a gestão compartilhada de Centros de Educação Infantil (CEIs) e também de determinados estabelecimentos de saúde, como é o caso das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs).
Mesmo que a lei não diga expressamente quando o poder público cede a essas entidades funcionários, bens móveis e imóveis para gerenciamento de equipamentos públicos, utilizados para atendimento direto ao cidadão, o processo se assemelha à concessão administrativa. Por essa razão existe, nesse caso, a noção de delegação dos serviços públicos.
O papel da administração pública na parceria é acompanhar e fiscalizar o desenvolvimento das atividades públicas por essas entidades e seu desempenho junto à sociedade. A celebração de parcerias também é motivo de polêmica. No quadro abaixo, você pode conferir alguns dos pontos discutidos pela literatura:
As parcerias firmadas com OSCIPs e OSCs seguem esse mesmo modelo?
A resposta é não. A parceria com demais organizações da sociedade civil é disciplinada por outras legislações específicas.
A parceria com Organizações Sociais de Interesse Público (OSCIPs), por exemplo, acontece via termo de parceria com a administração pública, para viabilizar atividades de interesse público que essas entidades já realizam em prol da sociedade. Do mesmo modo que acontece com as OSs, as OSCIPs recebem esse tipo de qualificação pelo poder público e sua atuação é disciplinada pela lei n.º 9.790/99.
Já as parcerias com Organizações da Sociedade Civil (OSCs), acontecem mediante termo de fomento ou termo de colaboração, de acordo com as regras estipuladas na lei 13.019/14. Nesse caso, a parceria visa a realização de atividades de interesse público, mediante a execução de atividades ou projetos estabelecidos em planos de trabalho de mútua colaboração com a administração pública.
Nesses tipos de parceria, portanto, não há a cessão de servidores ou de bens públicos para a realização de atividades, como pode acontecer na parceria com OSs.
Quer entender mais sobre Parcerias Público-Privadas? Confira o conteúdo do Projeto Direito ao Desenvolvimento: Parcerias Público-Privadas: um caminho para as metas do ODS 17
Há controle social dos serviços prestados por essas organizações?
Assim como outras atividades do Estado, as parcerias também são submetidas a avaliação dos órgãos de controle interno e externo do poder público. Enquanto a fiscalização dos órgãos de controle está relacionada com a transferência dos recursos públicos, a fiscalização sobre os produtos resultantes dessa parceria, sua economicidade e vantagem social fica sob responsabilidade do órgão ou entidade pública responsável por celebrar a parceria.
Do mesmo modo, tais parcerias se submetem às mesmas exigências legais de transparência pública, sendo seus respectivos objetos contratuais também passíveis de controle social.
Dessa forma, todo cidadão(ã) também tem o direito de monitorar, fiscalizar e acompanhar a execução das atividades realizadas indiretamente pela administração pública e pode exigir que os dados públicos relacionadas a essa atuação sejam disponibilizados a toda a sociedade. Trata-se de um complemento indispensável para garantir que as atividades desempenhadas por entidades do terceiro setor não desviem do sentido público ao qual se destinam.
Financiamento Privado
Como já foi comentado no texto sobre “O que são serviços públicos” da nossa trilha, quando repassados à iniciativa privada, os serviços públicos passam a ser explorados economicamente pelos concessionários ou permissionários destes serviços.
Nesse tipo de modelo, é por meio da cobrança de uma taxa módica aos consumidores dos serviços concedidos, fixada de acordo com o projeto de licitação, que os gastos relacionados à operação e ao aprimoramento do serviço são viabilizados. O Estado não participa como financiador dessas atividades, mas assume o papel de acompanhar a adequada execução do contrato, por meio de uma agência reguladora.
Assim sendo, podem ser objeto desse tipo de exploração, por exemplo, os serviços de saneamento básico, distribuição de energia elétrica e o transporte público.
No entanto, para que sejam operacionalizadas, essas atividades devem atender às condições mínimas, estipuladas por lei, para que sejam prestadas adequadamente a população.
Assim, os serviços prestados devem: ser oferecidos indiscriminadamente para todas as pessoas (generalidade), a um preço razoável (modicidade), atendendo satisfatoriamente às necessidades dos usuários (eficiência), dando bom tratamento aos consumidores (cortesia) e prestado de forma contínua a toda a população (continuidade).
Quando não são respeitadas as condições mínimas de serviço adequado, fica o concessionário ou permissionário exposto às sanções legais e contratuais estabelecidos pelo poder público.
Do mesmo modo, nesses tipos de contrato os direitos dos usuários devem estar claramente garantidos, conforme disposto na Constituição Federal, cabendo ao Estado receber, apurar e solucionar as queixas de usuários em relação a prestação desses serviços.
Diferentemente dessas duas modalidades, concessionária e permissionária, na modalidade de autorização dos serviços públicos, os preços são livres, sem a necessidade de controle estatal. Elas recaem sobre certos tipos de atividades ligadas ao serviços de comunicação, como por exemplo, os serviços de telefonia móvel. Por estarem relacionados a direitos restritos e não públicos, ao invés de serem regidos pelo direito público, tais atividades ficam subordinadas ao código do consumidor.
Além dessas modalidades, há também uma outra possibilidade de financiamento e de apoio aos serviços públicos que vem ganhando destaque nos últimos anos no Brasil: o fenômeno do investimento social privado.
Você sabe o que esse termo significa e por que ele é considerado uma das apostas para a transformação da gestão pública?
Fique de olho no próximo texto para conferir.
Te esperamos!