Silo, pseudônimo de Mario Luis Rodriguez Cobos, foi um pensador e escritor argentino. Sua mensagem, ainda que simples, era profunda, suas palavras transcenderam fronteiras, inspirando diversas culturas em todos os continentes.
Seu pensamento se baseia na superação do sofrimento, humanização, não discriminação, denúncia e oposição às diversas formas de violência (física, racial, econômica, psicológica, entre outras).
Neste texto da Politize!, você vai conhecer um pouco mais sobre a vida e a obra de Silo, que inspirou a possibilidade de mudança pessoal e social por meio da paz e não violência.
Primeiros passos de Silo
Mario Luís Rodriguez Cobos, escritor argentino, nasceu em Mendoza no dia 6 de janeiro de 1938. Filho caçula de um pai dedicado à produção de vinho e de uma mãe professora de música, Mario teve dois irmãos.
Estudou em escola católica marista, onde se destacou em competições de xadrez e ginástica olímpica, obtendo classificações regionais.
Silo cursou disciplinas de Direito na Universidade de Buenos Aires e, posteriormente, quando inauguraram a faculdade de Ciências Políticas em Mendoza, retornou a sua cidade natal para continuar seus estudos nessa área.
Seu aspecto físico, sendo alto e magro, inspirou o apelido “Silo”, que futuramente se tornaria seu pseudônimo literário.
Com um grupo de amigos, estudantes de Ciências Políticas, o jovem Silo passou a se dedicar a observar certos fenômenos que afetavam a sociedade, com informações sobre América, Ásia e África e constataram a desigualdade social, as ditaduras e a guerrilha.
O foco do grupo de estudos se estendia à investigação sobre a condição humana e suas problemáticas existenciais e sociais. Eles tinham o interesse nas obras de Albert Camus e Jean-Paul Sartre, críticas ao armamento, e apoio aos processos de mudança que começaram a surgir.
Em 1960, aos 22 anos, Silo realizou uma viagem de moto pela América do Sul, semelhante à que Che Guevara havia feito oito anos antes. Essa experiência proporcionou a ele a oportunidade de entrar em contato com grupos de vanguarda.
Contemporâneos, os argentinos Silo e Che Guevara tinham ideais revolucionários, mas diferenciavam-se no método de ação, Guevara defendia a luta armada e Silo, a não violência.
Em 1969, Silo começou a vida pública com dois fatos importantes: um discurso feito em 4 de maio, em um pequeno povoado aos pés dos Andes e o livro “O Olhar Interior”, publicado em 1972.
A cura do sofrimento
Silo propôs fazer sua primeira fala pública em um espaço aberto da capital argentina ou em Santiago do Chile, mas a época era de ditadura e forte repressão. O Exército argentino somente permitiu que ele se manifestasse ao pé de uma montanha nos Andes, situado na fronteira entre Argentina e Chile, em um povoado chamado Punta de Vacas.
Como relatado Patrick Barr-Melej (2007), a polícia observava atentamente à distância, enquanto dezenas de jovens chilenos e argentinos que escutavam Silo compartilhar os seus pensamentos sobre um conceito de “revolução” – a “ revolução total ” – que abalou vários interesses culturais, sociais e políticos no Chile durante a época da Unidade Popular.
Aos 31 anos, aos pés do Aconcágua, Silo realiza o primeiro discurso diante de um público de cerca de 200 pessoas, que ficou conhecido como “A cura do sofrimento”:
“Você deve saber que esse sofrimento é sempre baseado na violência que existe na sua própria consciência. Você sofre porque teme perder o que tem, ou pelo que já perdeu, ou pelo que não tem esperança de alcançar… Estes são os grandes inimigos do homem: o medo da doença, o medo da pobreza, o medo da morte, o medo da solidão”.
Barr-Melej (2007) destaca que “Enquanto um regime de direita estrangulava a esfera pública argentina durante as décadas de 1960 e 1970, o siloísmo apareceu principalmente em Santiago (Chile) e arredores, envolvendo jovens chilenos de vários estratos sociais.” para ouvir o pensador dizer:
“Dizem-me que os jovens em diferentes latitudes estão procurando falsas portas para sair da violência e do sofrimento interno. Procuram a droga como solução. Não procures falsas portas para acabar com a violência… Leva a paz em ti e leva-a aos outros”.
Eles acreditavam na transformação interna e psicológica, inspirados por figuras como Herbert Marcuse e Georges Gurdjieff. Silo partilha seus pensamentos sobre o sofrimento humano e a violência da “moralidade filisteia”:
Tu queres impor tua forma de vida ao outro, tu deves impor tua vocação ao outro… Mas quem te disse que és um exemplo que se deve seguir? … Onde está o molde e onde está o tipo para que tu o imponhas? Eis outra forma de violência. Só podes acabar com a violência em ti e nos outros e no mundo que te rodeia pela fé interna e pela meditação interna.
Silo propunha uma moral baseada na coerência – pensar, sentir e agir numa mesma direção – e na solidariedade – tratar os outros como quer ser tratado.
As ideias centrais desse discurso inspiraram o Humanismo Universalista, linha de pensamento plural, contra a discriminação, o fanatismo, a exploração e a violência. Os seis princípios do Humanismo Universalista tinham o compromisso de ação no mundo, através do Movimento Humanista:
- O ser humano como valor e preocupação central;
- Afirmar a igualdade de todas as pessoas e oportunidades iguais para todos;
- Reconhecer a diversidade pessoal e cultural;
- Sustentar o desenvolvimento do conhecimento, sem limitações impostas ao pensamento por preconceitos aceites como verdades absolutas ou imutáveis;
- Defender a liberdade de ideias e crenças;
- Repudiar todas as formas de violência (econômica, racial, sexual, religiosa, moral e psicológica etc).
O Movimento fundado a partir da década de 1980 deu origem a diversas organizações sociais, políticas e culturais (Partido Humanista, Convergência das Culturas, Comunidade para o Desenvolvimento Humano, Mundos sem Guerras e Sem Violência, Centro de Estudos Humanistas) nos cinco continentes.
No entanto, nem tudo foram flores nessa jornada. Em alguns países, grupos acusaram, sem comprovação posterior, o Movimento Humanista de ser uma seita, assim como difamaram as ideias do pensador argentino. Tais acontecimentos não intimidaram Silo, que continuou seu caminho não violento e humanizador.
Uma vida com propósito
Silo realizou palestras e conferências, além de participar de encontros internacionais. Nestes eventos, ele compartilhou seus pontos de vista e ensinamentos sobre a reflexão interior e ação social.
Em 1981, foi convidado a expressar as suas ideias, especialmente sobre a não violência, a ação válida e o sentido da vida, durante eventos na Europa (Madrid, Paris, Roma, Berlim), na Índia (Bombaim), no Sri Lanka (Colombo), Califórnia (San Francisco), México, entre outros.
Outro destaque foi sua participação ativa no processo do fim da Guerra Fria. Com a Glasnost e a Perestroika de Gorbachov na antiga União Soviética, Silo manteve contato direto com importantes lideranças russas, principalmente com o ministro de Relações Exteriores da época, Eduard Shedvarnadze.
Devido a essa contribuição, Silo recebeu o título de Dr, Honoris Causa da Academia de Ciências da Rússia, em 6 de outubro de 1993, “pelas suas contribuições ao Humanismo contemporâneo”.
Em 11 de novembro de 2009, Silo inspirou o surgimento da I Marcha Mundial pela Paz e pela Não-Violência, e é convidado a falar na Décima Cúpula dos Prêmio Nobel da Paz, em Berlin, na Alemanha. Com o discurso O Significado da Paz e da Não-Violência Hoje, o pensador insiste na principal urgência coletiva do momento: o desarmamento nuclear global.
Para Vilma Felix (2014) as sociedades contemporâneas tem uma permanente tensão entre as individualidades e coletividades. A pesquisadora analisou como o Movimento Humanista buscou superar tais tensões, através do estudo de campo sobre a primeira Marcha Mundial pela Paz e Não Violência.
A Marcha iniciou em 4 de outubro de 2009 na Nova Zelândia, percorreu 100 países e 300 cidades. Terminou em 2 de janeiro de 2010, reunindo cerca de 15 mil pessoas, em Puntas de Vacas, Argentina.
Os principais objetivos são o desarmamento nuclear mundial, a redução progressiva do armamento convencional e a construção de tratados de não-agressão entre países. Dez anos depois foi realizada a 2° Marcha e atualmente organiza-se a terceira edição da Marcha Mundial.
Parques de Estudo e Reflexão e Salas de Meditação
Outro feito idealizado por Silo foram os Parques de Estudos e Reflexão, criados nos cinco continentes, com a ajuda de voluntários e simpatizantes que realizam atividades de auto-gestão para a sua manutenção.
São espaços abertos ao estudo e reflexão, ao autoconhecimento, ao fortalecimento do afeto, da reciprocidade, onde as pessoas se encontram para estudar e meditar.
Os Parques contam com elementos cheios de significado:
- Sala de meditação totalmente branca, com formato semiesférico, sem símbolos ou imagens;
- Fonte que representa alegoricamente a união dos princípios feminino e masculino;
- Monolito, monumento de aço inoxidável, com o registro do ano em que o lugar foi fundado;
- Estela, com os nomes gravados de todos que contribuíram para a construção do espaço;
- Portal em estilo oriental delimita a entrada ao espaço de reflexão.
No Brasil existem três Parques, em Cotia (São Paulo), Igarassu (Pernambuco) e Maricá (Rio de Janeiro). Existem também espaços que contam com a Sala de meditação em Paraisópolis (Minas Gerais) e Tobias Barreto (Sergipe) e propiciam atividades de estudo, meditação e autoconhecimento.
Silo acreditava que somente criando espaços de estudo, troca de experiências, autoconhecimento e meditação, seria possível edificar bases sólidas para a superação da violência interna e social.
Em 16 de setembro de 2010, devido a uma doença renal, Silo morreu em casa, rodeado por sua família e alguns amigos próximos.
Obras literárias de Silo
Com o pensamento original e uma abordagem que tratou do tema da superação do sofrimento de várias maneiras, Silo teve uma produção literária vasta que foi traduzida e publicada em diversas línguas. Alguns de seus livros com breve descrição:
- Humanizar a terra: uma trilogia (O Olhar Interior, A Paisagem Interna e A Paisagem Humana) que mostra o caminho desde a interioridade mais profunda até ao mundo social e histórico;
- Experiências guiadas: narrações e jogos de imagens que convertem o leitor em protagonista dos mesmos e se mostram uma excelente ferramenta de trabalho de desenvolvimento pessoal;
- Contribuições para o pensamento: consiste em dois ensaios de reflexão filosófica, “Psicologia da Imagem” e “Discussões Historiológicas”;
- Mitos Raízes Universais: texto aborda diferentes culturas com base nos seus mitos e suas imagens mais profundas, com intuito de comparar os sistemas básicos de tensão no processo de formação dos grandes mitos (americanos, nórdicos, greco-romanos, persas, indianos, chineses, hebraicos, egípcios, entre outros);
- O dia do leão alado: histórias e contos do gênero fantástico que, em vez de nos manter em mundos de sonho, nos conduz sutilmente para as coisas importantes da vida;
- Cartas aos meus amigos: uma série de escritos nos quais Silo expõe sua filosofia político-social;
- Fala Silo: textos da participação de Silo em eventos públicos (apresentação de livros e conferências);
- Apontamentos de psicologia: conferências realizadas por Silo em 1975 (Corfu) e 2006 (Argentina), incluindo o Apêndice sobre as bases fisiológicas da psiquê;
- A Mensagem de Silo: lançado em 2002, o texto possui três partes: o Livro, a Experiência e o Caminho. A obra aborda temas relacionados à espiritualidade, ao sagrado, à morte e à imortalidade. Em seus últimos anos de vida, Silo ofereceu essa proposta de experiência profunda. Atualmente, existem comunidades da Mensagem de Silo que continuam seu legado por meio da prática de estudo e meditação.
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Referências:
- Barr-Melej , Patrick. «Revolução e libertação do ser: Notas sobre a origem e ideologia de um movimento esotérico contracultural durante o governo de Salvador Allende, 1970-1973» , Nuevo Mundo Mundos Nuevos [Online], Colóquios, Publicado em 18 de maio 2007 , consultado em 10 de outubro de 2023 . http://journals.openedition.org/nuevomundo/6057; DOI : https://doi.org/10.4000/nuevomundo.6057
- Documentário – Silo, un camino espiritual
- Felix, Vilma B. O movimento humanista e a marcha mundial pela paz e não violência -A busca da superação das tensões entre indivíduo e sociedade na criação das identidades coletivas. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Pernambuco, 2014.
- Revista Planeta – Parques de Estudos e Reflexão
- Silo.net – Sua mensagem, seu trabalho e sua vida pública
7 comentários em “Conheça Silo e seu legado de paz e não violência”
Texto muito bom.
Obrigado pelo conhecimento transmitido.
Excelente artigo, completo e esclarecedor da vida e obra de Silo Parabéns Cris!!
Muito bom, Silo foi esplendidamente descrito, parabéns Cristiane
Uma boa análise da obra de Silo, parabéns.
Um painel conciso mas bem detalhado da obra de Silo. Muito bom!
Excelente!
Excelente texto! Que a vida e a obra de Silo inspire milhares de seres humanos por esse mundo. Faço parte do organismo Mundo Sem Guerras e Sem Violências e estamos organizando a terceira Marcha Mundial pela Paz e a Não Violência. Fico muito feliz por esse texto que explica perfeitamente a origem dessa Marcha.