Com a votação do parecer do impeachment no plenário da Câmara dos Deputados neste domingo, vale entender uma importante polêmica: a ordem de votação dos deputados amanhã. De um lado, Cunha sustentou que a votação do impeachment deveria ocorrer do sul ao norte – posição que abandonou durante a semana. De outro lado, deputados pró-governo defenderam uma votação mista, por ordem alfabética. No final, prevaleceu a ordem alternando estados do norte e do sul, e vice-versa.
Vamos entender por que esse ponto causou polêmica?
O que diz a Lei?
O procedimento de votação sobre a admissibilidade de um processo de impeachment é determinado em lei, nesse caso, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados.
Segundo o regimento, assim que acaba a discussão do parecer sobre um pedido de impeachment (Art. 218, Parágrafo 8º),
esse mesmo parecer é submetido a votação para decidir se o pedido deve ser encaminhado ao Senado ou não. Essa votação deve ser nominal, o que significa que cada voto será revelado com o nome do respectivo votante – trata-se, portanto, de uma votação aberta, e não secreta.
Essa votação nominal, também de acordo com o regimento (Art. 187 4º), deve ser feita “(…) pela chamada dos Deputados, alternadamente, do norte para o sul e vice-versa, (…)”.
Isso posto, a definição da ordem de votação deveria ser algo simples. Contudo, a falta de clareza na redação do regimento somada a interesses políticos tornaram a ordem de votação um ponto de disputa entre diferentes interpretações da lei.
Interpretações
Votação inteira do sul ao norte
A interpretação dada por Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é a de que o “alternadamente” é em relação a cada votação nominal, e não a cada voto. Isso significa que se a última votação nominal começou pelos deputados dos estados do sul, por exemplo, a seguinte deveria começar pelos do norte e assim por diante, invertendo a ordem a cada nova votação nominal.
A última votação que seguiu semelhante ordem de votação, sustenta Cunha, foi a eleição de Severino Cavalcanti para a presidência da Câmara, em 2005. Considerando que essa votação de 2005 foi realizada dos deputados do Norte para os do Sul, deveria-se começar pelo sul na votação de domingo.
Entretanto, Cunha voltou atrás durante esta semana, concordando que a votação deveria ser alternada no sentido norte-sul.
Votação inteira do norte ao sul
Rubens Pereira (PCdoB-MA) defendeu que a votação de 2005 não deveria contar, pois, como descreve o próprio regimento interno da Câmara, a eleição do Presidente da Câmara deve ser feita por “escrutínio (voto) secreto” e não por voto nominal. Removendo-se esse precedente, sobra apenas a votação de um projeto de lei, presidida por (PSDB-MG) quando estava na Câmara, em 2001 – até mesmo essa referência é incerta por não fazer referência nem ao Art. 217 nem 218 do regimento interno da Câmara, que indicam as situações em que se deve usar o procedimento de norte a sul e vice-versa. Em todo caso, excluída apenas a votação de 2005, a chamada deveria ocorrer do norte ao sul, sem alternância.
Votação alternada entre norte e sul
O deputado (PDT-MA) propôs uma interpretação diferente: o “alternadamente” não diz respeito à sessão, mas aos votos, de tal modo que vota um deputado do norte, depois um do sul e vice-versa, seguindo em ordem alfabética até que se cubra todas as regiões – esse procedimento, argumenta Rocha, seria o mesmo do processo de impeachment de Collor.
Buscando esclarecer a questão, o deputado pediu ao STF que desse sua interpretação do regimento, porém o pedido foi negado pelo ministro Edson Fachin. Em consonância com a jurisprudência consolidada, a interpretação do regimento interno da Câmara é considerada uma matéria interna corporis, isto é, que só pode ser tratado no âmbito da própria Câmara.
No fim das contas, ficou decidido que a votação será alternada entre bancadas estaduais, começando com uma do norte, seguida por uma do sul, e vice-versa (uma bancada do sul e depois outra do norte).
Mas por que isso é importante?
Afinal, por que tanta discussão em torno da ordem de votação? Ela realmente importa?
Para Eduardo Cunha, a resposta é não, visto que os deputados em geral já têm um voto fixo, e não a abandonariam em virtude de uma mudança nas circunstâncias. Dessa forma, o fato de um deputado saber ou não o andamento da votação não deveria alterar sua disposição de voto.
Os governistas, por outro lado, temem que a ordem de chamada proposta por cunha produza um efeito manada durante a votação, caso venha a ser realizada como propõe Eduardo Cunha. Começando pelas regiões mais favoráveis ao impeachment – Sul e Sudeste – os votos pró-impeachment se acumulariam em proporção, dando aos parlamentares remanescentes na ordem de chamada a impressão de que o impeachment não pode mais ser impedido. Teme-se que com isso, deputados inicialmente anti-impeachment que votam apenas no final – como os das regiões Norte e Nordeste, onde o governo encontra maior apoio – acabem por ceder ao sentimento geral da votação, por verem diminuído o impacto de seu voto individual.
Veja a ordem dos estados na votação de domingo (17/04):
Roraima
Rio Grande do Sul
Santa Catarina
Amapá
Pará
Paraná
Mato Grosso do Sul
Amazonas
Rondônia
Goiás
Distrito Federal
Acre
Tocantins
Mato Grosso
São Paulo
Maranhão
Ceará
Rio de Janeiro
Espírito Santo
Piauí
Rio Grande do Norte
Minas Gerais
Bahia
Paraíba
Pernambuco
Sergipe
Alagoas