Em 1 de abril de 2020, após forte pressão de economistas, parlamentares e setores da sociedade civil, foi sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro o projeto de lei nº 9236/17. O projeto, que havia sido aprovado pelo Senado em 30 de março e pela Câmara dos Deputados no dia 26 do mesmo mês, determina concessão de uma Renda Básica Emergencial de R$600 per capita a grupos vulneráveis da sociedade durante a pandemia de covid-19. Além da sanção, o presidente também editou medida provisória que autoriza a abertura de crédito extraordinário para o pagamento dos benefícios. Contudo, a data para início dos pagamentos ainda não foi estabelecida
Nesse post, o Politize! irá te ajudar a entender os motivos e o contexto de criação desse projeto de lei, além de te apresentar as condições para a concessão dos benefícios que ele prevê. Boa leitura!
Qual o motivo desse projeto de lei?
A pandemia de covid-19 tem gerado impacto desastroso na economia dos mais diversos países do globo. Isso porque, na tentativa de conter a rápida transmissão da doença, líderes mundiais foram levados a estabelecer uma série de medidas restritivas em seus territórios – como o isolamento social, o fechamento de fronteiras e de estabelecimentos comerciais.
Tais medidas implicaram em drástica redução das trocas internacionais de bens e serviços, suspensão das atividades de inúmeros setores produtivos e encolhimento vigoroso do consumo dos cidadãos. Em consequência, microempreendedores e trabalhadores autônomos perderam suas fontes de renda, e empresas de diversas partes do mundo tiveram que fechar suas portas ou reduzir seus gastos, promovendo demissões em massa.
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Diante desse cenário, a fim de garantir a sobrevivência daqueles que estão sendo mais economicamente afetados pela pandemia, países como Estados Unidos, Cingapura, Alemanha e Reino Unido passaram a implementar medidas de fornecimento de créditos emergenciais.
Nos Estados Unidos, por exemplo, o Congresso americano aprovou – em 24 de março – um pacote que prevê a concessão de US$ 1.200 (R$ 6 mil) per capita a todos os cidadãos das classes média e trabalhadora. De forma semelhante, em Cingapura, foi estabelecido o fornecimento de US$ 300 (R$ 1,5 mil) em uma parcela, com possibilidade de US$ 100 adicionais (R$ 500), para cada filho menor de 21 anos de uma família. No Reino Unido, o governo cobrirá até 80% dos ganhos dos trabalhadores autônomos até junho (limitados a 2.500 libras por mês). E na Alemanha, empresas e freelancers poderão receber até 15 mil euros (R$ 85,5 mil) em subsídios diretos durante três meses.
Neste contexto, tem se fortalecido pelo mundo o debate sobre concessão de uma renda mínima de emergência que auxilie a sobrevivência dos mais afetados. De acordo com Juan Pablo Bohoslavsky, especialista independente da ONU, a implementação da renda básica permite que desempregados, trabalhadores informais e autônomos consigam pagar despesas básicas como alimentação, moradia e saúde, durante a crise decorrente da pandemia.
Como é o histórico da renda básica no Brasil?
Movido pela ideia de tornar mais justa a distribuição de renda no Brasil, em abril de 1991, o então senador Eduardo Suplicy submeteu ao Senado Federal uma proposta para a introdução do Programa de Garantia de Renda Mínima (PGRM) no país (PLS 266/2001). A proposta previa que todo cidadão brasileiro maior de 25 anos, cuja renda mensal fosse menor do que o valor de 45 mil cruzeiros à época, poderia receber um complemento de renda que iria corresponder a 30% da diferença entre a sua renda mensal e os 45 mil cruzeiros. Por exemplo, se, na época, uma pessoa possuísse uma renda mensal de 30 mil cruzeiros, ela iria receber um rendimento extra no valor de 4 mil e 500 cruzeiros (o qual corresponde a 30% da diferença entre a renda dessa pessoa e o mínimo estabelecido, que é 15 mil cruzeiros).
O projeto admitia que sua implementação poderia ser financiada por recursos federais, sobretudo em substituição a planos pouco eficientes no combate à pobreza. Além disso, ficou estabelecido que o programa poderia ser realizado de maneira gradual, sendo que, no primeiro ano (1995), por exemplo, seria destinado somente a pessoas com idade superior a 60 anos, passando a atender a totalidade de público prevista, pelo menos, até o ano 2002.
Em dezembro de 2002, o projeto foi aprovado no Senado e, em dezembro de 2003, houve a aprovação na Câmara dos Deputados. Todavia, embora tenha se tornado lei em janeiro de 2004 (Lei 10.835), a concessão de uma renda básica mínima nunca havia sido colocada em prática, efetivamente.
Por outro lado, desde a aprovação da lei – em 2004 – foram inúmeras as discussões nos Poderes Legislativo e Executivo nacionais e estaduais em torno de projetos baseados na oferta de rendas assistenciais.
Como resultado, surgiram programas como o Bolsa Escola e o Bolsa Família. O primeiro, respectivamente, nasceu em 2001, sob iniciativa do então presidente Fernando Henrique Cardoso, e funcionava como programa de concessão de recursos às famílias de jovens e crianças de baixa renda como estímulo para que eles fossem mantidos regularmente nas escolas. De maneira semelhante, o Bolsa Família – instituído no governo de Luís Inácio Lula da Silva em outubro de 2003 – trata-se de um programa de transferência direta de renda às famílias brasileiras em situação de pobreza e de extrema pobreza, a fim de garantir o acesso a recursos básicos de educação, saúde e alimentação.
A implementação de projetos assistenciais, entretanto, não foi suficiente para que a discussão sobre a criação de uma renda básica desaparecesse no Brasil. Isso se deve, em particular, à postura ativista de Eduardo Suplicy em relação ao tema. Desde a tramitação de seu projeto no Congresso, o ex-senador já lançou três livros que discutem a necessidade do benefício: Renda Básica: Uma Proposta Radical Para Uma Sociedade Livre e Economia Sã; Renda Básica de Cidadania – A Resposta dada pelo vento; e Renda de Cidadania – a Saída é pela Porta. Estes têm sido divulgados não só em debates dentro do Brasil, como também mundo afora.
De qualquer modo, o assunto nunca havia ganhado tanta força no Brasil como nos dias atuais. A crise ocasionada pela pandemia de coronavírus tornou a possibilidade de transferência de renda mínima a cidadãos mais vulneráveis como um dos temas mais importantes do debate político, culminando assim, na aprovação pela Câmara e pelo Senado do recente projeto de lei (PL 9236/17).
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Do que se trata o PL de renda básica emergencial?
O projeto de renda básica foi construído justamente para auxiliar brasileiros que perderam suas fontes de renda devido a paralisação das atividades comerciais e produtivas. Essa paralisação é decorrente da medida de restrição social, imposta para atenuar a transmissão do covid-19 no país.
Inicialmente, após forte pressão popular, parlamentar e de economistas e governadores dos estados brasileiros, o governo Federal sinalizou a concessão de créditos no valor de R$ 200 por pessoa. Os parlamentares, no entanto, rejeitaram a sugestão e indicaram que o benefício deveria ser superior a R$ 500 reais. Assim, em 26 de março, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 9236/17, de autoria do deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG), que teve aprovação no Senado 4 dias depois, por unanimidade.
O projeto prevê o pagamento de um auxílio emergencial no valor de R$ 600 a pessoas de baixa renda durante três meses ou enquanto durarem as medidas de isolamento social destinadas a controlar a transmissão do Covid-19.
Na prática, o auxílio pode chegar a R$ 1.200 por família (dois auxílios máximos por família correspondentes a dois trabalhadores). Mulheres que provêem sozinhas o sustento de seus filhos, também receberão R$ 1.200 (os senadores sinalizaram a possibilidade de disponibilizarem R$ 1.200 também a homens que sustentem sozinhos suas famílias, porém isso será avaliado em outro projeto de lei).
Quando o benefício começou a ser disponibilizado?
No dia 1 de abril de 2020, Bolsonaro sancionou o projeto de lei que disponibiliza o auxílio, como confirmado por um tuíte da Secretaria-Geral da Presidência. Na mesma ocasião, o Executivo publicou uma medida provisória que autoriza a abertura de crédito extraordinário para o pagamento dos benefícios.
Novo Auxílio Emergencial em 2021
Em abril de 2021, inicia o pagamento da segunda rodada do Auxilio Emergencial. A Medida Provisória 1.039 de março de 2021, que instituiu o Auxílio Emergencial 2021, apresenta novas regras para os beneficiários em relação ao ano de 2020.
A principal mudança foi no valor do Auxílio. Com o novo Auxílio, o valor das parcelas irá variar de R$ 150 a R$375 conforme o perfil do beneficiário e composição da família. Por exemplo, para uma família monoparental – dirigida por uma mulher -, o Auxílio será de R$375; para pessoas que moram sozinhas, o Auxílio será de R$150 reais; e para demais famílias de R$250. Outra mudança é de que só será permitido o pagamento de uma cota por família.
O primeiro grupo de pagamentos seguirá as datas do programa Bolsa Família para aqueles que pertencem ao programa. Para quem não pertence, as datas de pagamento das parcelas ainda não foram liberadas.
Como é feito o pagamento?
Instituições financeiras públicas, a exemplo do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal serão responsáveis por realizar a operacionalização e o pagamento do auxílio. Para isso, elas deverão abrir contas do tipo poupança social digital em favor dos beneficiários, com isenção de tarifas de manutenção e direito a uma transferência bancária grátis por mês. As contas poderão ser aquelas já empregadas para o pagamento de recursos de programas sociais governamentais, como PIS/Pasep e Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
De acordo com o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, o pagamento provavelmente ocorrerá de forma escalonada, aos moldes da liberação de saque do FGTS em 2019.
Quem pode receber o auxílio?
O Auxílio Emergencial 2021 segue sendo destinado, particularmente, a trabalhadores informais. O foco nesse público de trabalhadores se justifica por eles não possuírem acesso à rede de proteção social que os empregados formais possuem (com iniciativas como seguro-desemprego, saque do FGTS e licença saúde). Por esse motivo, frente à crise provocada pelo covid-19, suas fontes de renda serão fortemente prejudicadas.
De modo geral, a concessão do benefício em 2021 se mantém ao mesmo grupo de trabalhadores que em 2020. Assim, poderão recebê-lo brasileiros, maiores de 18 anos, que:
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sejam empregadores sem CNPJ;
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sejam microempreendedores individuais (MEIs);
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sejam contribuintes individuais ou facultativos do Regime Geral de Previdência Social (RGPS);
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trabalham formalmente com contrato intermitente;
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estejam desempregados;
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trabalham informalmente e estejam inscritos no Cadastro Único (CadÚnico) (que é o registro nacional de pessoas de baixa renda, geralmente utilizado na prestação de benefícios sociais, como o Bolsa Família).
A nova rodada do auxílio emergencial não permitiu a inscrição de novos beneficiários, assim recebem o Auxílio Emergencial 2021 somente aqueles que já estavam cadastrados no programa em 2020 e que se encaixam nas regras de beneficiário.
Quem não tem direito ao auxílio?
Há, contudo, algumas exceções entre os trabalhadores informais. Assim, não tem direito ao benefício em 2021:
- famílias cuja renda mensal seja superior a três salários mínimos (R$ 3.300);
- famílias com renda por membro maior que meio salário mínimo (R$ 550);
- pessoas que tiveram rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70 em 2019;
- pessoas que possuíam bens de valor superior a R$ 300 mil em 2019;
- residentes médicos, estagiários e beneficiários de bolsa de estudo;
- trabalhadores com vínculo formal, isto é, trabalhadores formalizados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e servidores públicos (ainda que em contrato temporário). Portanto, trabalhadores formais de baixa renda e aqueles que tiverem suas jornadas e salários reduzidos não receberão o benefício;
- cidadãos que já recebem outro benefício (como Benefício de Prestação Continuada (BPC), seguro-desemprego, aposentadoria ou pensão, excluindo os beneficiados pelo Bolsa Família, que poderão optar entre receber o valor pago pelo programa ou o auxílio de R$ 600).
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REFERÊNCIAS
Agência Brasil: Câmara aprova auxílio de R$ 600 por mês para trabalhador informal
BBC: como a Alemanha avança para conter o novo coronavírus e salvar vidas
Nexo Jornal: como vai funcionar o projeto de renda básica emergencial
RFI: Especialista da ONU defende renda mínima universal durante crise do coronavírus
Eduardo Suplicy: Garantia de renda mínima para erradicar a pobreza
Planalto: Lei n 10.835, de 8 de janeiro de 2004.
IPEA: o Programa de Garantia de Renda Mínima
Agência Senado: Senado vota nesta terça-feira criação da Renda Básica de Cidadania Emergencial
Rede Brasil atual: Senado ratifica Câmara e aprova renda de R$ 600 a R$ 1.200. Veja quem tem direito