A União de Nações Sul-Americanas (UNASUL), criada em 2008 e encabeçada por Brasil, Argentina e Venezuela, tem muito a ensinar-nos sobre o processo de integração regional na América Latina.
Nesse texto, a Politize! te explica o que foi a UNASUL e a sua importância para a integração na região e as relações internacionais.
O que foi a UNASUL?
A UNASUL foi um bloco de integração regional formado por doze países da América do Sul criado em 2008.
O principal objetivo do bloco era o de fomentar parcerias entre os países que visem o fortalecimento das relações comerciais, culturais, políticas e sociais.
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Qual o caminho até a UNASUL?
A UNASUL foi consequência de um processo de integração regional na América de Latina que surgiu bem antes dela. Apesar de ter sido criada apenas em 2008, o primeiro antecedente do órgão data os anos 1970, quando Brasil, Argentina e Paraguai disputaram o território que hoje é a Hidrelétrica de Itaipu (PECEQUILO; HAGE, 2007).
Assim, pode-se considerar a energia diplomática gasta entre os três países para a construção da hidrelétrica o marco inicial do processo de integração regional na América Latina.
Além de Itaipu, outro fator de convergência entre os três países citados foi a Guerra das Malvinas, onde o Brasil ainda que de forma discreta, apoiou a Argentina (PECEQUILO; CARMO,2015).
Portanto, a UNASUL é criada devido a uma convergência programática de vários governos da América Latina como Bolívia, Brasil, Equador, Paraguai, Argentina, Uruguai, dentre outros (FUCCILLE, 2014). A cooperação não estaria portanto atrelada apenas a fatores comerciais. Não foi a única iniciativa.
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Objetivos e principais ações
A UNASUL tinha por objetivo principal construir um espaço de diálogo e articulação no âmbito cultural, econômico e político entre seus membros. Suas prioridades eram as políticas sociais, a educação, a energia, a infraestrutura, o financiamento e o meio ambiente.
O surgimento da UNASUL foi baseado na promoção do desenvolvimento e de uma identidade política preocupada especificamente com a qualidade da democracia na região. Os esforços do órgão estavam voltados para a formulação de políticas baseadas em direitos relacionados às necessidades dos cidadãos vulneráveis da América do Sul (Riggirozzi e Grugel, 2015).
Diversos órgãos foram criados no âmbito da UNASUL para tratar sobre cooperação na região em diferentes áreas, como o Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS). O CDS tinha o propósito de reordenar questões de segurança e defesa na América do Sul, a fim de demonstrar que a interferência americana evidenciada desde o fim da Guerra Fria não seria mais predominante na região (Malamud e Schenoni, 2016).
O CDS foi pensado para permitir que os governantes sul-americanos resolvam situações de crise de segurança sem intervenções extrarregionais. O objetivo maior era formar uma comunidade de segurança regional (Saint-Pierre e Palacios Junior, 2014).
Além disso, a UNASUL também criou conselhos específicos para as áreas de saúde, luta contra o narcotráfico, infraestrutura e planejamento, desenvolvimento social, educação, cultura, ciência, tecnologia e inovação.
Dentre as principais atuações do bloco, podemos citar o papel de mediação da crise entre Colômbia e Venezuela entre julho e agosto de 2010; na solução da crise institucional ocorrida na Bolívia em 2008; como também na aprovação da Declaração de Solidariedade com o Haiti que estabeleceu um fundo UNASUL-Haiti no valor de US$ 100 milhões também em 2010.
O processo de declínio do bloco
A crise na UNASUL começa a partir de 2016, com a chegada de Michel Temer a presidência do Brasil e com os governos de Maurício Macri na Argentina, Partido Colorado no Paraguai, Kuccynski no Peru e Sebastian Piñera no Chile.
A crise de fato só vai ser deflagrada em 2017, quando o Secretário-Geral, Ernesto Samper, decide deixar o cargo em protesto ao impeachment de Dilma Rousseff. Desde então o órgão encontra-se sem comando efetivo. De acordo com reportagem do jornal Folha de São Paulo, o Brasil em 2018 tinha uma dívida de R$12,5 milhões de reais pela falta de pagamento de sua contribuição compulsória (FOLHA, 2018).
Também em 2018, a UNASUL perde a sua sede administrativa tomada de volta pelo governo Equatoriano. A organização não tinha recursos para honrar os pagamentos de seus funcionários e manter a sede.
Após a posse de Fernando Huanacuni, colocado no cargo de forma interina em 2018, ocorre a suspensão voluntária de seis membros da organização: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Paraguai e Peru.
A saída de tais países foi feita com o objetivo de pressionar a organização para nomear um secretário geral permanente, de acordo com o regulamento interno, seria o argentino José Octávio Bordón. O nome não foi aprovado internamente e a UNASUL naquele momento se rompeu ao meio.
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Críticas e elogios ao processo da UNASUL
O principal fator positivo que podemos destacar em relação a UNASUL foi a quebra do modus operandi em relação ao regionalismo até então praticado no continente sul-americano. A UNASUL trouxe um aspecto ideológico, distante das grandes potências e voltado para o fortalecimento político da região.
E esse também pode ser considerado como um dos principais problemas. Como a UNASUL tinha um viés ideológico mais a esquerda, a partir do momento em que os principais países do bloco viram seus presidentes perderem as eleições para partidos voltados a direita, o bloco perdeu muita força.
Como os blocos regionais afetam a sua vida?
Podemos associar os blocos regionais a nossa vizinhança de fato. Uma vez que o Brasil forma um bloco econômico, político ou militar com a Argentina, essa união afetará a relação dos dois países com os vizinhos, no caso o Uruguai, Paraguai e Chile.
Os blocos regionais tecem parte dessa rede invisível de influência que existe na nossa geopolítica. O preço de determinados produtos do nosso dia a dia (como o pão por exemplo) depende também da boa relação do nosso país com os principais países que produzem o trigo.
Portanto, os blocos regionais são a forma como os países resolveram se alinhar em busca do desenvolvimento mútuo.
E aí, compreendeu melhor o que foi a UNASUL e o seu projeto de integração regional da comunidade de países sul-americanos? Deixe sua dúvida nos comentários!
Referências:
- Folha de S. Paulo – Renúncia de chefe expõe situação de penúria da Unasul.
- FUCCILE, A. O Brasil e a América do Sul: (re)pensando a segurança e a defesa na região. Rev. Bra. Est. Def. ano 1, nº 1, jul./dez., 2014. p. 112-146.
- MALAMUD, A. Overlapping regionalism, no integration: conceptual issues and the Latin American experiences. Working Paper, EUI RSCAS, 2013/20, Global Governance Programme-42, European, Transnational and Global Governance.
- PECEQUILO, C. S.; CARMO, C. A. do. O Brasil e a América do Sul: relações regionais e globais. Rio de Janeiro: Alta Books, 2015.
- PECEQUILO, C. S.; HAGE, J. A. A. Dilemas Sul Americanos: o Brasil, o Paraguai e Itaipu. Boletim Meridiano 47. V. 8, n. 84 (2007).
- RIGGIOROZZI, P.; TUSSIE, D. The rise of post-hegemonic regionalism in Latin America. In: ______. The rise of post-hegemonic regionalism: the case of Latin America. London: Springer, 2012. p. 167-182.
- SAINT-PIERRE, H. L.; PALACIOS JUNIOR, A. M. C. As medidas de confiança no Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS): análise dos gastos em defesa (2009-2012). Revista Brasileira de Política Internacional, v. 57, n. 1, p. 22-39, 2014.